Conecte-se conosco

Artigo

Morre dom Paulo Evaristo Arns. Morre um santo

Publicadoo

em

Morreu hoje (14/12), em São Paulo, o arcebispo emérito da capital paulista, cardeal dom Paulo Evaristo Arns, 95.
Lutador pela liberdade, contra a Ditadura Militar, guardião dos Direitos Humanos, incentivador da Teologia da Libertação, foi um exemplo de coragem e amor ao próximo.
A seguir, trechos da biografia escrita pelo jornalista :

REGIME MILITAR

Nomeado bispo em 1966, por decisão pessoal do papa Paulo 6º, a quem conhecera em Roma, voltou à terra natal para ser ordenado ao lado dos colonos de Forquilhinha [região de Criciúma, em Santa Catarina.].
A seguir assumiu a função de bispo auxiliar de São Paulo, por uma improvável escolha do cardeal Agnelo Rossi, alinhado à ala conservadora da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.
Como bispo auxiliar da região norte da maior cidade brasileira, começou a visitar os presos comuns no Carandiru e, por designação do cardeal, foi ao presídio Tiradentes saber das condições de um grupo de frades dominicanos encarcerados por motivos políticos, entre eles frei Betto e frei Tito.
Constatou que foram torturados e encontrou Tito esvaindo-se em sangue. Voltou ao cardeal e relatou o que viu. Para sua surpresa, como relata em “Da Esperança à Utopia”, ouviu de seu superior: “Muito obrigado dom Paulo, (…) mas outros me garantem que não há tortura nas nossas prisões”. Ele nunca criticou publicamente dom Agnelo pela declaração.
Mas a partir desse batismo de sangue, assumiu em São Paulo a vanguarda da luta pelos direitos humanos e pela defesa dos presos políticos.
Em outubro de 1970, foi designado titular do arcebispado em substituição ao cardeal Rossi, que foi servir em Roma. Outra vez, uma escolha pessoal de Paulo 6º, o papa que dom Paulo mais admirou e de quem se aproximara em passagens de estudos pelo Vaticano.
À frente da Igreja de São Paulo, aplicou ensinamentos do Concílio Vaticano 2º e transformou em ações concretas a opção preferencial pelos pobres afirmada na Conferência Episcopal de Medellín, Colômbia, em 1968.
Começou a gestão vendendo o imponente palácio episcopal. Com o dinheiro, comprou terrenos em bairros populares para construir centros comunitários e instalações religiosas modestas, dando início à “Operação Periferia”.
Jogou os costumes principescos de seus antecessores pela janela. Surpreendeu os religiosos que o serviram na Cúria paulista ao sentar-se com eles às refeições.
Inspirou-se no que ouviu do pai ao contar-lhe que queria ser padre: [você] “sempre será filho de colono e de seu povo”.
Agindo como tal, investiu em trabalho comunitário, foi às periferias, voltou-se para os migrantes e espalhou Comunidades Eclesiais de Base pelos quatro cantos da cidade.
Ao mesmo tempo, revitalizou o estudo doutrinário entre os religiosos e fez da evangelização um objetivo constante em todas as ações da Arquidiocese, até nos presídios.
São dessa época seus grandes confrontos com os generais da ditadura. Enfrentou os sucessivos comandantes do 2º Exército (hoje Exército do Sudeste), sediado em São Paulo, e até presidentes da República.
Num encontro com o presidente Emílio Garrastazu Médici, a conversa encerrou-se aos berros. Foi Médici quem decretou, depois, em 1973, a cassação da rádio Nove de Julho, tradicional emissora da igreja em São Paulo.
Do mesmo modo, desafiou as autoridades civis de São Paulo, de governadores afinados com a ditadura a secretários de Segurança e delegados de polícia, tentando preservar a vida e assegurar os direitos fundamentais dos presos políticos.
Com base no exemplo de Paulo 6º no Vaticano, reproduziu na Arquidiocese de São Paulo a Comissão Justiça e Paz, em 1972, indo buscar o jurista Dalmo de Abreu Dallari para ser seu primeiro presidente. Paulo 6º declaradamente o admirava e, no consistório de 1973, elevou-o a cardeal.
Sem perder o foco na ação propriamente religiosa de que pouco se fala, usou a nova insígnia papal para se contrapor aos desmandos da repressão política. Apoiou decididamente o procurador de Justiça Hélio Bicudo em sua luta contra o Esquadrão da Morte -quadrilha policial de assassinos de que fazia parte um notório torturador e ícone da ditadura, o delegado Sergio Paranhos Fleury.
Foi a Comissão Justiça e Paz que publicou nos anos 70 o livro de Bicudo sobre o Esquadrão, recusado por editoras comerciais.
No período sofreu ameaças e calúnias —como denúncias anônimas tachando-o de homossexual. Sobre isso jamais se pronunciou, demonstrando absoluto desprezo por seus detratores.
Mas admitiu ter sido informado de que o acidente de automóvel que sofreu no Rio de Janeiro fora na verdade um atentado à sua vida.
Sobreviveu e ainda bateu muito na ditadura -por exemplo, patrocinando a publicação “Brasil: Nunca Mais”, sobre os mortos e desaparecidos na ditadura militar. Apanhou também.
Um dos animadores de suas organizações de base, o operário Santo Dias, presidente da Pastoral Operária, foi assassinado pela polícia com um tiro nas costas durante uma manifestação popular.
O nome do operário -“cuja sorte foi a mesma de Jesus Cristo pregado na cruz”, nas palavras de dom Paulo- tornou-se mais um símbolo da luta do cardeal com a criação, anos mais tarde, do Centro Santo Dias de Defesa dos Direitos Humanos, hoje internacionalmente conhecido.
Na prisão, dom Paulo foi ainda visitar —e procurar proteger sob o manto cardinalício- sindicalistas e estudantes.
No episódio Herzog, sua figura se agigantou. O regime militar fez de tudo para desqualificá-lo e ensaiou até manobras diplomáticas junto ao Vaticano por seu afastamento da Arquidiocese de São Paulo.
Foram esforços vãos.

