Adolescentes em conflito com a lei e a maioridade penal

Jornalismo x Entretenimento

Programa Luciana Gimenez
http://www.redetv.uol.com.br/videos/superpop/superpop-debate-sobre-reducao-da-maioridade-penal

Pressupostos

A imprensa tem a capacidade de moldar o debate dos temas da agenda social, afetando, com base no enquadramento da notícia, tanto o “sobre o que” o público pensa quanto o “como” se posiciona acerca de tais assuntos. (Síntese da Teoria Agenda-Setting)

Embora as notícias sejam uma espécie de índice do ‘real’, dão vida ao acontecimento, e desse modo, constroem o acontecimento — ou o ‘real’. (Síntese da Teoria Construcionista)

#JornalistasLivres não observamos os fatos como se estivéssemos deles distantes e alienad@s. Sabemos que a mídia, o jornalismo e @s jornalistas interferem diretamente naquilo que documentamos, reportamos e interpretamos.

Os valores que nos unem são o amor apaixonado pela democracia e a defesa radical dos direitos humanos.

Quem são?

São considerados adolescentes em conflito com a lei pessoas na faixa etária de 12 a 17 anos de idade que cometeram atos infracionais — de pequenos furtos a delitos graves, como homicídios. Totalizam 58.764 indivíduos, número correspondente aos adolescentes que cumprem medidas socioeducativas no Brasil, segundo levantamento da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República

É um segmento frequentemente associado à prática de crimes hediondos, mas as estatísticas contrariam o senso comum:

• Prevalência de ações contra o patrimônio (62,8%); roubo (34,7%) e furto (22%);
• Os crimes contra a pessoa e os costumes representam 13,6%
• Homicídios respondem por 4,1%
• A média mundial de participação de jovens na criminalidade é de 11,6%

Causas

É impróprio estabelecer uma relação direta entre pobreza e criminalidades. Mas as estatísticas apontam para o fato de que esta condição leva a outras vulnerabilidades, que incluem a ultrapassagem da linha que leva à inserção de garotos e garotas no Sistema de Justiça Juvenil.

• Baixos índices de desenvolvimento humano, o que aponta para uma sucessão de falhas institucionais que os expõem a violências e criminalidades — seja como vítimas, seja como autores;
• Baixa escolaridade e trabalho infantil;
• Privação da convivência familiar e comunitária;
• Homicídios, exploração e abuso sexual.

A sistemática violação dos seus direitos demonstra que a prioridade absoluta com que família, poderes públicos e sociedade deveriam agir para garanti-los, por imposição da Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ainda é um ideal a ser alcançado.

Principais indicadores do Sistema Socioeducativo brasileiro

• A maioria dos adolescentes cumprindo medidas de privação de liberdade, em números absolutos está no Sudeste (11.548). É mais que o dobro do Nordeste, segundo colocado.

• Em comparação à população total de adolescentes por estado, São Paulo é o que tem a maior taxa de internação, com 37,2 a cada 10 mil adolescentes.

• Entre os adolescentes cumprindo medidas socioeducativas, a maioria abandonou os estudos com 14 anos, entre a 5a e a 6a série; 89% não concluíram a formação básica até a 8a série. (#maisescolamenoscadeia)

Reincidência no Sistema Carcerário Adulto: 60%
Reincidência na Fundação Casa: 13%

Perfil dos atos infracionais cometidos por adolescentes inseridos no Sistema de Atendimento Socioeducativo

Roubo -> 39%
Tráfico -> 27%
Atos infracionais que atentam contra a vida (homicídio, latrocínio, estupro, lesão corporal) -> 13,3%

Fonte: Levantamento Anual dos/as Adolescentes em Cumprimento de Medida Socioeducativa/Dados de 2012

Perfil das unidades de internação

Capacidade e ocupação total nas unidades de internação

  • As instituições de 16 estados brasileiros estão atuando com superlotação.
  • A taxa média de ocupação é de 119,2%.
  • Centro-Oeste: 167,3%
    Nordeste: 186,3%
    Norte: 97,4%
    Sudeste: 104,4%
    Sul: 93%
    O pior estado é o Maranhão, com taxa de ocupação 458,9%; em seguida está o Mato Grosso do Sul, com taxa de 354,1%.

Constituição Federal

• O direito à prioridade absoluta (art. 227, caput);
• O direito à proteção especial, que compreende o direito ao devido processo legal, se acusado de prática infracional (art. 227, §3 º, IV);
• O direito de ter respeitada a sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento e de que as medidas pri- 6 ONU, 1990. 7 BRASIL, 1988. vativas de liberdade sejam breves e excepcionais (art. 227, § 3 º, V);
• O direito de ser tratado por legislação especial se cometer uma infração com menos de 18 anos (art. 228).
Inimputabilidade penal de crianças e adolescentes. De acordo com a lei máxima do País, não podem ser submetidos ao sistema de justiça comum, cabendo à legislação especial (o ECA) a tarefa de definir os critérios de imputabilidade e ordenar o processo de responsabilização pelos delitos cometidos.

ECA

Estatuto da Criança e do Adolescente

• No Brasil, os adolescentes são inimputáveis no contexto do sistema de justiça comum, mas são imputáveis no âmbito de uma legislação e sistema de justiça especializados, previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente.

• No artigo 106, o ECA determina que “nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente.”

“O direito à informação não é apenas fundamental para uma sociedade aberta e democrática, mas é uma arma central para a luta contra a pobreza e para a aceleração do desenvolvimento humano”. Pnud

A cobertura

Pesquisa da ANDI aponta para “uma prática editorial que não condiz com um dos papeis centrais do jornalismo — o de oferecer informação qualificada à sociedade, com pluralidade de pontos de vista e contextualização de fatos”. A cobertura tem caráter nitidamente ideológico, construído sobre uma tese, exposta de modo gráfico e baseada em mitos descolados dos dados da realidade.

A cobertura negligencia o debate sobre o sistema socioeducativo (seus desafios e potencialidades), e catalisa o medo coletivo, empurrando a população para a redução da maioridade penal como forma de resolver o problema.

Veículos analisados

O que não fazer

As narrativas dos meios de comunicação de massa atuam de forma decisiva na construção de valores e comportamentos sociais. Nesse contexto, o emprego de palavras inadequadas pode reforçar preconceitos ou estereótipos. No caso dos adolescentes em conflito com a lei, em que os direitos conquistados estão permanentemente ameaçados por uma cultura de criminalização, editores e repórteres precisam estar atentos ao emprego de termos que contenham juízos de valor. Veja alguns equívocos comuns:

As 7 tendências capitais do noticiário

  1. Centrado em crimes graves contra a pessoa envolvendo adolescentes.
    2. Restrito à legislação que regula as regras de responsabilização desse grupamento e não no abandono de direitos dos jovens.
    3. Focado na (pretensa) impunidade que seria garantida pelo ECA.
    4. Reduz a problemática à ação do sujeito, ignorando o contexto de produção do fenômeno.
    5. Focado no ato infracional, negligenciando desdobramentos legais.
    6. Limitado à defesa de mudanças na legislação que regula as regras deresponsabilização.
    7. Defende principalmente a redução da idade penal como solução para o fenômeno.

Negligências da cobertura

• Adolescentes privados de liberdade correspondem à apenas 4% do total de pessoas encarceradas no país. Dado: InfoPen
• A maioria dos casos ocorre em grupo, muitas vezes com adultos, o que pode ser indício de que os adolescentes são usados como “escudos”.
• Falta de contraponto com dados de jovens assassinados no Brasil.

Conclusão: a mídia torna sensacionalista crimes contra a vida ou violentos cometidos por adolescentes desde que sejam praticados contra vitima geralmente branca, geralmente de classe alta.

Dados de violência

Produzida por adolescentes

Quadro que demonstra que a violência creditada aos adolescentes não tem aumentado e que atos infracionais cometidos por eles não são, na grande maioria, atentados contra a vida.

O que a ECA prevê?

Mortes na Fundação Casa

Entre 2007 e 2010, ocorreram 73 homicídios contra internos nas unidades de privação de 11 estados brasileiros

Maioridade

Por que dizer não à redução da maioridade penal?

• É incompatível com a doutrina da proteção integral, presente no ECA, na Constituição e em documentos internacionais;
• É inconciliável com o Sinase, um conjunto de princípios administrativos, políticos e pedagógicos que orienta a aplicação de medidas socioeducativas em meio aberto ou fechado;
• É inconstitucional, pois viola Cláusula Pétrea (imutável) da Carta Magna;
• Afronta compromissos internacionais, que têm peso de normas constitucionais;
• Está na contramão do que discute a comunidade internacional, que tende a diminuir a severidade das respostas penais, a fim de reduzir seus efeitos negativos;
• As propostas de redução da idade penal se sustentam na exceção, pois o percentual de adolescentes autores de crimes de homicídio é minoria entre os adolescentes internados no País;
• Quando aplicado, o ECA apresenta bons resultados;
• A violência está associada a elementos como a desigualdade social, o racismo, a concentração de renda e a insuficiência de políticas sociais. E não se resolve com adoção de leis penais mais severas, exigindo medidas de natureza social que diminuam a vulnerabilidade de adolescentes.

Mitos e verdades

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