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Coronavírus

O novo ministro da Saúde do governo Bolsonaro

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Nelson Teich foi anunciado pelo  presidente Jair Bolsonaro (sem partido),  como seu escolhido, para substituir Luiz Henrique Mandetta no Ministério da Saúde. Mandetta foi demitido por Bolsonaro ou seja, sai após semanas de embates públicos com o presidente resultado da discórdia nas questões relacionadas a pandemia da covid-19. O principal ponto do confronto é a adoção do isolamento horizontal defendido por Mandetta e repelido por Bolsonaro.  O presidente defende o isolamento vertical cujo modelo resulta no isolamento social dos idosos, enquanto a população continua com as atividades normalmente mantendo apenas o distanciamento social.

Sócio da Teich Health Care, uma consultoria de serviços médicos, Nelson Teich , é médico formado pela UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), especialista em oncologia pelo Instituto Nacional do Câncer .  Ele  atuou como consultor da área de saúde da campanha eleitoral de Bolsonaro em 2018.  E chegou a ser cotado ao Ministério da Saúde à época da eleição de Bolsonaro.

Teich recentemente vem publicando artigos na rede profissional LinkedIn sobre a Covid-19.  Nos artigos, ele critica a  gestão de Mandetta frente ao Ministério da Saúde e faz propostas de como gerir.  Também seus artigos, ele coloca-se favorável ao isolamento horizontal  –  modelo rejeitado por Bolsonaro. Em certo momento , em dos seus artigos  – ” COVID-19: Como conduzir o Sistema de Saúde e o Brasil”)-  Teich trata o distanciamento social e  o isolamento  social como sendo a mesma coisa, apesar de afirmar que conceitualmente não são.

“ Diante da falta de informações detalhadas e completas do comportamento, da morbidade e da letalidade da Covid-19, e com a possibilidade do Sistema de Saúde não ser capaz de absorver a demanda crescente de pacientes, a opção pelo isolamento horizontal, onde toda a população que não executa atividades essenciais precisa seguir medidas de distanciamento social, é a melhor estratégia no momento. Além do impacto no cuidado dos pacientes, o isolamento horizontal é uma estratégia que permite ganhar tempo para entender melhor a doença e para implantar medidas que permitam a retomada econômica do país.”

 

No mesmo artigo fala sobre a economia que recebe uma abordagem constante em seus artigos.

“Iniciar uma estratégia que permita estruturar e coordenar a retomada das atividades normais do dia a dia e da economia. “

Em um outro  artigo;

“ Essa incerteza e o medo levam os países e sistemas de saúde a adotar de forma totalmente compreensível as medidas atuais, mas o ponto fundamental da discussão, quando mudamos a perspectiva para o lado econômico, é qual o impacto das perdas econômicas na mortalidade não só das empresas, mas das pessoas. Temos que avaliar a abordagem aparentemente oposta, que começa a discussão pelo lado econômico, usando o mesmo objetivo final, que são os desfechos clínicos em saúde, que é evitar a morte e o sofrimento das pessoas.”

” A crise econômica vai impactar muito a capacidade de ter acesso a cuidados adequados em saúde, mas esse não é o único problema. Por mais recursos financeiros que pessoas mais ricas possam ter, em algum momento vão ter dificuldade em encontrar itens básicos para o dia a dia, será cada vez mais difícil sair de casa, enfrentar saques e violência urbana e  ter acesso a um cuidado de saúde mais individualizado e de qualidade. A verdade é que não se consegue prever todos os desdobramentos e a magnitude de uma crise econômica severa. É impossível saber para onde isso vai nos levar no futuro e vale lembrar que nesse momento mudar para outro país não é uma opção possível. ”

Acima de tudo  vê com ceticismo as projeções do Imperial College London , referência mundial em ciências, cujas diretrizes  têm orientado as ações contra à pandemia da Covid-19  em muitos países. Os  EUA e o Reino Unido mudaram as estratégias adotadas ao coronavírus,  a partir dos estudos dos pesquisadores do Imperial College London

“Tomando como exemplo as projeções do Imperial College London, que foi feita em 27 de Março, o cenário mais pessimista projetava 1.152.283 mortes no Brasil. A  Gripe Espanhola de 1918, uma das maiores pandemias da história da humanidade, de acordo com estudos realizados, infectou 25% da população mundial e matou 2,5% (500 milhões e 50 milhões pessoas respectivamente). No Brasil ela matou cerca de 35.000 pessoas. Em 1918 a população brasileira era de 28.9 milhões de habitantes. Fazendo um ajuste para a população atual que gira em torno de 212.5 milhões de pessoas, o número equivalente de mortes no Brasil pela Gripe Espanhola seria de 257 mil pessoas. Os números do Imperial College da Covid-19 para o Brasil projetaram uma mortalidade 4,4 vezes maior que aquela ocorrida na Gripe Espanhola. Parece um exagero. Com medidas de supressão precoce, as projeções do número mortes pelo Imperial College para o Brasil cairiam para 44.212, uma redução de 96%. Parece outro exagero. A ideia aqui é mostrar que mesmo instituições renomadas e de referência podem fazer projeções que levam a cenários extremamente improváveis, que podem causar mais ansiedade e medo do que auxiliar na compreensão e solução de problemas.”

 

Conheça o artigo na íntegra:

COVID-19: Como conduzir o Sistema de Saúde e o Brasil

Esse artigo é dividido em duas partes. Na primeira falamos das ações para enfrentamento da crise causada pela Covid-19, algo que em grande parte já faz parte da visão da população e dos gestores. Na segunda parte vou abordar alguns pontos que acredito podem ter impacto nas avaliações, nas escolhas e nas definições de políticas e ações.

Podemos dividir as ações para o enfrentamento da crise atual desencadeada pela Covid-19 em alguns pilares:

  1. Entender que o atual momento é marcado por enorme falta de informação e grande incerteza em relação a Covid-19. Essa incerteza se aplica à história natural da doença e sua evolução, ao impacto final no nível de saúde das pessoas e da sociedade, ao tempo que a sociedade vai ter que conviver com uma mudança radical no seu dia a dia, e aos possíveis desdobramentos sociais e econômicos consequentes à doença e às medidas que vão sendo tomadas.

Um nível de incerteza muito alto obriga gestores a rever quase que diariamente, com bases em novas informações que vão sendo acumuladas, as escolhas, políticas e ações que foram previamente determinadas. Isso torna crítica a capacidade de gerar informação detalhada, completa e confiável, em tempo real.

  1. Estruturar os sistemas de saúde público e privado para que tenham a capacidade de oferecer os cuidados necessários para a população, durante o período da epidemia a após o seu término. O sistema de saúde vai ter que administrar uma enorme demanda reprimida ao término da crise da Covid-19.
  2. Tomar medidas que permitam ao Sistema de Saúde atender todos os que necessitam de cuidado durante a crise da Covid-19:

3.a.     Reduzir o volume da entrada simultânea de novos pacientes no Sistema de Saúde para que se consiga atender tanto aqueles com diagnóstico de Covid-19 quanto aqueles com outras doenças e problemas que não podem ter o seu cuidado postergado.

3.b.     Aumentar a capacidade do Sistema de Saúde para atender com qualidade a uma demanda aumentada de pacientes, estruturando a operação de forma que ela seja segura para os profissionais de saúde, e trabalhando em iniciativas voltadas a hospitais, leitos, equipamentos como respiradores, Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e Recursos Humanos.

3.c.      Iniciar programas de Telemedicina que vão auxiliar nos processos de diagnóstico e tratamento, permitindo que isso seja conseguido mantendo o distanciamento que protege profissionais e pacientes.

  1. Iniciar uma estratégia que permita estruturar e coordenar a retomada das atividades normais do dia a dia e da economia.
  2. Iniciar programas e pesquisas para avaliar as melhores estratégias de diagnóstico, prevenção, tratamento e monitoramento da Covid-19 e suas consequências.
  3. Criar um programa de Informação e Inteligência que consolide todas as informações críticas que vão permitir entender a doença e suas consequências e definir as políticas e ações adequadas.
  4. Trabalhar o Brasil com o detalhamento necessário por estados ou regiões, permitindo que as ações e políticas sejam implementadas na sequencia ideal nas diferentes regiões do país, auxiliando nas estratégias de logística e transferência de recursos de uma parte do país para outra. Isso vai evitar a compra de insumos e equipamentos de forma simultânea para todo o país, algo importante não só pelo custo financeiro, mas também por uma possível escassez de recursos para compra que pode acontecer em diferentes momentos ao longo da crise.
  5. Pesquisa na busca de Vacinas e Tratamentos que atuem sobre a Covid-19.

Vou comentar agora alguns pontos que me parecem críticos na avaliação da situação atual e no desenho dos próximos passos.

Vamos começar falando sobre a polarização que está acontecendo entre a saúde e a economia. Esse tipo de problema é desastroso porque trata estratégias complementares e sinérgicas como se fossem antagônicas. A situação foi conduzida de uma forma inadequada, como se tivéssemos que fazer escolhas entre pessoas e dinheiro, entre pacientes e empresas, entre o bem e o mal.

Um dos temas mais importantes relacionados à saúde de uma sociedade são os “Determinantes Sociais da Saúde” (DSS) , que são aquelas variáveis que impactam na expectativa e na qualidade de vida das pessoas. Cuidados em Saúde, Estabilidade Econômica, Educação e Condições Sociais são alguns desses determinantes e não existe uma definição clara do peso de cada um desses fatores no tempo de vida e no bem estar das pessoas. Todos precisam ser abordados simultaneamente, com o mesmo cuidado e atenção, principalmente em tempos de crise.

Quando medimos os benefícios das intervenções em Saúde usando a mortalidade e o sofrimento como desfechos principais e os benefícios da intervenção econômica sendo medidos usando número de empresas que quebram e as perdas financeiras e de empregos, naturalmente criamos um conflito e uma disputa intensa e desigual que impede a percepção de objetivos e metas comuns, e não leva a cooperação no desenho de programas e políticas. Qualquer escolha e ação, seja ela da saúde, econômica ou social, tem que ter na mortalidade o seu desfecho final, por mais difícil que seja chegar a esses números. É a única forma de comparar as ações e escolhas que são feitas de uma forma técnica, justa e equilibrada.

Outro ponto é que fala-se muito que a saúde tem que ser abordada de uma forma técnica, mas isso também vale para iniciativas econômicas e sociais. Uma abordagem técnica é aquela em que as ações e as consequências das ações são decididas e avaliadas com base em dados objetivos e indicadores. Como o impacto das decisões sociais e econômicas na mortalidade e na qualidade de vida não é simples ser medido, acabamos tratando tais escolhas e abordagens como políticas, o que é um erro.

Felizmente, apesar de todos os problemas, a condução até o momento foi perfeita. Pacientes e Sociedade foram priorizados e medidas voltadas para o controle da doença foram tomadas. Essa escolha levou a riscos econômicos e sociais, que foram tratados com medidas desenhadas para resolver possíveis desdobramentos negativos das ações na saúde.

 

O isolamento/distanciamento social.

Aqui vamos tratar isolamento e distanciamento como se fossem a mesma coisa, apesar de existir diferença entre esses conceitos.

Diante da falta de informações detalhadas e completas do comportamento, da morbidade e da letalidade da Covid-19, e com a possibilidade do Sistema de Saúde não ser capaz de absorver a demanda crescente de pacientes, a opção pelo isolamento horizontal, onde toda a população que não executa atividades essenciais precisa seguir medidas de distanciamento social, é a melhor estratégia no momento. Além do impacto no cuidado dos pacientes, o isolamento horizontal é uma estratégia que permite ganhar tempo para entender melhor a doença e para implantar medidas que permitam a retomada econômica do país.

Outro tipo de isolamento sugerido é o isolamento vertical. Nessa opção apenas um grupo de pessoas é submetido ao isolamento, no caso aquelas com maior risco de morrer pela doença, como idosos acima de 60 anos e pessoas com outras doenças que aumentam o risco de morte pela Covid-19. Essa estratégia também tem fragilidades e não representaria uma solução definitiva para o problema. Como exemplo, sendo real a informação que a maioria das transmissões acontecem à partir de pessoas sem sintomas, se deixarmos as pessoas com maior risco de morte pela Covid-19 em casa e liberarmos aqueles com menor risco para o trabalho, com o passar do tempo teríamos pessoas assintomáticas transmitindo a doença para as famílias, para as pessoas de alto risco que foram isoladas e ficaram em casa. O ideal seria um isolamento estratégico ou inteligente. Vamos falar sobre isso mais à frente.

 

Testes em massa

Testes em massa para a Covid-19 são necessários para o entendimento do comportamento da doença e para definir as melhores estratégias e ações.

Se os dados preliminares estiverem corretos, 80% dos pacientes com a Covid-19 não apresentam sintomas ou são pouco sintomáticos. Nesse cenário, a concentração dos testes em pacientes internados e mais graves, não vai permitir entender a epidemiologia da doença, o que implica no não conhecimento da sua incidência, evolução, prevalência, transmissibilidade e letalidade.

 

Projeções e Modelos Matemáticos

As informações sobre a Covid-19 vindo de outros países mostram um cenário assustador, grave e caótico nunca antes vivido no mundo no último século. Nesse cenário de grande incerteza em relação a história natural da Covid-19,  é necessário fazer escolhas e definir ações para abordar a crise atual. Na busca de tomar decisões mais embasadas, modelos matemáticos são criados e utilizados para realizar projeções com objetivo de ajudar no desenho de estratégias, políticas e ações.

As projeções que são feitas tomando por base modelos matemáticos alimentados com premissas incorretas causam grandes problemas. Os números gerados pelos modelos, que deveriam ser tratados apenas como possíveis cenários, cercados de enorme incerteza quanto a sua possível realidade,  acabam sendo tratados como uma evolução provável, quase como um fato concreto.  Não podemos assumir que vamos adivinhar o que vai acontecer no Brasil através do uso de modelos matemáticos ou da extrapolação do que acontece em outros países, até mesmo porque quando olhamos o cenário mundial vemos realidades muito diferentes entre os países na evolução da doença e não é simples entender os reais motivos dessas diferenças.

Tomando como exemplo as projeções do Imperial College London, que foi feita em 27 de Março, o cenário mais pessimista projetava 1.152.283 mortes no Brasil. A  Gripe Espanhola de 1918, uma das maiores pandemias da história da humanidade, de acordo com estudos realizados, infectou 25% da população mundial e matou 2,5% (500 milhões e 50 milhões pessoas respectivamente). No Brasil ela matou cerca de 35.000 pessoas. Em 1918 a população brasileira era de 28.9 milhões de habitantes. Fazendo um ajuste para a população atual que gira em torno de 212.5 milhões de pessoas, o número equivalente de mortes no Brasil pela Gripe Espanhola seria de 257 mil pessoas. Os números do Imperial College da Covid-19 para o Brasil projetaram uma mortalidade 4,4 vezes maior que aquela ocorrida na Gripe Espanhola. Parece um exagero. Com medidas de supressão precoce, as projeções do número mortes pelo Imperial College para o Brasil cairiam para 44.212, uma redução de 96%. Parece outro exagero. A ideia aqui é mostrar que mesmo instituições renomadas e de referência podem fazer projeções que levam a cenários extremamente improváveis, que podem causar mais ansiedade e medo do que auxiliar na compreensão e solução de problemas.

 

Isolamento Social

Finalmente vamos falar sobre o isolamento. Usando um conceito que hoje permeia a saúde, ele deveria ser personalizado. Um modelo semelhante ao da Coreia do Sul. Essa estratégia demanda um conhecimento maior da extensão da doença na população e uma capacidade de rastrear pessoas infectadas e seus contatos. Estamos falando aqui do uso de testes em massa para Covid-19 e de estratégias de rastreamento e monitorização, algo que poderia ser rapidamente feito com o auxilio das operadoras de telefonia celular. Esse monitoramento provavelmente teria uma grande resistência da sociedade e demandaria definição e aceitação de regras claras de proteção de dados pessoais.

 

Considerações Finais

Tudo o que foi falado é muito fácil de falar, mas muito difícil de fazer acontecer. Demanda uma gestão centralizada e estruturada, incluindo o sistema público nos níveis federal, estadual e municipal, a saúde suplementar e contribuições da iniciativa privada.

Também é fundamental o alinhamento dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

Gerir e fazer acontecer em períodos de crise é um desafio enorme.

Estamos vivendo um tempo de guerra e tempos de guerra, apesar de todas as dificuldades e perdas, são períodos onde grandes inovações acontecem, inclusive na saúde.

Essa é uma guerra diferente, em guerras convencionais a maior busca da inovação está voltada para fuzis, aviões de guerra, armas nucleares. Nesse caso nossas maiores inovações vão estar no campo da informação, das vacinas, dos medicamentos e na capacidade de rever nossas rotinas do dia a dia.

Espero que logo ali na frente a gente consiga encontrar ou desenvolver tratamentos que curem a Covid-19, para que a história natural da doença seja mudada e para que possamos retornar a um dia a dia mais leve e agradável, idealmente mudado para melhor pelo aprendizado desses tempos de guerra.

O segundo artigo foi publicado no dia 24 de março de 2020.

 

COVID-19: Histeria ou Sabedoria?

A discussão sobre as estratégias e ações que foram definidas por governos, incluindo o Brasileiro, para controlar a Pandemia do Covid-19 mostra uma polarização cada vez maior, colocando frente a frente diferentes visões dos possíveis benefícios e riscos que o isolamento, o confinamento e o fechamento de empresas e negócios podem gerar para a sociedade. É como se existisse um grupo focando nas pessoas e na saúde e outro no mercado, nas empresas e no dinheiro, mas essa abordagem dividida, antagônica e talvez radical não é aquela que mais vai ajudar a sociedade a passar por esse problema.

A situação do gestor de saúde é muito difícil, porque ele precisa tomar decisões duras usando informações e projeções que apresentam grande incerteza. A função daqueles que lideram e preparam o sistema de saúde para enfrentar problemas, como esse da Covid-19, não é ter uma estratégia “Robin Hood”, imaginando que existe um alvo preciso e vendo aquilo que é decidido hoje como o que vai definir o sucesso ou fracasso da estratégia e da abordagem. O sucesso vai depender da capacidade de colher dados críticos em tempo real, de incorporar e analisar essa base de dados atualizada, de ajustar as projeções quanto aos possíveis impactos das escolhas, rever as decisões e desenhar novas medidas e ações. Ter uma visão polarizada, tentando adivinhar o que vai acontecer ou assumindo posições radicais só vai atrapalhar a capacidade de entender e enfrentar a situação e de se transformar com a velocidade e eficiência necessárias.