JOÃO PAULO 2º

Surpreendentemente, sofreu seu maior revés no período da restauração democrática do país. Numa iniciativa cujas motivações mais profundas são até hoje mal explicadas, o papa João Paulo 2º fracionou a arquidiocese em seções menores e, por consequência, com menos poderes.
Antes que o fato fosse consumado, o cardeal se queixou pessoalmente ao papa, que negou ter dado a ordem. Porém, como dom Paulo deixa claro em suas memórias, nada dessa magnitude acontece sem autorização expressa do pontífice.
Também na campanha do Vaticano contra a Teologia da Libertação, arquitetada pelo então cardeal Joseph Ratzinger (depois papa Bento 16), João Paulo 2º agiu do mesmo modo.
Disse a dom Paulo que não era contra a doutrina, mas deixou a Cúria Romana mandar um visitador para colher elementos processuais com vistas a bombardear a prática da Teologia da Libertação em São Paulo.
Depois dessas contrariedades, o cardeal se afastou, em 1998, por limite de idade, do comando da Arquidiocese de São Paulo, levando o título de arcebispo emérito.
Passou os últimos anos de sua vida entre orações, leituras e assistência aos idosos, recebendo ainda inúmeras homenagens, entre as quais a da presidente Dilma Roussef que, em 18 de maio de 2012, foi visitá-lo na Congregação Franciscana Fraternidade Nossa Senhora dos Anjos, em Taboão da Serra (SP).
Na ocasião, Dilma contou a ele as providências do governo para criar a Comissão da Verdade, instalada poucos dias antes. Já bastante combalido, não fez comentários públicos a respeito.
A rigor, seu derradeiro gesto de caráter político -embora de fundo religioso- ocorreu pouco antes de deixar o comando da Arquidiocese, em 1998, quando reagiu de forma dura às atitudes da Cúria Romana, levando João Paulo 2º a admitir, em uma difícil conversa pessoal com o cardeal brasileiro, que era, sim, o responsável final por aquelas decisões polêmicas.
“A Cúria sou eu”, disse o papa, provocado por dom Paulo. Mais uma vez, então diante da autoridade máxima da Igreja Católica Romana, o frade mostrou que não era frouxo.

Artigo

LUTA ANTIRRACISTA PRECISA ACERTAR A ‘CABECINHA’ DE WILSON WITZEL

Publicadoo

em

Há anos a tática sobre segurança pública no Rio se concentra em operações espetaculares que resultam, de tempos em tempos, em um derramamento de sangue, com direito a traficantes, moradores de comunidades e policiais mortos.

O roteiro todos já conhecem. Unem-se policiais de diversos batalhões, eles invadem determinada localidade com poder de fogo muito superior, e terminam matando principalmente a ponta da cadeia do tráfico, a base da estrutura das facções, enquanto seus líderes comandam tudo de longe ou de dentro dos presídios, e no dia seguinte um novo comando paralelo se instala no mesmo lugar.

É uma máquina de moer gente. Mata-se loucamente, e no dia seguinte é como se nada tivesse mudado.

A situação é esta porque em certos locais do Rio a única chance de um jovem criado em situação de miséria comprar um tênis da moda é segurando uma arma que ele não sabe atirar direito. A parcela da população favelada que sobra do espaço da cidadania, por motivos que vão desde abandono familiar, déficit educacional ou imposição de terceiros, é seduzida por uma rede comércio ilegal que promete dignidade no contexto da extrema exclusão e sacrifica a vida destas pessoas como copos descartáveis.

São quase sempre jovens negros, no tráfico, na polícia ou nas casas vizinhas ao confronto entre eles. E suas mortes não comovem nem de perto tanto quanto o cãozinho morto na porta do Carrefour.

É assim desde que a abolição foi seguida pela recusa em absorver os negros no mercado formal de trabalho e a imigração de estrangeiros brancos para substituí-los. A pobreza se perpetuou a partir da negligência em gerar oportunidades e condições de vida saudável, e nela a criminalidade floresceu desde sempre.

Se soubesse da história do Rio, Wilson Witzel, o novo governador eleito no estado, que repete a palavra matar o tempo todo para agradar os ouvidos de uma classe média tanto preocupada com roubos quanto é racista, adepta de praias segregadas, odienta do funk, do samba e de pagode, faria algo para interromper a espiral macabra que corrói sua sociedade por dentro.

Alteraria o atraso social com políticas públicas inteligentes de ensino integral, cooperativas de trabalho, reforma do sistema penitenciário, investimento em tecnologia da informação e preparo de suas polícias. Enfrentaria o racismo com mais educação e cultura, e não faria coro com privilegiados que gostam de se remeter aos negros com termos tipicamente usados para animais, como “abate”.

Em 2010, o Rio viu Sérgio Cabral vencer Fernando Gabeira aproveitando-se, em parte, da crença de que o adversário era veado e maconheiro. Dali seguiu-se uma bandalheira que resultou, nos últimos anos, no colapso total das contas públicas. Já não há mais espaço de tempo para novos demagogos. E nem a população suporta mais mentiras no lugar de competência. Algo melhor que matar precisa vir à cabeça do novo governador. E eu sugiro que superar o seu racismo entranhado seja o melhor começo.

Por: Rodrigo Veloso – Colaborador dos Jornalistas Livres morador do Rio do Janeiro formado em Relações Internações

Continue Lendo

Artigo

OS BACHARÉIS DA RESISTÊNCIA

Publicadoo

em

 

Artigo de Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História da Universidade Federal da Bahia, com ilustração de Duke

 

O ano de 2005 é chave para a compreensão da crise brasileira contemporânea. Foi aí, no chamado “mensalão”, que se desenhou pela primeira vez aquela que, na minha percepção, é a característica mais importante da crise: o ativismo político dos profissionais da lei.

