Agricultura Familiar
“A exploração de animais não-humanos é uma parte essencial na expansão e no sustento do colonialismo”
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7 anos atrásem

Conheça a editora do blog Papacapim, Sandra Guimarães, que escreve sobre a culinária vegetal. Para ela os valores do Veganismo são os mesmos pelos quais os militantes da esquerda lutam: justiça, solidariedade e igualdade. E é impossível separar a exploração de animais não-humanos dos interesses essenciais do colonialismo e do capitalismo.
No próximo dia 16/08, às 10h o Jornalistas Livres estarão com Sandra, que hoje mora na Palestina, para um bate-papo ao vivo. Fique de olho das nossas redes para saber mais.
Abaixo, uma entrevista publicada pelo SUl 21 em abril deste ano:
‘Todas as opressões estão conectadas. Veganismo é uma extensão lógica da luta anti-opressão’
Marco Weissheimer
Existe uma hierarquia da opressão? Deve existir uma hierarquia entre as diferentes lutas contra diferentes formas de opressão? Essas questões entraram na vida de Sandra Guimarães desde cedo. Nascida em uma família vinda do Sertão nordestino, ela nasceu e cresceu em Natal, Rio Grande do Norte. O seu pai entrou no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) quando ela tinha 12 anos de idade e a reforma agrária passou a fazer parte de seu cotidiano. Estudar no exterior era o seu maior sonho e, desde os 14 anos, passou a economizar dinheiro para realizá-lo. Aos 20 anos, foi estudar em Paris onde morou por seis anos, formando-se em Linguística. Em 2007, decidiu fazer um trabalho voluntário de duas semanas na Palestina. Acabou ficando cinco anos lá trabalhando como voluntária no campo de refugiados de Aida, em Belém. Ao longo dessa trajetória, Sandra tornou-se chef vegana, escritora, ativista e guia política na Palestina.
Editora do blog Papacapim, Sandra Guimarães vem levando, desde 2014, grupos de brasileiros para tours político-ativista-veganos na Palestina. Para ela, o veganismo não é uma escolha alimentar, mas sim política. “Embora a opressão tenha várias faces”, assinala, “cada uma com as suas particularidades, todas elas tem uma coisa em comum: a exploração, discriminação e violência contra o ser mais vulnerável pelo ser que tem mais poder”. Em entrevista concedida por e-mail ao Sul21, Sandra Guimarães fala sobre essas escolhas, suas raízes e implicações políticas, e sobre o trabalho que vem realizando na Palestina. Os valores principais do veganismo, defende, são os mesmos pelos quais a esquerda luta: justiça, solidariedade e igualdade. “Se dizer vegana e de direita me parece uma contradição”, afirma
Sul21: Como se deu para ti essa confluência entre uma escolha alimentar e uma escolha política e de modo de vida?
Sandra Guimarães: Primeiro de tudo acho importante esclarecer que o veganismo não é uma escolha alimentar. Na verdade o regime da vegana é “vegetariano”, ou seja, somente alimentos de origem vegetal (quem não se alimenta do corpo de animais não-humanos, mas consume seus derivados segue o regime “ovo-lacto-vegetariano”). Então a pessoa vegana tem um regime vegetariano, mas também boicota a exploração e a violência contra animais em todos os aspectos da vida. Logo, o veganismo vai muito além do prato.
Tendo esclarecido o primeiro ponto, passemos ao segundo. Tem essa ideia de que a pessoa vegana optou por seguir uma ideologia, o veganismo, enquanto a pessoa que come animais e seus derivados, não. A verdade é que quando eu escolho comer plantas e você escolhe comer animais, nós duas estamos seguindo uma ideologia, mas a segunda é invisível porque é a ideologia dominante. Essa ideologia se chama “carnismo” e nos ensina, desde que nascemos, que comer animais e seus derivados é normal, natural e necessário (os três N do carnismo, descritos por Melanie Joy). Mas não todos os animais! Em algumas partes do mundo cachorros e insetos são considerados alimento, enquanto no Brasil são considerados, respectivamente, como companheiros ou praga. O carnismo traça essa linha arbitrária que vai decidir quais animais são comida e quais não são. A pessoa onívora gosta de acreditar que “come de tudo”, mas esse “tudo” representa simplesmente o que a sociedade onde ela vive decidiu que era comida.

Quando o veganismo entrou na minha vida eu já questionava muita coisa e estava envolvida em algumas formas de ativismo. Eu nasci em uma família economicamente desfavorecida, vinda do Sertão nordestino. Meu pai entrou pro MST quando eu tinha uns 12 anos e reforma agrária passou a fazer parte dos assuntos que discutíamos em casa. Meus pais tinham sido agricultores sem-terra boa parte da vida, assim como meus avós paternos e maternos. Embora minha família não fosse politizada, eu cresci com essa consciência de classe, esse entendimento da injustiça no campo e de que as pessoas mais vulneráveis eram exploradas e discriminadas. E além de ser mulher, sou lésbica e comecei a sentir essa discriminação dupla, causada pelo machismo e pela lesbofobia, muito jovem. Eu só me tornei ativista aos vinte e poucos anos, mas cresci vendo injustiça ao meu redor, sendo vítima de muitas delas e a vontade de mudar isso sempre esteve presente.
O veganismo veio então como a ferramenta que faltava pra eu entender que embora a opressão tenha várias faces, cada uma com as suas particularidades, todas elas tem uma coisa em comum: a exploração, discriminação e violência do ser mais vulnerável pelo ser que tem mais poder. Então essa confluência de causas que você falou vem daí. Do entendimento que todas as opressões estão conectadas. Do entendimento que justiça é algo indivisível. Se a justiça é dada a um grupo enquanto o outro é privado dela, isso é uma situação de injustiça.
Sul21: O que significa exatamente dizer que não é possível, coerentemente, ser um vegano de direita e/ou capitalista e/ou colonialista?
Sandra Guimarães: A maneira mais frequente de descrever o veganismo é “um modo de vida que busca excluir na medida do possível e praticável toda e qualquer exploração e crueldade contra animais pra alimentação, vestuário e qualquer outro propósito”. O inglês Donald Watson, que criou a palavra “vegan” e fundou a primeira sociedade vegana, em 1944, é o autor dessa definição. Não é a minha maneira preferida de descrever o veganismo porque ela pode levar à uma interpretação focada exclusivamente no consumo individual. Eu prefiro outra definição, a que entende o veganismo como uma postura política que rejeita a objetificação e mercantilização de animais e se compromete com a luta por abolição da exploração animal. Embora o objetivo do veganismo seja a libertação de animais não-humanos, eu vejo esse movimento como uma extensão lógica da luta anti-opressão de um modo geral.

Os valores principais do veganismo e da esquerda, como corrente política, são os mesmos: justiça, solidariedade e igualdade. Já o carnismo, a ideologia contrária ao veganismo, representa a ordem, onde os mais fortes, nesse caso os humanos, exploram os mais fracos, os não-humanos. Se dizer vegana e de direita me parece uma contradição porque não vejo como você pode defender a ordem, que é um dos valores principais da direita política, e ao mesmo tempo lutar por justiça e igualdade, valores que são impedidos de serem realizados enquanto essa ordem, que é necessariamente injusta, existir. Não estou afirmando que todas as pessoas que consomem animais são necessariamente de direita, mas se você é de esquerda, está engajada na luta por justiça e igualdade, mas ignora a conexão entre a opressão humana e animal, então sua análise está incompleta.
A exploração de animais não-humanos foi e ainda é uma parte essencial na expansão e no sustento do colonialismo.
Por isso também não vejo como seria possível defender o capitalismo e o colonialismo e se manter coerente com a ética vegana. A exploração de animais não-humanos foi e ainda é uma parte essencial na expansão e no sustento do colonialismo. Animais foram uma das primeiras formas de acumulação de capital e na fase mais moderna do capitalismo a exploração animal atingiu dimensões gigantescas e vimos o nascimento de fazendas de criação intensiva, onde animais são confinados aos milhares, abatedouros-fábricas com linhas de produção e capacidade de matar um número absurdo de animais por hora. Por isso é uma contradição se dizer vegana, ou seja, se posicionar como alguém que luta contra a exploração animal, e ao mesmo tempo defender o capitalismo e o colonialismo, sistemas que apoiam e se beneficiam imensamente da exploração animal. Algumas pessoas argumentam que seria possível ver nascer um capitalismo mais “compassivo” e sem exploração animal, talvez até sem racismo e sem a opressão das mulheres, mas isso é uma abstração que ignora que o capitalismo existente é fruto desses processos históricos reais.
