Por Walter Falceta, especial para os Jornalistas Livres
Por Walter Falceta, especial para os Jornalistas Livres
Atribui-se ao 32º presidente estadunidense, Franklin Delano Roosevelt, a perturbadora frase: “leva-se um bom tempo para trazer o passado ao presente”.
De fato, corre tempo demais até compreendermos o porquê das pequenas e grandes tragédias cotidianas. Roosevelt pensava, por exemplo, nos equívocos e desvarios econômicos e financeiros que haviam conduzido seu país à Grande Depressão.
O desprezo pelo passado frequentemente nos conduz ao horror e ao sofrimento, fenômeno que se apresenta aos olhos dos historiadores no período entre as duas devastadoras guerras mundiais que marcaram o Século 20.
No Brasil, há quem ainda não tenha compreendido, por exemplo, a natureza do Golpe Militar de 1964, que ceifou vidas, esperanças e amores.
Pior é a crença patológica em um passado edulcorado, no qual a farda supostamente garantiu aos brasileiros um tempo de ordem, progresso e segurança, de gestores públicos imaculados, jamais envolvidos em casos de corrupção.
Se o passado é moldado pela construção e reprodução de narrativas particulares, faz-se necessário garantir que o pensamento da civilidade possa concorrer com aquele da barbárie.
O livro “Sobre Lutas e Lágrimas – Uma Biografia de 2018” (Editora Record, R$ 44,90) escrito pelo jornalista Mário Magalhães, serve brilhantemente a esse propósito.
A obra trata do pretérito recente, esse que ainda não tivemos tempo de processar, cuja análise atenta exibe uma fieira de ocorrências espantosas, absurdas ou mesmo inacreditáveis.
A pena virtuosa do colega Mário nos choca ao narrar, por exemplo, os eventos de abril, quando o ex-presidente Lula deixou a resistente São Bernardo e rumou ao cárcere em Curitiba, vítima estoica das tramas lavajateiras.
Ora, um recuo modesto no tempo, que seja a 2008, exibe um país governado pelo mesmo nordestino. A economia cresce e multiplica-se a oferta de empregos, o filho do porteiro ingressa na universidade e a fome vai desaparecendo do cotidiano das famílias mais humildes.
Na época, poucos imaginavam que o ex-metalúrgico, mandatário colecionador de sucessos na gestão pública, pudesse cair vítima de um golpe articulado por procuradores reacionários em parceria com um magistrado de cultura limitada.
Causa estranheza que, em 2018, nos tenha faltado tempo para compreender 1968, o famoso ano rebelde que não terminou. Vivemos o ano passado de forma vertiginosa, ocupados, procurando entender o mês anterior, o dia de ontem, a hora passada.
Neste Brasil líquido, senão gasoso, como nos reconta o genial Mário, assistimos à caça de macacos, incriminados como transmissores da febre amarela. Se houve empoderamento das mulheres, multiplicaram-se os casos de feminicídio. O Doutor Bumbum revelou sua verdadeira índole. Caminhoneiros travaram o país, a intervenção militar amedrontou o Rio de Janeiro, a direita paranoica mobilizou-se contra a Ursal, índios e jovens recorreram ao suicídio para findar a aflição dos dias todos.
O neofascismo brasileiro, associado aos neoliberais que se desencantaram com o PSDB e o DEM, viabilizou a candidatura do ex-capitão Jair Bolsonaro. Neste medieval ano de 2018, milhões de brasileiros foram enganados pelo “tiozão” do WhatsApp, que repassou notícias sobre a “mamadeira de piroca” do Haddad, o mesmo candidato vermelho que, segundo ele, pretendia legalizar a pedofilia.
Na obra de Mário o que mais espanta, no entanto, é a celeridade nas mudanças de cenário. Nos textos escritos no início do segundo semestre, ele ainda cogita de uma candidatura de Lula e não descarta a vitória do ex-metalúrgico. Poucos meses adiante, o que se avalia é se Bolsonaro pode ou não vencer a eleição presidencial no primeiro turno.
O autor rememora o episódio da reportagem de Patrícia Campos Mello, da Folha, sobre o esquema ilegal de disparo de conteúdos anti-PT nas redes, bancado por empresas. Mas não faz olho militante. Investiga na minúcia os personagens de seu 2018, um ano que se converte, ele próprio, em personagem.
Na página 261, apresenta um rascunho do candidato presidencial de esquerda, Fernando Haddad:
- Em piscada de olho para o centro, Haddad elogiou Sergio Moro (“ajudou” o Brasil, com “saldo positivo”), mas criticou a condenação de Lula. Errou ao endossar a acusação improcedente que atribuía tortura ao general Mourão, porém se corrigiu. Criticou decisões de correligionários, como a desmesurada renúncia fiscal do governo Dilma.
Se nos adiantamos aqui, é bem possível que façamos um curioso spoiler daquilo tudo que já sabemos, ou julgamos saber.
Quer colar no passado e trazê-lo para decifrar o presente? Embarque nessa leitura, no fascinante jogo das frescas reminiscências. São 330 páginas, mas que passam rapidinho, como aquelas 730 de “Marighella – O Guerrilheiro que Incendiou o Mundo”, obra luminosa e reveladora do mesmo Mário.
Uma resposta
Kkkk Bando de esquerda ruim de memória , e a roubalheira daquele ladrão preso vcs esqueceram ??? Jornalista Lula livres.
Ridículos