Desigualdade de gênero derruba Brasil no ranking do IDHM 2016

 

“As mulheres continuam sendo, no Brasil e no mundo, o grupo social em maior desvantagem em relação ao desenvolvimento humano”

Essa é uma das conclusões do Relatório do Desenvolvimento Humano (RDH) 2016, lançado mundialmente nesta terça-feira (21/3) pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), a partir de sua sede em Estocolmo (Suécia).

Lembrando que a visão do RDH está baseada na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, que foi endossada pelos 193 Estados membros das Nações Unidas em 2015 e engloba ainda os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que o mundo também se comprometeu em alcançar. Além disso, ao contrário da visão tradicional que usava o PIB como parâmetro de desenvolvimento, os novos estudos se baseiam no conceito de desenvolvimento humano “das pessoas, para as pessoas e pelas pessoas”.

Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável acordados entre os países membros da ONU

 

Além da atualização anual do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil e de outros 187 países e territórios, o documento destaca os principais grupos sociais excluídos do desenvolvimento humano e o Brasil é um dos países mais citados nesse último relatório global.

Um dos motivos é o fato de que o país foi exemplo de desenvolvimento humano por décadas, havendo tirado mais de 40 milhões de pessoas das condições de pobreza e extrema pobreza (em vermelho no mapa abaixo) e mudado o panorama social do país com milhares de pessoas ascendendo à classe média.

A rápida evolução, especialmente durante os primeiros anos do governo Lula, chamou a atenção da comunidade internacional à época, inclusive com a própria ONU e o Banco Mundial dando destaque em 2015 para o Bolsa Família apontando-o como modelo de programa social.

 

Assim evoluiu o mapa do Brasil em relação ao IDHM (vermelho = muito baixo; laranja = baixo; amarelo = médio; verde = alto; azul = muito alto)

 

Em 2014, o relatório da ONU registrou ainda uma queda significativa da desigualdade no Brasil, com o Gini – indicador que mede o grau de concentração de renda por grupos – passando de 54,2 para 45,9.  Também se destacavam (até 2014) outros avanços como o aumento da escolaridade – o percentual da população de 18 a 24 anos matriculada no Ensino Superior subiu de 11% em 2003 para 18% em 2014 –  e a acentuada queda da mortalidade infantil (de 50.9 no início da década de 90 para 14.4 em 2014), políticas sociais que se constituíram no maior legado dos governos Lula e Dilma.

No entanto, o Brasil passou a cair vertiginosamente no IDHM especialmente depois de 2015 e o RDH 2016 aponta as crises política e econômica como fatores que levaram a esse cenário, especialmente no tocante aos indicadores de desenvolvimento de gênero: saúde, conhecimento e padrão de vida.

 

A realidade das mulheres

“Não será possível alcançar o desenvolvimento humano se metade da humanidade é ignorada. E a desigualdade de gênero e a falta do empoderamento das mulheres é um desafio ao progresso global em todas as regiões e grupos”.

Se comparados, o IDH dos homens fica em 0,751 e o das mulheres em 0,754 refletindo, por exemplo, um melhor desempenho educacional entre elas. Mesmo assim, os homens mantém indicadores de renda 66,2% acima. E se consideradas as três dimensões do Índice de Desigualdade de Gênero – saúde reprodutiva, empoderamento e atividade econômica – nosso país cai para um dos mais mal avaliados dentre os 159 países, na 92ª posição. Para piorar, a República Centro-Africana (país com menor IDH do mundo) tem mais mulheres (12,5%) com assento no Parlamento do que o Brasil (10,8%).

No âmbito da saúde, a mortalidade materna entre as brasileiras caiu de 104 (mortes em cada 100.000) para 44 este ano, mas se comparado com os 188 países, o Brasil cai para a 107ª posição. Também a expectativa de vida ao nascer entre as meninas, subiu de 69,2 na década de 1990 para 78,5 este ano mas comparado com os demais países, o Brasil sai da 123ª posição em 2013, para a 126ª no ranking deste ano. Índices como esses, comparados entre países que haviam avançado no ranking como o Brasil, demonstram que desde 2014 o país vem perdendo a curva ascendente de desenvolvimento que caracterizou a última década.

Um dos destaques do relatório também se baseia na afirmação de que nos últimos 25 anos, todos os países registraram progressos importantes no campo do desenvolvimento humano mas mulheres, grupos étnicos e raciais, além de populações rurais não se beneficiaram desses avanços.

Em todos os países, as mulheres sofrem discriminação no que se refere às oportunidades

 

Entre as médias globais

É importante destacar que o Brasil caiu em alguns medidores em relação a 2014, mas se mantém na 79ª posição, com IDH de 0,754 não havendo mudado no ranking se comparado com outros 188 países. Ainda assim, é a primeira vez, desde 1990 (quando o estudo passou a ser publicado anualmente) que o país fica estagnado no ranking global. E se analisados os 78 países com melhor IDH, apenas Arábia Saudita, Seicheles, Andorra e Ilhas Maurício tiveram desenvolvimento humano mais acelerado que o brasileiro entre 2010 e 2015.

Ocupando a 5ª posição na América do Sul entre os países com maior IDH, o Brasil só fica atrás do Chile, Argentina, Uruguai e Venezuela. Se considerados a América Latina e o Caribe, Cuba também fica à frente do Brasil, com um índice de 0.754 ocupando a 68ª posição, sendo que a expectativa de vida ao nascer em Cuba (79,6) também é maior que a do Brasil (74,7).  Já em relação ao Coeficiente de Gini, o Brasil é o quarto pior da América Latina e Caribe, ficando atrás somente da Colômbia, Haiti e Paraguai.

 

Soluções possíveis para todos

O relatório explica os motivos pelos quais determinados grupos tenham sido excluídos do desenvolvimento geral das nações e propõe estratégias e soluções em políticas públicas para melhorar os índices dessas populações. E um dos pontos para o qual o documento chama atenção é para o fato de que soluções macroeconômicas que favorecem um único grupo (com base no argumento do desenvolvimento econômico, como empresários ou produtores), geralmente não acrescentam melhorias nesses aspectos referentes ao desenvolvimento humano e ainda contribuem para aumentar a desigualdade e a concentração de renda.

A conclusão é que o Brasil, assim como vários outros países, precisam investir em mecanismos sociais inclusivos – especialmente para grupos como mulheres, negros e indígenas – e para isso é necessário que seus governos compreendam que esse tipo de investimento, ou seja, políticas públicas voltadas para o desenvolvimento da sociedade devem ser  sempre uma prioridade.
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* O Índice de Desenvolvimento Humano é um indicador que vai de zero a um (quanto mais próximo de um, maior o desenvolvimento humano) e mede o progresso de uma nação a partir de três dimensões: renda, saúde e educação.

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