Com arma na lancheira, uma criança de 9 anos se fere em Campo Grande

 

Ivany Turibio, especial para os Jornalistas Livres

O garoto de 9 anos (cuja identidade está preservada) foi para a escola na quarta-feira, 17/10, como fazia todos os dias. Talvez para brincar de policial, de herói, de bandido ou para imitar o candidato à Presidência que faz com o polegar e o indicador a pose de um atirador, ele colocou na lancheira uma pistola 6.35 do pai, agente de perícia em Campo Grande.

Durante a aula de geografia, no Colégio Adventista Jardim dos Estados – região nobre da capital – o aluno do quarto ano do ensino fundamental tirou a pistola lancheira e acidentalmente a disparou. O tiro atingiu sua coxa e um dos pés. O estampido assustou a todos. A professora correu com a criança para o Pronto Socorro da Santa Casa de Saúde. E felizmente tudo terminou bem. Mas o episódio marcou as crianças do estabelecimento: na porta, carros de polícia, ambulância, resgate e muitas pessoas atônitas quebraram a rotina tranquila a que todos estavam acostumados. O colégio emitiu nota informando que o menino levou a arma “sem consentimento e conhecimento dos pais e da própria escola” (veja abaixo).

Comunicado da escola

O que pode acontecer se o Estatuto do Desarmamento for reformulado, permitindo o porte de armas a qualquer “cidadão de bem”, como propõe o candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro? O que fará um aluno armado que discute com um colega no recreio ou fica contrariado com a atitude de um professor?  “Quando se libera a posse de armas, a gente bota em circulação um armamento em proporção incontrolável”, afirma a psicanalista Vera Iaconelli, diretora do Instituto Gerar. “Cada casa poderia ter uma arma. Ora, faz parte do desenvolvimento da criança imitar o adulto. E ela tem curiosidade sobre o funcionamento da arma, mas sem a competência e a noção de perigo que seriam necessárias”.

Para o gerente de advocacy do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli, estudos acadêmicos nacionais e internacionais mostram a relação direta entre o aumento da circulação de armas e o crescimento da criminalidade violenta. “Não se trata de opinião ou ideologia. Armas são instrumentos que têm falhas. E a qualidade das armas brasileiras é péssima”, afirma o advogado.

Vera Iaconelli lembra os dados divulgados pelo Mapa da Violência 2015, fazendo um balanço da situação no país depois da aprovação do Estatuto do Desarmamento em 2003. O relatório mostra redução de 160.036 mortes com arma de fogo durante o período. A liberação de armas, segundo Vera, afeta diretamente a vida das crianças. Ao contrário da educação da não-violência (não bater no amiguinho, conversar para resolver as questões), essa política ensina a fazer “justiça com as próprias mãos”. Para ela, “seria um verdadeiro salve-se quem puder”.

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