O MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) voltou à cena hoje (02/09) com mais uma ocupação.
O movimento ocupou um terreno de 60 mil m² no centro de São Bernardo, na Rua João Augusto de Souza, em frente à histórica fábrica da Scania, berço do movimento sindical que levou ao surgimento de Lula como liderança metalúrgica. Trata-se de um terreno particular, cercado por condomínios de alto padrão, que nunca recebeu qualquer uso além da cruel especulação imobiliária e em desrespeito explícito à função social da propriedade — definida pela Constituição de 1988 como obrigatória. Para o Estatuto da Cidade, Lei federal que regula a obrigatoriedade da função social da propriedade, toda propriedade precisa ter algum uso que envolva “o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas”. Esse terreno não está de acordo com a norma jurídica do país, uma vez que não é utilizado para a sociedade de nenhuma forma.
A importância dessa ocupação é enorme uma vez que, só em São Bernardo, o déficit habitacional é de 90 mil famílias sem casa, o maior do ABC, que acumula 230 mil famílias sem teto. A ocupação foi feita por quinhentas famílias do MTST que buscam, com a força da luta, garantir o direito constitucional e humano de ter uma casa. A legitimidade da ocupação se garante pelo simples fato de que o terreno foi sempre alvo exclusivo da especulação imobiliária.
Em um momento de crise econômica aguda no país, com diversos ataques aos direitos sociais, o desemprego em alta e os salários em baixa, muitas pessoas não têm como garantir uma casa, seja por meio de aluguel ou pela compra da própria casa. Assim, a ocupação de terrenos que não têm uso, apenas são deixados à espera da valorização de seu preço, enquanto milhares de pessoas não têm um teto sob o qual se abrigar, não é apenas um passo lógico, mas que caminha em busca da igualdade.
A ocupa
Localizada no centro de São Bernardo, região metropolitana de São Paulo, foi feita por volta das 00:30h da madrugada de sexta (01/09) para sábado (02/09) como é prática como do MTST, que evita realizar suas ações durante o dia para não atrair a atenção dos vizinhos e policiais. Cerca de 500 famílias ocuparam o terreno, sendo a maioria de São Bernardo, mas algumas vindo das cidades vizinhas, como Mauá, Santo André e Diadema.
O procedimento foi padrão. A hora da chegada é a mais importante e tensa, todos têm que sair dos ônibus rapidamente, pegar os kits de bambu e lona e, no meio do escuro total, começar a construir suas “casas”, na verdade, barracas precárias. É uma imagem impressionante, mais de quinhentas pessoas correndo por um campo aberto, só com as luzes do celular e às vezes uma lanterna aqui e ali, fazendo um trabalho bem coordenado de montar a estrutura de bambu, fincar a estrutura na terra e amarrar a lona. Em pouco menos de uma hora todo o campo já está lotado de pequenas barracas, algumas concentradas umas perto das outras, formando pequenas vilas. Outras pessoas escolhem um pouco de privacidade e montam suas barracas mais longe, e assim todo o campo acaba por ser ocupado.
Esse terreno era ideal para se montar o acampamento, pouco íngreme, bem largo e plano. As dificuldades de engenharia para montar a barraca são menores que em terrenos (muitas vezes já ocupados pelo movimento) que têm grandes barrancos, declives e a geografia passa a ser mais um problema. Mas, mesmo com um terreno bom, o pior problema enfrentado pelo movimento ao iniciar uma nova ocupação é a polícia.
A Polícia sempre acaba chegando, uma hora ou outra, e é esse o ponto que vai definir se a ocupação terá futuro ou acabará rapidamente. Caso a polícia resolva atacar, o movimento vai ter que escolher entre a resistência ou a saída do terreno. A escolha tem que ser tática: em alguns momentos é melhor sair, muitas vezes há crianças e idosos demais ou a polícia está muito intransigente. Em outros casos, o diálogo é possível. O movimento consegue explicar quais são seus objetivos e quem são aquelas pessoas que, se pudessem, não estariam ali no meio da noite e do frio. Há casos em que, tamanha é a importância do movimento, que os PMs respeitam a ocupação e deixam sua tradicional truculência de lado.
Ontem, a ação da PM, que chegou pouco mais de uma hora depois do início da ocupação, foi mais agressiva. Os primeiros policiais chegaram já com armas de grande calibre e munição dispersiva. Em menos de meia hora da chegada da primeira viatura, a pequena rua que levava até o terreno estava tomada por carros da ROTA e de viaturas comuns. A discussão entre o capitão e os advogados do movimento foi tensa. Mas como o número de pessoas dentro do terreno era muito grande, e como não havia nenhuma disposição para a violência entre os sem-teto, a polícia desistiu de intervir. Quem sabe o cordão de isolamento que os Sem Teto fizeram em frente ao terreno, com cerca de cem pessoas cantando em uníssono tenha influenciado a decisão de não reprimir a ocupação.
Com a saída da PM, a calma enfim chegou à ocupação. O maior perigo já passara, a maior parte das barracas de lona já estava montada (algumas pessoas já até dormiam dentro de suas casas improvisadas). Enquanto os últimos bambus eram fincados, a única coisa que faltava era terminar a construção da cozinha, o principal local do acampamento, aonde as refeições são preparadas e as reuniões ocorrem.
A ocupação continua resistindo. Durante a manhã, a PM fez uma passagem de averiguação, mas não houve tensões.

Veja em vídeos como foi a ocupação:
Deixe um comentário