Em editorial publicado no último domingo (29), o jornal Estado de São Paulo de alguma maneira volta aos tempos em que dava sustentação ao regime dos generais que controlou o país durante 21 anos.
Traz uma análise do atentado a tiros contra o acampamento de apoiadores de Lula em Curitiba onde o jornal sustenta que a origem dos disparos seria, na verdade, o próprio PT – que, nas suas palavras, estimulara o confronto político durante 30 anos.
É demais. Mesmo para Estadão.
Eu só posso me perguntar como é possível que um veículo que apoiou dois golpes presidenciais em sua relativa breve existência, que silenciou sobre sequestros de militantes, torturas sistemáticas e que sempre deu guarida a políticos do ramo mais podre da institucionalidade, como Aécio Neves, insinuar que o PT é que sempre foi intolerante, enquanto seus aliados seriam pacíficos democratas.
Ora, o PT nasceu das lutas da esquerda contra a ditadura que Estadão apoiou, e não o contrário.
Sejamos sinceros sobre quem efetivamente lutou para que não houvesse democracia e qualquer forma de tolerância política no Brasil. Nós sabemos que nas páginas de Estado de São Paulo não são publicadas opiniões contrárias à linha editorial que as empresas anunciantes simpatizam. E que não há espaço para contraditório nem equilíbrio no tom crítico.
Recentemente, numa espécie de déjà vu, nós vimos Estadão apoiar manifestações verde-amarelo protagonizadas por grupos ultraconservadores, anti-esquerdistas e até favoráveis à outra intervenção militar.
Apoiou também o processo de impeachment que logrou sacar da presidência da República a vencedora da última eleição, ainda que sem apresentar um crime que ela tenha cometido, ao custo de uma radicalização da política que teve como principal fenômeno para sociedade a ascensão do conservadorismo fascista que ameaça as instituições democráticas. A verdade é que o jornal se comprometeu com uma linha radical que chamou a atenção do mundo sobre uma guinada autoritária, e que seus donos têm problemas em reconhecer-se assim, preferindo divulgar, por exemplo, que o sucesso do deputado fascista nas pesquisas para presidente é culpa de “mau humor dos eleitores” ou até mesmo das redes sociais. Isentem-se como parte fundamental no processo de aderência popular ao conservadorismo intolerante. E não poderiam fazer isso.
Nos últimos meses houve ataques a sedes de partidos de esquerda, que foram vandalizadas e até alvos bombas. Ao mesmo tempo, o partido campeão de denunciados pela Operação Lava-Jato, o PP, conseguiu costurar nos bastidores do Congresso para atrair novos parlamentares e se tornar a segunda maior bancada partidária. Se essa contradição existe, em parte deve-se, sim, a uma cobertura de imprensa que criminaliza seletivamente a esquerda e blinda de conteúdo negativo políticos que se comprometem com uma agenda de favorecimento aos empresários.
A diminuição drástica de prefeituras comandadas por partidos de esquerda na última eleição municipal foi apoiada por Estadão como se o compromisso do veículo de imprensa fosse com uma militância partidária, e não com a cobertura isenta dos fatos, e o resultado a ser notado é um début à cena nacional de fundamentalistas religiosos, demagogos da segurança pública e latifundiários simpatizantes do trabalho análogo à escravidão. Não há no Brasil grupos mais intolerantes que estes.
As redes sociais estão tomadas de robôs e os principais comentários nas caixas de interação dos principais jornais são, normalmente, de perfis falsos e com conteúdo ultradireitista. Quem paga por este aparato é que deve se juntar a Estadão para explicar o clima de intolerância que estamos vivendo.
Devemos identificar com nitidez os que sempre estimularam o ódio político.