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Democracia

“Show de injustiças” contra dezenas de pagodeiros pobres da periferia do Rio

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Especial para os Jornalistas Livres

 

As centenas de pessoas presas na operação em Santa Cruz têm apenas uma coisa em comum: curtem Swing&Simpatia e Pique Novo. São fãs de pagodes – no popular, pagodeiros.

Era tudo normal. Show em uma das principais vias de Santa Cruz, bairro da Zona Oeste do Rio de Janeiro, o mais distante da região central da cidade. Anúncio no face, nas páginas da banda, áudio no zap e na rádio Costa Verde. Venda de ingresso individual. De camarote. Revista na entrada. Um sítio acostumado a receber eventos, de tudo que é tipo: festas de criança, cultos evangélicos e, como se sabe, shows de pagode. Não havia armas à vista. Cerveja no bar. Pagode no palco.

As centenas de testemunhas (ou sobreviventes) daquela noite contam a mesmíssima história: 3h30 de sábado dia 7, auge da lotação da festa, polícia entrou, rajadas de fuzil, tiroteio, mortos, todos os demais no chão, todos os homens para um lado, cara no chão, todas as mulheres para outro (sob gritos de piranha e vagabunda). Alguns fogem pelo muro de trás da festa. Banda, garçons, funcionários da festa liberados. Chegam mais policiais. Carros estacionados começam a ser arrombados. Armas, inclusive fuzis, são encontradas nos veículos. Pessoas com mandado de prisão expedidos escapam. Pessoas sem qualquer mandado ou investigação são presos. Cerca de 20 são liberados. Não cabem todos em dois ônibus. 159 são levados: encarregado de supermercado, administrador de empresa, funcionário da Michelin, gari da Comlurb, metalúrgico, estudante do ensino médio, motorista de uber, DJ, empregado doméstico, técnico em radiologia, concurseiro da Marinha, camelô de Santa Cruz, um artista de circo, um jovem autista. Tem preso de 18 anos que foi numa festa pela primeira vez. Tem preso de quase 60, que foi comemorar os 60 anos da irmã.

Delegado fala em dois anos de investigação. Pede a prisão de todos, diz que estavam em “festa da milícia”, que fazem parte da milícia. Secretário de Segurança vai à Cidade da Polícia poucas horas depois. Festeja com 159 medalhas na mão: “operação mais exitosa”. Interventor comemora. Ministro da Segurança Pública ameaça: “precisam explicar o que estavam fazendo em festa de bandido”. Presidente comemora operação “exemplo”. Pronto: a intervenção, finalmente, alcança a manchete que sonhava. No momento de pressão sobre as milícias, tcharaaaan a maior prisão de milicianos da história. Falou-se muito em mandado de busca e apreensão coletivo. Não se autorizou. Na prática, o que se viu foi um mandado de captura coletivo.

O Judiciário (também em intervenção?) mantém a prisão. A audiência de custódia para avaliar a prisão de cada um é feita coletivamente. Desembargadora não ouve todos e expede prisão preventiva para todos. Habeas Corpus negados. Famílias, não podem ter contato com seus amores e mães se desesperam, se despedaçam e, com documentos nas mãos, pedem socorro em praça pública, na frente do Tribunal de Justiça no centro, no juizado de Santa Cruz, na sala da Defensoria. Avó de um preso morre. Famílias falam em “pesadelo”, “filme de terror”, “não consigo mais comer ou dormir”.

Dentro da prisão, desesperados, presos dão carinho uns aos outros. O jovem acrobata, com viagem marcada para a europa, treina piruetas sobre os amigos no pátio de Bangu 9. O amor resiste, o grupo se une. Caetano Veloso, Wagner Moura e Marcos Frota se solidarizam com o artista. Justiça concede a liberdade.

Ele sai. Agora a imprensa dos grandes canais aparece. Coletiva. O defensor público fala que nunca viu nada igual “um show de pagode que terminou num show de injustiça”. O jovem agora livre prova que não é bandido, que seus amigos não são bandidos, dezenas de pais fazem o mesmo, trazendo histórias coerentes e apresentando contradições constrangedoras: por que as mulheres não foram presas também? Por que liberaram a banda? Como alguém que precisou pedir para mãe R$10 para ir na festa é um miliciano? Como um sítio de milicianos realiza encontros da igreja?

