No dia 05 de janeiro, diversos grupos feministas de Campinas organizaram um Ato para denunciar o machismo e a misoginia que motivaram o feminicídio ocorrido no dia 31 de dezembro de 2016 em Campinas. Na ocasião, treze pessoas (entre elas nove mulheres) foram assassinadas durante uma confraternização familiar. O assassino escreveu uma carta carregada de conteúdo misógino, machista e conservador. O Ato do dia 05 de janeiro foi uma resposta à chacina, às ideias retrógradas contidas na carta e à cultura machista que motivou estes assassinatos e muitos outros crimes e agressões por todo o país.
Abaixo, o manifesto oficial do Ato:
MANIFESTO NENHUMA A MENOS! Vivas nos queremos!
No dia 31/12 – véspera de ano novo – ocorreu uma chacina premeditada na cidade de Campinas, que teve como alvo principal as mulheres da família de Isamara. O crime tem características de ser mais um caso de feminicídio (crime hediondo previsto no código penal- Lei 13.104/15). Junto com mais oito mulheres e dois homens que tentaram conter o agressor, Isamara e seu filho de 8 anos foi brutalmente assassinada dentro de casa pelo ex-marido e pai da criança. As investigações seguem apurando o caso e deverão esclarecer todas os fatores que colaboraram para sua realização. Mas a carta deixada pelo atirador e divulgada pela imprensa não deixa dúvidas sobre o seu conteúdo machista.
As declarações do agressor foram um ataque não só àquelas vítimas, mas a todas as mulheres que foram insultadas como “vadias” (incluindo até mesmo a ex-presidente Dilma Rousseff) e aos defensores dos Direitos Humanos. Assim, trazendo à tona um sentimento profundo de ódio generalizado e vingança contra as mulheres, essa chacina feminicida se perpetua pela difusão desses ideais fascistas e misóginos impressos na carta, sendo um instrumento perigoso de incitação de novos crimes.
O Brasil ocupa o 4º lugar num ranking de violência contra a mulher envolvendo mais de 80 países. 13 mulheres são assassinadas todos os dias no Brasil. Mesmo com a promulgação da Lei Maria da Penha (lei. 11.340/06), inescrupulosamente debochada na carta do assassino ao chamá-la de “Lei vadia da Penha”, a cultura machista e misógina contínua se difundindo e fazendo novas vítimas. De 2009 a 2013 foram 234 casos de feminicídio só na Região Metropolitana de Campinas..
Assim, precisamos olhar não só para essa chacina de mulheres que ocorreu em um bairro de classe média, mas para todas aquelas outras mulheres, negras e periféricas, que são violentadas diariamente e que seguem anônimas, ou já foram esquecidas, nos noticiários da grande mídia. Precisamos olhar para o fato de que os crimes que levam à morte, na maioria das vezes, são precedidos por outras violações – injúrias, agressões, humilhações, restrições de liberdade – e que apesar de notificadas ao poder público não são interrompidas.
Qual a responsabilidade do Estado e as falhas nas suas políticas públicas na interrupção desse ciclo de violência contra a mulher? Consideramos simbólico o fato desse crime ter se dado num momento político em que as instituições republicanas estão postas em questão e no qual o discurso fascista ganhou voz no próprio parlamento. Os instrumentos legais criados para o enfrentamento da violência de gênero são importantíssimos, mas o direito penal não muda sozinho mentalidades. Até quando a Câmara Municipal de Campinas vai tentar proibir o debate de gênero nas escolas? Quantas vítimas mais serão necessárias para o poder público assumir sua responsabilidade na educação para a igualdade de gênero?
Deste modo, nós, mulheres organizadas pelo Nenhuma a menos – o Machismo mata, queremos nos posicionar contrariamente à perpetuação dessa cultura machista e do ódio contra as mulheres. Queremos abrir o debate crítico com a sociedade acerca dos mecanismos que levam a essa perpetuação. Assim, esse Ato marca o início de um período de lutas na cidade de Campinas:
– pela inserção do debate de gênero nas escolas – a fim de garantirmos uma educação pautada no princípio da igualdade;
– pela efetivação dos mecanismos de proteção a mulher definidos na Lei Maria da Penha – como um número adequado de Delegacias da Mulher em funcionamento, com atendimento especializado e funcionárias qualificadas;
– pela implantação da Vara da Violência doméstica;
– pelo fim da violência contra as mulheres – incluindo as violências psicológica, patrimonial e moral;
– pelo enfrentamento sistemático da cultura do estupro e do feminicídio;
– pelo direito de decisão das mulheres sobre seu corpo e sua vida.
Nenhuma a Menos – Campinas
ASSINAM ESTE MANIFESTO:
Advogados Independentes Campinas
Agentes da Pastoral Afro do Brasil
AF– USE
Aos Brados – Campinas
APEOESP (Mulheres da APEOESP)
Associação de Mulheres Guerreiras
Assossicação da Parada Orgulho LGBT de Campinas
Casa de Cultura Afro Fazenda Roseira
Casa de Cultura Tainã
CEAMO Centro de Apoio à Mulher
Centro Acadêmico de Pedagogia da Unicamp
Centro de Referência LGBT de Campinas
Coletivo de Juventude Domínio Público
Coletivo de Mulheres da CUT Campinas
Coletivo de Mulheres Negras Lélia González
Coletivo de Negras e Negros Raízes da Liberdade
Coletivo Feminista Rosa Lilás
Coletivo Juntas!
Coletivo Mulheres do PT
Coletivo Parajás
Coletivo Raízes da Liberdade
Comunidade Jongo Dito Ribeiro
Comunidade Menino Chorão
CONEPPA Coletivo Negro com Práticas Pedagógicas em Africanidades
Conselho Federal de Psicologia
Conselho Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de Campinas
Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Campinas
Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Hortolândia
Conselho Regional de Psicologia – Subsede Campinas
CUT-SP
Djumbo
Feminismo Negro Interseccional Campinas – Coletivo Lélia Gonzalez
Frente de Mulheres Negras de Campinas e Região
Frente Pró Cotas da Unicamp
Grupo de mulheres Pão e Rosas
Grupo Mulheres da Periferia
JPT Campinas
MAIC Movimento dos Advogados Independentes de Campinas
MAIS Movimento Por Uma Alternativa Socialista
Mandato da Vereadora do PSOL Mariana Conti
Mandato da Vereadora Sâmia Bonfim (PSOL/SP)
Mandato do Vereador Carlão (PT-Campinas)
Mandato do Vereador Pedro Tourinho (PT-Campinas)
Marcha Mundial das Mulheres
Minas da Luta
Movimento Raizes de Dandá
Mulheres do PSOL – SP
Mulheres do PT
Núcleo de Consciência Negra da Unicamp
Oyá-ò Estética Preta
Promotoras Legais de Hortolândia
Promotoras Legais de Jundiaí
Promotoras Legais Populares
Rede Feminista de Juristas
Secretaria Estadual da Mulher Trabalhadora da CUT-SP
Secretaria Nacional da Mulher Trabalhadora da CUT
Sindicato da Construcao Civil de Campinas e Regiao
Sindicato das Trabalhadoras Domésticas de Campinas
Sindicato dos Pscicólogos do Estado de São Paulo
SindiPetro Campinas
UBM União Brasileira de Mulheres
UNEGRO – Campinas e Região
As famílias não querem auxílio aluguel que não contempla todas as famílias. A Comunidade Mandela luta por Moradia para todas as famílias Foto: Fabiana Ribeiro | Jornalistas Livres
Negociação entre o proprietário do terreno e a municipalidade
A área de 300 mil metros quadrados é de propriedade de Celso Aparecido Fidélis. A propriedade não cumpre função social e possui diversas irregularidades com a municipalidade.
As famílias da Comunidade Mandela já demonstraram interesse em negociar a área, com o proprietário para adquirir em forma de cooperativa popular ou programa habitacional. Fidélis ora manifesta desejo de negociação, ora rejeita qualquer acordo de negócio.
Mas o proprietário e a municipalidade – por intermédio da COAB (Cia de Habitação Popular de Campinas) – estão negociando diretamente, sem a participação das famílias da Comunidade Mandela que ficam na incerteza do destino.
