Diversos coletivos e movimentos sociais mineiros se reuniram neste sábado, 28 de Maio, para a Marcha da Maconha de Belo Horizonte, manifestação anual que pede a legalização da Cannabis sativa para uso medicinal e recreativo. Os organizadores do ato acreditam que houve cerca de 15 mil participantes, a maior de sua história. Se iniciando às 4:20 da tarde, a marcha percorreu a região central da cidade. Ela terminou com a queima simbólica de um gigantesco “baseado” de papelão nos portões da sede do governo de Minas, o Palácio da Liberdade.
E foi por Liberdade que várias organizações civis se juntaram na Marcha da Maconha de Belo Horizonte, como os movimentos sociais as Brigadas Populares, a União da Juventude Socialista (UJS) e os coletivos Faísca, Maria Fumaça e Periferia Ativa. “O diferencial desta edição é esse! A galera está começando a entender que ir para a rua adianta. Isto aqui não é folia, é coisa séria”, explica Baden Jansen Dias, idealizador e organizador da Marcha na capital mineira. Somados a luta anti-proibicionista, foi formado diversas alas, cada uma acrescentando um enfoque particular a luta pela regulamentação das drogas.
“Fumar maconha já é nosso direito. Ninguém está lutando por isso aqui não”, explica o organizador. “O maior problema da proibição do uso de drogas não é o uso de drogas, mas a própria proibição. É o que gera o tráfico, é o que gera a violência. (…) O que a gente quer aqui é apenas poder plantar nossa baseado em casa. A gente quer o fim do genocídio da juventude negra na favela.”
Ele tem razão. O Atlas da Violência 2016, estudo lançado em Março deste ano e feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), revela que há um aumento de quase 20% nos homicídios de negros na última década. No mesmo período, a taxa de assassinatos para não negros diminuiu em 15%. Em reportagem ao Ponte Jornalismo, o pesquisador do Ipea, Daniel Cerqueira, reconheceu um “racismo institucional” que torna jovens e negros como alvo preferido da PM. Questionado pelo canal, ele também afirmou que “o único caminho para solucionar a violência relacionada ao tráfico é a legalização de todas drogas”.
A criminalização das drogas, no entanto, não atinge apenas homens negros e jovens. Danielle Vassalo, das Brigadas Populares e do coletivo Maria Fumaça, entende que a luta anti-proibicionista tem uma relação direta com a pauta feminista. “(A proibição) tange a liberdade dos sujeitos. Estamos lutando pelo uso das drogas, não só a maconha, porque entendemos que legalizando e regulamentando seu uso, você diminui o encarceramento e o genocídio da juventude negra, ou seja, contribui para a vida e para a liberdade dos sujeitos. O que as mulheres lutam hoje, as mulheres lutam pela vida e liberdade de seus corpos.”
UMA MANIFESTAÇÃO CRIMINALIZADA
Em Belo Horizonte, a Marcha da Maconha tem uma história difícil. Ocorrendo em centenas de cidades pelo mundo desde 1999, a manifestação faz parte de uma rede internacional que se opõe a Guerra contra as Drogas. No Brasil, sua primeira edição ocorreu em 2002 no Rio de Janeiro. A organização de uma Marcha mineira começou cinco anos depois, em 2007, preparando o primeiro ato para 2008. No entanto, ela foi proibida por um mandado de segurança emitido pelo Tribunal de Justiça do Estado, argumentando que o ato fazia “apologia ao consumo e ao uso de drogas.”
Este problema foi compartilhado por diversas edições e estados brasileiros. Tribunais orientaram a Polícia Militar fazer valer suas decisões, resultando em repressões a atos, além de prisões de manifestantes por participar ou simplesmente divulgar a ato político. Foi somente em 2011, que o Supremo Tribunal Federal decidiu de forma unânime dar legalidade da Marcha da Maconha. Os magistrados entendiam que o ato é uma manifestação garantida pelos Direitos de Liberdade de Expressão e Manifestação.
No entanto, esse direito ainda é questionado e arbitrariamente suprimido. No mesmo dia em que a capital de Minas teve a maior Marcha da Maconha de sua história, a capital do Brasil teve 51 ativistas pró-legalização detidos, sendo 11 menores de idade. Em entrevista dada a Mídia Ninja, Henrique, um dos organizadores da edição de Brasília, comentou a ação da polícia:
“A gente sabe muito bem que não é qualquer pessoa que vai presa, a gente sabe que as pessoas que são presas hoje por tráfico de drogas no Brasil mais de 70% são jovens, negros e da periferia. É uma criminalização da pobreza sim! É uma tática de controle da periferia sim! É puro reflexo de racismo.”
Ironicamente, a ação da PM do Distrito Federal foi nomeada de “Tolerância Zero”, segundo a Folha De S. Paulo. A polícia emitiu uma nota na madrugada de domingo, afirmando que as prisões ocorreram por porte de drogas. Apesar da ação policial, a Marcha em Brasília não foi interrompida, contando com cerca de 8 mil manifestantes.
LEGALIZAÇÃO DA MACONHA MEDICINAL
Entre os participantes da Marcha da Maconha de Belo Horizonte estava Leandro Ramires, 52 anos, médico e representante da Associação Brasileira de Pacientes de Canabis Medicinal.
“Meu filho de oito anos tem epilepsia refratária controlada por cannabis (…) Nós ficamos na mão de uma legislação estúpida que não permite que possamos cultivar aqui no Brasil para produzir o remédio que ele precisa e que tantas outras pessoas precisam para sobreviver”.
Apesar de tudo, há alguns avanços recentes no Brasil e na América latina. Em 2015, a sugestão popular SUG 8/2014 que defende a regulamentação do uso medicinal da cannabis foi discutida no Senado Federal e seu relatório foi aprovado na Comissão de Direitos Humanos. Se a tramitação continuar, a proposta pode vir a se tornar um projeto de lei. No mesmo ano, a Anvisa já permitiu a importação do canabidiol, derivado da maconha; no entanto, sua produção em território nacional continua proibida.
Na última quarta-feira, dia 25 de Maio, o Congresso da Colômbia aprovou o uso medicinal da maconha. Entre os argumentos para a aprovação da lei, se explica que alguns anestésicos tradicionais utilizados podem ser altamente aditivos para os usuários, enquanto a cannabis não gera vício, mas é capaz de aliviar a dor da mesma maneira. A lei prevê fomento estatal à pequenos e médios produtores para se criar medicamentos a base de maconha usados no tratamento de doenças como artrite, epilepsia e câncer.
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