Muita coisa está em xeque e muitas perguntas ainda precisam ser respondidas nesta história de Santa Cruz, os primeiros ossos aparentes de uma caveira chamada intervenção. Talvez a maior de todas seja: é proibido existir em locais dominados por grupos criminosos no Rio de Janeiro? É proibido viver e ir num pagode na Rocinha? Isso significa ser da facção X? É proibido viver e ir num pagode em Santa Cruz? Isso significa ser da milícia Y? Qual a independência da Justiça depois da pressão das autoridades do projeto intervencionista? A Justiça Estadual irá peitar a Intervenção Federal para mostrar o óbvio? Ou a Justiça também está sob intervenção?

Outras tantas perguntas ficam guardadas, para ser mais seguro.

A cada dia que passa, oficializa-se a criminalização do viver no Rio de Janeiro. A criminalização da pobreza já ultrapassou as ruas e becos das favelas, agora está no centro dos grandes bairros pobres.

Por fim, sempre ela. A Imprensa oficialesca. Mesmo 16 dias depois dos shows de Swing&Simpatia e Pique Novo, mesmo depois de tanto choro sincero derramado em nossas caras, mesmo depois das robustas contradições apresentadas, a manchete do maior portal de notícias do país, o G1, ainda se refere ao evento como “festa da milícia”. Vão se fuder.

 

Leia mais sobre a prisão dos 159 pagodeiros de Santa Cruz aqui

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1 Comment

1 Comments

  1. gustavo_horta

    25/04/18 at 9:20

    O que parece é que eles estão tentando irritar o povo até que o povo chegue ao limite de reagir. Neste ponto eles jogarão as tropas em cima com a desculpa “perfeita” de conter vandalismos e baderneiros.
    Deve ser algo sim
    Haveria alguma outra explicação mais inteligente para tanta estupidez e violência?

    Os Miseráveis. De Victor Hugo a Dostoiévski. Uma analogia – Por villorBlue
    > https://gustavohorta.wordpress.com/2018/04/25/os-miseraveis-de-victor-hugo-a-dostoievski-uma-analogia-por-villorblue/

    COMO É LINDA A JUSTIÇA À BRASILEIRA!! QUALQUER FILHO DA PUTA SE SENTE TUDO PODENDO. E, O PIOR DE TUDO, É QUE TEM PODIDO MESMO FUDER COM QUALQUER UM NESTA SURUBA BRAZZZIIILLL. É O BORDEL PAULISTANO BAHAMAS DO CAFETÃO CÃO IMPUNE.

    …No resumo, o antes explanado é uma analogia. Trarei este comentário para os dias atuais e uma comparação do que acontece no Brasil nestes dias.Troque os nomes nestas duas histórias, Valjean por “nação e a esquerda brasileira” e Dostoiévski por “Luiz Inácio Lula da Silva“.No primeiro caso, (Os Miseráveis) a esquerda brasileira tirou 36 milhões de pessoas da linha da fome (distribuiu pão aos famélicos e os estava ensinando a produzir o pão) e por este motivo está sendo condenada …

    #LULALIVRE

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Democracia

Urgente! The Intercept Brasil acaba de vazar áudio de Deltan Dallagnol

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Via The Intercept Brasil

Na manhã do dia 28 de setembro de 2018, a imprensa noticiou que o ministro do STF Ricardo Lewandowski autorizara Lula a conceder uma entrevista ao jornal Folha de S.Paulo. Em um grupo no Telegram, os procuradores imediatamente se movimentaram, debatendo estratégias para evitar que Lula pudesse falar. Para a procuradora Laura Tessler, o direito do ex-presidente era uma “piada” e “revoltante”, o que ela classificou nos chats como “um verdadeiro circo”. Uma outra procuradora, Isabel Groba, respondeu: “Mafiosos!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!”

Eram 10h11 da manhã. A angústia do grupo – que, mostram claramente os diálogos, agia politicamente, muito distante da imagem pública de isenção e técnica que sempre tentaram passar – só foi dissolvida mais de doze horas depois, quando Dallagnol enviou as seguintes mensagens, seguidas de um áudio.

28 de setembro de 2018 – grupo Filhos do Januario 3

Deltan Dallagnol – 23:32:22 – URGENTE
Dallagnol – 23:32:28 – E SEGREDO
Dallagnol – 23:32:34 – Sobre a entrevista
Dallagnol – 23:32:39 – Quem quer saber ouve o áudio
Dallagnol – 23:33:36 –

Leia a matéria completa no site do The Intercept Brasil:

https://theintercept.com/2019/07/09/vazajato-audio-inedito-deltan-dallagnol/

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Censura

Senadora do PSL cassada por caixa dois ofende jornalista por fazer seu trabalho

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Os bolsonaristas, muitas vezes eleitos com apoio da Grande Mídia, agora deram para atacar e ameaçar jornalistas que não passam pano para ilegalidades. Incensada pela imprensa tradicional de Mato Grosso quando aceitou a delação premiada do ex-governador Silval Barbosa (MDB) e o condenou a 13 anos e 7 meses em 2017 (mas permitiu o cumprimento da pena em casa), por exemplo, a então juíza Selma Arruda foi apelidada de “Moro de Saia”. Sob os holofotes favoráveis dos jornais, Selma se aposentou da magistratura e se candidatou, com o apelido na propaganda eleitoral, ao cargo de senadora pelo Partido Social Liberal (PSL), o mesmo de Bolsonaro. Ganhou fácil!

Depois disso, sua relação com o “modelo” não mudou. No último dia 19 de junho, por exemplo, durante depoimento do ex-juiz e atual ministro da justiça e segurança pública, Sérgio Moro, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, a senadora fez questão de dizer que “É absolutamente normal juiz conversar com o Ministério Público”. Moro respondeu com elogios: “É normal uma discussão de logística. Tem aqui a senadora Selma, que atuou muito destacadamente como juíza lá no Mato Grosso, teve várias operações, é normal depois da decisão proferida haver uma discussão sobre questão de logística, quando vai ser cumprida, como vai ser cumprida, e eventualmente pode ter havido uma mensagem nesse sentido. Isso não tem nada de revelação de imparcialidade ou conteúdo impróprio”, disse. Nenhum dos dois comentou, nem de leve, a condenação unânime do Tribunal Regional Eleitoral, em abril, à perda do mandato por caixa dois. Ela e seus dois suplentes, também cassados, não conseguiram mostrar ao tribunal a origem de R$ 1.2 milhão gastos na campanha.

Com a revelação do caixa dois, as relações da senadora com o jornalismo sério passaram a uma nova fase. Enquanto o Tribunal Superior Eleitoral analisa em segunda instância se ela deverá ou não deixar o cargo, Selma aproveitou as câmeras da TV Senado para insinuar que a atuação do jornalista Glenn Greenwald, vencedor dos maiores prêmios mundiais de jornalismo, não é profissional, mas guiada por interesses políticos. “O sujeito que vazou é marido do suplente do Jean Wyllys. Ele é intimamente ligado, né. Politicamente, óbvio que é uma estratégia para colocar em dúvida a atuação do juiz e do Ministério Público”, afirmou. Sobre as suas intenções políticas ou as de Moro quando ainda estavam na magistratura, não houve uma única palavra.

Na imprensa matogrossense, a antigamente sempre disponível magistrada passou a escolher com quem conversar. Na semana passada, por exemplo, foi procurada pelo jornalista Lázaro Thor Borges, do jornal “A Gazeta“, o maior diário do estado, para comentar uma reportagem, com dados oficiais obtidos a partir da Lei de Acesso à Informação e do Portal da Transparência, sobre salários de servidores públicos acima do teto constitucional. Via aplicativo de mensagens, a senadora respondeu com xingamentos e, novamente, insinuações de interesse político acima do jornalístico. “Tadinho, você é ridículo. Nem li nem sei do que você está falando. Sua opinião não faz efeito na minha vida e nem na de nenhum matogrossense”, escreveu a parlamentar. Borges, educadamente, respondeu apenas: “tudo bem, senadora”. Mas ela não parou por aí. Além de chamá-lo novamente de coitado e mandar “catar coquinho”, ainda o chamou de “retardado”, ao que Borges respondeu: “É só meu trabalho, senadora”. 

A reportagem, publicada no dia 22 de junho e que infelizmente não está disponível online no portal do jornal, trazia o valor mensal líquido de R$ 53,8 mil desde de março desse ano, mais de R$ 14 mil acima do teto de R$ 33,7 mil recebidos pelos ministros do Supremo Tribunal Federal. De acordo com a matéria, apenas 11 dos 84 magistrados aposentados do Superior Tribunal de Justiça de Mato Grosso receberam acima do teto em abril, mês do levantamento.   Os ataques da parlamentar ao jornalista foram repudiados em editorial do jornal, que publicou os prints das telas do celular mostrando as grosserias da senadora. Os as respostas mal criadas ao profissional também sofreram grande condenação do Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso, em nota também assinada pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). Está passando da hora de TODOS e TODAS jornalistas se unirem para barrar o crescimento do fascismo e as das ameaças aos profissionais, à liberdade de imprensa e à própria democracia.