Mas olha, não sou a porta-voz do movimento vegano e as opiniões que expresso aqui são só minhas. Como já falei, vejo o veganismo como parte essencial de uma luta anti-opressão mais abrangente, mas muitas pessoas vivem o seu veganismo de acordo com uma interpretação bem diferente. O veganismo que mais cresce é um veganismo que se distanciou do movimento radical inserido na luta por justiça social que ele foi durante a maior parte da História e passou a se interessar mais pelo indivíduo vegano. É um veganismo que não só é desconectado de outras lutas, mas cuja razão da sua popularidade é exatamente se definir como apolítico. O veganismo passa a ser vivido como uma prática individualista e consumista, motivada por ideais de compaixão, saúde e sustentabilidade, certo, mas que não deixa de ser uma prática consumista cujo potencial revolucionário foi suprimido. Essa despolitização do veganismo acabou deixando o espaço livre pra cooptação do movimento pelo capitalismo, tratando-o como um nicho de mercado, enquanto continua lucrando com a exploração e assassinato de mais de 70 bilhões de animais terrestres por ano, além de destruir a Terra e perpetuar violências contra humanos.
Mas a comunidade vegana é diversa e muitas de nós seguem essa linha revolucionária e entendem o veganismo como um movimento radical, anti-capitalista e anti-colonialista, que luta pela abolição animal, mas que também se posiciona do lado de todas as pessoas oprimidas no mundo.
Sul21: Em que medida, na sua opinião, a esquerda (considerando aqui uma visão de esquerda em geral, de pessoas que se reivindicam de esquerda, não necessariamente integrantes de partidos) vem tratando temas como o dos direito animais e a dimensão política da alimentação?
Sandra Guimarães: Me parece que a dissonância cognitiva da esquerda em geral com relação ao veganismo é bem grande. Pessoas de esquerda vão lutar contra o agronegócio, contra a violência no campo, contra o desmatamento das florestas, contra o extermínio das populações indígenas, contra o latifúndio, contra as desigualdades sociais e, ao mesmo tempo, falham em ver a conexão que aquele bife ou pedaço de queijo que ela come todos os dias tem com isso tudo. Sinto que essas pessoas veem a luta pela abolição da exploração animal como algo sem sentido ou até ofensivo diante de tanta opressão humana.
Como disse Angela Davis “a falta de engajamento crítico com a comida que comemos demonstra a que ponto a mercantilização se tornou a principal maneira pela qual percebemos o mundo.”
Mas não dá pra falar de direitos das populações indígenas e ignorar que a pecuária é responsável por 91% do desmatamento no Brasil, seja pra criar pastos ou cultivar soja pra alimentar animais destinados ao consumo humano. Não dá pra falar de soberania alimentar e ignorar que a pecuária ocupa 75% das terras aráveis do mundo, seja pra pasto ou pra produção de ração, mas produz apenas 12% das calorias consumidas globalmente. Que quase 80% da soja processada no Brasil vira ração e quase metade da soja não processada é exportada pra alimentar os animais criados pra consumo no exterior. Não dá pra falar de aquecimento global e ignorar que a pecuária sozinha é responsável por 14% da produção de gases de efeito estufa, mais do que todo o setor de transporte reunido. Falar da exploração da classe trabalhadora e ignorar que o trabalho nos frigoríficos é um dos mais insalubres que existe, com exposição a gases tóxicos, manuseio de instrumentos cortantes, repetição de gestos que levam a doenças crônicas, estresse e acidentes causados pela pressão pra produzir sempre mais e mais rápido. É um trabalho tão ruim e perigoso que só quem não tem nenhuma outra opção aceita fazê-lo, o que muitas vezes significa populações vulneráveis como imigrantes e refugiados sem documentação.
Eu fico muito decepcionada em ver o pessoal da esquerda ter uma atitude tão incoerente quando o assunto é veganismo. Vão denunciar o latifúndio, mas quando a vegana entra na conversa passam a defender a pecuária. A análise crítica para antes de chegar no conteúdo do prato. Como disse Angela Davis “a falta de engajamento crítico com a comida que comemos demonstra a que ponto a mercantilização se tornou a principal maneira pela qual percebemos o mundo.” É difícil entender como pessoas na esquerda podem falar longamente sobre o valor de troca do objeto real, mas não conseguem usar a mesma lente pra analisar o bacon ali no prato, pra enxergar o que está por trás daquele peito de frango, as relações que esses objetos incorporam e as implicações da sua produção.

Talvez algumas pessoas na esquerda associem o movimento vegano a uma escolha consumista e inacessível pra classe economicamente desfavorecida. Reconheço que nós, veganas, somos em boa parte responsáveis por isso. A mídia social ajudou a divulgar o veganismo, como aconteceu com muitos movimentos progressistas, mas ao mesmo tempo basta dar uma olhada no Instagram de veganas populares pra ver que o veganismo exibido ali é despolitizado, elitista e na maior parte do tempo consumista. Isso acaba alienando muita gente. Aquela história de que se não for acessível aos mais pobres, não é revolucionário. A verdade é que comida vegana pode ser a mais barata de todas, encontrada nas feiras (não em lojas de produtos especializados). É macaxeira, é tapioca, é feijão com arroz. Como diz um amigo meu: “Comida vegana é a comida do proletariado.”
E os produtos frutos da exploração animal são artificialmente baratos. Um relatório feito pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável e pela Agência Alemã para a Cooperação Internacional mostrou que pra cada R$1 milhão de receita gerado pela pecuária, R$ 22 milhões se perdem em capital natural e outros danos ambientais. E o prejuízo ambiental não para por aí. As operações de abate e processamento de animais custam 371% a mais, em danos ambientais do que a receita que geram. Já imaginou quanto custariam os pedaços de animais vendidos em açougues se refletissem com o custo real de produção? Não precisamos imaginar porque já tem vários grupos pagando caro pela carne que você compra barata: biomas desaparecendo, populações indígenas perdendo suas terras e sofrendo uma verdadeira limpeza étnica, ativistas que militam contra os crimes do agronegócio sendo assassinadas… Aí a esquerda vai por um lado defender a floresta, defender as populações indígenas e por outro lado patrocinar, ao comer carne, os crimes que denuncia. Percebe a incoerência?

Sul21: Como nasceu essa ideia do tour político-vegano na Palestina e qual o objetivo desta iniciativa?
Sandra Guimarães: Eu fui pra a Palestina, pela primeira vez, em 2007, pra um trabalho de voluntariado de duas semanas. Eu estava morando em Paris, onde estudei durante seis anos. Fui a Palestina pra ficar duas semanas e acabei ficando cinco anos. Depois de viver cinco anos na Palestina, sempre trabalhando como voluntária no campo de refugiados de Aida, em Belém, eu me senti na responsabilidade de compartilhar o que eu tinha aprendido com a minha comunidade, no caso as pessoas do Brasil. Há grupos de brasileiros que vêm para a Terra Santa, mas só visitam Israel. Nos cinco anos em que vivi na Palestina, cruzei com muitos ativistas da Europa, dos Estados Unidos e do Canadá, mas não encontrei quase ninguém do Brasil. Então, senti essa responsabilidade de compartilhar a causa palestina e o que estava acontecendo lá com as pessoas do Brasil.
Em 2013, fui morar na Bélgica, em Bruxelas, e um ano depois decidi fazer o primeiro tour na Palestina, sempre com esse objetivo de compartilhar a Palestina que eu conheci com pessoas do Brasil. É um tour político, ativista e vegano. A ideia, desde o início, era mostrar toda a opressão da qual o povo palestino é vítima. Não fazia sentido pra mim, como ativista pela abolição da exploração animal, falar da opressão humana durante o dia e, à noite, sentar em um restaurante e ver as pessoas comendo um animal, reproduzindo uma opressão contra os animais não humanos. Pra mim, só fazia sentido se fosse desse jeito, com uma maneira interseccional de ver as lutas e as opressões. Era uma extensão lógica da minha visão política e da minha ética.
Nem todas as pessoas que participaram do tour eram veganas, mas a condição era de que, naquelas duas semanas, elas se alimentassem só com alimentos de origem vegetal. As pessoas vieram de várias cidades do Brasil – às vezes, brasileiros morando na Europa -, sendo responsáveis por suas passagens de avião. O tour só começa quando todos se encontram em Jerusalém em um dia e hora determinados. O primeiro durou duas semanas, mas os últimos foram de onze dias. De Jerusalém, nos deslocamos pra Belém, que é a base do tour. O grupo fica hospedado na casa de uma família do campo de refugiados de Aida, com quem eu trabalhei em um projeto de empoderamento de mulheres palestinas que têm filhos com deficiência ou que estão sozinhas cuidando da família (Noor Women’s Empowerment Group). É um projeto pra criar uma fonte de renda para essas mulheres. Uma das atividades pra criar essa renda é fazer hospedagem na casa das poucas famílias que têm um quarto livre.
O primeiro objetivo de tour é educar as pessoas e mostrar o que é a realidade do povo palestino pra que entendam o que significa as palavras ocupação e colonização
Desde o início quis que os participantes do tour ficassem hospedados na casa de uma família palestina em um campo de refugiados, pra que pudessem ter a experiência do que é viver em um campo de refugiados e que o dinheiro, ao invés de ir para um hotel, fosse pra família. Então, as pessoas ficam hospedadas na casa de uma família no campo de refugiados de Aida e a cada dia visitamos uma cidade diferente. Pra mim era muito importante também que o grupo de brasileiros que participasse do tour ouvisse a história e a narrativa sobre a situação na Palestina diretamente da boca das palestinas. Não fazia sentido que escutassem isso da boca de uma brasileira. Em cada cidade que a gente vai, eu contrato uma pessoa de lá que faz trabalho de guia político. No primeiro dia, a gente faz um tour pelo distrito de Belém. Depois, vamos a Hebron, onde há uma pessoa nos esperando. Em Jerusalém, fazemos o tour político com uma organização de lá e assim por diante.
Então, o primeiro objetivo de tour é educar as pessoas e mostrar o que é a realidade do povo palestino pra que entendam o que significa as palavras ocupação e colonização. Por mais que a gente leia mídias alternativas, o que ficamos sabendo é apenas uma fração do que vai se descobrir conhecendo diretamente essa realidade. Esse é o objetivo número um do tour. O segundo objetivo é mostrar solidariedade ao povo palestino, conhecer as iniciativas neste sentido, participar de ações, apoiar a economia local que está sendo muito estrangulada por conta da ocupação. Até o começo da segunda intifada, havia muitos turistas. Hoje é quase nada.

Sandra Guimarães participará de conferência internacional na Palestina. (Divulgação)
O último objetivo é encorajar as pessoas a terem um ativismo de solidariedade á luta palestina quando elas voltam para o Brasil, seja da maneira mais simples, mostrando fotos da viagem e contando o que viram e ouviram, ou indo mais longe e organizando alguma atividade de solidariedade com o povo palestino. Desde 2014, foram sete tours, o último agora em 2018. Considero que meus objetivos foram atingidos, principalmente no que diz respeito ao envolvimento das pessoas quando elas voltam para o Brasil. Teve gente fazendo conferências sobre a Palestina em universidades, outros promovendo festival de filmes palestinos e festival de culinária palestina. Duas meninas que participaram do tour e estão atualmente em Portugal estudando (uma em Coimbra e outra em Lisboa), organizaram a semana do apartheid israelense. Muitas das pessoas que participaram dos tours não eram envolvidas com nenhum tipo de ativismo. Outras eram ativistas só no campo dos direitos dos animais e hoje são ativistas também dos direitos humanos. Isso me enche de orgulho.
Acho que, como ativista estrangeira na Palestina, sou muito mais útil fazendo isso, trazendo pessoas do Brasil, mostrando a realidade da ocupação pra que elas possam ajudar a sensibilizar um público mais amplo, do que fiz durante os cinco anos que trabalhei como voluntária. Também era um trabalho incrível, mas acho que qualquer estrangeira poderia ter feito isso. Sinto que a minha responsabilidade maior é dentro da minha comunidade.
Sul21: Você se considera uma ativista dos direitos humanos e dos direitos animais. Como esses dois planos se articulam, na tua opinião?
Sandra Guimarães: Pra mim, essa é luta só, uma luta contra a opressão. Atualmente sou voluntária de uma organização chamada Palestinian Animal League (PAL/Liga Palestina dos Animais), que é a primeira organização palestina a tratar dos direitos animais. É uma organização interseccional. O foco não é somente o animal não humano. As pessoas que participam da PAL também atuam na defesa dos direitos humanos e dos direitos da terra. Eu me encontrei muito com essa organização, pois ela representa a maneira como vejo essas conexões. A PAL vai promover, de 3 a 6 de maio, a primeira conferência internacional na Palestina sobre direitos animais, intitulada “Defendendo a Palestina –Libertação humana, animal e da terra”. Eu vou dar uma palestra nesta conferência, onde várias pessoas, algumas estrangeiras, mas a maioria da Palestina, falarão sobre essa conexão entre libertação humana, libertação animal e libertação da terra e sobre como não pode existir uma coisa sem a outra. O mecanismo que oprime esses diferentes grupos é o mesmo.

Alguém pode objetar: como assim, pensar em direito dos animais em um contexto onde os direitos humanos são violados todos os dias, como ocorre na Palestina? Acho muito interessante a resposta de Ahmad Safi, um dos fundadores da PAL, pra essa pergunta. Ele diz: eu não posso ficar sentado em casa esperando o fim da ocupação israelense pra começar a lutar pela sociedade em que quero viver. Isso tem a ver com a hierarquia da opressão. A militância da esquerda, de um modo geral, trabalha com essa hierarquia. Segundo ela, primeiro a gente liberta os humanos, depois os animais e depois a terra. Até dentro da libertação dos humanos essa hierarquia aparece. Já ouvi muitas pessoas dizendo na Palestina: primeiro vamos acabar com a ocupação israelense, aí a gente vai lutar pelos direitos das mulheres depois a gente luta pelos direitos da população LGBT. O problema é que, quando você estabelece essa hierarquia e luta pela libertação de um grupo específico, passa a reproduzir a opressão contra os outros grupos que não estão ali contemplados. Esse é o sentido da resposta de Ahmad: eu luto pela sociedade em que quero viver, com direitos pra todas as pessoas, pros animais e com respeito à terra.