Desde 2005 que juízes, desembargadores, ministros dos tribunais superiores e procuradores são personagens recorrentes na crônica política. Depois de 2014, a Operação Lava Jato se tornou palco para a fama desses profissionais. Mais do que nunca, o Brasil é a República dos Bacharéis.

Os marqueteiros da Operação Lava Jato afirmam que pela primeira vez na história do Brasil os empresários milionários sentiram na pele o peso da lei. É uma meia verdade. Se é meia verdade, por consequência lógica, é meia mentira também.

Os empresários presos atuavam no ramo da construção civil e de obras de infraestrutura. Os agentes econômicos envolvidos com atividades financeiras e especulativas não foram incomodados. Somente os mais ingênuos são capazes de acreditar que Marcelo Odebrecht ou Léo Pinheiro são mais corruptos que os executivos do Itaú ou do Santander, que também financiavam campanhas eleitorais, que também estabeleciam relações nada republicanas com a classe política.

Por que uns foram presos, enquanto os outros estão aí, lucrando bilhões todos os anos?

A seletividade da Operação Lava Jato é óbvia e salta aos olhos de qualquer um que queira enxergar a realidade. A narrativa do combate à corrupção está sendo utilizada como pretexto para o desmanche do Estado e dos investimentos públicos em infraestrutura, o que favorece os interesses ligados ao capital financeiro nacional e internacional. A comunidade jurídica brasileira colaborou com esse projeto, ajudou a desmontar parques industriais, levando empresas nacionais à falência, sempre com o pretexto do “combate à corrupção”.

Como bem disse Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça, a Justiça brasileira “prometeu acabar com os cupins, mas acabou ateando fogo à casa”.

Porém, seria um erro dizer que a comunidade jurídica é um bloco homogêneo, que todos os seus integrantes se movem na mesma direção. Alguns momentos na cronologia da crise mostram que o cenário não é tão simples, que há bacharéis dispostos a confrontar a hegemonia daqueles que entregaram seus serviços aos interesses do capital financeiro internacional.

Destaco aqui três nomes: Rodrigo Janot, Rogério Favreto e Marco Aurélio de Mello.

Em algum momento da crise, os três contrariaram interesses hegemônicos. Meu objetivo aqui é relembrar esses episódios e sugerir que a resistência democrática não pode abrir mão da institucionalidade. Ir às ruas e disputar o imaginário das pessoas não significa deixar de operar por dentro das instituições burguesas, explorando suas contradições. Uma coisa não exclui a outra. Uma coisa complementa a outra.

 

Rodrigo Janot

Rodrigo Janot foi empossado pela presidenta Dilma Rousseff como procurador geral da República em 2013, sendo reconduzido ao cargo, também por Dilma, em 2015. Janot foi personagem protagonista em alguns dos momentos mais agudos da crise brasileira, no período que compreendeu a derrubada de Dilma Rousseff e a ascensão de Michel Temer.

Sinceramente, não sou capaz de definir a identidade ideológica de Rodrigo Janot, de dizer se ele é de esquerda ou de direita. Talvez ele não pense a realidade nesses termos. Antes de se tornar procurador geral da República, Janot tinha atuação engajada na defesa dos direitos da população carcerária. No segundo turno das eleições presidenciais de 2018, Janot se manifestou a favor da candidatura de Fernando Haddad.

26 de agosto de 2015. Sabatina de recondução de Janot à chefia da Procuradoria Geral da República. Senado Federal. A crise institucional se aprofundava e começava a se desenhar no horizonte o golpe parlamentar que meses depois derrubaria Dilma Rousseff.

A oposição, liderada por senadores do PSDB e do DEM, colocou Janot contra a parede. Ana Amélia, Aécio Neves, Aloísio Nunes, Antonio Anastasia exigiam que a PGR denunciasse a presidenta Dilma Rousseff. Foram quase 12 horas de uma sabatina tensa e atravessada pelo partidarismo político. Por inúmeras vezes, Janot disse que não havia indícios suficientes para fundamentar uma denúncia contra a presidenta da República.

Janot não denunciou Dilma enquanto ela estava no exercício do mandato.

