Prefeitura sabota encerramento do Dia da Mulher no fim de semana

Cancelamento de última hora obrigou o adiamento
Mais de cinco mil mulheres participaram da Marcha do dia 8 de março em Florianópolis. Sucesso da atividades da semana provocou boicote do encerramento pela prefeitura. Foto: Sérgio Lds

Florianópolis é uma das cidades que mais ganham noticiário no país por casos de feminicídio e crimes hediondos ligados à intolerância de gênero. No entanto, isso parece não preocupar a prefeitura. As entidades organizadoras do 8M Brasil em Santa Catarina denunciaram a Prefeitura Municipal de Florianópolis pelo boicote das atividades de encerramento do Dia da Mulher neste final de semana. Segundo uma nota de repúdio dirigida ao prefeito Gean Loureiro e publicada ontem (10/3), na página do 8M, “atos deliberadamente machistas e opressores” por parte do poder público municipal culminaram com o cancelamento do evento marcado para este sábado há mais de um mês. Depois de impor na última hora uma série de entraves burocráticos, a prefeitura não autorizou o uso do espaço público previsto para as atividades, que começariam com um cortejo de mulheres às 11 horas, no Instituto Cultural Arcoíris, e encerrariam às com uma festa e um ato político e cultural na Bodega La Kahlo, das 14 às 20 horas de sábado.  Em repúdio à sabotagem, o 8M realizou, no horário divulgado, o que chamou de “Cortejo Baque de mulheres”, em frente ao Arcoíris. Em forma de jogral, as mulheres denunciaram os desmandos, sabotagens e intimidações que as entidades promotoras da semana da mulher sofreram na organização dos eventos, lembrando que Florianópolis é uma das cidades mais destacadas do país pelos casos de feminicídio e lesbo e homofobia. Confira o protesto no vídeo ao vivo da La Kahlo:

Também em resposta ao boicote, as feministas adiaram a realização dos atos de encerramento para o dia 17 de março, próximo sábado, quando prometem vir em dobro. “Vamos fazer um ato de fechar a Hercílio Luz no dia 17 de março”, avisa a advogada Íris Gonçalves, da coordenação geral. “A desautorização do espaço e outras ações intimidantes tiveram por objetivo boicotar e coibir as atividades de resistência neste dia”, afirma a documentarista Adriane Canan, coordenadoras da comissão de comunicação do 8M em Santa Catarina. “A prefeitura está cerceando o direito cidadão de ocupar os espaços públicos”, acrescenta Cristine Larissa Classen, que coordenou as atividades culturais da Semana da Mulher. “Não resta dúvida que é uma perseguição a tudo o que representa o 8M: mulheres na rua lutando por direitos trabalhistas e denunciando as múltiplas formas de violência da sociedade machista”, afirma a advogada Íris Gonçalves, da coordenação do 8M. Na avaliação das integrantes do movimento, é também uma perseguição à La Kahlo Bodega, um espaço cultural que se declara feminista e se configura como um espaço aberto à diversidade de gêneros, como reduto de mulheres do movimento LGBT. “Não vamos nos deixar calar e tomarem nossos direitos ao espaço público”, avisa Cristine Larissa Classen.

Cores de Aidê, bloco de mulheres, abre a marcha na avenida Paulo Fontes. Foto: Raquel Wandelli
PROGRAMAÇÃO CONSCIENTIZA CONTRA A VIOLÊNCIA DE GÊNERO

Depois do sucesso das realizações da Semana e do Dia Internacional da Mulher em Florianópolis, pelo segundo ano consecutivo, parece que os entraves burocráticos impostos pela Prefeitura não vão intimidar a organização do 8M Brasil em Santa Catarina. “No dia 17 de março vamos voltar e será maior”, garantem as coordenadoras. Sob o mote “É tempo de Rebelião”, a grande marcha das mulheres do dia 8 de março reuniu mais de cinco mil pessoas em passeata por mais de duas horas pelas principais ruas da cidade. Gritando pela tolerância, pelo fim à violência contra a mulher, acenaram bandeiras de todas as cores e partidos, movimentos sociais organizados, grupos de cultura popular, trabalhadoras urbanas e ruais, sindicalistas. Todas unificadas por um único grito “Fora Temer”, pela volta da democracia, contra a reforma da previdência e pelo fim dos ataques aos direitos humanos e sociais e, sobretudo, pelo basta à opressão da mulher. E foram mais de 20 mil pessoas envolvidas no conjunto de atividades desenvolvidas durante toda a semana em Florianópolis e nas principais cidades de Santa Catarina. Mesas redondas, rodas de conversa, oficinas, mostra culturais, seminários, palestras, manifestações artísticas, troca de cartas com mulheres e mães presidiárias tomaram conta do Largo da Alfândega, das 8 às 23 horas durante todo o dia 8 de março. O dia de lutas só terminou com o final da Batalha da Alfândega, uma disputa de grupos de rap e cultura popular a partir de temáticas feministas e sociais, toda programação voltada à conscientização e sensibilização para a tolerância e diversidade, como acentuam as organizadoras.