A minha conferência será sobre o “vegan-washing” israelense, uma estratégia de usar o veganismo como uma cortina ou um mecanismo pra “lavar”, de alguma maneira, os crimes cometidos por Israel. Eles promovem Tel Aviv como a capital vegana do mundo e o exército israelense como o mais vegano do mundo, onde os soldados que se declaram veganos têm direitos a botas de couro sintético, boinas de lã sintética e a refeições veganas. Não é questionado o fato de que esses mesmos soldados vão cometer crimes contra humanos. Essa é uma arma de propaganda bastante usada por Israel. O governo está pagando viagens para blogueiras veganas do mundo inteiro irem pra Israel e descobrirem a capital vegana do mundo, distraindo a atenção em relação à ocupação e colonização que está acontecendo na Palestina. Escrevi um artigo no meu blog onde aprofundo essa questão.
Agricultura Familiar
Brasil sofre com pandemia da Covid e pandemia da fome
É o Dia Mundial da Alimentação Saudável, mas o Brasil está prestes a voltar para o mapa da fome
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16/10/20
16 de outubro é o Dia Mundial da Alimentação Saudável e em todo o Brasil estão ocorrendo ações em defesa da soberania alimentar. A política de governo de Jair Bolsonaro, marcada pelo desmonte dos direitos dos trabalhadores, aumento histórico da taxa de desemprego e a não valorização da vida do povo têm contribuído diretamente para o aumento da fome entre os brasileiros.
Em Goiânia, o Fórum Goiano em Defesa dos Direitos da Democracia e da Soberania, Fórum que reúne diferentes movimentos sociais e entidades sindicais, distribuiu alimentos da agricultura familiar na movimentada Praça A, região central da capital, local onde fica um terminal de ônibus.

Apesar de Jair Bolsonaro tentar se gabar pela produção de alimentos para 1 bilhão de pessoas durante discurso da ONU, o presidente não citou que a fome se alastra pelo Brasil. A insegurança alimentar é uma realidade desde 2017-2018 para 84,9 milhões de brasileiras/os (IBGE), sendo 10,3 milhões de pessoas residentes em domicílios com insegurança alimentar grave, ou seja, falta comida em casa com frequência. O número não leva em consideração os moradores em situação de rua.
Segundo a Central Única dos Trabalhadores de Goiás (CUT-GO), os alimentos da ação solidaria em Goiânia, durante o ato pela soberania alimentar, foram produzidos pelos assentados da Reforma Agrária ligados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) e o Movimento Camponês Popular (MPC).

Conforme conta Jéssica Silva Brito, do Movimento Camponês Popular de Goiás, presente no ato em Goiânia, o fato de poucas empresas atuarem no controle dos preços dos alimentos, apesar de cerca de 70% da alimentação que chega na mesa dos brasileiros vir da agricultura familiar camponesa, é o monopólio criado pelas empresas que acaba por controlar os preços dos alimentos.
Segundo o IBGE, o arroz ficou quase 20% mais caro desde o início do ano, o preço do feijão subiu 32,6%, da abobrinha, 46,8%; e da cebola, 50,4%. O desemprego já atinge 13,7 milhões de pessoas.
Os pequenos produtores vêm sofrendo com fim das políticas públicas para o setor e o consequente aniquilamento dos programas que garantiam comida de qualidade e acessível na mesa do povo.
“O estado deveria mediar, controlar o mercado, mas não o faz e ainda não tem investido na agricultura familiar camponesa”, explica. Ainda, com a pandemia, “os agricultores perderam cerca de 40% da sua renda, por conta do fechamento dos comércios e dos pontos de venda”, afirma.
Os dados do IBGE de 2018 sobre a fome no Brasil mostram que a pandemia da covid-19, apesar de acentuada no Brasil pela negligência do governo federal e muitos governos estaduais em enfrentar a crise sanitária, esta pode ser considerada o único vilão da pandemia da fome que se espalha pelo Brasil. O aumento no preço dos alimentos combinado com desemprego estão a refletir diretamente para este retrocesso enquanto Nação e o possível retorno do país para o Mapa da Fome.