Já com Temer, o comportamento de Rodrigo Janot foi completamente diferente. Foram duas denúncias, em pleno exercício do mandato. A primeira denúncia foi apresentada em junho de 2017. A segunda veio três meses depois, em setembro.

Michel Temer precisou acionar suas bases na Câmara dos Deputados para barrar as duas denúncias. Precisou liberar verbas para os deputados aliados. Precisou gastar capital político. Acabou lhe faltando fôlego político para aprovar a Reforma da Previdência, que era a grande agenda do seu governo. Capital político tem limite, igual a peça de queijo: diminui um pouco a cada fatia retirada.

Se Temer não conseguiu aprovar a Reforma da Previdência, parte da derrota pode ser explicada pelas flechas disparadas por Rodrigo Janot, que acabou colaborando para defender os direitos previdenciários dos trabalhadores brasileiros do ataque do capital especulativo.

Qual era o seu objetivo? Comprometimento com uma agenda social-democrata? Um republicanismo genuíno que parte do princípio de que não pode existir seletividade na aplicação da lei? As duas coisas juntas?

Não dá pra saber. Fato mesmo é que ao desestabilizar Michel Temer, Janot contrariou os interesses do rentismo.

 

Rogério Favreto

Quem acompanha a trama da crise brasileira lembra bem do dia 8 de julho de 2018. Era manhã de domingo e o país foi sacudido pela notícia que dividiu a sociedade, deixando metade da população em estado de graça e a outra metade babando de ódio.

“Lula vai ser solto!”. Assim, estampado em letras garrafais em todos os veículos da imprensa.

Rogério Favreto, desembargador do Tribunal da 4° Região em diálogo direto com lideranças petistas, autorizou um habeas corpus de urgência, determinando a soltura imediata de Lula.

Todos os envolvidos sabiam que Lula não seria solto. Lula nem fez as malas. O objetivo ali era tático: levar as instituições burguesas a extrapolar os limites da própria legalidade.

Sérgio Moro despachou estando de férias e negou o habeas corpus, o que ele não poderia fazer. Moro contrariou a ordem de um superior, subvertendo a hierarquia do Poder Judiciário.

Thompson Flores, presidente do Tribunal da 4° Região, cassou a decisão de Favreto, o que somente poderia ser feito pelo colegiado dos desembargadores.

Em um ato de resistência, Rogério Favreto deixou claro para o mundo que Lula é um preso político que a todo momento inspira atos de exceção.

 

Marco Aurélio Mello

Marco Aurélio Mello, tendo mais coragem que juízo, vem sendo a voz da resistência no Supremo Tribunal Federal. Eu poderia dar vários exemplos de ações de Marco Aurélio em defesa da Constituição, da legalidade democrática e da soberania nacional. Fico apenas com dois.

1°) Em 19 de dezembro de 2018, na véspera do recesso do Judiciário, Marco Aurélio soltou um bomba: em decisão autocrática determinou que a Constituição fosse respeitada, ordenando a libertação de todos os presos condenados em segunda instância, o que beneficiaria o presidente Lula.

É que a Constituição é clara. Só pode prender depois do trânsito em julgado. Se está errado ou não é outra discussão. Constituição não se questiona, a não ser para fazer outra Constituição.

Liminar pra cá, liminar pra lá. Procuradores da Lava Jato convocando entrevista coletiva para dizer como STF deveria agir. Mais uma vez a sociedade dividida. Novamente, Lula nem fez as malas, pois experimentado que é, sabia muito bem que não seria solto.

Dias Toffoli, presidente do STF, derrubou a decisão de Marco Aurélio, contrariando o regimento interno da Casa, que diz que somente a plenária do colegiado é legítima para anular ato autocrático de um ministro.

Se Lula não estivesse preso, o regimento seria respeitado. Lula não é um preso comum.

2°) Na última semana, vimos outro embate entre Marco Aurélio e Dias Toffoli. Dessa vez, o motivo foi a venda dos ativos da Petrobras. Marco Aurélio, outra vez em decisão autocrática, proibiu a venda, num ato de defesa da soberania nacional. Dias Toffoli autorizou a venda, se alinhando aos interesses privados e internacionais.

