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Tag: Alexandre de Moraes

  • Absolvição de major contraria provas, diz membro do Condepe

    Absolvição de major contraria provas, diz membro do Condepe

    O júri presidido pelo juiz Anderson Fabrício da Cruz absolveu, por 4 a 3, o major Herbert Saavedra ontem (29/8). Ele era acusado pela morte de Douglas Silva e Felipe Macedo Pontes, ambos com 17 anos, em São Bernardo do Campo. O Ministério Público já anunciou que vai recorrer.

    O assassinato dos dois jovens

    Na noite do dia 30 de novembro de 2011, os amigos Douglas e Felipe estavam saindo de moto da escola estadual onde estudavam no Bairro Demarchi, em São Bernardo do Campo, quando foram abordados pelos 3 PMs da Força Tática.

    Posteriormente, os policiais disseram que eles eram suspeitos de um roubo no bairro. “Porém, esse suposto roubo jamais ocorreu, já que nenhuma ocorrência do tipo foi registrada na Delegacia da área, assim como nenhuma vítima ou testemunha do suposto crime foi localizada pela própria polícia”, afirma o advogado Ariel de Castro Alves, membro do Condepe (Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana), que acompanha o caso desde o início.

    As investigações do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) demonstraram que Felipe foi assassinado na própria abordagem e Douglas foi morto a caminho do Hospital, após, inclusive, ter dito a uma testemunha que temia ser morto pelos PMs no caminho ao Hospital, por ter presenciado o assassinato de seu amigo na abordagem policial.

    “Existem fortes indícios de que os adolescentes foram executados pelos PMs, já que conforme os laudos do IML, Douglas levou 5 tiros e Felipe recebeu 4 disparos”, afirma Ariel, complementando que o laudo residuográfico do Instituto de Criminalística não constatou resíduos de pólvora nas mãos das vítimas.

    A denúncia do Ministério Público

    Após 4 anos de investigações, os policiais militares Herbert Saavedra, Alberto Fernandes de Campos e Edson Jesus Sayas Junior, se tornaram réus no Processo Criminal pelos 2 homicídios. Na época, o juiz Fernando Martinho de Barros Penteado, da Vara do Júri de São Bernardo do Campo, acatou a denúncia criminal apresentada pela promotora de Justiça Thelma Thais Cavarzere.

    Na denúncia, a promotora afirmou taxativamente que “os imputados mataram Douglas para assegurar a ocultação e a impunidade do homicídio que praticaram contra Felipe”. Por fim, a promotora denunciou os 3 PMs pelos 2 homicídios qualificados.

    Sentença de Pronúncia da Vara do Júri de SBC

    No dia 17 de fevereiro de 2017, após terminar a fase de instrução processual, na qual foram ouvidas as testemunhas do crime e analisadas todas as provas e laudos produzidos durante o Inquérito da Polícia Civil, o juiz titular da Vara do Júri de São Bernardo do Campo, Fernando Martinho de Barros Penteado, decidiu que os réus deveriam ser julgados pelo Júri Popular, entendendo que estavam presentes os “indícios suficientes de autoria e materialidade” com relação ao envolvimento dos PMs  com o crime. A sentença cita os depoimentos das testemunhas protegidas, que foram ouvidas em audiência, que afirmaram que os jovens estavam desarmados e foram assassinados pelos policiais militares.

    O relato de Ariel de Castro Alves sobre a abolvição

    “O resultado do Júri foi uma afronta ao senso de Justiça e um estímulo à violência policial. A decisão dos jurados contraria frontalmente as provas dos autos. Uma testemunha ouvida pela polícia e pela justiça, um frentista de um posto de gasolina que trabalhava em frente ao local dos fatos, disse que viu a abordagem, onde os jovens saíram da moto com as mãos na cabeça e desarmados, quando os policiais fizeram vários disparos contra eles.  A testemunha ainda chegou a presenciar os PMs forjando provas no local do crime, para simular um suposto confronto. Ela afirmou ter visto os policiais tirando armas de fogo de dentro da viatura da PM e colocando as nas mãos dos jovens. Essa e outras testemunhas foram ouvidas na Vara do Júri, durante a instrução do processo criminal. Felipe foi atingido por 4 disparos e Douglas por 5 tiros. Mais um caso terrível de impunidade, que só gera mais violência. Policiais violentos geram riscos para toda sociedade.”

    Notas

    1 Para mais informações sobre a federalização das investigações:

    Autos do Inquérito Policial não foram encontrados por 8 meses Em julho de 2012, o Ministério Público Federal de São Paulo, após ser acionado pelos advogados André Alcantara e Ariel de Castro Alves, pediu ao Procurador Geral da República a federalização das investigações sobre as mortes dos 2 adolescentes. Na época, os autos do Inquérito Policial estavam sumidos há 6 meses. Porém, 2 meses depois do pedido de federalização, os autos do Inquérito Policial foram encontrados no Fórum de Santo André e não no de São Bernardo, onde deveriam estar. http://www.prsp.mpf.gov.br/sala-de-imprensa/noticias_prsp/31-07-12-2013-mpf-em-guarulhos-sugere-federalizacao-de-homicidio-de-dois-adolescentes-em-sao-bernardo-do-campo

    2 Para mais informações sobre a demanda da Human Rights Watch por providências do governo Alckmin

    Human Rights Watch cobrou providências do Governador de São Paulo Em 29 de julho de 2013, a ONG (Organização Não Governamental) internacional Human Rights Watch apresentou um documento ao Governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, citando os assassinatos de Douglas e Felipe, em São Bernardo do Campo, como exemplo de “casos padrão” na atuação da Policia Militar Paulista, nos quais “policiais executam pessoas e, em seguida, acobertam esses crimes”. http://www.hrw.org/pt/news/2013/07/29/brasil-execucoes-acobertamentos-pela-policia

    3 Essa matéria recebeu o selo 034-2018 do Observatório do Judiciário.

    4 Para ler outras matérias do Observatório do Judiciário:
    https://jornalistaslivres.org/categoria/observatorio-do-judiciario.

  • Brasil deve garantir direitos políticos de Lula, diz CNDH

    Brasil deve garantir direitos políticos de Lula, diz CNDH

    Nota pública do CNDH em reconhecimento à legitimidade do Comitê de Direitos Humanos da ONU
    O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), órgão autônomo criado pela Lei n° 12.986/2014, vem, através desta Nota Pública, expressar seu reconhecimento à legitimidade do Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas (ONU), enquanto órgão de monitoramento do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, de conferir interpretação autêntica do tratado internacional e, nesse sentido, reafirma o respeito às suas decisões.
    Nesse sentido, está em consonância com o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos a decisão do Comitê de que Lula possa exercer seus direitos políticos, inclusive com acesso apropriado à mídia e a membros do seu partido político, enquanto candidato às eleições presidenciais de 2018. O CNDH entende, assim, que as medidas interinas adotadas pelo Comitê devem ser cumpridas pelo Estado brasileiro, independentemente de seu caráter vinculante, como expressão de sua boa-fé no cumprimento de obrigações internacionalmente assumidas quanto à implementação de direitos humanos no país.
    Brasília, 27 de agosto de 2018
    CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS – CNDH

    Notas

    1 Essa matéria recebeu o selo 033-2018 do Observatório do Judiciário.

    2 Para ler outras matérias do Observatório do Judiciário:
    https://jornalistaslivres.org/categoria/observatorio-do-judiciario.

  • É imperativo restaurar o respeito à presunção de inocência

    É imperativo restaurar o respeito à presunção de inocência

    por Antonio Maués – Professor da Universidade Federal do Pará

    Embora o Brasil ocupe o 4º lugar no ranking de países com maior número de pessoas presas, o poder judiciário vem ordenando a prisão de condenados em segunda instância, enquanto ainda estão pendentes recursos que podem levar à absolvição do réu, à redução da pena ou à mudança em seu regime de cumprimento. Essa situação decorre, especialmente, de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) tomada em 2016, que relativizou o princípio da presunção de inocência previsto na Constituição e permitiu que os tribunais do país, mesmo antes do trânsito em julgado da condenação, determinassem o início do cumprimento da pena, agravando a situação em um sistema carcerário que contava, em junho de 2016, com mais de 726 mil pessoas presas.

    Para denunciar o erro dessa decisão e lutar pela revisão da jurisprudência, a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) lançou, em agosto, a Campanha Nacional pela Presunção de Inocência, em conjunto com outras entidades, como a Associação Juízes para a Democracia e o Coletivo Transforma MP. A campanha busca fazer valer o disposto no art. 5º, LVII, da Constituição de 1988, segundo o qual: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, garantia também prevista em tratados internacionais de direitos humanos e que visa proteger o direito à liberdade de todos os cidadãos e cidadãs.

    A importância da presunção de inocência é ainda maior no contexto do sistema carcerário brasileiro, que coloca em condições sub-humanas os presos, dentre os quais, 64% são negros e 45% são analfabetos ou não conseguiram concluir o ensino fundamental. Além disso, estima-se que 35% das pessoas presas no Brasil não foram ainda condenadas definitivamente e, portanto, podem ser julgadas inocentes ou terem suas penas atenuadas. As constantes revoltas em presídios no Brasil, que levam a mortes e várias outras ações violentas, demonstram cabalmente como neles ocorre uma situação grave e permanente de violação de direitos fundamentais, o que o próprio STF reconheceu ao declarar o sistema carcerário brasileiro um “estado de coisas inconstitucional”.

    Aqueles que defendem o cumprimento da pena antes da decisão final argumentam que essa medida é necessária para evitar a impunidade. Porém, o princípio da presunção de inocência não impede que ocorra a prisão do réu antes do trânsito em julgado de sua condenação, desde que haja motivos para decretá-la. Além de gerar injustiças, o cumprimento antecipado da pena tende a piorar as condições do sistema carcerário. Segundo estudo da Defensoria Pública, somente no Estado de São Paulo foram expedidos mais de 13 mil mandados de prisão com base na decisão do STF, embora 44% dos recursos apresentados pela DPE-SP ao Superior Tribunal de Justiça levem à redução da pena ou à absolvição dos acusados. Na Defensoria Pública do Rio de Janeiro, 49% dos habeas corpus apresentados às instâncias superiores conseguem atenuar a pena imposta pelas instâncias inferiores.

    O STF tem a oportunidade de corrigir seu erro por meio do julgamento de ações declaratórias de constitucionalidade cujo relator, Min. Marco Aurélio, já autorizou serem levadas à decisão do tribunal. Vários ministros têm se manifestado no sentido de que a presunção de inocência vem sendo desrespeitada no Brasil e reconhecem a urgência de rever a jurisprudência sobre a matéria.

    A mobilização capitaneada pela ABJD pretende acelerar esse processo. Em quase todos os estados do país, núcleos da ABJD têm realizado seminários e debates sobre a presunção de inocência para apresentar à opinião pública os graves problemas que decorrem desse descumprimento da constituição e dos tratados internacionais de direitos humanos. Além disso, a ABJD tem coletado assinaturas em um abaixo-assinado que será entregue ao STF no início de setembro.

    Todas as pessoas podem participar da campanha, baixando os materiais que se encontram no site da ABJD: www.abjd.org.br.

    Notas

    1 Essa matéria recebeu o selo 032-2018 do Observatório do Judiciário.

    2 Para ler outras matérias do Observatório do Judiciário:
    https://jornalistaslivres.org/categoria/observatorio-do-judiciario.

     

  • Apontamentos para uma série sobre o futuro de Aécio Neves

    Apontamentos para uma série sobre o futuro de Aécio Neves

    Por cinco votos a zero, o Supremo Tribunal Federal acatou a denúncia de corrupção contra o senador mineiro Aécio Neves (PSDB). Até seu grande amigo e aliado político, Alexandre Morais, votou a favor. Na denúncia de obstrução da justiça, votou contra, mas os demais pares votaram a favor, e assim o ‘Mineirinho’ da planilha da Odebrecht virou réu em dois processos.

    Os caciques do PSDB, ao comentar a decisão do STF, sacaram o argumento de que isso confirma que “a lei é para todos”. Será?

    Desde que foi exposto pelas gravações de Joesley Batista, quando pediu e recebeu R$ 2 milhões, e de mandar um emissário descartável pegar o dinheiro (alguém que possa matar antes de delatar), Aécio trafega dos espaços onde antes reinava como uma alma penada. Aqui e ali um jornal lhe dá espaço para dizer que foi vítima de uma armação, e só. Os velhos amigos correram para apagar fotos ao seu lado, outros dizem ter sido enganados pelo jeitobom moço do playboy carioca/mineiro.

    A atual situação da ex-estrela do PSDB pode nos levar a desenhar um enredo e sugerir o que irá acontecer com ele daqui para frente:

    EPISÓDIO 1. STF aceita julgar tucano por corrupção e obstrução da justiça. A decisão ganha o noticiário geral do país e seu partido aparentemente o entrega às feras A ideia de que “a lei é para todos” serve para divulgar o filme e a série contra Lula, além de atrair a atenção do público para Aécio, na esperança de que esqueçam outros tucanos. A ‘justiça’ deu uma mãozinha ao candidato a presidente do partido, Geraldo Alckmin, também delatado na Lava Jato, que teve seu processo enviado para a branda justiça eleitoral, e isso não pegou muito bem junto aos brasileiros indignados.

    EPISÓDIO 2. “Mineirinho” analisa se renuncia, ou deixa o mandato vencer, para perder o foro privilegiado. Se renunciar, conta com uma decisão monocrática barrosiana de mandar o processo para a primeira instância, como fez com Azeredo. A vantagem é que, sem mandato, logo será esquecido e vai gozar do anonimato, e da grana que o acusam de ter rapinado.

    EPISÓDIO 3. Aécio analisa aguardar o fim do mandato. Até lá o processo não andou um metro, vai perder o foro e vai para a primeira instância mineira de qualquer forma. Lá não lhe faltam juízes amigos e devedores de favores para congelar as investigações e aguardar a prescrição. As duas opções podem ser utilizadas, o que não influenciará muito no capítulo final desta história.

    EPISÓDIO FINAL. Em qualquer das hipóteses, o cara não será preso, entre outras coisas porque carrega em si o ovo da serpente tucana que precisa ser congelado para não chocar. Além disso, o judiciário brasileiro já demonstrou que tem uma decisão fechada e coerente para cada tipo de suspeito, réu ou condenado. Um exemplo disso é a escolha de qual julgamento tem cobertura televisiva ao vivo, e qual é censurado. Nos julgamentos dos petistas, a decisão foi de transmissão em cadeia nacional, “porque é do interesse público”. Já no caso de Aécio, Carmen Lúcia proibiu a transmissão. Aí já não sabemos no interesse de quem.

    Embora aparentemente a história esteja recheada de ingredientes que têm feito muito sucesso ultimamente, é duvidoso que ela vá empolgar. Em primeiro lugar, porque os produtores não irão investir muita grana na sua divulgação. Está mais para uma história que se deseja cair no esquecimento. Em segundo lugar, porque o protagonista hoje parece um daqueles atores hollywoodianos, que um dia dominaram a bilheteria, e hoje fazem ponta em filmes “B”. A melhor aposta é a de que esta série não saia do papel.

    O resumo da ópera é o seguinte: da mesma forma que um dia o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso declarou “esqueçam o que eu escrevi”, a fala final desta história que não ganhará nem telonas e nem telinhas é Aécio Neves declarando: “esqueçam que eu existi”.

    • Everaldo de Jesus é jornalista e mestrando em História pela Universidade Estadual da Bahia.
  • Mais um plágio de Alexandre de Moraes

    Mais um plágio de Alexandre de Moraes

    Por Gustavo Aranda, especial para os Jornalistas Livres

    Ministro da Justiça licenciado e o mais novo indicado para a vaga deixada por Teori Zavascki no STF (Supremo Tribunal Federal), Alexandre de Moraes copiou literalmente em seu livro “Legislação Penal Especial” (Editora Atlas, 2006, São Paulo) diversos trechos da obra “Tóxicos, Prevenção – Repressão”, de seu colega da Faculdade de Direito da USP e professor titular de direito penal do Mackenzie, Vicente Greco Filho.

