A PM e a Reforma da Previdência

Familiares de policiais militares manifestam-se em frente ao quartel da PM, em Vitória (ES)

Por Carlos Wagner, especial para os Jornalistas Livres

 
Como sinais emitidos por um sismógrafo que acaba de captar um grande terremoto sendo gerado no interior da Terra. Assim devem ser entendidas as razões que levaram à greve do mês passado dos policiais militares capixabas, que teve seu foco maior em Vitória (ES). Eles fazem parte de um contingente de 450 mil PMs espalhados pelos 26 Estados e mais o Distrito Federal. São homens e mulheres armados, equipados, mal treinados e, miseravelmente, remunerados – com exceção do DF.

 

De todo o aparato policial brasileiro, do qual fazem parte também as polícias civis e Federal, são os PMs os mais exigidos pela população, por fazerem o chamado patrulhamento ostensivo, responsável por conter aqueles tipos de crimes que mais atormentam a população como assalto a pedestre, latrocínios (roubo com morte), furto e roubo de veículos e arrombamentos. Esses crimes são praticados por quadrilhas cada vez mais audaciosas e perigosas. Muitas deles se organizam em forma de facções, que têm como seus expoentes o Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo, e o Comando Vermelho (CV), do Rio de Janeiro.

 

Com pequenos retoques, é esse o quadro entre os 450 mil policiais militares, responsáveis pela segurança nas 5,5 mil cidades do país. Usando o jargão dos repórteres para descrever a situação das polícias militares, pode-se dizer que é um barril de pólvora com um pavio curto aceso. E o fogo que consome o pavio é o projeto de reforma da previdência do governo federal. Muito embora PMs e bombeiros tenham sido deixados de fora do projeto pelo presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP), indiretamente eles serão atingidos.

 

Temer retirou-os da reforma usando o argumento de que eles são pagos pelos Estados, cabendo, portanto, aos governadores lidarem com a questão. O que o presidente não disse, e é isso que as entidades de classe dos PMs estão alertando, é que os Estados, para terem acesso ao socorro financeiro do governo federal, precisam dar em troca contrapartidas – ou seja, cortar gastos. E um dos maiores gastos é a previdência social. Portanto, os PMs e os bombeiros serão atingidos por reformas. No Rio Grande do Sul, há projetos em andamento na Assembleia Legislativa que mexem com a aposentadoria dos brigadianos – como são chamados os policiais militares gaúchos.

 

Se o barril de pólvora explodir, como acreditam várias lideranças sindicais, a parte visível da explosão será a greve, temida pela população, principalmente das cidades grandes, por se tratar da polícia ostensiva. Embora proibidas, por ser a PM um braço das Forças Armadas, as greves acontecem. A maior de todas, que se espalhou por todo o país, foi em 1997, em Belo Horizonte (MG), quando um cabo foi morto por uma bala perdida.

 

A parte invisível desta explosão já está acontecendo. É a busca da renda extra pelo policial militar, na forma do “bico” como segurança privado. No Brasil, de Norte a Sul e de Leste a Oeste, a maior ocupação dos policiais militares é trabalhar na segurança do pequeno comércio varejista. Aliás, há estatísticas mostrando que a maioria das mortes e dos ferimentos entre os PMs ocorre em confrontos com bandidos enquanto eles fazem “bico”.

 

Outro problema é o envolvimento de policiais militares em agressões e até mortes de pessoas, que, por algum motivo, frequentam o comércio que é protegido por eles. A maioria dessas agressões acontece em casas noturnas, onde eles são contratados como “leões de chácara”.

 

Um tipo de ocupação que vem crescendo entre os PMs do Brasil e tem sido detectado por várias corregedorias das polícias militares é o recrutamento pelas quadrilhas. No Rio de Janeiro, nasceram entre os PMs as milícias que substituíram os traficantes em várias favelas. Nos Estados do Norte e do Nordeste, investigações que apontam o envolvimento com os bandos, que usavam as táticas do cangaço – um grupo bem armado ocupa uma cidadezinha – para assaltar bancos nas cidades do interior. No Oeste, há o envolvimento com contrabandistas e traficantes dos países vizinhos, principalmente do Paraguai. No Sul, além trabalharem no comércio varejista, eles também formam seguranças clandestinas de residências em ruas e avenidas.

 

A insatisfação nas polícias militares é explosiva. Não por acaso, é justamente neste ambiente que prosperam discursos comprometidos com o retrocesso político, como se viu durante a greve dos PMs capixabas, em que o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) e seus assessores tiveram um papel muito ativo. Imaginem o que aconteceria em um movimento como o de 1997. (Veja neste vídeo aqui quem são os heróis de Bolsonaro e pense se é isso o que vc deseja para o país).

 

Durante a ditadura militar (1964 a 1985), as polícias militares fizeram parte do serviço sujo para as Forças Armadas – reprimindo as passeatas e prendendo e torturando em seus quartéis. Claro, os oficiais que faziam a ligação entre as tropas federais e as PMs não estão mais na ativa. Mas muitos deles estão vivos e gozam de boa saúde. Bolsonaro pode ser o fósforo que irá acender o pavio do barril de pólvora. Quem duvida?

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

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