Apresentei três exemplos, de três profissionais da lei que em algum momento da crise contrariaram os interesses que hoje ditam os rumos da política brasileira. Não existiu nenhuma articulação entre eles. Os exemplos mostram apenas que as instituições burguesas não são homogêneas, que existem contradições que devem ser exploradas.

A resistência democrática, portanto, precisa se equilibrar sobre dois pés. Um nas ruas, agitando e apresentando soluções para o nosso povo, que já vai começar a sentir na pele as consequências de um governo ultraliberal, autoritário e entreguista. O outro pé deve estar bem fincado nos corredores palacianos, onde se desenrolam as tramas institucionais.

Precisamos, sim, de líderes populares, de líderes que saibam falar ao coração do povo, que entendam as angústias da nossa gente. Precisamos também de articuladores, de conhecedores da lei e dos regimentos, de lideranças versadas no jogo jogado nos bastidores. Resistência democrática é trabalho de equipe.

 

Continue Lendo

Artigo

Armai-vos uns aos outros

Publicadoo

em

Por José Barbosa Junior
O presidente da República Fundamentalista de Vera Cruz (antigo Brasil – porque agora nada pode ser vermelho), decretou nesta terça-feira algumas flexibilizações na Lei que regulamentava a posse de armas, o que, na prática, significa que ele liberou geral. A proposta anterior, de no máximo duas armas por cidadão, passou para quatro armas, sendo liberadas outras mais, conforme a necessidade apresentada pelo futuro portador.
Em resumo, a barbárie está liberada oficialmente em nosso país. “Cidadãos de bem” agora vão poder, finalmente, matar os bandidos que lhe atormentam a vida. Por bandidos leia-se pobres, pretos, pardos e párias, que de já tão coisificados, tornaram-se sem valor e pessoalidade em sua existência.
O que mais me choca, porém, é que Bolsonaro foi eleito e é apoiado, inclusive e principalmente nesta questão, por gente que se afirma cristã. Isso mesmo! Gente que diz seguir aquele nazareno marginal que afirmou que “bem-aventurados são os pacificadores, pois eles serão chamados filhos de Deus”, aliás o mesmo que afirmou que “quem vive pela espada, morrerá pela espada”.
Parece estranho. E é.
Mais estranho ainda porque em toda a campanha do atual presidente, ele fez questão de repetir o versículo que diz “e conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”.
A verdade é que a liberação de armas só gerará mais violência num país que respira violência.
A verdade é que mais mulheres serão vítimas de feminicídio, já que seus maridos machões agora poderão ter suas armas para suprirem seus outros fracassos.
A verdade é que mais LGBT’s morrerão nas mãos de homofóbicos que disfarçam seus preconceitos em discursos machistas e religiosos.
A verdade é que agora fica mais fácil planejar o suicídio, endêmico numa sociedade cada vez mais doente e adoecedora, refém de um sistema que empurra pessoas à depressão (sem contar as depressões que independem de fatores externos) e num país onde adolescentes cada vez mais se matam por conta de bullying e outras coisas mais. Ah! E sem falar no alto índice de suicídio entre pastores, tema cada vez mais recorrente nos últimos anos.
A verdade é que as brigas de trânsito, de bares, de baladas agora serão resolvidas na base do “quem saca primeiro”, porque com essa liberação a ideia de que o outro possa estar armado será sempre evidente e, entre ele e eu, é melhor que eu saque antes dele.
A verdade é que temos um governo violento, que ampara e incita à violência, que não esconde o prazer na tortura e na morte dos inimigos. Isso legitima e legitimará a barbárie!
Em nome da verdade… no governo mais mentiroso que já temos! E eu aguardo o dia da liberdade! Ela virá… mais cedo ou mais tarde!

*Teólogo e Pastor da Comunidade Batista do Caminho em Belo Horizonte.

Continue Lendo

Trending