Os avanços na erradicação da fome se deveram, no passado, à implantação de uma política de segurança alimentar e nutricional a partir de 2003, no primeiro governo Lula, com a aplicação de políticas públicas, com os aumentos do salário mínimo acima da inflação, com a geração de empregos e com a implementação do programa Fome Zero.
O trabalhador e sindicalista Mauro Rubem, importante liderança do estado de Goiás, afirma, em entrevista ao Jornalistas Livres, que o incentivo à plantação de monocultura que é dado no país é também o causador do flagelo da fome e lembra que está destruindo o meio-ambiente. “Esse modelo é destruidor da terra, é um modelo onde eles querem esgotar toda a riqueza natural, transformar a classe trabalhadora em escravos e jogar as pessoas em um conflito social sem tamanho”.
No próximo dia 15 de novembro, a população vai às urnas eleger os próximos parlamentares municipais, prefeitas e prefeitos. Ainda que a batalha por garantias de direitos plenos, como soberania alimentar, não se limite à disputa eleitoral, eleger candidatos comprometidos com a luta de classes cria condições para avançar rumo a este norte.
“A população tem que ser atenta ao processo eleitoral municipal de agora, porque as eleições para vereança e prefeitura criam caminhos para começar mudanças”, afirma Mauro Rubem.
Agricultura Familiar
Marmitas orgânicas da agricultura familiar beneficiam moradores em situação de rua
Campanha ‘Lute como quem cuida’ realiza entrega de 300 quentinhas da agricultura famil por dia em ação coletiva do MST e do MSTC
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30/07/20
Uma rede de voluntários e militantes que atuam da produção ao preparo de alimentos orgânicos, saudáveis e da agricultura familiar tem feito a diferença na vida e na saúde de moradores em situação de rua e em condição de vulnerabilidade da cidade de São Paulo, por meio do projeto Lute como quem cuida. Elaborado e colocado em prática de maneira coletiva pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento Sem Teto do Centro (MSTC) de São Paulo, o projeto distribui aproximadamente 300 marmitas todos os dias há mais de três meses.
Por Nara Lacerda, do Brasil de Fato
A ideia é criar uma rede de solidariedade contínua, que atenda essas populações em um momento delicado, com a crise causada pelo coronavírus. A falta de recursos e trabalho pode agravar ainda mais a insegurança alimentar e nutricional. No Brasil, o acesso a alimentos cultivados sem veneno ainda é limitado. Em parte, pelo preço que as grandes redes varejistas praticam, mas também pela falta de incentivo à agricultura familiar.
A dirigente do MST no estado de São Paulo Daiane Ramos explica que a campanha teve início no âmbito da Brigada Estadual de Solidariedade Zilda Camargo, formada por militantes de diversos municípios, e cresceu com foco na coletividade. Segundo ela, a intenção é chegar à doação de 30 mil marmitas entre julho e agosto.
CLIQUE AQUI PARA CONTRIBUIR COM A CAMPANHA
“Essa brigada está desde o dia 20 de abril participando desse trabalho intenso de solidariedade para a Rede Rua e o Prédio dos Imigrantes (que abriga pessoas de outros países em situação de vulnerabilidade). No fim ela se estendeu, na parceria com o MSTC. As organizações se unem por uma causa única, de trazer esse alimento saudável e orgânico para essas pessoas mais vulneráveis. Infelizmente, com a covid, vem aumentando esse número.”
Mais que a simples doação dos produtos, o projeto tem cuidado especial com a garantia de que essas pessoas vão receber o melhor da produção orgânica do país. Todo o preparo – da higienização ao embalo – segue normas sanitárias criteriosas, que ficaram ainda mais rígidas com a pandemia. O cardápio é definido entre os militantes, mas leva em consideração também as sugestões de quem recebe as marmitas.
Moradores de rua do centro de São Paulo recebem os alimentos. / Arquivo Brigada Zilda Camargo Ramos
Os mais de 200 quilos semanais de arroz, por exemplo, vêm de assentamentos do Rio Grande do Sul, que hoje são os maiores produtores do grão na América Latina. A Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF), em Guararema (Região Metropolitana de São Paulo), fornece as hortaliças e o pão. Assentamentos e acampamentos de outros municípios enviam em média por semana 90 quilos de feijão, 30 quilos de macarrão, 230 quilos de carne, 120 dúzias de ovos e 150 quilos de legumes.
O trabalho é totalmente coletivo e dividido. Cada voluntário tem a oportunidade de passar por diferentes etapas do processo, para ampliação da experiência e dos laços criados entre quem está na colheita e atrás do fogão e as pessoas que recebem os alimentos. Oscar do Nascimento Teles, militante do MST e morador do Assentamento Dom Tomás Balduíno, no Pontal do Paranapanema (SP), faz parte dessa rede. Ele relata o cuidado existente em todo o processo.
