A Empresa Brasil de Comunicação (EBC) tem sido alvo de censura pelo governo de Jair Messias Bolsonaro. As palavras “Golpe” e “Ditadura” estão excluídas da matérias produzidas pelos jornalistas.
Em nota veiculada pelo sindicato Jornalistas e Radialistas do DF, RJ e SP, jornalistas denunciam que só é possível descrever o golpe que levou o Brasil para um ditadura de vinte e um anos quando “as matérias trazem declarações do presidente para negar o fato: ‘para Bolsonaro, não houve ditadura no Brasil’. A palavra “golpe” é ainda mais escondida. No lugar de ‘aniversário do golpe’, se usa ‘comemoração de 31 de março de 1964’.” denuncia a nota.
A censura afeta todos os formatos produzidos pela EBC, desde rádio, matérias televisivas e textos escritos. As palavras deixaram de ser usadas para descrever a ditadura após o presidente ter incitado os quartéis a comemorarem a data.
Na nota é colocado que a fonte da censura é incerta. Não há certeza se é uma ordem direta do planalto ou se uma busca por não provocar o presidente, por parte da diretoria.
É feita uma convocação para os profissionais da EBC irem “trabalhar de roupa preta na segunda-feira, dia 1 de abril”.
Leia a nota na integra abaixo:
NA TENTATIVA DE REESCREVER A HISTÓRIA, EBC CENSURA “DITADURA” E “GOLPE” EM REPORTAGENS
Com a proximidade do aniversário de 55 anos do golpe de 1964, que deu início a uma ditadura militar com 21 anos de duração, a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) vem impedindo o uso das palavras “golpe” e “ditadura” para classificar esse episódio da história brasileira. A censura ocorre nas reportagens de TV, rádio e agências.
A cobertura que evidenciou a proibição teve início quando o presidente da República, Jair Bolsonaro, afirmou que os quartéis deveriam comemorar a data. Houve repercussão na sociedade civil, no Congresso Nacional e em outros espaços de poder. O Ministério Público Federal recomendou que os comandos militares desistissem da celebração, e a Defensoria Pública da União entrou com uma ação para impedir os planos comemorativos, entre outros fatos com claro valor de noticiabilidade – e amplamente divulgados pela imprensa em geral.
Nas reportagens e títulos que tratam sobre o assunto, o termo “ditadura” está sendo sistematicamente substituído por “regime militar”, a não ser quando as matérias trazem declarações do presidente para negar o fato: “para Bolsonaro, não houve ditadura no Brasil”. A palavra “golpe” é ainda mais escondida. No lugar de “aniversário do golpe”, se usa “comemoração de 31 de março de 1964”.
Há relatos, ainda, da não veiculação de reportagens sobre a ação da DPU e da recomendação do MPF (uma estratégia é a substituição da matéria por uma “nota”, para fingir equilíbrio, quando se sabe o valor de cada formato dentro de um jornal), da retirada, redução ou desvalorização de relatos de vítimas da ditadura e até mesmo de dados já amplamente divulgados sobre o número de mortos e desaparecidos no período.
Não se sabe se a orientação veio do governo ou se os gestores da EBC se adiantaram a um possível desconforto governamental e implantaram a censura prévia que, mais do que tentar agradar os governantes utilizando para isso a comunicação pública, tentam reescrever e amenizar os fatos históricos.
Como trabalhadores da comunicação, temos compromisso com o Estado democrático de direito, com a narrativa honesta dos fatos e com a pluralidade de vozes da sociedade. É danoso ao Brasil que as reportagens da EBC, distribuídas gratuitamente para o país e o mundo, tentem esconder ou minimizar os crimes contra a humanidade praticados no período da ditadura militar.
Nos 21 anos que se seguiram ao golpe de 1964, milhares de pessoas foram exiladas, torturadas, estupradas, demitidas, perseguidas, presas e censuradas pelo Estado, entre outros prejuízos à dignidade humana e coletiva. Jornalistas, artistas, professores, advogados, políticos, operários, líderes populares, indígenas, crianças e até mesmo militares das Forças Armadas estão entre as vítimas, que sofreram por não concordarem com a ditadura. É nosso dever lembrar e contar o que aconteceu neste país.
Para que nunca mais se repita. Inclusive a censura.
OBS: Para protestar contra essa situação, conclamamos os colegas a virem trabalhar de roupa preta na segunda-feira, dia 1o de abril.