Ilustração: Caco Bressane, para os Jornalistas Livres

Por Rafael Castilho*, para os Jornalistas Livres

Não aborte.
Mas se você for pobre, não saia fazendo filho por aí para que eles dependam de esmola do governo.
Então previna-se, mas não seja vagabunda de levar camisinha na bolsa. Não dê no primeiro encontro. Não use roupas apertadas e não provoque desejo indiscriminado nos homens. Não dance funk. Não queira merecer um estupro.
Mas, caso seja estuprada, ainda sim não aborte.
Não aborte, não tenha filhos por aí, não seja vagabunda, não dê, não provoque desejo. Se possível não exista.

Vá trabalhar, vagabundo.
Trabalhe, mas não proteste. Não saia por aí querendo direitos.
Não seja ingrato e aceite tudo de bom grado.
Se você quer ganhar mais, tem que ser estudado.
Se você é só estudante é vagabundo. Quem só estuda é filhinho de papai.
Filhinho de papai é vagabundo.
Se você só trabalha é trabalhador. Mas se não estuda não quer o melhor pra você, então é vagabundo.
Não seja um vagabundo. Não seja só trabalhador. Não seja só estudante. Não seja um pobre. Não seja um filhinho de papai. Se possível não exista.

Não ande de skate, não ande de bicicleta, não vista-se como gnomo. Não seja mais um alternativo. Aliás, nem são necessárias tantas alternativas.
Abaixe o som, desocupe as ruas, penteie este cabelo, emagreça, envelheça, cale a boca.
Não use tóxico, não seja viado, não dê a bunda, não use máscaras.
Não seja politicamente correto, coma a porra da banana, na Paulista não! Carnaval não! Na Pompeia não! Na Vila Madalena não! Metrô não! Ciclovia não! Faixa de Ônibus não! Exista não!

Agradeço pelas surras que meu pai me deu. Quem não fez merda não foi torturado. Em briga de marido e mulher ninguém mete a colher. Ele é preto de alma branca. Ele sabe se colocar no seu lugar. Quem mandou ela querer ter direitos iguais. Deu nisso. Não morreu nenhum santo. Ela bem que mereceu. Você me conhece. A mãe chora agora. Hoje em dia a gente sai é não sabe se volta. Eu pago os meus impostos. Queremos Barrabás. Tudo o que eu penso eu falo na cara. Não adianta dar o peixe. Sabe com quem você está falando? Então por que não tem cota pra ruivo? Então porque você tem um IPhone? Deus castiga. Sua casa tem senha no WiFi. Ta com dó, leva pra casa. O Chico Buarque nunca trabalhou na vida. Eu sou assim e não vou mudar. Está é a minha opinião.

*Rafael Castilho é sociólogo com especialização em Política e Relações Internacionais e em Gestão Pública. Também é coordenador do Núcleo de Estudos do Corinthians.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

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