O Sindicato dos Metalúrgicos do ABC realizou na manhã desta quinta-feira (23) uma assembleia com as trabalhadoras e trabalhadores demitidos pela Ford em 2019. O companheiro Sapinho conduziu a plenária. Ele relembrou as manifestações e protestos contra a decisão da empresa de acabar com a produção de caminhões na América Latina, fechando assim a fábrica de São Bernardo do Campo.
O objetivo do encontro era prestar contas aos trabalhadores e informa-los a respeito das negociações com possíveis compradores do parque fabril, o que poderia garantir os cerca de 3 mil postos de trabalho. Rumores de que a Caoa e empresas chinesas teriam interesse não se concretizaram.
Em seguida, o coordenador do Departamento Jurídico do SMABC, Marcelo Mauad, fez um relato do ponto de vista jurídico das negociações. De acordo com Mauad, “O SMABC não poupou esforços para reverter a decisão da empresa com objetivo de manter os empregos. Inclusive, foi até os Estados Unidos para dialogar com a direção mundial da Ford e buscar um caminho para resolver a situação da melhor maneira”.
Rafael Marques, presidente do Instituto Trabalho, Indústria e Desenvolvimento (TID-Brasil) fez uma análise de conjuntura política e criticou a falta de interesse dos governos – municipal, estadual e federal – em querer resolver o problema. Em sua opinião, o posicionamento dos governos poderia ter sido determinante na decisão da empresa. “Nosso Sindicato fez o seu papel. Mas, infelizmente, a ausência de interesse dos nossos governantes nos prejudicou. Com apoio do governo federal, nossa conversa com a Ford seria completamente outra”, declarou.
Cronologia
Em 19 de fevereiro de 2019, a Ford anunciou que iria fechar a planta da fábrica em São Bernardo do Campo. A decisão afetou 2,8 mil trabalhadores – 750 diretos e o restante terceirizado –, além de 35 mil indiretos em toda cadeia produtiva. Em julho eles foram efetivamente demitidos, restando apenas alguns funcionários do administrativo. No dia 30 de outubro ela encerrou efetivamente sua atividade depois de 52 anos em São Bernardo do Campo.
As famílias não querem auxílio aluguel que não contempla todas as famílias. A Comunidade Mandela luta por Moradia para todas as famílias Foto: Fabiana Ribeiro | Jornalistas Livres
Negociação entre o proprietário do terreno e a municipalidade
A área de 300 mil metros quadrados é de propriedade de Celso Aparecido Fidélis. A propriedade não cumpre função social e possui diversas irregularidades com a municipalidade.
As famílias da Comunidade Mandela já demonstraram interesse em negociar a área, com o proprietário para adquirir em forma de cooperativa popular ou programa habitacional. Fidélis ora manifesta desejo de negociação, ora rejeita qualquer acordo de negócio.
Mas o proprietário e a municipalidade – por intermédio da COAB (Cia de Habitação Popular de Campinas) – estão negociando diretamente, sem a participação das famílias da Comunidade Mandela que ficam na incerteza do destino.
As mulheres são a grande maioria da Comunidade e também são elas que estão nos atos lutando por direitos. Foto: Fabiana Ribeiro | Jornalistas Livres
As famílias querem ser ouvidas
Durante o ato, uma comissão de moradores da Ocupação conseguiu ser liberada pelo contingente de Guardas Municipais que fazia pressão sobre os manifestantes , em sua grande maioria formada pelas mulheres da Comunidade com seus filhos e filhas. Uma das características da ocupação é a liderança da Comunidade ser ocupada por mulheres, são as mães que lideram a luta por moradia.
A reunião com o presidente da COAB de Campinas e Secretário de Habitação – Vinícius Riverete foi marcada para o dia 28 de setembro.
A luta e a esperança de igualdade social Foto: Fabiana Ribeiro | Jornalistas Livres
As mulheres da Comunidade Mandela, em sua maioria são trabalhadoras informais, se organizam para lutar por moradia.
Depois de muita espera, dez dias após o encerramento do prazo para a saída das famílias da área que ocupam, o juiz despacha no processo de reintegração de posse contra da Comunidade Mandela, no interior de São Paulo. No despacho proferido , o juiz do processo – Cássio Modenesi Barbosa – diz que aguardará a manifestação do proprietário da área sobre eventual cumprimento de reintegração de posse. De acordo com o juiz, sua decisão será tomada após a manifestação do proprietário. A Comunidade, que ocupa essa área na cidade de Campinas desde 2017, lançou uma nota oficial na qual ressalta a profunda preocupação em relação ao despacho do juiz em plena pandemia e faz apontamento importante: não houve qualquer deliberação sobre as petições do Ministério Público, da Defensoria Pública, dos Advogados das famílias e mesmo sobre o ofício da Prefeitura, em que todas solicitaram adiamento de qualquer reintegração de posse por conta da pandemia da Covid-19 e das especificidades do caso concreto.
Ainda na nota a Comunidade Mandela reforça:
“ Gostaríamos de reforçar que as famílias da Ocupação Nelson Mandela manifestaram intenção de compra da área e receberam parecer favorável do Ministério Público nos autos. Também está pendente a discussão sobre a possibilidade de regularização fundiária de interesse social na área atualmente ocupada, alternativa que se mostra menos onerosa já que a prefeitura não cumpriu o compromisso de implementar um loteamento urbanizado, conforme acordo firmado no processo. Seguimos buscando junto ao Poder público soluções que contemplem todos os moradores da Ocupação, nos colocando à disposição para que a negociação de compra da área pelas famílias seja realizada.”