As mulheres são a grande maioria da Comunidade e também são elas que estão nos atos lutando por direitos. Foto: Fabiana Ribeiro | Jornalistas Livres
As famílias querem ser ouvidas
Durante o ato, uma comissão de moradores da Ocupação conseguiu ser liberada pelo contingente de Guardas Municipais que fazia pressão sobre os manifestantes , em sua grande maioria formada pelas mulheres da Comunidade com seus filhos e filhas. Uma das características da ocupação é a liderança da Comunidade ser ocupada por mulheres, são as mães que lideram a luta por moradia.
A reunião com o presidente da COAB de Campinas e Secretário de Habitação – Vinícius Riverete foi marcada para o dia 28 de setembro.
A luta e a esperança de igualdade social Foto: Fabiana Ribeiro | Jornalistas Livres
As mulheres da Comunidade Mandela, em sua maioria são trabalhadoras informais, se organizam para lutar por moradia.
Em Campinas, interior de SP, coletivo se organiza contra o apagamento da memória das verdadeiras vítimas da pandemia
Hoje, 05 de setembro, aconteceu pela manhã no centro da cidade o “Ato Vidas Interrompidas” promovido pelo Coletivo 1000vidas. O ato foi planejado para evitar aglomeração e foi transmitido ao pela página https://tv.socializandosaberes.net.br, com falas e intervenções artísticas que iniciaram no Largo do Rosário .
Ato Vidas Interrompidas – Campinas-05-09-2020 Foto: Fabiana Ribeiro
Na sequência, os participantes seguiram em cortejo para a Praça Bento Quirino . Na praça – marco zero da cidade – está localizado o monumento-túmulo de Carlos Gomes, que recebeu uma instalação artística com o intuito de homenagear às vítimas do Covid-19. Dessa forma foram colocados mil laços de fitas representando cada vida perdida para a doença, na cidade de Campinas.
Ato Vidas Interrompidas – Campinas-05-09-2020 Foto: Fabiana Ribeiro
Na semana passada, Campinas superou as 1000 mortes confirmadas, sendo o 11º município brasileiro com mais óbitos causados pela Covid-19. Campinas ainda tem mais óbitos pela doença que 15 capitais de estado do Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, entre elas Curitiba, Belo Horizonte e Porto Alegre, que são mais populosas e que têm 969, 944 e 663 mortes confirmadas, respectivamente.
Ato Vidas Interrompidas – Campinas-05-09-2020 Foto: Fabiana Ribeiro
O coletivo
O Coletivo 1000vidas nasceu da indignação de algumas pessoas com o apagamento da memória de amigos, familiares, conhecidos e cidadãs/ãos que estão morrendo ou sofrendo com o Covid-19 sob um manto de apatia de governantes e de parte da imprensa que nos têm tratado como estatísticas de adoecimentos e mortes aceitáveis frente às necessidades da economia e do mercado. Movido pelo sentimento incômodo da indignação, o coletivo propõe ações que desvelem as narrativas das famílias e as dores de suas perdas e pretende realizar diversas outras atividades , uma das propostas é um Memorial Virtual na forma de uma página na internet dando voz e prestando homenagens, a quem partiu e a quem sofre por estas vidas interrompidas prematuramente. O memorial conta com apoio do Conselho Municipal de Saúde de Campinas.
Integram o coletivo mais de 40 movimentos organizados de trabalhadores, sociais, culturais e outros.
Mais retomada de atividades e número de vítimas continua crescendo
No dia 02 de setembro, o Prefeito de Campinas – Jonas Donizette (PSB) assinou o decreto que autoriza a retomada de atividades culturais, como museus, cinemas e teatros, além de permitir eventos, convenções e serviços de bufê adulto, a partir de 04 de setembro .
A Prefeitura de Campinas (SP) informou, neste sábado (5), que foram confirmadas mais 10 mortes por novo coronavírus, além de outros 344 casos. Com isso, a cidade chegou a 1.069 óbitos provocados pela covid-19, e 29.327 moradores infectados.