O papel do líder e gestor em um processo como o do Covid-19 é mais complexo do que tentar adivinhar o que vai acontecer para planejar os próximos passos. Aquele que lidera a estruturação e operação do sistema de saúde em situações como essa precisa mapear os possíveis cenários, do mais provável ao menos provável, e de alguma forma se preparar para cada um deles e para suas evoluções. Isso vale inclusive para os cenários menos prováveis, principalmente se eles trazem com eles possibilidades catastróficas, como acontece com a Covid-19.

Comparações com pandemias anteriores como a Gripe Espanhola e a Gripe Suína são inevitáveis. A mais importante delas é a Gripe Espanhola de 1918. Publicações apontam que a Gripe Espanhola matou cerca de 40 a 50 milhões de pessoas no mundo, tendo acometido em torno de 500 milhões de pessoas, aproximadamente ¼ da população mundial na época. O surto aconteceu em 3 ondas, sendo a segunda onda a mais severa delas. Nesse aspecto é interessante acompanhar o que vai acontecer na China, onde aparentemente a doença foi controlada. Um reaparecimento significativo, uma 2a onda mais agressiva, pode apontar para uma semelhança maior com a Gripe Espanhola do que inicialmente imaginado. A Gripe Espanhola e a Covid-19 aconteceram em momentos muito distantes da história. Por um lado temos hoje uma interação muito maior entre países e pessoas, mas em contra partida temos uma capacidade muito maior de tratar e curar complicações como pneumonias bacterianas que se superpõem à infecção viral inicial e de oferecer cuidados de suporte sofisticados, como os respiradores. As idades mais comprometidas também foram diferentes, com um acometimento maior em pessoas mais jovens na Gripe Espanhola, mas isso é algo esperado, já que a expectativa de vida ao nascer em 1917, era muito inferior. Na Espanha em 1917 a expectativa de vida ao nascer era de 42,63 anos e caiu para 30,29 anos em 1918. Portugal teve uma queda de 35,60 para 20,30 no mesmo período e no Brasil os números foram respectivamente 31,98 e 26,68 anos.  Para compararmos, em 2018 a expectativa de vida ao nascer no Brasil foi de 76,3 anos. A 1a Guerra Mundial, que durou de 1914 a 1918, matou cerca de 20 milhões de pessoas, menos da metade da Gripe Espanhola. Alguns pesquisadores afirmam que a Gripe Espanhola matou em 24 meses mais do que a AIDS em 24 anos.

É muito medo e incerteza no ar. O grande problema que vivemos hoje é a incerteza sobre o potencial de contaminação e letalidade do novo Coronavírus. Falta informação com a complexidade, detalhamento e velocidade necessárias. Quanto menos informação de qualidade, maior vai ser a incerteza que o gestor vai trabalhar para definir políticas e ações. Informações menos precisas e defasadas  acabam levando a um maior número possível de cenários e cada um deles cercado de muita incerteza. Tomar decisões e fazer escolhas nessas condições é um enorme desafio. A chance de errar é grande, daí a necessidade de tentar reduzir a incerteza através da informação complexa, detalhada e em tempo real.

Quando vemos acontecer coisas que nunca vimos antes, como hospitais pelo mundo não conseguindo dar conta do volume de pacientes, discussões sobre ter que escolher quem vai ser tratado, quando pessoas precisam esperar e se acumulam na espera do seu enterro, isso liga um sinal de alerta para possibilidade de estarmos diante de algo novo e de potencial indefinido quanto a capacidade de contagiar e matar. Se hoje temos acontecimentos mais graves e diferentes do que já vimos acontecer no passado, talvez estejamos diante de uma doença também diferente do que já vivenciamos antes. Quando pessoas próximas ou de alguma forma conhecidas começam a ser acometidas e a morrer, isso inevitavelmente vai levar ao medo da situação atual poder ser de alguma forma semelhante à Gripe Espanhola.

Eu tinha recentemente me formado médico quando a AIDS surgiu e lembro claramente que apesar do grande medo e ansiedade que existiu ao longo dos primeiros anos da doença, nada semelhante ao que vivemos hoje aconteceu.

O acesso a informação também é bem diferente hoje, mas a grande pergunta que me faço é se essa diferença impacta mais no volume e na qualidade do conhecimento ou na velocidade de acesso a ele.

A mudança de comportamento de Boris Johnson no Reino Unido e de Donald Trump nos Estados Unidos em relação as medidas de isolamento aconteceu em função de uma projeção feita à partir da comparação da evolução da Gripe Suína com a Covid-19. Essa modelagem projetou 250 mil mortes no Reino Unido e 1 milhão de mortes nos Estados Unidos. Mesmo que tivessem opiniões diferentes em relação a melhor forma de abordar o problema, ficou impossível para Johnson e Trump correr o risco de cometer um erro na avaliação do risco e em enfrentar as  consequências de um erro dessa magnitude. Vale dizer que modelagens e previsões radicais e emocionais geram mais problemas que solução.

Como vemos, o risco da Covid-19 para a sociedade e para a saúde das pessoas ainda não é claro e pode ser muito grande. Essa incerteza e o medo levam os países e sistemas de saúde a adotar de forma totalmente compreensível as medidas atuais, mas o ponto fundamental da discussão, quando mudamos a perspectiva para o lado econômico, é qual o impacto das perdas econômicas na mortalidade não só das empresas, mas das pessoas. Temos que avaliar a abordagem aparentemente oposta, que começa a discussão pelo lado econômico, usando o mesmo objetivo final, que são os desfechos clínicos em saúde, que é evitar a morte e o sofrimento das pessoas.

Criar uma polarização, imaginando que de um lado estão as pessoas e do outro lado o dinheiro, pode ser um erro grave na avaliação do problema trazido pela Covid-19. Uma situação de competição pode gerar grande ineficiência na capacidade de interpretar a evolução da situação e na capacidade de ajustar o sistema de saúde e o dia a dia das pessoas adequadamente.

Um conceito importe são os “Determinantes Sociais da Saúde”, que são aquelas variáveis, independentes dos cuidados em saúde, que vão ter um impacto muito significativo na mortalidade, na expectativa de vida e na qualidade de vida das pessoas. A Estabilidade Econômica é um desses Determinantes.

Sem a informação precisa sobre o impacto de uma recessão e de uma crise econômica na mortalidade, fica muito difícil comparar os desfechos clínicos decorrentes das diferentes abordagens, de escolhas como o confinamento, distanciamento e fechamento de comércios e outras atividades ligadas ao consumo e que impactam diretamente na saúde econômica de um país.

Os que mais sofrem em crises econômicas são as pessoas mais pobres, mas é um erro as pessoas com melhores condições financeiras imaginarem que estarão imunes às consequências de uma crise econômica grave. A crise econômica vai impactar muito a capacidade de ter acesso a cuidados adequados em saúde, mas esse não é o único problema. Por mais recursos financeiros que pessoas mais ricas possam ter, em algum momento vão ter dificuldade em encontrar itens básicos para o dia a dia, será cada vez mais difícil sair de casa, enfrentar saques e violência urbana e  ter acesso a um cuidado de saúde mais individualizado e de qualidade. A verdade é que não se consegue prever todos os desdobramentos e a magnitude de uma crise econômica severa. É impossível saber para onde isso vai nos levar no futuro e vale lembrar que nesse momento mudar para outro país não é uma opção possível.

Não me coloco aqui como alguém que defende um lado ou outro, na verdade é o oposto, não pode existir lado. O fundamental é analisar criticamente e de forma contínua a situação e as projeções, integrando continuadamente a nova informação na análise. A informação que chega a cada dia precisa ser complexa, detalhada e em tempo real. É necessário rever diariamente a realidade, os cenários, as projeções e as ações. Como comentado, projeções e posições radicais e emocionais só levam a mais confusão e problema.

Fundamental evitar posições pré concebidas que vão bloquear a capacidade de analisar de forma clara e ideal a informação, o momento e as prováveis consequências. Com base nessas análises contínuas e não emocionais, as políticas e ações serão revistas.

É crítico entender que mudanças contínuas nas decisões e ações não são um sinal de fraqueza, incapacidade ou de desorganização, mas sim a estratégia ideal em situações onde mudanças acontecem rapidamente e que são marcadas por grande risco, incerteza e desinformação.

Os modelos e projeções precisam levar em consideração o impacto de uma crise econômica nos níveis de saúde e mortalidade da população. É necessário que o desfecho clínico seja a métrica comum na avaliação de qualquer iniciativa tomada pelos países e pelos gestores. Precisamos avaliar o impacto de uma crise econômica usando uma métrica que leve em consideração número de mortes, e números que reflitam outros indicadores de saúde e bem estar. Como projeções em relação a esses números são muito difíceis e complexas, acabamos não trazendo essa métrica e esses indicadores para as análises e discussões com o peso e rigor necessários. Não levar em consideração de forma clara o lado negativo das escolhas leva invariavelmente a decisões que podem gerar mais mal do que bem para a sociedade.

Se não conseguirmos encontrar rapidamente um tratamento para a Covid-19, algo que talvez os tratamentos à base de cloroquina possam representar, a cada dia que passar essa situação de confinamento, isolamento e queda econômica vai levar a uma angústia, desconforto, ansiedade e problemas crescentes e imprevisíveis. É preciso acompanhar as mudanças de comportamento, valores, prioridades e escolhas que vão acontecer com a evolução da situação atual.

Informação em tempo real, sabedoria e capacidade de comunicar e executar vão ser as ferramentas mais importantes para que possamos enfrentar a Covid-19 e sairmos dela da forma menos sofrida possível.

 

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Coronavírus

Após ameaça de corte de salários, 8 professores indígenas morrem por covid-19 em RR

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Um áudio da Chefa da Divisão de Educação Escolar Indígena, Gleide de Almeida Ribeiro, enviado em abril em um grupo pelo Whatsapp, colocou em pânico professores indígenas da rede estadual de ensino de Roraima.

“Eu quero a confirmação dos centros regionais! Escolas que não estiverem funcionando, que não começou e nem vai começar [a dar aulas presenciais], nós vamos suspender o pagamento dos professores! Eu preciso urgentemente dessa informação. Já foi autorizada a suspensão do pagamento dos professores da Serra da Lua – exceto aquelas escolas que estão funcionando. Por isso eu preciso urgentemente saber quais são as escolas que estão funcionando na Serra da Lua, ou então todas as escolas da Serra da Lua vão ser suspensos o pagamento”, disse a Chefa da Divisão do governo de Antônio Denaruim (sem partido).

Por Martha Raquel, do Brasil de Fato

Após o envio do áudio, Silvana*, professora seletivada, teve alguns dias descontados de seu salário por se recusar a ir até a casa dos alunos para entregar atividades. Por medo de retaliação, ela preferiu não se identificar, e detalhes como etnia, região e escola de atuação serão mantidos em sigilo.

Diferente do restante do país que cumpre, em algum nível, o estudo à distância, os alunos indígenas de Roraima não conseguem ter uma estrutura de internet e de aparelhos eletrônicos para assistir às aulas. Além dos alunos, alguns professores também não sabem como usar o aparelho para dar aulas. Os professores reclamam que não houve qualquer tipo de instrução para que as aulas fossem dadas à distância.

A reportagem do Brasil de Fato tentou entrar em contato com Gleide de Almeida Ribeiro, Chefa da Divisão de Educação Escolar Indígena, e Leila Perussolo, Secretária de Educação e Desporto do Estado de Roraima, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.

Silvana conta que assim como ela, a maioria dos professores indígenas são seletivados, ou seja, podem ter seu salário cortado a qualquer momento. “Primeiro pediram que fôssemos até a casa dos alunos entregar as atividades e lá teríamos que aguardar que eles as fizessem e nos devolvessem. Quando nos recusamos disseram que teríamos que atendê-los na escola. Hoje atendemos salas inteiras de uma vez”. Ela explica que o governo de Antônio Denaruim não enviou máscaras, álcool em gel, luvas ou qualquer outro equipamento de segurança para as escolas. “Atendemos 6 ou 7 alunos de uma vez sem nenhuma proteção”, explicou.

Desesperada com a situação, outra professora que também não quis se identificar desabafou: “Nós não temos como ficar sem salário, ainda mais durante uma pandemia. O que estão fazendo com a gente é desumano. Como eu vou chegar pros meus filhos e falar ‘ou a mamãe sai pra trabalhar e corre o risco de morrer pra poder trazer comida pra casa ou a gente vai passar fome’? Não tem como eu fazer isso”.

A primeira morte de professora

Professora indígena da etnia Macuxi, Bernita Miguel, de 52 anos, foi a primeira vítima do coronavírus dentro das escolas indígenas de Roraima. Bernita ensinava a língua Macuxi na Escola Estadual Indígena Artur Pinto na comunidade Nova Esperança, na região de São Marcos, no município de Pacaraima.

Professora Macuxi Bernita Miguel, primeira professora vítima de coronavírus em Roraima / (Reprodução / Facebook)

Professora Macuxi Bernita Miguel, primeira professora vítima de coronavírus em Roraima / (Reprodução / Facebook)

Enock Taurepang, coordenador-geral do Conselho Indígena de Roraima (CIR), explica que o governo estadual não tem se importado com a saúde indígena. “Os professores indígenas estão entre a cruz e a espada. O governo joga essa proposta de 15 ou 20 dias de repasse de atividade pros alunos, mas aulas estão acontecendo e isso nos preocupa mesmo que seja de 15 em 15 dias”, explica. “Ainda tem profissionais indígenas que se reúnem dentro do ambiente escolar para fazer o planejamento e isso é uma preocupação muito grande”, completou.

O coordenador do CIR explica que não é possível prever quem está contaminado ou não. “Já temos 8 perdas de professores para essa doença e não queremos ter mais vidas levadas por essa doença. Esse método proposto para os professores expõe o professor, o aluno, o pai do aluno e consequentemente toda a comunidade. Nós temos a cultura de visitar nossos parentes, ir nas casas dos parentes de manhã ou no finalzinho da tarde pra conversar, pra repassar informação, pra combinar o trabalho do dia seguinte. E tudo isso propicia que o vírus se espalhe em toda a comunidade”.

coronavírus passa de cada pessoa contaminada para três a cinco pessoas. O que significa que, sem nenhuma medida de contenção, o número de casos tem potencial de dobrar, em média, a cada quatro dias. Em ambientes fechados o contágio é muito maior, sobretudo se se faz uso de ar condicionado, onde a troca de ar é aquém da ideal. O contágio é rápido uma vez que há uma faixa grande de pessoas que são pré-sintomáticas e durante essa fase seguem transmitindo mesmo antes de apresentar os sintomas.

“Nesse modelo de continuar com os atendimentos presenciais, todos ficam expostos. Não importa se é um, dois ou três minutos, não importa o tempo. Essa doença se espalha de uma maneira tão rápida… basta você ter um pequeno contato e aí lá se vai o vírus causar mais mortes. Esse modelo não é apropriado para nós, não é!”, explicou Enock.

Segundo o Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), há hoje 821 casos de indígenas confirmados com covid-19 e 47 óbitos em Roraima. No Brasil, o número passa para 14.793 infectados e 501 mortes, sendo 131 povos atingidos. Os estados com maior número de indígenas infectados pelo vírus são Amazonas, Para e Maranhão. Os principais povos atingidos pela doença foram Kokama (60 óbitos), Xavante (33 óbitos) e Guajajara (30 óbitos).

Rotina em sala de aula

Silvana explica que as aulas acontecem por horário determinado, exemplo: alunos do quinto ano das 09h às 10h; do sexto ano das 10h às 11h; e assim por diante. As salas de aula continuam iguais, sem afastamento de carteiras ou distanciamento social. Os estudantes formam uma fila e vão, um a um, tirar as dúvidas. Geralmente o professor fica sentado e o aluno em pé ao lado. Ela conta que nem todos os alunos têm máscara, e que poucas escolas disponibilizam álcool em gel. Ela, que tem apenas licenciatura para dar aulas para alunos do ensino fundamental, há alguns anos assumiu, a pedido do governo estadual de Roraima, matérias como sociologia, biologia e espanhol. Silvana tem, em média, 120 alunos.

Enock explica que, ainda que o governo tenha enviado alguns vidros de álcool, eles não são suficientes. “Não é uma realidade para o professor indígena pensar ‘ah, agora eu posso trabalhar e fazer as minhas atividades com o mínimo de segurança’, não é! Mandar dois ou três vidros de álcool em gel para uma escola que tem 40 ou 50 professores é inviável, é inadmissível”.

Outras formas de lidar com a situação

Para o CIR, há outras formas de manter o emprego dos professores durante a pandemia. “O professor poderia estar produzindo materiais pedagógicos específicos e diferenciados para as escolas indígenas nesse período de um ou dois meses. O professor ficaria liberado para fazer seu próprio material pedagógico e depois que tudo isso passasse, ficaria mais fácil de ele chegar com esse material, apresentar e aplicar para os seus alunos. Ele só iria aplicar o que ele já tinha criado nesse período que ele passou sem dar aula. Então, de uma forma ou outra, o professor não pararia suas atividades como profissional”, explicou Enock.

Para ele, o governo não está escutando as demandas e as sugestões dos professores. “Quando essa ordem vem de cima, o profissional indígena se sente na obrigação de executar aquilo que tá se pedindo mesmo que a sua vida esteja em risco. Se eu paro de executar minha atividade como professor por causa de uma pandemia, o governo aponta o dedo e diz que vai tirar o meu salário e eu tenho muita conta pra pagar. Tenho uma família pra alimentar, e se eu parar, consequentemente, eu vou perder tudo isso; e daí fico na obrigação de executar o que o governo tá pedindo mesmo colocando minha vida em risco”, explicou.

Professores vítimas do Covid-19

Assim como Bernita, outros sete professores faleceram por conta da doença. Elizabeth Ribeiro, da etnia Wapichana, tinha 37 anos e dava aulas na comunidade Canauanim, no município do Cantá. Já Fausto Silva Mandulão, de 58 anos, era professor há 41 anos. Liderança indígena, ele lecionava na Escola Estadual Indígena Professor Ednilson Lima Cavalcante, na comunidade Tabalascada, também em Cantá. Ambos faleceram no mesmo dia, 03 de junho, vítimas da doença.

Poucos dias depois o professor indígena da etnia Macuxi, Luciano Peres, de 68 anos, também faleceu vítima da doença. Formado em pedagogia e matemática, lecionou no Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol. Ele também atuou como gestor pedagógico na escola estadual Tuxaua Silvestre Messias e foi secretário na prefeitura de Pacaraima.

Alvino Andrade da Silva, da etnia Macuxi, também foi vítima da doença uma semana mais tarde. Nascido na Comunidade Indígena Boqueirão/Região do Tabaio, município de Alto Alegre, atuou como assessor técnico da Associação dos Povos Indígenas do Estado de Roraima (APIRR), entre 2005-2011. Dulcirene Freitas de Lima, 47 anos, da etnia Taurepang, da Comunidade Canauanin; Irinel Melquior, da etnia macuxi, da Comunidade Ticoça; e Maika Ferreira Melo, da etnia Macuxi, da Comunidade Sucuba, também morreram vítimas do vírus.

Como o vírus têm chegado às comunidades?

Segundo a APIB, em muitos casos o vírus tem chegado pelo próprio governo federal, como no caso da região do Alto Solimões e no Vale do Javari onde a covid-19 foi levada por pessoas da equipe da SESAI que estavam contaminadas. No Parque Tumucumaque (Pará e Amapá), o vírus chegou com o Exército. Em regiões do Sul e Centro-Oeste, o agronegócio tem sido um dos principais vetores da disseminação da doença entre povos indígenas. O garimpo ilegal e outras ações criminosas que invadem as terras indígenas têm levado a doença para territórios em Roraima e Pará. A exposição ao vírus na tentativa de acessar o auxílio emergencial do governo também tem sido uma das formas de chegada nas aldeias.

Todas as vidas indígenas importam

Segundo o CIR, há mais de mil professores seletivados no estado de Roraima. “Independente da quantidade, se existissem dois professores seletivados, a gente ia lutar pela vidas desses dois. Se existisse um professor concursado indígena, a gente ia lutar pela vida desse professor concursado indígena. Todas as vidas importam! São as pessoas que estão dando a vida e o sangue todos os dias dentro das escolas indígenas pra fazer a educação acontecer, pra fazer com que o aluno jovem ou a criança possa ter o entendimento maior do mundo em que a gente tá vivendo. Então essas pessoas importam e são muito preciosas pra comunidade”. Ele explica que tanto os professores mais jovens, quanto os professores mais velhos têm um grau de conhecimento imenso e que ambos são vidas essenciais nas comunidades.

Tratamentos tradicionais contra o vírus

Para o CIR o número de professores contaminados pode ser muito grande, levando em conta os que estão recebendo tratamento dentro das comunidades. Há contaminados que estão em isolamento e seguindo tratamento com medicamentos farmacêuticos e tradicionais.

Silvana voltou da comunidade em que dá aulas com sintomas de covid-19. Depois de 17 dias conseguiu realizar o exame, que deu negativo, e acredita que o vírus não foi encontrado em seu corpo porque tomou algumas garrafadas –  um medicamento tradicional – por muitos dias seguidos.

As garrafadas podem ser produzidas de diversas formas. Silvana se tratou com a Garrafada de Quina Quina (a casca da árvore com água) e com a Garrafada de Limão e Laranja (são batidos no liquidificador dois limões com casca e sem sementes e uma laranja com casca, se adiciona água e bebe-se 3 vezes ao dia).

A nossa bandeira é a vida!

“O CIR tem a obrigação, e a gente faz com gosto, de defender o direito do parente, defender o direito do profissional indígena, defender o direito do pai, da mãe, do filho, do neto, do indígena em geral. Quantas vezes forem necessárias, o CIR vai se manifestar e vai dizer não à morte, não ao genocídio do povo indígena! Não! Basta! A gente quer viver! A gente quer ver o parente feliz! A gente quer ver o parente com saúde! A gente quer ver o parente autônomo, de todas as formas! Essa é a nossa bandeira, a vida, o bem-viver das comunidades”, finalizou Enock.

*Nome fictício 

Edição: Mauro Ramos

 

Veja também: O racismo de Bolsonaro contra populações indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais

 

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Coronavírus

Novo normal: Brasil tem mais de mil mortes por dia e governantes festejam o tal “platô”

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Novo normal? Hospitais públicos estão no limite, com as UTIs superlotadas; cresce o número de doentes morrendo em casa

Por Ricardo Melo*

A pandemia do coronavírus está fora de controle em todo o planeta. Sintomático: o país considerado o mais desenvolvido do mundo, os Estados Unidos, meca do capital financeiro, é incapaz de deter as mortes que se acumulam aos milhares. Lidera o ranking da morbidez. Atrás dele, disputando o pódium do genocídio, está o Brasil de Jair Bolsonaro.

Tem se falado muito sobre o primado da ciência, bla, bla bla. É bom que se aposte na certeza científica contra as feitiçarias, charlatanices e vendedores de remédios contra piolhos como salvação da humanidade. Ou contra mercadores de cloroquina que só fazem encher os bolsos(naros) de um dinheiro extra.

Os fatos, porém, ultrapassam este debate. Vamos falar do Brasil. Um governador como João Dória comemora que São Paulo aparentemente atingiu um tal “platô”. “Temos y infectados, x mortes e a situação parece estar se estabilizando.”   

Ei, que negócio é este? Como assim? Tem gente morrendo. E não é madame que acha que morador de rua é folgado e gosta de viver ao relento. São na maioria trabalhadoras e trabalhadores abandonados à própria sorte e sem condições de se defender. Os números são inequívocos. Há um corte social evidente entre as vítimas. Aqui no Brasil, nos EUA e pelo mundo afora.

