Jornalistas Livres

Categoria: memória e Justiça

  • Temer indica colaborador da ditadura para a Comissão da Anistia

    Temer indica colaborador da ditadura para a Comissão da Anistia

    Para quem não é do Rio Grande do Norte e não conhece tão NEFASTA e canalha figura, eis um texto que  a DHnet (www.dhnet.org.br) divulga em primeira mão. Uma plaquete em que ele, no ano de 1976 chama o ditador Médici de “irmão” (tratamento entre os maçons. Além de informante na época da Ditadura, ele se dizia maçom). Leiam abaixo a plaquete inteira, denominada “A Maçonaria e a Revolução de 1964 – Comemoração do 9º Aniversário da Revolução”, de autoria do informante Paulo Lopo Saraiva, hoje nomeado para a Comissão da Anistia.

    O Ministério da Justiça, do ministro golpista Alexandre de Moraes, trocou 19 dos 24 membros da Comissão de Anistia, que analisa os pedidos de indenização e reparação de pessoas prejudicadas por atos de exceção cometidos durante as ditaduras brasileiras. As mudanças passam a valer a partir desta sexta.. Aqui fotos de  “A Maçonaria e a Revolução de 1964 – Comemoração do 9.o Aniversário da Revolução”, de autoria do informante Paulo Lopo Saraiva.

     

     

  • Não era bandido, era trabalhador

    Não era bandido, era trabalhador

    Por Natália Martino e Leo Drumond | Projeto Voz para os Jornalistas Livres

    Um salário mensal que pode ser recebido pela família de alguém condenado à privação de liberdade. Trata-se do auxílio-reclusão, tão maltratado por aqueles que se referem a ele como “bolsa bandido”. Digo “pode” porque os requisitos necessários para conseguir tal recurso são tão amplos que apenas 24 mil famílias conseguem acessá-lo – em um universo de mais de 600 mil detentos, ou seja, não chega a mais de 4% da população carcerária. O pagamento desse benefício causa um impacto de menos de R$ 2 milhões nos gastos da Previdência Social brasileira, o que corresponde a cerca de 0,5% do total, de acordo com relatórios do governo federal de 2014, últimos dados disponíveis. O que disse até aqui já é informação suficiente para desbancar tantos ataques a esse instituto, mas é melhor explicar cada um deles mais detalhadamente.

    Itauna_MG, 30 de janeiro de 2014. Modelos alternativos de presidios Na foto, a APAC de Itauna, referencia nacional no modelo que prega um presidio sem policias e armas Foto: LEO DRUMOND / NITRO
    Na foto, padaria da APAC de Itauna, referencia nacional no modelo que prega um presidio sem policias e armas

    Comecemos pelos requisitos. São muitos e eles podem ser conferidos aqui, mas vale um destaque. O ponto de partida é a contribuição previdenciária do agora condenado, antes trabalhador. Ao contrário do que muito se propaga, a dicotomia trabalhador versus criminoso não existe. Grande parte da população carcerária brasileira é formada por pessoas que possuíam algum tipo de ocupação legal antes da prisão, mesmo que isso acontecesse paralelamente a atividade ilícitas. Se a maioria não acessa o auxílio-reclusão, é porque a ocupação tantas vezes não se concretiza em empregos formais e sim em bicos e similares. Isso sem contar a impossibilidade de algumas famílias conseguirem vencer a burocracia e apresentar certos documentos exigidos quando tantas vezes nem mesmo endereço reconhecido pelo poder público possuem.

    A história do auxílio-reclusão é uma evidência de que cometer atos ilícitos não é uma exclusividade de “vagabundos que não trabalham”. Foi instituído pela primeira vez pelo Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM), em 1933, seguido pelo também extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários (IAPB), em 1934, autarquias que substituíram as antigas Caixas de Aposentadorias, mantidas pelas empresas. Nasceu, portanto, do reconhecimento de categorias profissionais da sua vulnerabilidade frente ao Sistema de Justiça Criminal. Em 1960, foi incluída na Lei Orgânica da Previdência Social e, mais tarde, em 1988, foi reconhecido pelaConstituição da República, no artigo 201.

    Ribeirao das Neves_MG, 09 de Janeiro de 2014 Imagens do primeiro presidio construido e administrado no regime de PPP (Parceria Publico Privada) no estado. Foto: LEO DRUMOND / NITRO
    Detentos em oficina de trabalho no primeiro presidio do regime de PPP (Parceria Publico Privada) em Minas Gerais

    O fato de se tratar de um auxílio previdenciário também faz com que seja necessário se destacar o seguinte: a Previdência Social é um fundo conhecido como solidário. Isso significa que empregados, empresas e Estado contribuem para garantir o bem-estar daqueles que ficarem impedidos de trabalhar por um período, seja por estarem sob a custódia do Estado, seja por estarem doentes, seja por terem alcançado uma idade avançada. Esses, por algum momento, também contribuíram para garantir o bem-estar de outros enquanto trabalhavam e contribuíam. O benefício recebido é proporcional ao que foi pago ao fundo anteriormente. Não há que se falar, portanto, em “homens de bem sustentando vagabundos”. E, claro, ninguém vai dizer que a culpa do tão alardeado “rombo da Previdência” é de um benefício que consome menos de 0,5% dos seus recursos, correto?

    Quem ajudar: agressores ou vítimas?

    Superada, então, a classificação de “bolsa-bandido”, já que estamos falando de trabalhadores, é preciso esclarecer outras questões fundamentais. Em primeiro lugar, aqueles que atacam o beneficio usam com frequência o subterfúgio de dizer que a vítima ficaria desamparada enquanto os bandidos seriam beneficiados. Pretendem, assim, garantir a empatia dos interlocutores, que, obviamente, tendem a ser mais condescendentes com os agredidos. É, como tantos outros, um argumento superficial que não leva em consideração que a mesma Previdência Social garante auxílios como pensão por morte ou aposentadoria por invalidez para as vítimas – esses responsáveis por aproximadamente 9% e 4%, respectivamente, dos gastos do fundo (lembrando que nem todos os casos tiveram como causa atos de violência). Em outro texto, podemos tratar também do trabalho realizado atrás das grades, que gera um salário do qual é retirado um terço para assistência de vítimas de violência.

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    Na foto, recuperando do regime fechado na APAC de Itauna

    Por último, a alegação de que o benefício seria um incentivo ao crime ao criar condições para que o “bandido” usufrua do dinheiro do Estado para sustentar a si e a sua família é, no mínimo, inocente – e, em muitos casos, demagoga e maldosa. Como se não bastasse estar enclausurado diariamente, obrigado a conviver em celas superlotadas, sem circulação de ar ou luz do sol, com pessoas com as quais não se possui vínculos afetivos e que, em tantos casos, têm histórico de violência, as celas brasileiras são absolutamente insalubres em sua maioria.

    De acordo com pesquisa da Fundação Getúlio Vargas, realizada nos presídios paulistanos, 58% dos detentos afirmam que não há água suficiente para beber, 95,3% disse ter sido agredido dentro das unidades prisionais e 58,7% alega não ter acesso a atendimento médico. Por causa dessas condições, a infecção por tuberculose, por exemplo, é quase 30% maior do que no restante da população. Se alguém acha um bom negócio trocar um trabalho de 8h diárias por um situação dessas 24h por dia, que se habilite no posto policial mais próximo.

  • Impunidade são 12 mil assassinatos por ano com quase ninguém na cadeia

    Impunidade são 12 mil assassinatos por ano com quase ninguém na cadeia

    Quando se completam 10 anos dos Crimes de Maio de 2006 (http://bit.ly/1Q4V0qS), 10 meses da chacina de Osasco (http://bit.ly/1XpCmMs) e pouco mais de 10 dias da morte do menino Ítalo por um policial no bairro do Morumbi em São Paulo (http://bit.ly/1Uzrjdz) e da execução de Brian em Ourinhos (http://bit.ly/28ES8Y5), o regime interino de Michel Temer, atendendo à chamada Bancada da Bala, tira a urgência da tramitação do projeto de lei enviado pela presidenta Dilma e pelo ex-ministro da Justiça, Eugênio Aragão, para endurecer a apuração de homicídios praticados pelas forças de segurança (http://nao.usem.xyz/8668).

    Mães de Maio- São Paulo - maio de 2015
    Mães de Maio- São Paulo – maio de 2015

    A quem interesse não apurar devidamente essas mortes? Infelizmente, boa parte da população, estimulada por uma mídia que alardeia diariamente a violência nas periferias, compra a ideia de que “bandido bom é bandido morto” (http://bit.ly/21mH4t7) sem perceber como essa violência afeta toda a sociedade. Por isso, também, o Brasil é campeão em homicídios no mundo, tem a polícia que mais mata e também a força policial mais vítima de assassinatos (http://bit.ly/1UPir6c). Violência gera violência e a impunidade alimenta esse ciclo. Não é à toa que as PMs são responsáveis, segundo dados oficiais, por 18% de todos os homicídios em São Paulo (http://bit.ly/1UdoxQU). Se extrapolarmos esses dados para os cerca de 60 mil assassinatos por ano no Brasil, teremos quase 12 mil mortos pelas forças de segurança.

    Manifestação contra chacina no Capão Redondo - São Paulo, janeiro de 2013
    Manifestação contra chacina no Capão Redondo – São Paulo, janeiro de 2013

    Outro dado alarmante é apenas 8% dos crimes de morte, excluindo os oficialmente identificados como “decorrentes de ação policial” são esclarecidos. Entre eles estão as inúmeras chacinas que ocorrem regularmente em todo o território nacional. Por todos esses motivos, discutir a violência policial deveria ser um dos temas mais importantes no Brasil. E isso tem sido feito por grupos como o Movimento Independente Mães de Maio (http://www.maesdemaio.com/) que há 10 anos lutam contra a impunidade e pedem a federalização das investigações de mortes em decorrência de ação policial. Os Jornalistas Livres têm acompanhado essa trajetória desde sua fundação, assim como nós da MediaQuatro (http://www.mediaquatro.com/) já há mais de cinco anos.

    Cemitério de Santos onde várias vítimas dos Crimes de maio estão enterradas - dia das mães 2014
    Cemitério de Santos onde várias vítimas dos Crimes de maio estão enterradas – dia das mães 2014

    Assim, convidamos a todos que compreendem a gravidade da situação a divulgar, visitar e colaborar com a exposição Bendito O Fruto (http://www.kickante.com.br/campanhas/apoio-ao-projeto-bendito-o-fruto) que retrata a violência policial e a atuação das Mães de Maio. A abertura acontece hoje, 15 de junho de 2016, às 18:00 no saguão do Bloco 5R da Universidade Federal de Uberlândia, Campus Santa Mônica, como parte da VI Jornada em Defesa do Estado Democrático de Direito e Democracia Social – Cidadania Direitos e Resistência, que ocorre nos auditórios A e B a partir das 19:00. A partir de amanhã até o dia 6 de julho, a mostra estará em exibição no Espaço Cultural do Mercado Municipal de Uberlândia. O objetivo do financiamento coletivo é permitir a realização da mostra em si e um evento de fechamento com debate, catálogo e a presença das Mães de Maio.

    https://www.youtube.com/watch?v=mjCuq6FNUV0

     

     

  • TEATRO: “Eu não quero viver em uma ditadura”, Caio Fernando Abreu

    TEATRO: “Eu não quero viver em uma ditadura”, Caio Fernando Abreu

    Por Caio Santos, especial para os Jornalistas Livres

    Quando disse a um amigo que ia ao teatro assistir a uma peça em homenagem ao Caio Fernando Abreu, ele ironizou:  “Para que uma peça em homenagem a ele?  O facebook e orkut já fazem isso.”

    A sua reação é compreensível. O escritor se tornou um clichê, citações dele aparecem recorrentemente em diferentes perfis das redes sociais: “Não doí mais. Mas dá saudade.” “Tudo que você precisa está na sua alma e em seu coração” “O tempo tem uma forma maravilhosa de nos mostrar o que realmente importa”. Essas e outras frases de efeito motivacionais são recortadas de seus textos e viralizadas na internet. Isto, em parte, fez com que sua obra fosse popularizada. No entanto, também se banaliza. Quantas destes compartilhadores conhecem sobre a vida do autor? E quantos de fato leram os contos originais?

    “Caio era um escritor muito marginal, era gay assumido, uma figura underground, libertária, relacionada às drogas e ao sexo. Ficou conhecido no meio por representar a voz de uma geração dos anos 70 e 80, dos jovens que viveram a ditadura, principalmente por uma escrita confessional e intimista, que se volta para dentro.” explica o dramaturgo Juarez Guimarães Dias. “Quando você edita três frases de um conto inteiro, empobrece as frases porque elas perdem o contexto. Então parece que são frases de autoajuda […], mas ele também estava preocupado sobre a ditadura e sobre o que estava acontecendo”.

    O espetáculo EuCaio, chegando agora na sua terceira temporada em Belo Horizonte, busca revelar este lado esquecido do autor. Com direção de Juarez Guimarães, os textos e a vida de Caio Fernando Abreu mostram uma consciência atormentada pela perseguição e pela violência política da época, manifestada em cena por um recurso próprio do teatro: o corpo.

    Imagem de Divulgação do Espetáculo Eu, Caio
    Imagem de Divulgação do Espetáculo Eu, Caio

    O ator Matheus Soriedem se contorce e se mutila, sofrendo pelos horrores da ditadura militar. Brutalizado, sua performance tem como cenário nada mais que um amontoado de carvão, marcando e realmente afetando o ator durante o espetáculo. O diretor confessou que chega a machucar  o artista, que recebeu acompanhamento médico para evitar lesões.

    Apesar da voz atormertada e do corpo martirizado, o mais assustador do espetáculo é sua atualidade. A cada temporada, seu texto é revisto, acrescentando referências a fatos recentes, porém condizentes com o clima de terror e opressão dos Anos de Chumbo. Os tiros disparados na Marcha das Mulheres Negras em Brasília, as mortes de trabalhadores do MST no Paraná e, em Minas Gerais, a liminar que proibia estudantes de discutirem o impeachment são alguns exemplos mencionados, todos que aconteceram nos últimos meses. EuCaio é uma peça documentário sobre a aflição de um tempo tragicamente próximo, o que torna esta citação de Caio Fernando Abreu, pouco compartilhada, tão adequada aos dias de hoje: “Eu não quero viver em uma ditadura”.

    EuCaio está em cartaz no Teatro Marília, de  10 a 19  de Junho de 2016, de sexta-feira a domingo, sempre às 20:00. A entrada é R$20,00 (meia R$10,00). Mais informações (31) 3277-6319.

  • O Trabalhador

    O Trabalhador

    Primeiro de maio, dia do trabalho.

    O povo “celebrado” pela data se vê vencido, sujeitado e encurralado por um golpe que fere, antes de tudo, as suas conquistas. Quão poucas, já roucas.

    O trabalhador que não dorme, que se fere, que sangra, que morre. Não entra para a história. Não tem tempo de sonhar, nem sabe o que é sonho. Trabalho imposto, forçado, que deixa a vontade de lado.

    Quando é artista, vagabundo ativista. Senão ferramenta da máquina da vida, que enferruja e vai pro lixo. Sem saída. Sem verniz, sem polimento.

    “Ai, não encosta essa mão suja, grossa.”

    Suja, grossa, sim. Resistência, sobrevivência. Símbolo da minha luta, do pouco ar que me permitiram respirar.

    Não tem liberdade, mas dizem que é livre pra escolher. E pra viver?

    “Esta cova em que estás, com palmos medida
    Não é cova grande, é cova medida
    É a terra que querias ver dividida”

    (Funeral de um Lavrador – Chico Buarque)

    Midia Ninja

    Mas vai entender. Mesmo sabendo ser estatística, visto como “aquela classe”, os carteiras-assinadas se erguem na dor, encontram seus iguais, olham para o céu, fecham os olhos e respiram o ar da luta. Não é a luta pelo trabalho, é pelo trabalhador. É pela dignidade. É pela escolha.

    Mesmo com olhos embotados de cimento e lágrima, enfrentam o doutô, enfrentam o futuro e mudam a história de “fim” para “começo”. Das trancas para oportunidades. O suor, enfim, encontra seu verdadeiro trabalho. O trabalho pelo trabalhador.

    “O operário foi tomado
    De uma súbita emoção
    Ao constatar assombrado
    Que tudo naquela mesa
    – Garrafa, prato, facão
    Era ele quem fazia
    Ele, um humilde operário
    Um operário em construção.
    Olhou em torno: a gamela
    Banco, enxerga, caldeirão
    Vidro, parede, janela
    Casa, cidade, nação!
    Tudo, tudo o que existia
    Era ele quem os fazia
    Ele, um humilde operário
    Um operário que sabia
    Exercer a profissão.”

    (Operário em Construção – Vinícius de Moraes)

  • Jorge: mais um retrato da criminalização dos movimentos sociais no Brasil

    Jorge: mais um retrato da criminalização dos movimentos sociais no Brasil

    ‘O que é o judiciário para o homem do povo?’ Para o povo do Vale do Urucuia, em Minas Gerais, justiça trabalha para criminalizar lideranças de movimentos que defendem a reforma agrária e lutam contra a desertificação da região noroeste

     

    No dia 25 de fevereiro de 2014, sob o sol forte do sertão, centenas de pessoas saíram em passeata pelas ruas de Buritis, no Vale do Urucuia, em Minas Gerais, região eternizada na obra de Guimarães Rosa,  Grande Sertão: Veredas. Jorge, conhecido como Jorge do PT e tido como pacificador de conflitos agrários, havia sido condenado, em quatro processos, a 26 anos e 7 meses de prisão.

    O Sindicato dos Trablhadores da Agricultra Familiar havia convocado a população, por meio de uma carta aberta, a se manifestar a favor de Jorge: “Quem de nós, em sã consciência, pode dizer que suas sentenças estão a serviço de uma efetiva justiça social? O que é o judiciário para o homem do povo, senão o triste prolongamento do aparelho repressor estatal? O que é o judiciário para o desempregado sem estabilidade, para o sem-terra, para os deserdados da vida, enfim, senão a ponta de lança de um sistema econômico elitista, pronto para a estocada final? ”

    Na Assembleia Legislativa de Minas Gerais também houve crítica à atuação do judiciário de Buritis. O deputado Nilmário Miranda, do Partido dos Trabalhadores, afirmou que a condenação de militantes de movimentos sociais está se tornando uma prática: “Condenar a penas elevadas dirigentes de movimentos que querem fazer valer a função social da propriedade e caçar os foragidos como se fossem bandidos de alta periculosidade é dar caráter político e ideológico ao judiciário”, afirmou o deputado, que ainda denunciou outros casos de condenação na região, como o de Adriano Paiva Coutinho, preso antes mesmo da publicação da sentença, e de outros dois militantes condenados a mais de 7 anos de prisão pela ocupação pacífica de uma agência do Banco do Brasil.

    Jorge do PT ou do MST

    Jorge é pai de 15 filhos. Pessoa alegre e que está sempre de prontidão para ajudar as pessoas necessitadas, é o que dizem de Jorge em toda a região do Vale do Urucuia. É portador de bons antecedentes. Ao longo da militância pela reforma agrária e contra o desmatamento e secamento de importantes rios e córregos, se envolveu em alguns processos na justiça.

    Sempre foi um um agricultor/político/ militante conhecido. Em 2002, quando a fazenda do ex presidente da República Fernando Henrique Cardoso foi ocupada, Jorge estava lá e já era liderança. Líder maior do MST na região, Jorge integrava o Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura Familiar; a Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar do Distrito Federal e Entorno; o Comitê de Defesa da Bacia Hidrográfica do Rio Urucuia; presidia o Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores de Buritis e era Diretor Coordenador do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Econômico – IBRADEC.

    Jorge foi o vereador mais votado em 2008 no município e presidiu a Câmara enquanto legislou. O que explica a movimentação contra a sua condenação.  A maioria dos manifestantes eram trabalhdores, e principalmente assentados: há 21 assentamentos em Buritis, provenientes de reforma agrária, onde vivem mais de 1.000 famílias que produzem alimentos de forma sustentável.

    A condenação de Jorge

    Em 20 anos de luta, nenhum processo contra Jorge havia avançado e sido tão sério como o de 2014: ele responderia por crimes de dano ao patrimônio e furto. O dano: o uso de um trator da prefeitura para arar a terra durante uma ocupação, que foi devolvido depois. O furto: um grampeador que sumiu de uma agência ocupada por assentados a favor de uma liberação de crédito.

    Na verdade Jorge nem teria a oportunidade de responder.

    Tudo começou em janeiro de 2014, quando uma publicação na página do Facebook de Jorge não agradou ao juiz da Comarca, Dalmo Luiz Silva. A postagem se referia a um processo contra um companheiro de luta de Jorge. Era de fato uma crítica à atuação do judiciário. Mas o processo não corria em segredo. No mesmo dia em que Jorge prestava esclarecimentos sobre o fato à Polícia Civil, o julgado, Ellyanderson, foi transferido para outra comarca, com a justificativa de que ele apresentava periculosidade, mesmo sendo réu primário, preso provisório (a prisão ocorreu em novembro de 2013 mas a condenação se deu em abril de 2014) e tendo residência fixa e bons antecedentes.

    De acordo com representação feita pela advogada de Jorge à Anistia Internacional, foram forjados depoimentos de agentes de segurança contra Ellyanderson e Jorge. O magistrado envolveu o judiciário do Estado contra os “bandidos perigosos”, por meio da entidade Amagis – Associação dos Magistrados Mineiros, que declarou em nota, divulgada no dia 13 de janeiro de 2014, que os acusados representavam um atentado contra o Estado de Direito, ao utilizar uma rede criminosa (?). A tal rede criminosa é o perfil de Jorge do PT no Facebook, onde a postagem com a crítica ao juiz foi feita.

    Para Jorge a punição foi maior: após três dias do depoimento à Polícia Civil sobre a postagem nas redes sociais, o juiz condenou Jorge a quatro sentenças, TODAS NA MESMA SEMANA. Não satisfeito, o juiz também decretou prisão preventiva de José Irene Ribeiro Ribas, no dia 20 de março de 2014. José Irene, assessor político e amigo de Jorge, foi preso em sua residência à noite, acusado de estupro de vulnerável. Sem laudo pericial, sem direito à defesa ou algo parecido. Dois dias depois da prisão decretada, a suposta vítima refez o depoimento, que isentava o acusado do estupro. Mesmo assim, o juiz não revogou a prisão.

    José Ribas, como é conhecido, conseguiu provar sua inocência em outra comarca, por um juiz plantonista. Tudo leva a crer que José Ribas foi condenado pelo juiz por comentar a publicação na página de Jorge do PT (sério?). O inocente ficou preso por três dias, teve sua imagem associada a um crime de estupro de vulnerável e correu risco de morte na prisão.

    A prisão de Jorge

    O mandado de prisão de Jorge foi expedido no dia 27 de janeiro de 2014. Ele permaneceu foragido por mais de dois anos. Foi preso no dia 26 do mês passado em um assentamento. Policiais militares foram registrar uma ocorrência por agressão doméstica em uma comunidade rural de Buritis, mas acabaram pegando Jorge.

    A defesa de Jorge entrou com representaçao na Anistia Internacional e também no Conselho Nacional de Justiça. Mas Jorge segue perdendo. Os pedidos de revogação da prisão preventiva e concessão de regime semiaberto foram negados no dia 4 deste mês. O dirigente terá de cumprir 14 anos, 11 meses e 26 dias de prisão em regime fechado.

    O juiz que negou os pedidos, João Henrique Bressan de Souza, afirma na decisão que a vinculação de Jorge a movimentos sociais pode gerar atos violentos contra o poder público e a sociedade. (?)

    Enquanto o judiciário criminaliza lideranças importantes de movimentos sociais, fica mais fácil para os fazendeiros desmatar o cerrado e “roubar” água de rios e córregos para irrigar sua monocultura. E quem está contra a sociedade é Jorge.