O dia de hoje (31/08) será decisivo para as 108 famílias que vivem na área ocupada na região do Jardim Ouro Verde em Campinas, interior de São Paulo. Assim sendo, o último dia do mês de agosto, a data determinada como prazo final para que os moradores sem-teto deixem a área ocupada, no Jardim Nossa Senhora da Conceição. A comunidade está muito apreensiva e tensa aguardando a decisão do juiz Cássio Modenesi Barbosa – da 3ª Vara do Foro da Vila Mimosa que afirmou só se manifestar sobre a suspensão ou não do despejo na data final, tal afirmativa só contribuiu ainda mais para agravar o estado psicológico e a agonia das famílias.
A reintegração é uma evidente agressão aos direitos humanos dos moradores e moradoras da ocupação, segundo parecer socioeconômico do Núcleo Habitação da Defensoria Pública do Estado de São Paulo . As famílias não têm para onde ir e cerca de entre as/os moradoras/es estão 89 crianças menores de 10 anos, oito adolescentes menores de 17 anos, dois bebês prematuros, sete grávidas e 10 idosos. 62 pessoas da ocupação pertencem ao grupo de risco para agravamento da Covid-19, pessoas idosas e com doenças cardiológicas e respiratórias, entre outras podem ficar sem o barraco que hoje as abriga.
Parecer socioeconômico da Ocupação da Comunidade Mandela. Importante trabalho da agente socióloga do Núcleo de Habitação – Defensoria Pública do Estado de São Paulo.
A Defensoria Pública do Estado de São Paulo, a Comissão dos Direitos Humanos da Câmara de Campinas e o Ministério Público (MP-SP) se manifestaram em defesa do adiamento da reintegração durante a pandemia. A Governo Municipal também se posicionou favoravelmente a permanência após as famílias promoverem três atos de protesto. Novamente a Comunidade sofre com a ameaça do despejo. As famílias ocupam essa área desde 2017 após sofrem uma reintegração violenta em outra região da cidade.
As famílias
A comunidade possui 89 crianças com idade inferior a 10 anos
foto: Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
Célia dos Santos, uma das lideranças na comunidade relata:
Foto Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
“ Tentamos várias vezes propor a compra do terreno, a inclusão das famílias em um programa habitacional, no processo existem várias formas de acordo. Inclusive tem uma promessa que seriam construídas unidades habitacionais no antigo terreno que ocupamos e as famílias do Mandela seriam contempladas. Tudo só ficou na promessa. Prometem e deixam o tempo passar para não resolver. Eles não querem. Nós queremos, temos pressa. Eles moram no conforto. Eles não têm pressa”
Simone é mulher negra, mãe de cinco filhos. Muito preocupada desabafa o seu desespero
Foto: Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
“ Não consigo dormir direito mais. Eu e meu filho mais velho ficamos quase sem dormir a noite toda de tanta ansiedade. Estou muito tensa. Nós não temos para onde ir, se sair daqui é para a rua. Eu nem arrumei as coisas porque não temos nem como levar . O meu bebê tem problemas respiratórios e usa bombinha, as vezes as roupinhas dele ficam sujas de sangue e tenho sempre que lavar. Como vou fazer?”
Dona Luisa é avó, mulher negra, trabalhadora doméstica informal e possui vários problemas de saúde que a coloca no grupo de risco de contágio da covid-19. Ela está muito apreensiva com tudo. Os últimos dias têm sido de esgotamento emocional e a sua saúde está abalada. Dona Luisa está entre as moradores perderam tudo o que possuíam durante a reintegração de posse em 2017. A única coisa que restou, na ocasião, foi a roupa que ela vestia.
Foto: Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
“ Com essa doença que está por aí fica difícil alguém querer dar abrigo para a gente. Eu entendo as pessoas. Em 2017 muitos nos ajudaram e eu agradeço a Deus. Hoje será difícil. E eu entendo. Eu vou dormir na rua, junto com meus filhos e netos. Sou grupo de risco, posso me contaminar e morrer. E as minhas crianças? O quê será das crianças? Meu Deus! Nossa comunidade tem muitas crianças. Esses dias minha netinha me perguntou onde iríamos morar? Eu me segurei para não chorar na frente dela. Se a gente tivesse para onde ir não estaria aqui. Não é possível que essas pessoas não se sensibilizem com a gente. Não é possível que haja tanta crueldade nesse mundo.”
Comunidade Mandela – Foto Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres