Por Kátia Passos e Lucas Martins
O jovem Heverton Enrique Siqueira, 20 anos, está preso desde o dia dez de outubro, após ter sido reconhecido, como um dos assaltantes do roubo de um carro na região de Sapopemba, zona leste de São Paulo. A família do jovem presenciou a prisão e denuncia o erro de reconhecimento, por isso, luta para provar a inocência de Heverton.
O advogado de defesa de Heverton, Dr. Ricardo André de Souza, recebeu da vítima um testemunho, registrado em cartório, no qual, consta a informação que os policiais da ocorrência teriam forçado a vítima a testemunhar e reconhecer o jovem na delegacia.
A vítima escreveu uma carta onde relata que foi ao 69° DP (onde foi registrada a ocorrência), em 11 de outubro, mas chegando lá, soube que só poderia fazer a retificação do Boletim de Ocorrência com o mesmo delegado que conduziu o registro do documento, o senhor Daniel Bruno F. Colombini.
Na carta, consta ainda o pedido claro de retificação: “venho por esta carta me retificar pelo ocorrido no dia 10-10-2019, como foi tudo muito rápido entre o roubo e a elucidação do caso, coisa de 30 a 40 minutos, eu ainda me encontrava muito abalado e nervoso” e a vítima ainda completa: “posso afirmar com certeza que Heverton e [seu amigo menor de idade] não são autores desse delito”.
No dia da prisão, o reconhecimento foi positivo somente após Heverton colocar o capuz, uma exigência dos policiais, ação que contraria a normativa que rege a forma como deve ser feito o reconhecimento: a vítima tem que reconhecer o suspeito após descrevê-lo e “se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la”, ou seja, sem fatores que influenciem para o reconhecimento de alguém em específico.
Heverron está no terceiro ano do ensino médio e pode se formar este ano. Seu principal plano para o futuro é ir morar com a namorada em uma casa que estão reformando e que ganharam dos pais da jovem. Mas agora tudo depende de desfazer essa terrível injustiça e provar que ele não participou de crime. Nos últimos meses Heverton, além de ir à escola, entregava currículos em busca de emprego e revendia roupas com um amigo.
Mais sobre o caso
Segundo informações captadas no Boletim de Ocorrência, na manhã do dia 10 de outubro, a vítima do roubo, que trabalha como motorista, chegou na casa da mãe e após estacionar, saindo do carro, foi surpreendido por dois homens que saíram de trás de um veículo escolar. Daí consta no B.O “ao olhar um dos indivíduos achou que [era] seu amigo, por ser muito parecido com um conhecido, e quando foi cumprimentá-lo este anunciou o roubo. Subtraíram três telefones celulares, um de uso pessoal, um que usa para trabalhar com aplicativos e outro obsoleto que estava dentro do carro. A vítima afirma que os criminosos entraram no veículo, determinaram que andasse até o fim da rua e foram embora. A vítima andou até o fim da rua, depois retornou e na casa da mãe e ligou para a Policia Militar”.
O carro foi encontrado cerca de trinta minutos, abandonado aproximadamente a 400 metros de onde ocorreu o roubo e devolvido para a vítima.
A irmã do jovem, Layliane Cristina Siqueira, conta que Heverton acordou cedo no dia e seguiu com sua rotina normal, se banhou e tomou café. Por volta das 08h09 ele realizou uma vídeo-chamada com a namorada e os três permaneceram algum tempo conversando pelo celular. Mais tarde, por volta das 09:30h, ele saiu para fumar um cigarro, em uma praça próxima de casa, onde encontrou um amigo, ficando ali até serem abordados pela polícia.
Segundo o depoimento dos policiais do caso, a procura era por “um negro aparentando ser adolescente com camisa azul e amarela, e outro também jovem pardo com blusa clara”. Na praça, encontraram Heverton e seu amigo, que é menor de idade, e os abordaram “questionaram ambos, que afirmaram que estavam na praça e iriam para a escola, porém não estavam com nenhum material escolar”.
Em depoimento Heverton apontou que “não sabe o motivo pelo qual foi reconhecido, o que aconteceu? e qual relação isso teve com estar de laranja?”
O menor evidentemente foi apreendido. Em depoimento contou que “saiu de casa para ir à escola e que não levou nenhum material escolar porque teria festa no local e que chegou na escola e não tinha ninguém.” De lá seguiu para casa da avó e depois foi até a praça onde ficou “conversando com seu amigo Heverton, que mora perto de casa”. A escola onde estudam os dois, a E.E. Professor Arthur Chagas Junior, confirmou que naquele dia houve uma festa, em comemoração ao Dia das Crianças.
A abordagem foi presenciada pela irmã, que tentou explicar aos policiais que Heverton esteve em casa durante a manhã. Mas bastou o racismo estrutural incutido do Oiapoque ao Chuí do Brasil, para que a cor da pele, a raça, a classe, batesse com a descrição inicial da vítima e assim, serem levados para averiguação na 69º D.P, de lá para cá, Heverton não saiu mais detrás das grades.
Nem mesmo os celulares roubados estavam com eles ou foram encontrados. Heverton segue encarcerado, tendo a vida dilacerada e ainda assim, resistindo e aguardando o julgamento. Até quando?