    O livro, que é o quinto da coleção “Fundamentos Jurídicos”, toda ela redigida sob a coordenação e responsabilidade de Moraes, foi escrito pelo ministro licenciado em coautoria com o Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, Gianpaolo Poggio Smanio. Procurado pelos Jornalistas Livres, o ministro da Justiça licenciado – por meio de sua assessoria de comunicação – não negou a cópia literal dos trechos em questão, apenas afirmou que esta parte do livro foi escrita e é de inteira responsabilidade de seu colega e Procurador-Geral do Estado de São Paulo (leia mais abaixo). Smanio não respondeu às perguntas dos Jornalistas Livres até a primeira publicação desta reportagem. Porém, uma hora depois da matéria ser publicada, a assessoria do Ministério Público de São Paulo entrou em contato com a redação e afirmou que a cópia poderia ter sido feita de qualquer dicionário.

    No dia seguinte, sábado (11/02), por volta das 11 horas da manhã, a mesma assessoria enviou nova explicação. De acordo com a nota, a obra “Legislação Penal Especial” (Editora Atlas, 2006, São Paulo), escrita em coautoria com Alexandre de Moraes, “trouxe uma extensa gama de conceitos sobre diversas normas penais. Os trechos referidos de autoria de Gianpaolo Smanio traziam comentários sobre a Lei de Drogas já revogada (Lei n. 6368/76) e tratavam de conceitos objetivos sobre os tipos penais, de domínio comum aos estudiosos do tema, constantes de vários livros que também tratavam do assunto, que foram apresentados de maneira direta para melhor compreensão dos alunos e daqueles que se debruçavam sobre as questões relativas à mencionada Lei de Drogas.” (Leia as respostas completas da Procuradoria em “Outro Lado”, ainda nesta reportagem.)

    Somente nesta semana, esta é a terceira obra jurídica de Moraes – tido até então como um constitucionalista de qualidade inconteste – em que são detectadas cópias deliberadas de trechos de outras obras sem a devida menção ao autor. Todas foram reveladas pelos Jornalistas Livres. (Clique aqui e aqui para conhecer os outros dois casos de plágio).
    Indicado à vaga no STF pelo presidente Michel Temer, antes de assumi-la, o ministro licenciado terá que passar por uma sabatina no Senado Federal. Entre os pré-requisitos legais para ocupar a vaga estão possuir “reputação ilibada” e notório saber jurídico”.

    Voltando ao livro do professor Greco, a obra data de 1991 e traz comentários sobre a Lei n.6368/76, que criminaliza o tráfico de drogas, tema caro a Moraes, que já disse querer erradicar o consumo de maconha no país.

    Como nas outras denúncias de plágio que envolvem o escolhido por Temer, ele simplesmente faz constar o nome do autor copiado na bibliografia, mas ignora as aspas ou citações, tornando impossível identificar os trechos que Moraes copia de outros autores, contrariando, assim, as normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) para a citação de autores em obras acadêmicas. Veja abaixo…

     

     

    Nos trechos destacados, observa-se a apropriação de termos através de cópia literal, sem qualquer identificação por meio de aspa ou citação.
    Das 40 linhas presentes na página 120 de “Legislação Penal Especial”, por exemplo, 26 foram clonadas por Alexandre Moraes de seu colega.

    A utilização de termos incomuns, como “dádiva”, por exemplo, evidenciam a má conduta acadêmica.

     

     

    Em cópias com três linhas ou mais, a ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) determina a diminuição da fonte e o recuo da margem, exatamente para auxiliar o leitor a não confundir grandes citações com o autor da obra.

     

     

     

    Outro Lado

    Em nota enviada aos Jornalistas Livres, Alexandre Moraes, coordenador da coleção “Fundamentos Jurídicos” e um dos dois autores do quinto número, “Legislação Especial”, eximiu-se de culpa pelos trechos copiados de um outro livro, embora não tenha negado a existência da cópia. Leia, abaixo, a íntegra da resposta da assessoria do ministro licenciado.

    A obra “Legislação Penal Especial” é de coautoria de Alexandre de Moraes e Gianpaolo Poggio Smanio, que, após vários anos de aulas ministradas, abordaram os temas mais relevantes de cada uma das leis analisadas.
    O trabalho foi dividido por capítulos, que foram escritos segundo a maior especialidade de cada um dos coautores.
    O capítulo referente à “Lei de Drogas” foi escrito pelo coautor Gianpaolo Poggio Smanio, que analisou detalhadamente os tipos penais, a partir de conceitos clássicos da doutrina e jurisprudência, inclusive apontando os julgados mais importantes em cada caso.
    Em sua bibliografia, há mais de duas dezenas de livros, entre eles as clássicas obras dos professores Vicente Grecco Filho e Damasio de Jesus, que também adotam conceitos clássicos.
    Para mais esclarecimentos, o dr. Smanio está à disposição.”

    Uma hora depois desta reportagem ser publicada, exatamente às 20h29, a Assessoria de Comunicação do Ministério Público de São Paulo enviou a seguinte resposta aos Jornalistas Livres: 

    “Não existe plágio. Os trechos citados pela reportagem são reproduções de conceitos de dicionários. Exportar tem a mesma definição em qualquer obra que se consulte, independentemente de seu autor.”

    No dia seguinte ao da publicação da reportagem, no sábado (11/02), por volta das 11 horas da manhã, a mesma assessoria enviou nova explicação.

    “A obra ‘Legislação Penal Especial’ (Editora Atlas, 2006, São Paulo), escrita em coautoria com Alexandre de Moraes, trouxe uma extensa gama de conceitos sobre diversas normas penais. Os trechos referidos de autoria de Gianpaolo Smanio traziam comentários sobre a Lei de Drogas já revogada (Lei n. 6368/76) e tratavam de conceitos objetivos sobre os tipos penais, de domínio comum aos estudiosos do tema, constantes de vários livros que também tratavam do assunto, que foram apresentados de maneira direta para melhor compreensão dos alunos e daqueles que se debruçavam sobre as questões relativas à mencionada Lei de Drogas.”

     

     

     

    CRIME DE PLÁGIO

    O crime de plágio está tipificado no art. 184 do Código Penal, pela leitura in verbs:

    Art. 184. Violar direitos de autor e os que lhe são conexos:

    Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.

    • 1o Se a violação consistir em reprodução total ou parcial, com intuito de lucro direto ou indireto, por qualquer meio ou processo, de obra intelectual, interpretação, execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem os represente:

    Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

     

    Aqui é interessante notar que ele cita o julgamento referente, mas não cita o autor original do texto.

     

     

    Trecho do Livro de Alexandre de Moraes

     

     

    Primeira citação ao autor Vicente Greco Filho (acima), o que contribui para a tipificação do crime, pois uma das características principais para a comprovação do plágio é a prova de que o autor teve acesso à obra original.

    Abaixo, Alexandre de Moraes, finalmente faz o uso correto das aspas.

     

    Trecho do Livro de Alexandre de Moraes

     

    Procurado para comentar o assunto, o autor da obra copiada, Vicente Greco Filho, não se manifestou até a publicação desta reportagem.

     

     

     

  • O cinema ajuda a entender os perigos de Alexandre de Moraes

    O cinema ajuda a entender os perigos de Alexandre de Moraes

    Nas últimas semanas, vimos o Brasil e os EUA ganharem potenciais novos juízes das cortes mais altas de seus respectivos sistemas judiciários. Por lá, no dia 1º de fevereiro, o presidente republicano Donald Trump apontou o juiz federal Neil Gorsuch, de 49 anos, para preencher a vaga deixada na Suprema Corte por Antonin Scalia, que faleceu em fevereiro de 2016. Bem antes da posse de Trump, o presidente Barack Obama havia feito sua própria indicação para o cargo, o democrata moderado Merrick Garland, mas ações dos republicanos no Congresso americano bloquearam e adiaram o processo de confirmação do candidato justamente para que Trump pudesse escolher outro.

    Meros cinco dias depois, no Brasil, o presidente Michel Temer também fez sua escolha para o Supremo Tribunal Federal: seu próprio Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, é o indicado para substituir Teori Zavascki, que morreu em um acidente de avião no dia 19 de janeiro. Moraes tem bastante em comum com Gorsuch, o candidato americano – ambos estão no final de seus 40 anos, e possuem um histórico de decisões conservadoras polêmicas em seu passado.

    Neil Gorsuch

    No caso de Gorsuch, trata-se de decisões como a do caso Hobby Lobby v. Sebelius (2013), em que defendeu o direito de uma loja de materiais artísticos de se recusar a prover anticoncepcionais para seus funcionários, sob a alegação de que seus donos, parte de uma tradicional família evangélica, tinham objeções religiosas à prática. Visto que o atual plano de saúde governamental americano, conhecido como ObamaCare, inclui a distribuição de anticoncepcionais, a decisão (mais tarde confirmada pela Suprema Corte) essencialmente permite que empresas e organizações particulares ajam contra práticas e decisões públicas caso elas infrinjam, de alguma forma, sua crença religiosa.

    Embora no caso de Alexandre de Moraes não tenhamos tantas decisões judiciais para nos basearmos a fim de compreender suas opiniões, temos sua atuação em órgãos públicos e sua afiliação política. Ligado ao PSDB, o jurista foi Secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, sob o governo de Geraldo Alckmin, entre janeiro/2015 e maio/2016, período em que a violência da Polícia Militar foi duramente criticada, frente a protestos de rua e ocupações de escolas. A Polícia de Moraes foi responsável por uma em cada quatro pessoas assassinadas no ano de 2015, em São Paulo, segundo dados levantados pela própria Rede Globo.

    Em suma, o Brasil e os EUA acabaram de indicar dois homens perigosos para os mais altos cargos judiciários de seus respectivos governos – como a história (e o cinema) nos ensina, isso pode não acabar bem.

    Wendell Pierce como Clarence Thomas e Kerry Washington como Anita Hill no filme Confirmation (2016)

    Confirmação

    Produzido em 2016 para comemorar os 25 anos de uma confirmação de Suprema Corte histórica nos EUA, o telefilme Confirmation é centrado na atriz Kerry Washington, conhecida por interpretar a impulsiva e brilhante Olivia Pope na série Scandal. Aqui, Washington entrega uma atuação precisa e comovente como Anita Hill, professora de direito que, após saber que seu ex-chefe, o juiz Clarence Thomas, havia sido indicado para a Suprema Corte dos EUA pelo então presidente George H.W. Bush, é procurada por representantes do Senado e relata que, no passado, havia sido sexualmente assediada por Thomas.

    Hill trabalhou com Thomas em duas agências governamentais na administração Reagan, ambas direcionadas à diversidade no ambiente de trabalho. Em 1991, uma década depois dos alegados casos de assédio, Hill virou testemunha em uma série de audições polêmicas em que um grupo (todo masculino) de senadores considerou as acusações de assédio a fim de determinar se Thomas deveria ser bloqueado de servir na Suprema Corte. Os conselheiros próximos ao presidente Bush e os senadores republicanos então empreenderam uma verdadeira caça às

    Os verdadeiros Clarence Thomas e Anita Hill, em 1991

    bruxas, buscando difamar a reputação de Hill e sugerindo até que ela sofresse de erotomania, distúrbio que leva indivíduos a presumirem ou fantasiarem avanços sexuais daqueles a sua volta.

    Confirmation, da forma que foi dirigido por Rick Famuiywa (do ótimo Dope) e escrito por Susannah Grant (indicada ao Oscar por Erin Brockovich), é uma envolvente mistura de fato e ficção ou conjectura, destrinchando a intimidade desses personagens sem perder de vista as questões que essencialmente aborda. O juiz Clarence Thomas eventualmente foi confirmado e serve na Suprema Corte dos EUA até hoje, mas a muito pública odisseia de Hill influenciou uma eleição americana (em 1992) que colocou um número recorde de mulheres no Senado, e praticamente obrigou o presidente Bush a passar novas leis de proteção à mulher no ambiente de trabalho.

    Confirmation é um filme sobre assédio sexual, sim, e sobre o machismo que predomina em nossas instituições políticas e permite que ele aconteça, e que os acusados saiam sem punição nenhuma, com um cargo na mais alta corte dos EUA de presente. É também, no entanto, um conto de aviso perturbador sobre o quanto interesses políticos e mentiras estratégicas podem interferir em uma decisão que não deveria ser ideológica, mas puramente ética. Uma decisão que molda por exemplo e por efeito o futuro do país – nos momentos de caos que vivemos, é sempre bom realçar essa importância.