Há dinheiro de sobra rodando pelo mundo para debelar uma pandemia como esta. Ninguém de bom senso acredita que a colaboração entre cientistas de ponta de todo o mundo não poderia achar uma saída rápida para aplacar um vírus. Mas o que se vê é uma guerra entre laboratórios multinacionais gananciosos para ver quem vai chegar primeiro à pedra filosofal. 

Enquanto isso, além das vítimas do vírus, assiste-se ao sacrifício desumano de milhares de profissionais de saúde que tentam fazer o que o capitalismo predador não faz. Salvar vidas. Eles trabalham sem proteção, em sistemas públicos de saúde desmantelados e entregues ao olho gordo do dinheiro grosso.  As histórias de enfermeiros e médicos que morreram vítimas do vírus ou se mataram por não conseguir impedir a morte de pacientes recheiam as páginas dos principais jornais do mundo. 

 

Novo normal no Jornal Nacional

Por aqui, a tragédia também virou o novo normal. O Jornal Nacional, da Rede Globo, já trata o assunto como uma seção. Colocou um apresentador que parece ter saído de uma impressora 3D para falar sobre os números do dia. Como se estivesse falando das cotações da bolsa ou do dólar. Ou da previsão do tempo. “Amanhã vão morrer tantos, sobreviver outros. Agora é com você, Bonner”. A rede Globo sempre será a Globo, a mesma que “descobriu” que havia uma ditadura no Brasil com quase meio século de atraso.

E seguem os enterros. Literalmente.

Vamos falar claro: as medidas de relaxamento do isolamento social são criminosas. Isto mesmo, senhor Dória e outros governadores e prefeitos. Vejam o caso da Índia e de outros países. Enquanto não houver uma vacina ou uma solução intermediária, a exposição de cidadãos a céu aberto equivale a uma sentença de morte distribuída por amostragem.

Sobre Bolsonaro é inútil falar. Faz tempo, cerca de trinta anos, que ele tá pouco se lixando para o Brasil. Tá mais preocupado com Queiróz e dona Márcia (a propósito: para quem não sabe, a avó da mulher dele, Michelle Bolsonaro, foi recolhida no meio da rua com o coronavírus. Neste momento, luta contra a morte num hospital ).

Enfim, é um escândalo. Os culpados estão identificados. São as autoridades, aliadas do capital gordo, que menosprezam a vida dos que não têm como se proteger e pregam o libera geral. Dane-se o povo. Aquelas excelências estão resguardadas por grandes hospitais, planos de saúde e benesses de todo tipo. Trump, Bolsonaro e Dória estão sãos e salvos. 

Para a maioria, sobra o “platô” das covas.

 

*Ricardo Melo, jornalista, foi editor-executivo do Diário de S. Paulo, chefe de redação do Jornal da Tarde (quando ganhou o Prêmio Esso de criação gráfica) e editor da revista Brasil Investe do jornal Valor Econômico, além de repórter especial da Revista Exame e colunista do jornal Folha de S. Paulo. Na televisão, trabalhou como chefe de redação do SBT e como diretor-executivo do Jornal da Band (Rede Bandeirantes) e editor-chefe do Jornal da Globo (Rede Globo). Presidiu a EBC por indicação da presidenta Dilma Rousseff.

Leia mais Ricardo Melo em:

 

https://jornalistaslivres.org/quem-confia-em-milton-ribeiro-o-ministro-da-educacao-escolhido-por-bolsonaro/

 

Jair Bolsonaro é um assassino —agora de papel passado

 

 

ENEM: BOLSONARO QUER DESTRUIR OS SONHOS DA JUVENTUDE POBRE DO BRASIL

 

 

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#EleNão

Ato na Paulista, neste sábado (13/06), faz protesto “contra governo da morte”

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Neste sábado (13/6), a avenida Paulista será o espaço de mais uma manifestação pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro. O ato está sendo organizado por grupos sem vínculos partidários ou institucionais, que protestam contra o genocídio produzido pela irresponsabilidade do governo federal diante da pandemia do Covid-19 e contra a violência policial e estatal que vitima os brasileiros mais pobres e vulneráveis.

Bolsonaro, que já vinha pressionando prefeitos, governadores e empresários para um “retorno à normalidade”, antes mesmo do Brasil atingir o pico da pandemia e a contaminação estar controlada, estimulou, em live transmitida na úlltima quinta-feira (11/06), que a população invada os hospitais, filme os leitos e envie as imagens para a Polícia Federal e para a Abin, colocando em cheque os números apresentados pelas secretarias de saúde de estados e municípios. De acordo com nota divulgada pelo grupo que organiza o Ato, não resta outra alternativa que não seja ocupar as ruas e confrontar o governo com os resultados de sua própria política, “o Brasil não pode mais aguentar duas crises ao mesmo tempo: a pandemia e Bolsonaro. Uma se alimenta da outra. A única maneira de lutar contra a pandemia é derrubando este governo irresponsável. Não sairemos das ruas até que ele caia”.

Jair Bolsonaro também ameaçou, nesta quinta-feira (11), vetar a prorrogação do auxílio emergencial, caso o Congresso mantenha o valor de R$ 600. A proposta apresentada pelo governo é reduzir o valor pela metade, para mais dois meses de auxílio.

“A função primeira de um governo é proteger a população. Bolsonaro e seus seguidores zombam dos mortos e conspiram contra políticas que poderiam salvar vidas”.

 

 

 

Outra medida tomada por Bolsonaro esta semana, que vai de encontro às reclamações do Ato Contra o Governo da Morte, foi a exclusão da violência policial do relatório sobre violações de direitos humanos, uma tentativa clara de maquiar os números, assim como é a política oficial com o Coronavírus.

Serão distribuídas para os manifestantes, 500 fotos com vítimas da violência do Estado na ditadura e nos dias atuais, pela polícia e Covid-19. O uso de máscaras e a observação da distância de dois metros uns dos outros será obrigatório. Uma equipe irá garantir a distância e a segurança dos participantes.

O Grupo que organiza a ação é apartidário e espontâneo, composto por ativistas, artistas, advogados, professores, profissionais de saúde, estudantes, comunicadores. Cidadãs e cidadãos que não verão calados mais um genocídio do Estado brasileiro contra o seu povo.

Leia a íntegra do manifesto:

 

 

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