por Adriana de Castro, especial para os Jornalistas Livres
Nesta quinta-feira (8/2), o Supremo Tribunal Federal julga a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3.239, proposta pelo antigo PFL, atual DEM em 2004. O PFL queria derrubar o decreto do então presidente Lula de 2003 que regulamenta a titulação dos quilombos, baseado em artigo da Constituição Federal de 1988. A ação preocupa as comunidades quilombolas e pode comprometer o direito aos territórios ancestrais. Os quilombolas, estimados em 16 milhões de pessoas em todo o pais, se mobilizam, tanto para derrotar a ação como para derrubar a nova tese proposta pelo ministro Dias Toffoli – o marco temporal. A petição “O Brasil é Quilombola! Nenhum Quilombo a Menos! e apoie a luta quilombola pela terra” já recolheu cerca de 100 mil assinaturas, informa Arilson Ventura, coordenador nacional da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).
Apesar do senador Agripino Maia ter declarado hoje à imprensa que a ação não representa o DEM atual, Inês está morta. Já é a terceira tentativa de votação pelo STF. A sessão desta quinta-feira é a retomada do julgamento suspenso em novembro do ano passado após voto do ministro Dias Toffoli e pedido de vistas do ministro Edson Fachin. Nestas idas e vindas surgiu a tese do “marco temporal”, ou seja, uma comunidade só poderia ter direito à posse da terra se nela estivesse – e se conseguir provar a presença – em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição. A tese ignora remoções forçadas e outras violências, muito presentes no contexto de ditadura militar, vivenciadas pelas comunidades, alertam as lideranças quilombolas.
“Essa tese nega o nosso direito ao futuro, engessa e condiciona a gestão dos territórios”, afirma o advogado Danilo Serejo, do Movimento dos Atingidos pela Base Espacial de Alcântara, no Maranhão. O advogado, filho de quilombola, representa 150 comunidades em Alcântara.
É uma clara disputa ideológica que envolve a questão da terra no Brasil. É o embate entre duas propostas: a terra como mercadoria para compra e venda ou para acolher e garantir a sobrevivência e a identidade dos povos que tradicionalmente as ocupam, como os quilombolas e indígenas, esclarece Serejo. Ele lembra que em 1850, a legislação já definia a posse da terra para aqueles que podiam comprar. A abolição da escravatura veio bem depois, em 1888, condenando os antigos escravos a condição de sem-terra.
Na cidade maranhense de Alcântara, mais de 200 quilombos lutam há mais de 30 anos pelo reconhecimento de seus territórios. São cinco ações na Justiça Federal do Maranhão e duas internacionais junto à Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização dos Estados Americanos (OEA). Todas pelo reconhecimento dos direitos quilombolas contra o Estado brasileiro e a base militar de lançamento espacial.
“É preciso lembrar que os quilombolas são realidades históricas: surgiram antes da Constituição e persistiram após sua promulgação. Seus direitos não se extinguem no tempo, sob pena de se chancelar verdadeira eliminação étnica, isso porque sem território seus direitos identitários fundamentais estarão sendo suprimidos”, destaca Juliana de Paula Batista, advogada do Instituto Socioambiental (ISA).
Números
São cerca de seis mil comunidades quilombolas autodeclaradas, principalmente na Bahia, Maranhão, Pará e Minas Gerais. Destas, apenas 200 tem títulos definitivos de posse da terra. São 1,6 mil processos abertos no Incra e quatro mil territórios certificados pela Fundação Palmares. De acordo com Arilson Ventura, 16 milhões de quilombolas vivem espalhados Brasil afora.
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