Por Júlia Carvalho, da agência Saiba Mais
Antes do sol surgir no assentamento Paulo Freire, zona rural de Mossoró, Aldeiza da Silva, de 42 anos, já está de pé para iniciar os trabalhos no campo. A criação de abelhas, a plantação de hortaliças, além de outras atividades voltadas para a agroecologia são auxiliadas pelo marido, com quem é casada desde os 15.
A família consegue obter, em média, de R$ 80 a R$ 100 reais por semana com a venda dos produtos, realizada em feiras durante quatro dias na semana, além das entregas pela região, organizadas através do aplicativo de mensagens Whatsapp. Essa é a única fonte de renda para manter a casa e os três filhos: uma de 13, um de 24 e outro de 27. Os dois últimos, além de ajudar nos serviços rurais, pedalam, todos os dias, do assentamento a UFERSA, onde cursam licenciatura no campo.
Aldeiza é uma das muitas mulheres que viajaram do interior do Estado à capital potiguar na manhã desta terça-feira (11) para acompanhar a votação do projeto de Lei que cria o Programa de Compras Governamentais para aquisição de produtos oriundos da agricultura familiar, o PECAFES. O projeto foi proposto pela deputada Isolda Dantas (PT) e aprovado por unanimidade na Assebleia Legislativa. É o primeiro projeto aprovado por Isolda, como deputada. A partir de agora, o PL segue para o Centro Administrativo, onde será sancionado pela governadora Fátima Bezerra (PT).
A proposta obriga que pelo menos 30% da alimentação comprada pelo Estado seja oriunda da agricultura familiar. Segundo o Secretário de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar Alexandre Lima, o Estado é hoje o maior comprador dos alimentos do campo e movimentou, só em 2018, cerca de R$ 5 milhões desse mercado. Para 2019, a partir da sanção de Fátima Bezerra, a expectativa é de que esse valor chegue em R$ 20 milhões.
“Esse proejto de Isolda é revolucionário, ele vai colocar agricultura familiar do estado em outro patamar. Já está mais do que comprovado que as políticas de compra governamentais organizam e muito o processo produtivo, porque o grande gargalo da agricultura é onde vender, e você tendo o Estado como grande comprador, você tem uma garantia que ao produzir vai ter um mercado em potencia”, explica.
Segundo Alexandre, a criação de oportunidade para as famílias rurais permite que esses trabalhadores tenham acesso ao crédito, melhorem sua estrutura produtiva e qualidade de vida. De acordo com o secretário da pasta, a proposta também cria uma modalidade inédita no Brasil, quando institui a compra indireta.
“Toda empresa que fornecer alimentação preparada terá que comprovar que 30% do que ela usou pra comprar o cardápio vem da agricultura familiar. Esse projeto avança no que já foi feito até hoje no país em termos de aquisição de alimentos. É uma nova modalidade de compra governamental que tá sendo proposta por ela (Isolda) e que o governo abraçará porque é uma política pública fundamental e que está no plano de governo de Fátima”, garantiu.
Dados da Sedraf mostram que em mais de 75% dos estabelecimentos rurais há agricultores familiares. Atualmente, existem cerca de 35 cooperativas de agricultores no Rio Grande do Norte e mais de 200 mil pessoas ocupadas no campo são oriundas da agricultura familiar. Segundo Isolda Dantas, não é possível pensar em qualquer política pública para o desenvolvimento do RN sem incluir esse grupo:
“Agora eles terão mercado pra esses produtos. Tendo mercado, vai fomentar a economia rural, produzir mais e fixar as famílias no campo. Além de criar a perspectiva de sorbreviver e de melhorar a qualidade de vida no campo. Fora que todos os produtos de qualidade, da agroecologia, pra fortaler a soberania alimentar, que tem sido cada vez mais difícil.”
Segundo a deputada, o projeto prevê a constituição de um comitê gestor que vai acompanhar toda execução do programa. Já os alimentos que forem comprados pelo governo do RN devem abastecer as secretarias do Estado e contemplar a alimentação de presídios, restaurantes populares e a área da saúde, conforme explicou o representante da Sedraf.
Moradora no assentamento Nova Esperança, em Mossoró, Francisca de Melo, de 62 anos, é agricultora e também viajou mais de 280 km nesta terça-feira para ver o projeto ser aprovado. Ela conta que diminiu a frequência do plantio e sobrevive com a renda vinda do bolsa família, recebido pela filha. Agora, com o incentivo estatal, pretende retormar de forma intensa com os trabalhos da agricultura. “Espero que esse projeto ajude a gente”, resumiu.
Estiveram presntes na ALRN, além dos agricultores familiares e movimentos sindicais e sociais, alunos do curso de agropecuária da Escola Agrícola de Jundiaí. De acordo com Luiz Fernando de Santana, de 19 anos, a coordenação do curso trouxe 14 alunos da EAJ, já que o Projeto de Lei, além dos trabalhadores do campo, pode vir a beneficiar os futuros técnicos:
“Uma vez que praticamos o ato de extensão rural para produtor rural, temos a competência de produzir, planejar e administrar o produtor nesse fornecimento. Se esse modelo de PL for aprovado temos um aumento, um vasto leque pra essa produção e se torna uma demanda maior de técnicos para produzir esses alimentos para o Estado”, explica.