Hoje também foi realizada uma atividade on-line de Lançamento da Campanha Despejo Zero em Campinas -SP (
Campinas acaba prorrogar a quarentena até 06 de outubro, a medida publicada na edição desta quinta-feira (10) do Diário Oficial. Prefeitura também oficializou veto para retomada de atividades em escolas da cidade.
A Comunidade Mandela e as ocupações
A Comunidade Mandela luta desde 2016 por moradia e desde então tem buscado formas de diálogo e de inclusão em políticas públicas habitacionais. Em 2017, cerca de mais de 500 famílias que formavam a comunidade sofreram uma violenta reintegração de posse. Muitas famílias perderam tudo, não houve qualquer acolhimento do poder público. Famílias dormiram na rua, outras foram acolhidas por moradores e igrejas da região próxima à área que ocupavam. Desde abril de 2017, as 108 famílias ocupam essa área na região do Jardim Ouro Verde. O terreno não tem função social, também possui muitas irregularidades de documentação e de tributos com a municipalidade. As famílias têm buscado acordos e soluções junto ao proprietário e a Prefeitura. Leia mais sobre: https://jornalistaslivres.org/em-meio-a-pandemia-a-comunidade-mandela-amanhece-com-ameaca-de-despejo/
O dia de hoje (31/08) será decisivo para as 108 famílias que vivem na área ocupada na região do Jardim Ouro Verde em Campinas, interior de São Paulo. Assim sendo, o último dia do mês de agosto, a data determinada como prazo final para que os moradores sem-teto deixem a área ocupada, no Jardim Nossa Senhora da Conceição. A comunidade está muito apreensiva e tensa aguardando a decisão do juiz Cássio Modenesi Barbosa – da 3ª Vara do Foro da Vila Mimosa que afirmou só se manifestar sobre a suspensão ou não do despejo na data final, tal afirmativa só contribuiu ainda mais para agravar o estado psicológico e a agonia das famílias.
A reintegração é uma evidente agressão aos direitos humanos dos moradores e moradoras da ocupação, segundo parecer socioeconômico do Núcleo Habitação da Defensoria Pública do Estado de São Paulo . As famílias não têm para onde ir e cerca de entre as/os moradoras/es estão 89 crianças menores de 10 anos, oito adolescentes menores de 17 anos, dois bebês prematuros, sete grávidas e 10 idosos. 62 pessoas da ocupação pertencem ao grupo de risco para agravamento da Covid-19, pessoas idosas e com doenças cardiológicas e respiratórias, entre outras podem ficar sem o barraco que hoje as abriga.
Parecer socioeconômico da Ocupação da Comunidade Mandela. Importante trabalho da agente socióloga do Núcleo de Habitação – Defensoria Pública do Estado de São Paulo.
A Defensoria Pública do Estado de São Paulo, a Comissão dos Direitos Humanos da Câmara de Campinas e o Ministério Público (MP-SP) se manifestaram em defesa do adiamento da reintegração durante a pandemia. A Governo Municipal também se posicionou favoravelmente a permanência após as famílias promoverem três atos de protesto. Novamente a Comunidade sofre com a ameaça do despejo. As famílias ocupam essa área desde 2017 após sofrem uma reintegração violenta em outra região da cidade.
As famílias
A comunidade possui 89 crianças com idade inferior a 10 anos
foto: Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
Célia dos Santos, uma das lideranças na comunidade relata:
Foto Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
“ Tentamos várias vezes propor a compra do terreno, a inclusão das famílias em um programa habitacional, no processo existem várias formas de acordo. Inclusive tem uma promessa que seriam construídas unidades habitacionais no antigo terreno que ocupamos e as famílias do Mandela seriam contempladas. Tudo só ficou na promessa. Prometem e deixam o tempo passar para não resolver. Eles não querem. Nós queremos, temos pressa. Eles moram no conforto. Eles não têm pressa”
Simone é mulher negra, mãe de cinco filhos. Muito preocupada desabafa o seu desespero
Foto: Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
“ Não consigo dormir direito mais. Eu e meu filho mais velho ficamos quase sem dormir a noite toda de tanta ansiedade. Estou muito tensa. Nós não temos para onde ir, se sair daqui é para a rua. Eu nem arrumei as coisas porque não temos nem como levar . O meu bebê tem problemas respiratórios e usa bombinha, as vezes as roupinhas dele ficam sujas de sangue e tenho sempre que lavar. Como vou fazer?”
Dona Luisa é avó, mulher negra, trabalhadora doméstica informal e possui vários problemas de saúde que a coloca no grupo de risco de contágio da covid-19. Ela está muito apreensiva com tudo. Os últimos dias têm sido de esgotamento emocional e a sua saúde está abalada. Dona Luisa está entre as moradores perderam tudo o que possuíam durante a reintegração de posse em 2017. A única coisa que restou, na ocasião, foi a roupa que ela vestia.
Foto: Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres
“ Com essa doença que está por aí fica difícil alguém querer dar abrigo para a gente. Eu entendo as pessoas. Em 2017 muitos nos ajudaram e eu agradeço a Deus. Hoje será difícil. E eu entendo. Eu vou dormir na rua, junto com meus filhos e netos. Sou grupo de risco, posso me contaminar e morrer. E as minhas crianças? O quê será das crianças? Meu Deus! Nossa comunidade tem muitas crianças. Esses dias minha netinha me perguntou onde iríamos morar? Eu me segurei para não chorar na frente dela. Se a gente tivesse para onde ir não estaria aqui. Não é possível que essas pessoas não se sensibilizem com a gente. Não é possível que haja tanta crueldade nesse mundo.”
Comunidade Mandela – Foto Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres