O prefeito de São Paulo lança o programa “Alimento para todos”, que consiste na distribuição de alimentos liofilizados para paulistanos pobres. Como o próprio prefeito afirmou, são alimentos que seriam jogados no lixo, e são “reaproveitados” com toda a “segurança alimentar”. Uns chamam de ração, o Doria chama de “comida de astronauta”, e a pergunta fica: Doria acha que pobre é bicho, ou ele vive em outro mundo?
É interessante, porém, ele falar em “segurança alimentar”, inclusive afirmando – verdade ou não – que já comeu o “alimento”. O problema é que Doria Jr traz aos alimentos aquela velha – e errada – oposição entre “segurança” e “dignidade”. Um alimento pode ser seguro, e até nutritivo, mas não respeitar o principio da dignidade da pessoa humana. E os astronautas?
Quando falamos em direitos é imprescindível ter em conta o contexto social. Uma coisa é precisar comer “alimento liofilizado” (ração) no espaço, um ambiente inóspito, e outra coisa é comer ração num país que é uma potência na produção de alimentos. O Brasil é um país onde não só não se pode aceitar que alguém passe fome, como não se pode aceitar que alguém coma mal. A situação se agrava quando se trata da cidade mais rica do País.
Churrascarias, jantares a luz de velas, feiras gastronômicas ou santas ceias são a prova de que se alimentar é muito mais do que encher o estômago e absorver nutrientes. Comer é um fenômeno social-cultural. Criar uma distinção em que determinada classe come mais como um animal do que como o prefeito de São Paulo.
Não basta não deixar morrer de fome, é preciso garantir uma vida digna a todos. O sistema de seguridade social que é previsto na nossa Constituição Federal, que tem como um de seus três eixos a Assistência Social, não é compatível com a passividade do cidadão dependente da assistência Social. O que diferencia o “Alimento para Todos”, do Doria, do “Bolsa Família”, do governo Lula, é que o programa [de transferência de renda] Bolsa Família garante autonomia aos beneficiários, no “Alimento para Todos”, não. Administração familiar de dinheiro é uma coisa, de “granulado” é outra.
Distribuindo à população alimentos que nem seus cinco cachorros comem, João Doria tenta resolver a questão de “dar a vara” ou “dar o peixe” da pior forma possível: ele dá a “isca amarrada no anzol”.