Uma das coisas mais marcantes em todas as manifestações organizadas pela direita após Dilma se reeleger é a selfie com o policial. Em todas essas manifestações, pessoas de pele clara, carteiras cheias e caras pintadas com as cores da nossa bandeira posaram ao lado de policiais militares pra tirar a famosa foto de si mesmo, como se dissessem à sociedade que aqueles homens e mulheres eram motivo de muito orgulho para toda a população do Brasil.
Eles só se esqueceram — ou nunca perceberam, mesmo — o que aquela corporação realmente representa para os moradores da periferia, maioria da população, que sempre que veêm uma viatura dobrar a esquina ficam ao menos desconfortáveis, pra não dizer completamente assustados, mesmo.

Crianças tiram fotos com a PM, considerado “heróis” no ato do dia 16 — Foto: Roberto Setton
Não é à toa. O tratamento da polícia para com os brancos de classe média é sempre de total respeito — eu mesmo já fui parado pela polícia algumas vezes e em todas elas fui tratado como senhor, e não como bandido. Ao mesmo tempo já ouvi relatos de pessoas negras que foram paradas pela polícia e saíram da batida completamente humilhadas.
A elite, porém, não tem como entender isso, pois lhes falta o que na periferia existe de sobra: o pensar nos outros.
Nos atos de ontem a cena foi diferente.
Podia-se ouvir, entre as palavras de ordem, os gritos de “Não vai ter selfie!”, que claramente era uma resposta direta à polícia e às selfies com a classe média. Não, não vamos tirar selfies com vocês, não vamos tratá-los como heróis. Vamos no máximo tratá-los com o respeito que gostaríamos de ser tratados, não vamos lhes atacar e não vamos lhes xingar, mas longe de nós tirar uma selfie com vocês.
Além de uma mensagem à polícia, o grito era uma clara provocação aos manifestantes de domingo passado. Vários cartazes, fotos e intervenções ocorreram pra lembrar os dezoito mortos na chacina que ocorreu em Osasco e Barueri na semana passada, antes da manifestação da direita, que não lembrou do ocorrido. E mesmo que eles fossem forçados a se lembrar, as opiniões também seriam bem diferentes das de ontem, que em sua esmagadora maioria pediam única e exclusivamente que justiça fosse feita.

Já a classe média, em sua maioria através dos comentários na internet, responsabilizou as vítimas — “Se estavam num bar, naquela hora, boas pessoas não eram”. A lei, porém, deve ser igual para todos, e toda pessoa merece um julgamento antes de receber sua pena.
E mesmo que a classe média sonhe que esse momento um dia chegará, ainda não vivemos no mundo de Judge Dredd, daquele filme com o Stallone, em que os policiais são também juízes e executores das sentenças.
Diante de tudo isso, não é de se espantar que os policiais presentes na manifestação do último domingo sorrissem ao ver as câmeras dos celulares apontadas pra sua face. É de se espantar, porém, que a periferia ainda tenha que sofrer essa segregação até quando vai às ruas lutar. Por tudo isso — e mais um pouco — , realmente, não houve selfie com os policiais.
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