Jornalistas Livres

Autor: Helio Carlos Mello

  • Cacique Raoni das onças e o prêmio da paz

    Cacique Raoni das onças e o prêmio da paz

    Novamente indicam  o velho indígena para o Prêmio Nobel da Paz, um homem que leva a dor de gente antiga, terra anterior às nações modernas. O bem da terra e de mato, de água limpa que brota e corriam sozinhas, virava chuva, virava mar. Uma terra semelhante ao direito de todos.

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    Nem tanta paz temos em dias assim, século 21 tão tenso, audaz, mas sei vir do século passado esse chamado de paz. Esse lugar distante chamado Brasil, é você, sou eu, infindável estréia.

    Ropni Metuktire, a onça fêmea, grande cacique da guerra que diz paz, hoje carrega a borduna e o celular em suas mãos, bem sabe que a grande aliança é a razão entre os homens de bem.

    Na palma da mão, sabemos todos nós do mapa de nosso inferno, o domínio da terra de outros, a invasão do chão alheio. Se tudo é história, o fato é que das praias penetramos para o mato, montanhas e campos de ouro, esmeraldas e brilhantes, feridas da paixão onde sepultaram o tempo que passa, no futuro queremos sempre um país. 

    Palavras calam, selamos pífios comandantes, terra devastada.

    Dizimamos porque aprendemos assim, e reprogramar, mudar atitudes, nem sempre é tão simples como um berro, vozes sem ordem ou harmonia.

    De repente, o que vejo entre tal pandemia, é que vibra forte o tom, perfaz séculos, e nossa paz dar-se-á um dia. Como disse Darcy Ribeiro no enterro de Glauber Rocha, uma dor de todos os brasileiros num país do futuro, é um lamento, cocar de luz, rumo azul.

    imagens por helio carlos mello

  • A rua sem saída dos aflitos

    A rua sem saída dos aflitos

    Sonhei com animais, aqueles que fogem e morrem entre o fogo, cruel desilusão, tal a chama de Deus que lambe. Acordei aflito, puta sede.

    Fui para a Rua dos Aflitos, onde há uma capela, fechada estava, tão antiga, solo dos mortos na batalha vã, chão de miseráveis, vencidos, dos olhos cheios de chuva entre o sertão de direitos antigos.

    A Capela dos Aflitos, também conhecida como Capela de Nossa Senhora dos Aflitos, está localizada em uma pequena rua na Liberdade, entre a Rua Galvão Bueno e a da Glória.

    O fogo incide entre as comunidades, seres ou seu verso,  a humanidade. Em campos de refugiados na Grécia da filosofia, nas florestas e campos daqui, na usura dos homens.  Restam capelas e antigos cemitérios, vestígios.

    Chama-se Liberdade esse bairro da metrópole, cruel contradição, como se morrer condenado libertasse os homens da opressão.

    Nenhum rio aqui passa, ou córrego, olho d’água.  Há um sino que repousa no domingo, forte sol entre a pandemia, tudo vibra no largo.

    Há uma manchete planetária, fique em casa. Não há nada de novo na pífia nova realidade, subterrâneos, campo santo da liberdade. 

    A Capela dos Aflitos, também conhecida como Capela de Nossa Senhora dos Aflitos, está localizada em uma pequena rua na Liberdade, entre a Rua Galvão Bueno e a da Glória, na cidade de São Paulo.

    Lambe agreste língua, aspirador voraz chama em vorazes manchetes. 

    Não desista, minha boca seca pronuncia, repartida, recortada, partida língua. Tal cobra, cheira e enxerga, lambe o tempo e seu espaço. Aflição deve ser isso, quase estado de poesia, nada há muito além, banal canção do acaso.

    O fogo, a forca, a língua, o sino.

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  • Dia D a Amazônia

    Dia D a Amazônia

    Um dia vi Crânio, um moço, no guindaste fazendo mural. Era metrópole, hoje isola sua senda, desmata, interrompe o ciclo. Amazônia, sua gente.

    Fiquei pensando agora, enquanto a rádio tocava Palhaço, de Egberto Gismonti, se haveria um dia da Amazônia, no Brasil de fato. A floresta, perto do fogo todo dia, finda.

    Há um desencanto, estranho sentimento em ver que o mundo virgem desiste de seus encantos, uma saudade do que vimos quando jovens, do avião ou à pé, entre trilhas.

    De repente, repetem-se trajetos. Onde antes era mato, ontem ainda, hoje é toco, é pasto, é revirado solo de garimpo e seus entornos, tal boca banguela.

    Penso em passarinhos, mariposas,  em borboletas, beija flores em dias assim. Tão frágil, delicado é o vínculo. Meu amigo Yanahim, do Xingu,  dos milenares indígenas Waujá, gente de barro e fogo, a melhor cerâmica dessa gente assim, de mato. Tudo vai bordando, índio, preto, tv, rede e cuidados.

    Yanahim Waujá, da Terra Indígena do Xingu. Seu alimento, fortalecido por doações de entidades para boa nutrição, torna possível o isolamento e as compras na cidade e possível contágio ao corona vírus.

    O poder da autoridade. O vento vai levando tudo embora, mas resiste, avança.

    Quando tudo falha no rumo das coisas, sei bem, o bem é comunicar-se, alertar, expor a fina estampa da realidade. Tomba árvore, turva água, para o ar junta-se a fumaça do horizonte. 

    Interessante ver que da garoupa, agora se faz lobo guará a nova cédula e seu valor.

    Dia da Amazônia é coisa de tons, como cantava o Tom Jobim, se o mato que é bom, o fogo queimou Cadê o fogo? A água apagou E cadê a água? O boi bebeu Cadê o amor? O gato comeu E a cinza se espalhou E a chuva carregou Cadê meu amor que o vento levou? (Passarim quis pousar, não deu, voou).

  • Morreu Piauí, Antônio José da Silva

    Morreu Piauí, Antônio José da Silva

    A notícia da morte de Piauí comove as gerações que protestam na avenida.

    por Helio Carlos Mello

    Eu não sabia que seu nome era Antônio, dizem que era um mago. Conheci o cabra de tanto vê-lo ali, sempre ali. Em dias de paz vendia sua arte, em dias de luta expunha seus conceitos do mundo, se misturava entre os indígenas, mulheres, negros ou em qualquer marcha em protestos pela vida, se opunha à tropa de choque quando necessário.

    por Maria Eugênia Sá

    Todos o chamavam Piauí. Milhares o notavam e ele viu milhões ali passando, tantas pernas, tantos ternos, tantos poderes que desfilam na avenida Paulista, no vão maluco do MASP. 

    Soube hoje que Antônio morreu, no Piauí, em Teresina, debilitado estava pela trato que a vida lhe deu, entre a arte e os pensamentos, na defesa marginal do planeta, acima do entendimento comum dos negócios do mundo. Paz, amor, natureza não são moedas. 

    por Bacellar

    Curioso agora notar, como a morte das pessoas crava vazios na metrópole. Antônio voltou de bicicleta para sua cidade natal, Picos. No Piauí, encontra agora a terra, deixou o asfalto, no planeta pulsa.

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  • Metade de nós é onça, outra metade é lua

    Metade de nós é onça, outra metade é lua

    Mudam a cor da casa que temos direito. Sei, será azul a casa do povo, a vida.

    Amor não sabe ficar só. 

    Dia frio olho pro céu, 

    há meia lua, há onça, um azul intenso, às 15 horas,

    na metrópole.

    A espada de Caxias,

    minha casa, minha vida, o céu desse momento?

    Azul é minha morada.

    Ando indignado, não sei,

    seguirei soldado de mim mesmo, 

    minha gente. Voraz, faminta, carente. 

    Não me iludo, escandalizo só.

    Tudo é foco.

  • Antropoceno, construir e destruir, a doença

    Antropoceno, construir e destruir, a doença

    Tudo flutua, indigenista. Trafega, navega a arca entre conversas com pensadores indígenas. Há algo líquido no momento atual. Sem sair de casa, encontro tantos, todos numa rede, como a chuva, uma neblina entre os não índios se dissipa. Conversam livres na Terra redonda, numa mídia índia que nos toca profundamente.

    antropoceno

    Antropoceno.

    Maracá, emergência indígena, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil. Até o carcará, em barranca de areia na curva de rio, questiona, para onde foram as andorinhas?

    Entre redes e na rede, finca-se facão, flexiona-se o arco, a flecha leve.

    Não invadem, ocupam.

    antropoceno
    Sônia Guajajara, liderança indígena, aos olhos e ouvidos de Zé Celso Martinez Corrêa, em 2016, no Oficina.

    Há culpados, punem os mais fracos. Metem fogo, degradam, punem pelo sistema, suas economias. Resistir é verbo duro. Resisto, no presente, por resistirem eles, no infinitivo, tudo questão de pães e conjugação, um equilibrar-se.

    antropoceno
    Direção por Mari Corrêa, roteiro por Paulo Junqueira, produção por Instituto Catitu e Instituto Socioambiental.

    Texto e fotografias por helio carlos mello.