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Categoria: LGBT

  • Plano Municipal de Educação de São Paulo: os bastidores de uma derrota anunciada

    Plano Municipal de Educação de São Paulo: os bastidores de uma derrota anunciada

     

    Com apenas 2 votos a favor de manter as expressões de gênero, diversidade e orientação sexual no Plano Municipal de Educação de São Paulo, os vereadores da capital paulista protagonizam um grande retrocesso no acesso a direitos humanos, pautados pelas demandas de uma igreja católica retrógrada e atrasada

    Com fotos de Ennio Brauns

    Na contra-mão da história, São Paulo — a quarta maior cidade do mundo e a maior da América do Sul — perde a oportunidade de construir uma democracia em que todas as pessoas são contempladas independente de etnia, credo, sexo, orientação sexual e identidade de gênero. Ao mesmo tempo, em São Francisco, Califórnia (EUA), o curso “História do movimento LGBT” é instituído no ensino médio das escolas públicas.

    Perdemos feio. Ou melhor, a democracia e a luta pelos direitos humanos no Brasil sofreram uma derrota fragorosa: 2 votos contra e 42 a favor do texto final do PME-SP (Plano Municipal de Educação de São Paulo), que retirou expressões como “gênero”, “orientação sexual” e “diversidade” de seu escopo. Mas essas questões permanecem no ambiente escolar junto a uma grande parcela da população com grandes dificuldades de frequentar as salas de aula. Porque é na escola que o preconceito, a discriminação e a violência misógina e homotransfóbica é reproduzida e disseminada.

    Os 11 ônibus que chegaram na frente da Câmara paulista logo nas primeiras horas da manhã, traziam um pequena multidão. Munidos de um trio elétrico, fiéis e padres se revezavam em canções e discursos em “defesa da família”(hetero, cisgênera e católica). De fora a fora do carro alegórico, um cartaz imenso com a bandeira brasileira exprimia também uma posição política: a igreja católica, que apoiou o golpe militar de 1964, retoma sua posição no conturbado cenário de instabilidade política e econômica ao lado daqueles que querem golpear a ordem democrática para propor o deposição da presidenta eleita pela maioria do povo brasileiro. Aos poucos um cenário nefasto vai sendo montado onde uma questão dialoga com a outra: ao mesmo tempo em que os discursos clamam pela defesa da família, fiéis são convocados a comparecer na manifestação do dia 16/8, do movimento de oposição “Vem pra rua”, que pede o impeachment.

    A igreja católica, agora assumindo integralmente a direção da “guerra santa”, em parceria com políticos conservadores, aparelhou a Câmara Municipal, criou um palanque em frente ao órgão público que deveria representar e contemplar tod@s @s cidad@os para proclamar que tem poder sobre as decisões de um Estado que se diz laico mas se dobra ao “poder divino”. Não é à toa que um grande crucifixo repousa firme e sólido sobre as cabeças dos políticos no plenário.

    Dom Odilo, o grande maestro dessa sórdida sinfonia teocrática neofascista, ligou para o presidente da Câmara e marcou audiência com os relatores para impedir que a “ideologia de gênero” fosse implantada nas escolas. Essa, sim, é uma elaboração ideológica de má-fé para manipular fieis desinformados que repetem frases desconexas sobre um tema que não compreendem e nem vão compreender. Lotaram a entrada com camisetas brancas mas não era paz que queriam, não era o amor que seu mestre Jesus Cristo ensinou o que levava aquela gente a se juntar. Foram armados com discursos de ódio, praguejando e cuspindo frases como: “Você vai queimar no inferno!”. No caminhão conseguido às pressas para as pessoas que defendiam os direitos humanos, algumas lideranças lgbts, feministas e ativistas em geral se revezavam para pelo menos neutralizar a violência do ataque fundamentalista. Travaram uma verdadeira batalha com ofensas aos gritos dentro e fora da Câmara. Lotaram o plenarinho e a parte que lhe cabia da galeria.