 

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Democracia

Deputado do PSOL que chamou Sérgio Moro de “ladrão” já havia chamado Eduardo Cunha de “gângster”

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Por Rafael Duarte I Agência Saiba Mais

O deputado do PSOL Glauber Braga (PSOL/RJ) desestabilizou os parlamentares governistas nesta terça-feira (2), na Câmara dos Deputados, ao dizer que o ex-juiz e atual ministro da Justiça Sérgio Moro passará para a história como um “juiz ladrão e corrompido”.

As palavras duras do parlamentar mexeram com os brios dos colegas que participaram da sessão da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara para defender o ex-juiz das graves acusações de interferência no julgamento do ex-presidente Lula reveladas pelas mensagens trocadas entre ele e procuradores da operação Lava Jato.

Moro se esquivou da maioria das perguntas e voltou a tentar criminalizar o site The Intercept Brasil, que vem divulgando a conta gotas as mensagens. Acuado, o ex-juiz deixou a sala da comissão sob os gritos de “ladrão” e “fujão”. A sessão foi encerrada após um tumulto generalizado:

– “A história não absolverá o senhor, da história o senhor não pode se esconder. E o senhor vai estar no livro de história como juiz que se corrompeu, como um juiz ladrão. A população brasileira não vai aceitar como fato consumado um juiz ladrão e corrompido que ganhou uma recompensa pra fazer com que a democracia brasileira fosse atingida. É o que o senhor é: um juiz que se corrompeu, um juiz ladrão”, disse já sob os gritos da tropa bolsonarista.

 Após o discurso, as redes sociais do deputado foram inundadas de xingamentos e mensagens de apoio. Ele agradeceu a solidariedade e voltou a provocar tanto Sérgio Moro como a militância que o defende:

– Obrigado pelas inúmeras mensagens de apoio ! E pra turma da extrema-direira que veio aqui desabafar, infelizmente não posso me desculpar. O herói de vocês feriu a democracia brasileira e recebeu a recompensa de Bolsonaro. E em linguagem bem popular, juiz vendido é juiz ladrão ! Boa noite. Fiquem bem!”, escreveu.

Esse não é o primeiro discurso de Glauber Braga que repercute no Congresso e na imprensa. Em 2016, durante a votação para a abertura do processo de impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff, o voto do deputado do PSOL também foi um dos mais comentados. Na ocasião, ele chamou de “gângster” o então presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, atualmente preso, em Curitiba. E evocou figuras históricas da democracia brasileira:

– Eduardo cunha, você é um gangster e o que dá sustentação à sua cadeira cheira a enxofre. Eu voto por aqueles que nunca esconderam o lado fácil da história. Voto por Marighella, voto por Plinio de Arruda Sampaio, voto por Evandro Lins e Silva, voto por Arraes, voto por Luís Carlos Prestes, voto por Olga Benário, voto por Brizola e Darcy Ribeiro, voto por Zumbi dos Palmares, voto não.

Perfil

Glauber Braga é advogado, natural de Nova Friburgo (RJ), tem 37 anos e está filiado ao PSOL desde 2015. Ele exerce o quarto mandato na Câmara Federal. O primeiro assumiu como suplente, em 2007, quando ainda militava no PSB, e os demais foram exercidos como titular da vaga.

Braga ocupou a liderança da bancada do PSOL em janeiro de 2017. No ano anterior, disputou a eleição para prefeito de Nova Friburgo e ficou em 2º lugar.

Progressista, Glauber Braga realiza um mandato participativo defendendo bandeiras em defesa da democracia e direitos humanos. Está na linha de frente da luta no parlamento contra a reforma da Previdência.

O parlamentar do PSOL foi relator da Comissão Especial de Medidas Preventivas Diante das Catástrofes Climáticas, que gerou a primeira Lei Nacional de Prevenção e Resposta a Desastres Naturais (12.608): o Estatuto de Proteção e Defesa Civil. O estatuto foi sancionado pela Presidência em abril de 2012.

Em 2018, Glauber Braga foi escolhido pelo júri especializado do portal Congresso em Foco como o melhor parlamentar do Brasil.

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