Para as feministas, a prefeitura tenta, em vão, enfraquecer o movimento, proibindo suas realizações de forma autoritária, através de burocracia e boicote direto à continuidade dos eventos ligados ao dia mundial de luta das mulheres organizados pelo movimento feminista 8M. “Fica evidente que essa é uma retaliação à liberdade e a luta pela igualdade e pela democracia”, acrescenta Shirley Azevedo, coordenadora do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Urbanas (MTU Santa Catarina) .  “Não vamos nos calar! Este chamado é para que os nossos direitos ao uso de espaços públicos continuem existindo e sejam respeitados! Essa luta é de todos e todas! Bora pra rua com Movimento Baque Mulher e 8M batucar pelos nossos espaços de direito!”, dizia a chamada convidando para o Cortejo Baque Mulher em repúdio ao boicote do encerramento do 8M!

 

CARTA DE REPÚDIO DO 8M SANTA CATARINA À PREFEITURA MUNICIPAL DE FLORIANÓPOLIS E AO CERCEAMENTO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E MOBILIZAÇÃO DAS MULHERES!

Prefeito Gean Loureiro, você não vai nos calar!

O oito de março é marcado pelo Dia Internacional da Mulher e, assim como em 2017, o movimento 8M Santa Catarina, que reúne mulheres de diversas representações da Grande Florianópolis, organizou suas ações para a semana do 8 de março com bastante antecedência. Entre as burocracias necessárias para ocupar espaços públicos da cidade, já bastante reduzidos para uso da cidadania, estão as licenças e protocolos, os quais o 8M Santa Catarina respeitou e organizou junto aos órgãos responsáveis. E, sim, obtivemos as licenças obrigatórias.

Acontece que a Prefeitura não fez sua parte. E não só isso: tentou ao máximo nos boicotar e calar nossas vozes. Em uma atitude deliberadamente machista e opressora, permitiu que a Feira da Alfândega acontecesse na quinta-feira, dia 8, justamente no dia previsto para a grande atividade das mulheres, preparada para aquele espaço das 7 horas da manhã até a noite. Ressaltamos aqui que a feira normalmente não abre nas quintas-feiras.

É importante enfatizar que apoiamos a agricultura familiar, as feirantes e os feirantes, e acreditamos que a feira é de extremo valor para fazer oposição às grandes multinacionais que dominam o mercado. As agricultoras e agricultores são nossas companheiras e nossos companheiros! Nossa crítica não é a eles, mas às autoridades municipais.

As ações da Prefeitura para boicotar e coibir as atividades de resistência neste dia foram evidentes, incentivadas, inclusive, pelo secretário da Prefeitura que insistiu que alguns feirantes ficassem bem em frente de espaços de nossas atividades, bloqueando e impedindo circulação. Em frente ao coreto, onde aconteceriam as atividades culturais, por exemplo, sobraram poucos metros livres. Além de tudo, a Prefeitura ainda tentou se aproveitar da nossa organização colocando seu balão de identificação. No mesmo dia, as mulheres conseguiram que o balão fosse retirado. A atual gestão da Prefeitura de Florianópolis não nos representa!

As atitudes de intimidação não param por aí.

No sábado, 10, as atividades do 8M Santa Catarina continuam e teríamos um evento no bar “La Kahlo”, espaço conhecido por ser reduto das mulheres e da comunidade LGBT, no centro de Florianópolis. Entretanto, foram inventadas pela Prefeitura algumas burocracias de última hora para liberação da atividade, mesmo com as taxas já pagas, documentos enviados e todos os protocolos respeitados pelo 8M Santa Catarina . Na sexta, 9, a Prefeitura começou a solicitar outros documentos. Quando representantes do 8M Santa Catarina chegaram com eles em mãos, as pessoas da Prefeitura, as que deveriam receber e liberar, disseram que “o expediente havia fechado”.

Eles acham que vão nos calar, mas se enganaram!

As mulheres organizadas no 8M Santa Catarina não se calarão. Vamos denunciar o boicote e a opressão machista da Prefeitura de Florianópolis aos quatro cantos. A retaliação à liberdade e à luta das mulheres pela igualdade e a democracia, assim como a hostilização, burocratização e criminalização do uso dos espaços da cidade por todos os movimentos será denunciada. A Prefeitura de Florianópolis, com o uso da burocracia e da força, vem cotidianamente fechando espaços públicos. Mas a cidade é de todas e todos. A Prefeitura não pode impedir que nos manifestemos. Não à repressão, aos golpes cotidianos nos direitos, aos ataques às trabalhadoras e trabalhadores, em todos os níveis.

Quando impede as mulheres de ocuparem espaços em Florianópolis, estão mexendo também com todas as mulheres do mundo, pois as atividades do 8M Santa Catarina acontecem junto com as atividades de mulheres em todos os continentes, numa ação global que levou milhões de nós às ruas no 8 de março. Em 2019 vai ser maior!

Contra qualquer abuso de autoridade, estaremos em luta, sempre! Nós, mulheres, não tememos burocracias e intimidações de nenhum nível. Resistimos até hoje e continuaremos resistindo! Estamos permanentemente organizadas e em #TempoDeRebelião.

 

 

 

COMENTÁRIOS

POSTS RELACIONADOS

Café com muriçoca: Sem justiça, sem paz

Sem justiça sem paz

Bem-vindos e bem-vindas ao “Café com muriçoca” – espaço de compartilhamento literário dos Jornalistas Livres. No texto de hoje, “Sem justiça, sem paz”, Dinha apresenta um pequeno manual para suas filhas organizarem a luta armada e se defenderem do machismo nosso de cada dia.