Por Carol Ramos (reportagem), imagens e pesquisa Marília Rubio e Marcela Sayeg Johansson, especial para os Jornalistas Livres
Máquinas paradas, luzes apagadas, pátios e refeitórios vazios, encomendas vencidas, revolta e incerteza no ar. As últimas três semanas não têm sido fáceis para os trabalhadores da Flaskô, a fábrica de tambores plásticos localizada na região metropolitana de Campinas (SP).
Não é a primeira vez que a Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL), responsável pelo abastecimento de energia na região, corta a luz do local. Em 2007, a fábrica ficou 40 dias sem energia, mas aceitou negociar a dívida de R$ 1 milhão herdada dos patrões e pagou o valor em 100 parcelas. “Produzimos R$ 700 mil por mês e temos clientes e entregas à fazer, mas desta vez a CPFL não está querendo nem dialogar”, diz Alexandre Mandl, advogado da Flaskô e membro Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares (RENAP).
Diante do cenário político atual de perda de direitos trabalhistas, o advogado não acredita que a companhia de luz tenha interesse em manter uma fábrica autogerida, que não precisa de patrão, sirva de exemplo para o país. “O Hopi Hari tem uma dívida de R$ 60 milhões com a CPFL e a luz deles está ligada. A Flaskô deve R$ 1 milhão e 600 mil”, afirma Mandl.
Em 2003, ano da ocupação, a Flaskô fazia parte do grupo Holding Brasil, braço da poderosa Tigre, que desde a década de 90 acumulava dívidas, desembocando no fechamento de 40 empresas do grupo. Dentre elas a Cipla e a Interfribra, de Joinville (SC), que ao lado da Flaskô sofria com o acúmulo de salários atrasados e outros desrespeitos aos direitos trabalhistas. Juntas, as três fábricas retomam a produção e tornam-se o tripé do Movimento Fábricas Ocupada, irmanadas com diversas ocupações operárias pelo mundo, como na Argentina (Zanon, Chilavert, Hotel Bauen) e na Grécia (Vio.Me).
Fotos Marília Rubio e Marcela Sayeg Johansson
Os operários da Flaskô conseguiram vitórias como a diminuição da jornada de trabalho de 44 para 30 horas semanais, excluindo os sábados do escopo sem afetar os salários e a produtividade, e a diminuição das diferenças salariais de quinze vezes para apenas três. Além de fundarem uma vila operária e uma Fábrica de Esportes e Cultura que conta com uma programação de teatro, saraus, festas e exposições que atende à região, carente de equipamentos do gênero, os operários criaram o Festival Flaskô Fábrica de Cultura. Com periodicidade anual, o evento recebe grupos artísticos, bandas, apoiadores e público de outros lugares do Brasil e do mundo e é um espaço de resistência através da arte, onde trabalhadores podem encontrar parceiros e dialogar através de peças, debates, lançamento de livros, músicas e filmes.
Assista o Vídeo:
Nesta quarta-feira (19) haverá uma audiência pública com a CPFL na Câmara de Vereadores de Sumaré e você pode ajudar a Flaskô compartilhando esta matéria e usando as hashtags #cpflreliguealuz #vivaaflasko.
As famílias não querem auxílio aluguel que não contempla todas as famílias. A Comunidade Mandela luta por Moradia para todas as famílias Foto: Fabiana Ribeiro | Jornalistas Livres
Negociação entre o proprietário do terreno e a municipalidade
A área de 300 mil metros quadrados é de propriedade de Celso Aparecido Fidélis. A propriedade não cumpre função social e possui diversas irregularidades com a municipalidade.
As famílias da Comunidade Mandela já demonstraram interesse em negociar a área, com o proprietário para adquirir em forma de cooperativa popular ou programa habitacional. Fidélis ora manifesta desejo de negociação, ora rejeita qualquer acordo de negócio.
Mas o proprietário e a municipalidade – por intermédio da COAB (Cia de Habitação Popular de Campinas) – estão negociando diretamente, sem a participação das famílias da Comunidade Mandela que ficam na incerteza do destino.
As mulheres são a grande maioria da Comunidade e também são elas que estão nos atos lutando por direitos. Foto: Fabiana Ribeiro | Jornalistas Livres
As famílias querem ser ouvidas
Durante o ato, uma comissão de moradores da Ocupação conseguiu ser liberada pelo contingente de Guardas Municipais que fazia pressão sobre os manifestantes , em sua grande maioria formada pelas mulheres da Comunidade com seus filhos e filhas. Uma das características da ocupação é a liderança da Comunidade ser ocupada por mulheres, são as mães que lideram a luta por moradia.
A reunião com o presidente da COAB de Campinas e Secretário de Habitação – Vinícius Riverete foi marcada para o dia 28 de setembro.
A luta e a esperança de igualdade social Foto: Fabiana Ribeiro | Jornalistas Livres
As mulheres da Comunidade Mandela, em sua maioria são trabalhadoras informais, se organizam para lutar por moradia.
Em Campinas, interior de SP, coletivo se organiza contra o apagamento da memória das verdadeiras vítimas da pandemia
Hoje, 05 de setembro, aconteceu pela manhã no centro da cidade o “Ato Vidas Interrompidas” promovido pelo Coletivo 1000vidas. O ato foi planejado para evitar aglomeração e foi transmitido ao pela página https://tv.socializandosaberes.net.br, com falas e intervenções artísticas que iniciaram no Largo do Rosário .
Ato Vidas Interrompidas – Campinas-05-09-2020 Foto: Fabiana Ribeiro
Na sequência, os participantes seguiram em cortejo para a Praça Bento Quirino . Na praça – marco zero da cidade – está localizado o monumento-túmulo de Carlos Gomes, que recebeu uma instalação artística com o intuito de homenagear às vítimas do Covid-19. Dessa forma foram colocados mil laços de fitas representando cada vida perdida para a doença, na cidade de Campinas.
Ato Vidas Interrompidas – Campinas-05-09-2020 Foto: Fabiana Ribeiro
Na semana passada, Campinas superou as 1000 mortes confirmadas, sendo o 11º município brasileiro com mais óbitos causados pela Covid-19. Campinas ainda tem mais óbitos pela doença que 15 capitais de estado do Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, entre elas Curitiba, Belo Horizonte e Porto Alegre, que são mais populosas e que têm 969, 944 e 663 mortes confirmadas, respectivamente.
Ato Vidas Interrompidas – Campinas-05-09-2020 Foto: Fabiana Ribeiro
O coletivo
O Coletivo 1000vidas nasceu da indignação de algumas pessoas com o apagamento da memória de amigos, familiares, conhecidos e cidadãs/ãos que estão morrendo ou sofrendo com o Covid-19 sob um manto de apatia de governantes e de parte da imprensa que nos têm tratado como estatísticas de adoecimentos e mortes aceitáveis frente às necessidades da economia e do mercado. Movido pelo sentimento incômodo da indignação, o coletivo propõe ações que desvelem as narrativas das famílias e as dores de suas perdas e pretende realizar diversas outras atividades , uma das propostas é um Memorial Virtual na forma de uma página na internet dando voz e prestando homenagens, a quem partiu e a quem sofre por estas vidas interrompidas prematuramente. O memorial conta com apoio do Conselho Municipal de Saúde de Campinas.
Integram o coletivo mais de 40 movimentos organizados de trabalhadores, sociais, culturais e outros.
Mais retomada de atividades e número de vítimas continua crescendo
No dia 02 de setembro, o Prefeito de Campinas – Jonas Donizette (PSB) assinou o decreto que autoriza a retomada de atividades culturais, como museus, cinemas e teatros, além de permitir eventos, convenções e serviços de bufê adulto, a partir de 04 de setembro .
A Prefeitura de Campinas (SP) informou, neste sábado (5), que foram confirmadas mais 10 mortes por novo coronavírus, além de outros 344 casos. Com isso, a cidade chegou a 1.069 óbitos provocados pela covid-19, e 29.327 moradores infectados.
O dia de hoje (31/08) será decisivo para as 108 famílias que vivem na área ocupada na região do Jardim Ouro Verde em Campinas, interior de São Paulo. Assim sendo, o último dia do mês de agosto, a data determinada como prazo final para que os moradores sem-teto deixem a área ocupada, no Jardim Nossa Senhora da Conceição. A comunidade está muito apreensiva e tensa aguardando a decisão do juiz Cássio Modenesi Barbosa – da 3ª Vara do Foro da Vila Mimosa que afirmou só se manifestar sobre a suspensão ou não do despejo na data final, tal afirmativa só contribuiu ainda mais para agravar o estado psicológico e a agonia das famílias.
A reintegração é uma evidente agressão aos direitos humanos dos moradores e moradoras da ocupação, segundo parecer socioeconômico do Núcleo Habitação da Defensoria Pública do Estado de São Paulo . As famílias não têm para onde ir e cerca de entre as/os moradoras/es estão 89 crianças menores de 10 anos, oito adolescentes menores de 17 anos, dois bebês prematuros, sete grávidas e 10 idosos. 62 pessoas da ocupação pertencem ao grupo de risco para agravamento da Covid-19, pessoas idosas e com doenças cardiológicas e respiratórias, entre outras podem ficar sem o barraco que hoje as abriga.
Parecer socioeconômico da Ocupação da Comunidade Mandela. Importante trabalho da agente socióloga do Núcleo de Habitação – Defensoria Pública do Estado de São Paulo.
A Defensoria Pública do Estado de São Paulo, a Comissão dos Direitos Humanos da Câmara de Campinas e o Ministério Público (MP-SP) se manifestaram em defesa do adiamento da reintegração durante a pandemia. A Governo Municipal também se posicionou favoravelmente a permanência após as famílias promoverem três atos de protesto. Novamente a Comunidade sofre com a ameaça do despejo. As famílias ocupam essa área desde 2017 após sofrem uma reintegração violenta em outra região da cidade.
As famílias
A comunidade possui 89 crianças com idade inferior a 10 anos
foto: Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
Célia dos Santos, uma das lideranças na comunidade relata:
Foto Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
“ Tentamos várias vezes propor a compra do terreno, a inclusão das famílias em um programa habitacional, no processo existem várias formas de acordo. Inclusive tem uma promessa que seriam construídas unidades habitacionais no antigo terreno que ocupamos e as famílias do Mandela seriam contempladas. Tudo só ficou na promessa. Prometem e deixam o tempo passar para não resolver. Eles não querem. Nós queremos, temos pressa. Eles moram no conforto. Eles não têm pressa”
Simone é mulher negra, mãe de cinco filhos. Muito preocupada desabafa o seu desespero
Foto: Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
“ Não consigo dormir direito mais. Eu e meu filho mais velho ficamos quase sem dormir a noite toda de tanta ansiedade. Estou muito tensa. Nós não temos para onde ir, se sair daqui é para a rua. Eu nem arrumei as coisas porque não temos nem como levar . O meu bebê tem problemas respiratórios e usa bombinha, as vezes as roupinhas dele ficam sujas de sangue e tenho sempre que lavar. Como vou fazer?”
Dona Luisa é avó, mulher negra, trabalhadora doméstica informal e possui vários problemas de saúde que a coloca no grupo de risco de contágio da covid-19. Ela está muito apreensiva com tudo. Os últimos dias têm sido de esgotamento emocional e a sua saúde está abalada. Dona Luisa está entre as moradores perderam tudo o que possuíam durante a reintegração de posse em 2017. A única coisa que restou, na ocasião, foi a roupa que ela vestia.
Foto: Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
“ Com essa doença que está por aí fica difícil alguém querer dar abrigo para a gente. Eu entendo as pessoas. Em 2017 muitos nos ajudaram e eu agradeço a Deus. Hoje será difícil. E eu entendo. Eu vou dormir na rua, junto com meus filhos e netos. Sou grupo de risco, posso me contaminar e morrer. E as minhas crianças? O quê será das crianças? Meu Deus! Nossa comunidade tem muitas crianças. Esses dias minha netinha me perguntou onde iríamos morar? Eu me segurei para não chorar na frente dela. Se a gente tivesse para onde ir não estaria aqui. Não é possível que essas pessoas não se sensibilizem com a gente. Não é possível que haja tanta crueldade nesse mundo.”
Comunidade Mandela – Foto Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres