Jornalistas Livres

Autor: Helio Carlos Mello

  • Remover entraves

    Remover entraves

     

    O mundo anda meio sem projetos.

     

    Ratos não fazem projetos, agem.

     

    Roem.

     

    Defecam pequenos pontos pretos,

     

    urinam onde comemos.

     

    Homens fazem projetos,

     

    defecam pontos,

     

    urinam também, como ratos.

     

    Rato é fato. Ratos cheiram-se. 

     

     

    .

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

    Por Rodrigo Baptista – do site Do Senado Federal

     

    Os senadores Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e Marcio Bittar (MDB-AC) apresentaram na semana passada um projeto que propõe acabar com a reserva legal, área do imóvel rural que não pode ser desmatada, mas pode ser explorada de forma sustentável. O PL 2.362/2019 revoga todo o capítulo que trata da reserva legal no Código Florestal (Lei 12.651, de 2012) e reacende o debate em torno de um dos pontos mais polêmicos do texto, que levou 13 anos para ser aprovado pelo Congresso.

    Na quarta-feira (17), Bittar e Bolsonaro se reuniram com o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, para tratar do assunto. Para os senadores, a reserva legal impede a expansão do agronegócio. O objetivo, dizem, é dar aos produtores rurais, sobretudo nos estados da Amazônia Legal, a oportunidade de expandir as atividades agropecuárias.

    A proposta não mexe nas áreas de preservação permanente, como encostas de morros e nascentes de água e, segundo os senadores, “vai remover entraves para a expansão da agropecuária, gerar empregos e contribuir para o crescimento do país”.

    Os senadores argumentam que hoje, o papel de uma certa “ecologia radical, fundamentalista e irracional é impedir nosso desenvolvimento e abrandar a concorrência” para permitir a expansão da agropecuária em outros grandes países produtores que tem padrões de preservação bastante inferiores aos nossos.

    Mas o presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA), senador Fabiano Contarato (Rede-ES) lembra que a atual legislação foi construída com a participação de toda a sociedade.

    — Nossas leis e políticas públicas na área ambiental são o resultado de décadas de esforços de sucessivos governos que, desde os anos 1960 até recentemente, vinham buscando criar as condições institucionais para assegurar a todos os brasileiros o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Essas leis e políticas foram construídas dialogando com o Congresso Nacional, empresários, cientistas, trabalhadores e ambientalistas e têm grande potencial de promover dois dos grandes objetivos que a sociedade brasileira almeja: desenvolvimento econômico e social e conservação do meio ambiente — afirmou.

    Em março, o senador Marcio Bittar (MDB-AC) já havia apresentado, sozinho, um projeto de lei que também tentava retirar da lei a obrigatoriedade de reserva legal em propriedades rurais. O PL 1.551/2019 foi distribuído para relatoria de Fabiano Contarato (Rede-ES) na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). Além da CCJ, o novo projeto, o PL 2.362/2019, também receberá decisão final da CMA.

    — Infelizmente o PL 1551/2019, de autoria do senador Márcio Bittar, ao qual fui designado relator na CCJ, foi retirado pelo autor e substituído pelo PL 2362/2019, de idêntico propósito e teor, assinado pelo senador Flávio Bolsonaro. Solicitei à presidente da CCJ, senadora Simone Tebet, que mantivesse a relatoria comigo, por se tratar da mesma matéria. Ainda aguardo resposta dela, mas estou seguro de que poderei continuar o trabalho de relatoria que já tinha iniciado. Darei oportunidade para que todos os interesses envolvidos no tema se manifestem e apresentarei o parecer que julgar o melhor para o Brasil — garantiu Contarato.

    Em consulta pública no Portal e-Cidadania do Senado, o PL 2.362/2019 teve até a tarde desta segunda-feira (22) 73 votos contra e dois a favor. Já o PL 1.551/2019 recebeu o apoio de 504 pessoas. Mais de 14 mil manifestaram-se contrariamente à proposta.

    Legislação

    Desde 1934, o Brasil conta uma legislação específica da vegetação, mas o conceito de reserva legal foi adotado no Código Florestal de 1965. De acordo com a legislação atual, resultado de ampla discussão no Senado e na Câmara, os imóveis rurais devem manter vegetação nativa com base em percentuais mínimos em relação a sua área, que variam de 20% a 80% conforme o tamanho do terreno, o tipo de cobertura vegetal e a região do Brasil.

    Atualmente, as propriedades rurais na Amazônia Legal têm reserva legal estabelecida em 80%; no Cerrado, 35%; e outras regiões esta porcentagem é de 20%.

    APPs

    O Código Florestal também prevê a existência de Áreas de Preservação Permanente (APP), áreas que devem permanecer intocadas e não podem ser exploradas economicamente de nenhuma forma.

  • Enfiando o pé na jaca

    Enfiando o pé na jaca

    Monstros marinhos.

     

    Agora entendo bem, tudo se encaixa. Primeiro foi a vontade de fundir o Ministério do Meio Ambiente, depois um ferro em brasa nas ONGs, ICMBio, Conama, Acordo de Paris, Fundo Amazônia,  Terras Indígenas, ESEC Tamoios,  Fundação Oswaldo Cruz; tudo numa mira de metralhadora.

     

    O eleito enfia o pé na jaca, faz o que prometeu em campanha.

     

    Correndo por fora, o cacique Raoni faz seu périplo, busca o apoio em países mais sóbrios, líderes mais lúcidos.

     

    A grande disparidade entre a atitude do chefe da nação, que desmantela, e o chefe indígena, que fortifica, salta aos olhos.

     

     

    Ropni Metuktire, conhecido mundialmente como cacique Raoni.

     

     

     

     

    A nação busca sua terra, corpo e espírito. Muitos trazem miopia de destino, horizonte, vontades.

     

    A lógica do sistema pede renda, produção, recompensa. Outras legiões querem moradia, escola, pesquisa, florestas cheias de macacos e abelhas. Há uma grande batalha entre livros e armas nas ruas, passeatas imensas, pernas e mais pernas a caminhar e pedir, querendo barrar o ralo que nos metemos.

     

     

    Tudo padece. Antigos quinhões se dispersam em nova ordem, milícias afoitas querem sua porcentagem e a parte que renegam ao povo.

     

    Entre presidente e cacique, sigo o homem mais sábio, a boca larga das palavras obvias. De fato, sabedoria pode ser que seja estar uma árvore, já dizia o poeta Manoel de Barros.

     

     

    Cabeceiras do Rio Xingu, na Terra Indígena do Xingu, contígua à Terra Kayapó, último legado intacto ao agronegócio, que desmatou o Estado de Mato Grosso.

     

     

     

     

  • Intolerância religiosa

    Intolerância religiosa

     

    Quando criança, lembro-me que lia nos livros e jornais impressos, sobre o mar e as matas. Vi mitos e seus donos, Iemanjá, rainha do mar, Mavutsinim catando seus troncos na mata, fazendo seus filhos.

     

    Tudo tão gratuito, nunca me pediram moeda para saber, amar e rezar.

     

    Templo, terreiro, altar, tudo em seus cantos e cânticos. Lá longe as margens do rio, as lavadeiras, a lavanderia.

    Idelza Digiere – óleo sobre tela

     

    Fé linda, limpa, livre que trazemos no peito.

     

    Meu Deus, por que  me abandonaste, é dúvida do profeta e frase do poeta, se sabias que eu não era Deus, se sabias que eu era fraco?

     

    Cinquenta e quatro anos de vida, e o mar e a mata tornaram-se sinônimos de pré-sal e agronegócio, sem encanto ou respeito pelos donos sagrados dos cantos e curvas, ondas e brisas no segredo de cada coisa. Tudo virou um mercado, investimento, domínio.

    “Ninguém é maluco de peitar, foram 15 barracões, 15 babalorixás de nome, de respeito, que não vão poder mais ser cidadãos”

    https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2019/05/27/traficantes-dao-ordem-para-fechar-terreiros-na-baixada-fluminense.ghtml?fbclid=IwAR3vF83P2lMFTRGTTyUK0D9nIOBUr9scHWY973v-7Ig1YodsBOr0aP78zsI

     

    Liguei cedo a TV, vi escancarado que proíbem terreiros, mandam fechar as portas daquilo que não está no jogo, atacam, dizem ser ordem do tráfico.

     

    Nota no livro de Vagner Gonçalves da Silva, antropólogo – Intolerância religiosa: impactos do neopentecostalismo no campo religioso afro-brasileiro. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo.

     

    Terá no Brasil até a fé virado assunto de milícias, transcendendo podres poderes, extorquindo nossa reza dos matos e águas?

     

    Meu povo grita, mareja os olhos, fecha a alma. Há desencanto, medo, escândalo. Fechar terreiros é como incendiar aldeias.

     

    É pau, é pedra, é água.

     

    Um fuzil ameaça os santos.

     

     

  • Livros do desassossego

    Livros do desassossego

     

    Há três anos, na Avenida Paulista, caminhava num domingo, 3 de julho de 2016, às 13h47.

    Dava-se um tumulto entre vontades e intenções, outros quereres. Um honesto professor, ciclista, bradava em protesto pela vida que via ameaçada, e ao açoite recebia o achaque dos que creem que nem toda vida vale a pena, gente que aprecia ditadura.

     

    Eu, no espanto, cliquei a lógica da cena paradoxal.

     

    Três anos decorreram, quase nada difere ou destoa em domingos assim, fatos conduzem ao mesmo ponto. Uns querem livros, ciência, outros armas, limites, cunha.

     

    Nessa ampulheta em que vivemos, recordo-me, também, de Chico Buarque todo borrado de tinta, com o chapéu e o sorriso aberto, no mesmo local manchado, atacado pelos que não gostam de pensamento.

     

     

     

     

     

    No mesmo período, as máculas a Chico foram substituídas pelo Prêmio Camões, o mais importante da literatura a acolher um autor de língua portuguesa pelo conjunto da sua obra.

     

    A avenida Paulista continua em  desassossegos, desaforos, desabafos. A educação rompeu o medo no asfalto, milhares pediram respeito ao presidente inculto. Jovens de preto, vermelho, branco.

     

     

     

     

     

     

     

     

    Avenida roda viva, não cala, não cede.

     

    imagens por Helio Carlo Mello© – Jornalistas Livres

     

     

     

     

     

     

  • Minas não é acidente

    Minas não é acidente

     

     

    O drama da Vila Socorro, na cidade de Barão de Cocais, aos pés do caminho da lama que ameaça, é o drama de todo brasileiro comum; poderemos todos sucumbir quando a terra tremer.

    Minas lembra um país corroído por ratos.

    Vivi alguns anos nas montanhas de Minas, tive meu filho nos altos picos, ar fresco, água boa, pedra dura.

     

    De repente, a boniteza das Geraes virou sinônimo de acidente, de descaso, catástrofe, sujeira. Tantas lavras, há séculos, e seu povo continua simples, pobre, em volta da cata ao ouro, ferro, pedras. Aqueles que são removidos e alertados sobre o caminho que a lama fará, pouco ou nada possuem. As cachoeiras que trazem na alma, as galinhas do terreiro, a horta e os pés de flores ao lado da casa, nada disso caberá na mala da fuga, na real balbúrdia que tornou-se viver entre montanhas.

    Quem ganhou com isso, pergunto, valeu a pena?

     

    Ainda discutimos nossas minas, enquanto o mundo fala de genes e naves. 

     

     

    E além das cidades, dessa gente toda que habita os cantos, as curvas dos morros, há também os rios, que vão avermelhando-se com o ferro das montanhas. Além de Minas Gerais, tantos Estados guardam seus segredos escondidos por aí, perigos contidos, sorrateiros, calados.

     

     

    O planeta azul, suas águas claras, tudo vai tingindo-se de rubro na conquista dos homens. Fica aquela vergonha na cara da gente, um acanhamento, diante da insanidade dos que guiam a história e seus negócios. E a mineração mal começou a caminhar no Brasil, há tantos planos, desejos, projetos.

     

    Minas Gerais nos joga na cara os erros nossos de cada dia, e mesmo assim insistimos abrir, usar, vender. Criamos problemas pensando em riqueza. Um dia seremos uma tela no computador, cheia de espaços vazios pontuados com um triângulo vermelho onde fora rio, montanha, mina ou nascente.

     

     

  • Tchau tartaruga

    Tchau tartaruga

    Digitei tartaruga na busca do computador, deu só tristeza, maldade:

     

     

    Comi tartaruga junto aos índios Javaé, no Araguaia, também junto aos Kawaiwete, no Xingu. Entre fogo nas pedras, assa-se o bicho em seu próprio casco, convertido em panela. Boa carne, bom alimento para o homem e seu clã na aldeia.

     

    São tantas tartarugas na terra, nos rios, no mar, que nos amedronta saber que as tartarugas encontram seu fim é no plástico que comem. Não basta ser jabuti, tracajá, verde, de pente, trombetas, de couro, cabeçuda. É em nosso lixo que morrem as tartarugas.

     

    E querem mais lixo os homens e seus mascates, mercadores do meio ambiente.

    Tudo confirma notícias aflitas, mas muitos ainda não desistiram, querem paz entre os bichos da Terra, não importa se é pulga, tartaruga, elefante ou macaco no galho.

     

    Que vivam, homem ou árvore, dizem os líderes cientes do planeta que pulsa sob nossos pés. Outros, que criam universos paralelos, querem o prelo das notas e seus dividendos, a riqueza de alguns e a miséria dos seres num ambiente que mingua, grita, exclui milhões de espécies na máquina de mercadorias do mundo.

     

     

    É hora de escolher para onde vamos, decidir se queremos tartarugas em nosso mundo, o que deixar viver ou excluir.

     

     

     

    Restos de esqueleto de tartaruga encontrados em praia deserta de Paraty, RJ.

     

     

    É triste, mas é fato, 40 milhões de anos em evolução terminam assim, no lixo.