Os primeiros movimentos do novo governo eleito no domingo não nos dão a menor esperança de que isso possa dar certo.
Em entrevistas coletivas caóticas em volta da mansão de Jair Bolsonaro, que continua recolhido na Barra da Tijuca, dois porta-vozes se revezam para liberar a conta gotas, no varejão do dia, o que se poderia chamar de “programa de governo”.
Apresentado como superministro da Economia, que englobará Fazenda, Planejamento e Indústria e Comércio, Paulo Guedes, que o presidente eleito chama de “Posto Ipiranga” (ele tem respostas para tudo), anuncia como prioridade aprovar “pelo menos uma parte” da reforma previdenciária de Temer ainda este ano, para enfrentar o rombo fiscal..
Obscura figura do baixo clero, tal como era Bolsonaro até outro dia, Onyx Lorenzoni, deputado do DEM, indicado para a Casa Civil, já discorda, e chama de “porcaria” o projeto que está encalhado no Congresso.
É só uma amostra da bateção de cabeça dos novos donos do poder, um exército brancaleone em que se misturam três filhos parlamentares, um economista megalômano, um suplente de senador, membros das bancadas BBB (Bala, Bíblia e Boi), o desconhecimento da realidade e muitas vaidades, para ver quem tem mais força junto ao presidente eleito.
Entre as novidades até agora apresentadas para formar o elenco, entraram também o juiz Sérgio Moro, que condenou Lula, e o astronauta Marcos Pontes, cotado para ministro de Ciência e Tecnologia, um militar que se tornou garoto propaganda dele mesmo, depois de uma rápida viagem ao espaço.
Moro é esperado no Rio nesta quinta-feira para dar o sinal de positivo a Bolsonaro, que o quer no Ministério da Justiça. Faz todo sentido e não chega a ser uma surpresa.
Fora isso, é o de sempre: procissões de empresários, pastores e parlamentares, levando sugestões de nomes e demandas setoriais, figuras manjadas do velho establishment, tão criticado pelo presidente eleito na campanha.
Entre eles, muitos que estão sendo investigados pela Lava Jato e que agora poderão contar à mesa com a companhia do implacável juiz Moro.
Que o sistema político-partidário vigente desde o advento da Nova República, após o fim da ditadura, estava com o prazo de validade vencido, todo mundo já sabia.
Mas nada indica que a Era Bolsonaro vá mudar alguma coisa para melhor, muito ao contrário. Não corremos esse risco.
Na onda conservadora que varreu o país, elegeram-se vários cacarecos de diferentes tribos, agora ávidos para pegar uma boquinha no governo do capitão reformado, como pudemos ver na noite da vitória durante a reza puxada pelo senador-pastor Magno Malta, outra figura emblemática da nova ordem.
Pelo cheiro da brilhantina, há um clima retrô pairando no ar da Barra da Tijuca, bem a propósito o novo centro do poder, que faz lembrar a Casa da Dinda, de triste memória.
Se não conseguiram até agora nem organizar entrevistas coletivas, podemos imaginar o que nos espera quando eles forem todos para Brasília, com a missão de governar 208 milhões de brasileiros afundados na maior crise política e econômica da nossa história.
Nas mesmas redes sociais que levaram Bolsonaro ao poder, já surgem as primeiras críticas de apoiadores insatisfeitos com o que estão vendo no entorno do eleito.
Esperavam o quê?
Vida que segue.