    O final daquela história a gente já conhecia. Sabíamos que íamos perder. Mas não daquela forma vergonhosa. Não para nós, população vulnerável. O que aconteceu é uma vergonha para o Brasil. Políticos, como sempre, cederam não só à pressão moralista conservadora da igreja, mas também às propostas que contemplam seus umbigos e partidos… Lamentável. Os tradicionais partidos de direita foram coerentes com seu histórico de desrespeito aos direitos humanos, mas o que causou revolta e muitos posts nas redes sociais foi a decisão do PT, que mais uma vez deixou de contemplar uma de suas maiores bandeiras com medo de se envolver em pautas que trouxessem mais desgaste político. Ficou em cima do muro até o último instante, quando capitulou, e por unanimidade disse SIM ao texto racista, misógino e homotransfóbico do PME-SP. Justificou sua adesão ao texto final como um recuou para não perder as conquistas mais amplas como qualidade da educação, relação professor x aluno, e mais creches… Ventila-se nos bastidores que houve uma negociação entre a prefeitura e Dom Odilo sobre as creches conveniadas de propriedade da igreja católica. Se são boatos ou não, saberemos na sequência. Disseram também que é possível avançar e reconquistar o que foi perdido mudando a linguagem nas emendas que forem apresentadas na próxima eleição do dia 25 . Papo para boi dormir. Já era! Se perdemos agora, perderemos depois… É fato!

    Depois que PT chegou no “fechamento de questão”, a vereadora petista Juliana Cardoso, única guerreira a assumir integralmente as atividades em defesa das populações vulneráveis, criando o ato do dia 5/8, que lotou a platéia do Salão Nobre da Câmara de ativistas e representantes de entidades de direitos humanos e comunidade científica, teve que ceder e votar contra suas convicções por ser líder da bancada dos vereadores do PT. De outra forma, seu voto seria caracterizado como quebra de fidelidade partidária.

    O PT foi criado sobre duas grandes correntes: sindicalistas da CUT e militantes de esquerda católicos das CEBs, adeptos da teologia da libertação. Essa formação católica do partido é evidente até hoje. Todos os vereadores petistas são católicos praticantes e se elegeram majoritariamente com votos da comunidade católica. Quatro deles são ligados à comunidade católica da Zona Sul, a mais conservadora, que tem tomado a frente na “guerra santa”. Não é de se espantar a unanimidade do voto a favor.

    Eu me pergunto quantas mulheres precisarão ser agredidas e estupradas? Quantos gays, lésbicas e bissexuais precisarão ser acuados com chacotas cotidianas? Quantas travestis, mulheres transexuais e homens trans precisarão ser expulsos das escolas para que os representantes eleitos pelo povo reflitam sobre a necessidade fundamental de se transmitir noções de direitos humanos voltados para a igualdade e identidade de gênero, e respeito à orientação sexual de cada criança? Quantas vidas valem a viabilidade política e econômica de projetos políticos?

    Até a Rede Globo, que sempre defendeu valores tradicionais, colocou duas lésbicas com um filho formando uma família homoafetiva numa novela de horário nobre. Já está em fase de pesquisa a nova novela que tratará do tema da transexualidade, bem agora, com esse levante conservador da igreja atacando as garantias de acesso à cidadania da população lgbt .

    A realidade é que os partidos de esquerda não mobilizaram suas bases, principalmente os setoriais lgbts, não fizeram nenhum chamamento para levar militantes pra fazer frente aquela invasão católica da Câmara Municipal. Bastava 0,001% da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo. É muito estranho ver que a esquerda ainda não abraçou a causa lgbt, por razões históricas. Nos anos 80, o nascente ativismo homossexual e o feminismo foram acusados de dividir a luta maior dos trabalhadores, de serem frutos de resquícios burgueses, que não levavam em consideração os efeitos da opressão dos patrões sobre os trabalhadores… Houve até lideranças da esquerda que fizeram declarações do tipo: “o trabalhador bate na mulher porque é oprimido pelos patrões.”