“Os companheiros estão fazendo isso com muito amor e carinho, porque a gente viu a realidade na rua de quem tá recebendo o alimento. Você ver as pessoas na fila, erguendo as mãos para pegar aquela comida. Isso fortalece demais nosso trabalho na cozinha, em fazer isso com amor, carinho e preparar os alimentos com todo um protocolo de higiene e cuidado. Nessa grandeza que é São Paulo, é um pouquinho que a gente está fazendo, mas de grande proporção. A gente sabe da importância”, finaliza.
Pela “manutenção imediata da vida”, a iniciativa “Lute como quem cuida” convida a sociedade civil para também colaborar. As doações podem ser realizadas por meio do site da campanha na internet.
Saiba mais: Quem é Carmen Silva, a líder dos sem-teto que a (in)Justiça quer prender

Há pouco mais de sete anos, dezenas de famílias transformaram a terra improdutiva do fazendeiro José Ivan Cassaro, no município de Gália, no Centro-Oeste de São Paulo. A área foi reflorestada e hoje os moradores do assentamento Luiz Beltrame de Castro são responsáveis pelo abastecimento de inúmeros alimentos à população da região. Pois bem, depois do renascimento produtivo da área, o latifundiário cresceu o olho na terra e agora luta para tê-la de volta. E, pior, encontrou uma juíza que lhe deu ganho de causa. Por isso os assentados estão em luta para se manterem produzindo naquele pedaço de terra e, para isso, querem seu apoio. Pedem que você faça como o ator Marcos Palmeira e manifeste ao desembargador Hélio Nogueira seu apoio e solidariedade aos sem-terra que desejam se manter trabalhando no local ao lado de suas famílias.
As cartas solicitando a suspensão definitiva do despejo devem ser enviadas para o seguinte endereço, podendo usar o texto apresentado abaixo:
Gabinete do Desembargador Federal Hélio Nogueira: gab12410@trf3.jus.br
Nós , ________, vimos através deste, solicitar justiça às famílias assentadas do assentamento Luiz Beltrame de Castro, no município de Gália, estado de São Paulo.
A área onde estão morando, produzindo e contribuindo com a economia da região e contribuindo também para a melhoria dos hábitos alimentares das pessoas que consomem seus produtos, recebeu a classificação de terra improdutiva pelo Incra há sete anos atrás.
Uma vez assentadas, as famílias reflorestaram a área transformando-a em belíssimos pomares. Tal atitude trouxe ganhos ambientais incalculáveis para a região. Através do suor derramado de seus rostos, a terra se tornou produtiva. De lá saem mandioca, banana, feijão, doces, geleias, legumes , hortaliças, temperos, queijo, ovos e leite pra alimentar as cidades do entorno. As famílias assentadas conquistaram sonhos, entre eles, o da casa própria. Casa essa que de forma cúmplice guarda os segredos do futuro pensado durante um almoço, jantar ou durante um cafezinho às pressas. Esses sonhos dizem respeito ao aumento da roça, do plantel de galinhas ou porcos, melhorar a alimentação do gado e obter um leite melhor. Nesse processo não existem motivos inconfessos a não ser o de trabalhar mais e mais para contribuir com o desenvolvimento do país alimentando a parte que lhes cabe nessa imensa nação. Portanto, é imensamente injusto ceifar essas vidas, retirando-as das terras que essas famílias fizeram renascer. É um plano de muito mau gosto devolver a terra ao senhor José Ivan Cassaro, que inclusive na época da desapropriação alegou não produzir pois a terra não prestava.
Pois bem, esses trabalhadores que lutaram pra conquistar terra, transformaram a improdutividade num espaço pulsante de vida. A partir da terra nua transformaram-na num organismo com vida, com árvores que já estão produzindo frutos e, principalmente cumprindo a função social da terra: colaborar com a economia da região, aumentar o emprego e produzir alimentos. Isso por si só já lhes garante o direito de permanecer na terra, que por um gesto arbitrário de uma juíza, deu ganho de causa ao latifundiário.
Solicitamos que analise esse processo à luz das leis, da Constituição Federal e dos interesses difusos de forma a restabelecer a credibilidade do sistema Judiciário. Sem mais para o momento, subscrevemos.
O desembargador responsável em julgar o processo do assentamento Luiz Beltrame no TRF-3 é o juiz Hélio Nogueira.
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Paulo Costa
17/08/18 at 11:32
ótima matéria !