     

     

  • A educação é a base da inclusão social para travestis e transexuais

    A educação é a base da inclusão social para travestis e transexuais

     

    “Tenho 37 anos. Eu me prostituo desde os 16 anos. É uma vida muito triste que eu passei. Hoje eu não passo mais, e esse é o caminho: a educação!”


    Foi com essas palavras que a travesti Aline Marques, que aparece na foto acima, arrancou lágrimas e aplausos do auditório lotado do salão nobre da Câmara Municipal de São Paulo, durante o ato “Respeito se Aprende na Escola”, realizado no último dia 5 (quarta-feira). Aline é bolsista do programa Transcidadania, da Prefeitura de São Paulo, que disponibiliza R$ 827,40 mensais para travestis e transexuais em situação de vulnerabilidade social que querem voltar a estudar.

    O ato “Respeito se Aprende na Escola” reuniu polític@s , ativistas, feministas, artistas, e representantes de entidades LGBTs científicas e educacionais, e marcou o início de uma semana de atividades de resistência e enfrentamento aos fundamentalistas religiosos que querem excluir questões de gênero do PME-SP (Plano Municipal de Educação de São Paulo). Todos esses ativistas prometem lotar o plenário da Câmara no dia 11 por ocasião da votação do projeto.

    “Nós não devíamos estar na mão de pessoas que acham que a religião pode interferir na vida das pessoas.Isso não pode acontecer”, disse Aline em seu emocionante depoimento.

    Ela e outros 20 travestis e mulheres transexuais chegaram cedo à concentração realizada antes do ato, participando ativamente de uma ação política que elas sabem o quanto é importante: defender o debate democrático nas escolas sobre questões de gênero que afetam diretamente a comunidade T, e que podem desenvolver dispositivos que combatam a transfobia nos ambientes escolares. Há estudos que mostram a trágica evasão escolar de travestis, mulheres transexuais e homens trans, causada pela intolerância e pelo preconceito. É uma forma de acabar excluindo, por tabela, essas pessoas do convívio social e do mercado de trabalho.

    Durante sua fala, Aline chamou uma companheira de nome Joana D’arc que estava de óculos escuros, e pediu para que ela mostrasse seus olhos inchados, prova de que fora vítima de violência nas ruas. Joana foi espancada num bar por um grupo de amigos que estavam bebendo e começaram a agredi-la “somente por que é uma travesti — foi isso que esses covardes falaram”.

    Essa é “a realidade da vida de uma travesti, de uma transexual quando elas estão no meio da sociedade, quando não tem educação”. Aline se refere à prostituição como única possibilidade de sobrevivência quando não se tem acesso à educação e à qualificação profissional. E nas ruas muitas estão expostas a todo tipo de violência e maus tratos, quando não são assassinadas. Prova disso é que os jornais publicam diariamente tragédias envolvendo travestis e transexuais em situação de vulnerabilidade social.

    No final de sua fala, Aline elogiou o programa Transcidadania, que precisa deixar de ser só um projeto piloto para pouc@s e expandir seus benefícios diante da grande população de travestis e transexuais em situação de rua em São Paulo. Um salário mínimo mal paga o aluguel, fazendo com que a maioria continue na prostituição para sobreviver. É preciso pensar também em como incluir @s estudantes no mercado de trabalho formal.

    Aline conseguiu se empregar e hoje vive com a soma do dinheiro da bolsa com o salário:

    “Nós, com esse projeto, voltamos a viver, voltamos à escola. Eu pude ter a minha vida de volta. Hoje tenho um emprego como agente de prevenção, que me dá uma grana bacana, para que eu não precise me prostituir. Levo minha comida pra casa sem me prostituir.”

    Luiza Coppieters, a professora de filosofia do Colégio Anglo, que foi demitida depois de assumir sua transexualidade, também fez uma fala inflamada , lembrando que nós, travestis, mulheres transexuais e homens trans precisamos ocupar os espaços, nas ruas, nas escolas, nas universidade, no mercado de trabalho, e também ocupar as tribunas dos centros de poder político. Ela faz parte de uma pequena parcela de pessoas Ts que conseguiram suportar a violência transfóbica nos ambientes escolares e se alçaram ao ensino superior. Mas foi cassada no seu direito de educadora quando fez a transição para o gênero feminino (https://medium.com/jornalistas-livres/col%C3%A9gio-anglo-%C3%A9-denunciado-por-transfobia-e79f80bf9058)

    A articulação política de travestis, mulheres transexuais e homens trans não tem mais de duas décadas, mas já começa a incomodar os setores reacionários, que não admitem e não conseguem viver com as diferenças…Não conseguem viver em harmonia num regime democrático. São os mesmo fascistas que saem às ruas pedindo a volta da Ditadura.

    Jornalistas Livres faz um chamamento a tod@s travestis, mulheres transexuais e homens trans para que contem suas histórias de discriminação e intolerância na escola, enviando seus depoimentos para o email : jornalistaslivres@gmail.com.

     

  • Respeito se Aprende na Escola! Contra a discriminação, o ódio e a perseguição dos fundamentalistas religiosos

    Respeito se Aprende na Escola! Contra a discriminação, o ódio e a perseguição dos fundamentalistas religiosos

    Hoje, dia 5, às 19h, será realizado um Ato na Câmara Municipal de São Paulo em repúdio a “manifestações de intolerância e intromissão fundamentalista na votação do Plano Municipal de Educação de São Paulo(PME-SP)”. É uma iniciativa dos movimentos sociais e da sociedade civil, preocupados com o avanço de setores conservadores que tentam minar as conquistas de direitos, atacando frontalmente a democracia e o Estado laico brasileiro. Participam da ação 110 entidades científicas e de direitos humanos.

    Numa ação orquestrada pelos setores mais conservadores e reacionários da Igreja Católica e de várias denominações evangélicas, vereadores de todos os municípios do Brasil estão sendo pressionados pelos párocos locais, para retirar dos textos finais dos Projetos Municipais de Educação, os termos “gênero”, “orientação sexual” e “diversidade”. Em São Paulo, vereadores já retiraram todas as referências a questões de gênero e sexualidade do texto final, que volta para o plenário no dia 11 de agosto em nova votação.

    Ontem, véspera do Ato, o vereador do PSDB Eduardo Tuma, representante da bancada da bala, realizou um seminário sobre “ideologia de Gênero”, uma expressão usada pela igreja católica para desqualificar e atacar a luta pela emancipação das mulheres e pelos direitos civis de populações socialmente vulneráveis, como as pessoas LGBTs. O seminário foi realizado em parceria com a Renovação Carismática, uma denominação católica que prega que “o pecado é ação contrária à vontade de Deus e é a fonte de todos os males existentes na sociedade”. Na entrada do seminário foi distribuída uma cartilha com um conteúdo preparado para incutir terror nas pessoas. Está escrito lá —um exemplo de mentira, canalhice e covardia :

    “O que acontecerá caso aprovem a ideologia de gênero nas escolas? Todas as nossas crianças deverão aprender que não são meninos ou meninas, e que precisam inventar um gênero para si mesmas. Para isso, receberão materiais didáticos destinados a deformar sua identidade. E isso seria obrigatório por lei.”

    A expressão “Ideologia de Gênero” foi falada pela primeira vez pelo papa Bento 16, num discurso proferido à Cúria Romana em 21 de dezembro de 2012.

    “…sob o vocábulo «gender — gênero», é apresentado como nova filosofia da sexualidade, a “Ideologia de Gênero”. De acordo com tal filosofia, o sexo já não é um dado originário da natureza que o homem deve aceitar e preencher pessoalmente de significado, mas uma função social que cada qual decide autonomamente (…). Salta aos olhos a profunda falsidade desta teoria e da revolução antropológica que lhe está subjacente. (…) Se, porém, não há a dualidade de homem e mulher como um dado da criação, então deixa de existir também a família como realidade pré-estabelecida pela criação.”

    O mito essencialista de que a natureza não só produz corpos como também comportamentos, e que homens e mulheres já nasceriam com as características que hoje conhecemos, foi derrubado pela antropóloga Margareth Mead em 1937, quando ela publicou o livro: “Sexo e temperamento”, um relato de suas pesquisas na Nova Guiné. Ao pesquisar três tribos de nativos, ela encontrou três modelos distintos de “homem” e “mulher”, completamente diferente dos modelos que nós conhecemos. Esse livro é tido como o estopim do movimento feminista internacional.

    Quando o papa atual, em sua recente viagem pela América Latina condenou as “ideologias” se referia também à “ideologia de gênero”que ele condena:

    “A ideologia de gênero é um erro da mente humana que provoca muita confusão, onde a família está sendo atacada.” disse Francisco num discurso dirigido aos jovens numa viagem a Nápoles, Itália. Ele denunciou ainda a existência de uma estratégia para impor a “ideologia de gênero” em países em desenvolvimento por meio de formas “chantagistas” de oferta de ajuda, o que Francisco denominou de “colonização ideológica”.

    Segundo Francisco, existem atualmente tipos semelhantes a “Herodes” modernos que “destroem, que tramam projetos de morte, que desfiguram a face do homem e da mulher, destruindo a criação.”

    Um vídeo no youtube (https://youtu.be/rPQfcGKR0FI) contém a explicação do que seria a tal “ideologia de gênero”, na conceituação da extrema-direita neofascista teocrática que quer golpear o Estado laico e a democracia brasileira.

    Transcrevo aqui uma parte esclarecedora :

    “A ideologia de gênero nasce apoiada na filosofia marxista de luta de classes onde Frederic Engels diz: a primeira opressão de uma classe surge “pelo antagonismo homem mulher, sexo feminino pelo masculino.” Ela está apoiada no “movimento feminista radical dos anos 60 e 70, que apoiado na filosofia marxista (…) e nas ideias da filósofa francesa Simone de Beauvoir que disse “ninguém nasce mulher, mas sim torna-se mulher”.

    Um dos alvos principais desse factóide criado pela Igreja Católica é a emancipação das mulheres, visando à perpetuação de posições misóginas e machistas dentro das instituições de ensino. Não falar sobre sexualidade nas escolas é negar informações importantes, como os cuidados que se deve ter com relação à contracepção (não se pode esquecer que a Igreja até hoje mantém-se contrária ao uso de contraceptivos e de preservativos, além de condenar o aborto), e para a prevenção das doenças sexualmente transmitidas.

    Mulher católica reza o terço durante discussão na Câmara sobre o Plano Municipal de Educação

    O catolicismo não condena diretamente a homossexualidade, mas considera que são pessoas “intrinsecamente desordenadas” que só podem ser incluídas nas comunidades cristãs se mantiverem o celibato — a prática da “sodomia” é considerada pecado. Retirar a expressão “orientação sexual” dos Planos Municipais de Educação é impedir que dispositivos de prevenção à homofobia sejam implantados nas instituições de ensino, e expor gays, lésbicas e bissexuais a violências cotidianas. Por tabela, as famílias homoafetivas são desqualificadas e combatidas, em nome de um modelo heteronormativo, considerado “natural”.

    Mas os fundamentalistas religiosos que atacam aquilo que chamam de “ideologia de gênero”, têm descarregado toda a sua artilharia sobre a comunidade de travestis, mulheres transexuais e homens trans, que tem se fortalecido em sua luta por direitos civis nos últimos tempos. Foram vários os ataques transfóbicos recentes das bancadas católica e evangélica, unidas à bancada da bala, com projetos tentando anular direitos já adquiridos. Cito, entre os principais, a decisão do Conselho Nacional de Combate à Discriminação e promoções dos direitos de lésbicas, gays, travestis e transexuais (CNCD/LGB), que garantiu o nome social em todas as instituições educacionais públicas e privadas, o uso de uniformes condizentes com a expressão de gênero autodeclarada, e do banheiro mais adequado. Todos esses direitos serão comprometidos se questões relativas a gênero não puderem fazer parte dos currículos escolares. A maior parte de travestis e uma parte considerável de mulheres transexuais e homens trans não têm nem o ensino fundamental completo, porque acabam abandonando a escola, atacados que são por sua expressão de gênero não-reconhecida.

    Sem informação, a homo-lesbo-transfobia vai continuar fazendo suas vítimas dentro e fora das salas de aula.

    Em depoimento, o ativista Adriano Diogo, um dos apoiadores do Ato, declarou que será “um erro gravíssimo, o dia em que, na escola, você não puder aceitar as crianças do jeito que elas são e não dar a elas o direito à liberdade de expressão e ao devido tratamento; você está criando uma forma de exclusão enorme pra uma faixa da população. É uma coisa perigosíssima porque qualquer pessoa dentro da escola e até pai de aluno poderá expulsar um aluno que destoe da heteronormatividade. O que está atrás disso tudo na realidade é uma enorme perseguição a qualquer manifestação LGBT. É uma coisa medieval, terrível de alguns setores religiosos que não aceitam que o mundo tenha essas características. Não só não aceitam como querem punir quem aceita. Daqui a pouco a Câmara vai votar a revogação da teoria de evolução de Darwin, aprovar o criacionismo (que defende o mito bíblico da origem da humanidade em Adão e Eva), a revogação da Lei internacional dos direitos humanos. E sabe-se lá o que eles podem inventar de pior…”

    “Família que exclui LGBT não é Família!”: manifestantes exigiram respeito e laicidade nas escolas

     

  • Rostos visíveis: quem deu a cara à tapa na parada LGBT de BH!

    Rostos visíveis: quem deu a cara à tapa na parada LGBT de BH!

    Da militância às cores e à festividade, a Parada LGBT de Belo Horizonte, realizada hoje (19/07), quebrou paradigmas e serviu para renovar as energias dos que lutam todos os dias para sobreviver e garantir os seus direitos na sociedade.

    Fotos: Pedro Gontijo / Jornalistas Livres

     

     

  • Parada LGBT BH 2015: um local de (R)existência e identidade

    Parada LGBT BH 2015: um local de (R)existência e identidade

     

    Parada LGBT BH 2015: um local de (R)existência “As pessoas sabem que a gente existe, mas elas querem jogar a gente de lado” — diz Anyky Lima, presidente da Cellos MG e representante estadual da ANTRA

    A capital mineira entardeceu com a imensidão das cores da diversidade invadindo a Praça da Estação e as ruas neste domingo, 19 de julho. Mais de 50 mil pessoas saíram de suas casas para desfilar contra o preconceito e a invisibilidade que sofrem os movimentos que integram a sigla LGBT.

    Pedro Gontijo / Jornalistas Livres

    A mobilização daqueles que a sociedade nega e põe à margem deve ser diária. Anyky Lima, presidente do Cellos MG e representante mineira da ANTRA (Associação Nacional das Travestis e Transexuais), ressalta o poder desta data como o símbolo da batalha diária de ser LGBT: “Nós usamos este dia para reivindicar direitos e para mostrar que a gente existe e que a travesti é um ser humano. A Parada pra mim é um dia de luta, como outro qualquer, que a gente luta o ano inteiro e a vida inteira, mas além de ser um dia de luta é um dia de felicidade, que a gente vai pra rua mostrar que a gente existe.”

    Mostrar-se ao olhar do outro que interpela e questiona a existência LGBT e seu direito de pertencer à sociedade, para Anyky, é o desafio: “A travesti e a transexual tem que ocupar todos os espaços. Eu tô aqui representando mas eu quero que outras meninas apareçam e ocupem este espaço. É uma coisa que você tem que conquistar, ninguém vai te dar de mão beijada”.

    Nicole Marinho / Jornalistas Livres

    Esbanjando sempre um sorriso, Anyky ressalta que “já tiveram muitas coisas boas por aqui, casamentos, avanços na área da saúde, tudo aqui é um recomeço e a gente vai lutando para conquistar mais avanços a cada dia”. Mas também questiona os avanços e retrocessos dos últimos tempos: “o nome social não é uma lei, é uma portaria, então pra mim ele não tem muito valor, tem lugares que as pessoas não respeitam”.

    A Parada LGBT de Belo Horizonte contou com apresentações artísticas e falas dos principais movimentos envolvidos e autoridades apoiadoras da causa. Nilmário Miranda, Secretário de Estado de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania de Minas Gerais, também manifestou seu repúdio ao preconceito. “Eu participo das Paradas há mais de 20 anos, o movimento foi crescendo, virou uma multidão e um movimento social. Mais de 30 cidades fazem paradas hoje em dia, e houveram conquistas muito boas no judiciário, na sociedade e na mídia para romper esta discriminação. Acho que o nosso objetivo é acabar com toda forma de preconceito, que faz muito mal a uma sociedade.”

    Pedro Gontijo / Jornalistas Livres

    Pós-abertura, três trios elétricos se alinharam para fazer o percurso que trouxe o grito e também toda a alegria e energia dos movimentos LGBT às ruas da cidade. A Parada seguiu pela Rua da Bahia até a Av. Afonso Pena rumando sentido à Av. Professor Moraes.

    Ao lado dos trios, as reivindicações eram semelhantes. Aléxia Star, drag queen há 2 anos, indica para a sociedade: “vamos nos conscientizar, vamos nos tratar com respeito que é o que estamos precisando para um mundo melhor e com paz”. A transformista Eli Moon compartilha da mesma ideia, retomando o intuito da data: “hoje em dia a Parada do orgulho LGBT tem perdido muito foco, na verdade a gente não pode perder o intuito, a Parada existe para que a gente peça respeito”.

    Pedro Gontijo / Jornalistas Livres

    O tão pedido respeito vem aos poucos, mas o avanço da aceitação fica nítido quando se nota a presença, ainda que sutil, dos ativistas do Movimento em Cores, Doutra Forma e Redenção Pedro II, ligados a igrejas que veem as pessoas LGBT com amor. “A gente queria quebrar o preconceito que a igreja tem com todo este movimento, porque somos cristãos e Jesus não tem preconceito, então quem é de Jesus também não tem. Quem julga as pessoas, não tem tempo para amá-las”, explica Esther Roth, representante do grupo cristão que levou diversas bandeiras à Parada.

    Pedro Gontijo / Jornalistas Livres

    Em união à fala de Esther, a drag queen Aléxia também enxerga esperança para o conflito entre algumas religiões e o movimento LGBT. “Na verdade isso é um movimento, as pessoas estão vindo aqui para criar um mundo sem preconceito”. O contraponto é feito pela Presidente da Associação das Prostitutas de Minas Gerais, Cida Vieira: “essa marcha é uma marcha muito importante e nos permite falar sobre a “Putafobia”, que existe no mundo inteiro e não é vista”.

    Nicole Marinho / Jornalistas Livres

    A prostituição é pauta fundamental à Parada, e segundo Cida, a discussão ainda não acontece como deveria. “Nós invadimos as paradas , porque quando você fala em LGBT existem as profissionais do sexo, gays, lésbicas, trans. Nós, profissionais do sexo, muitas vezes somos bissexuais também”. Quando questionada, Cida diz que sua presença na Parada tem uma razão gritante: “Contra a violência dos profissionais do sexo, tendo em vista vários assassinatos sem estatística. A profissional existe e somos assim reais”. Crítica, Cida pede por mais direitos e visibilidade: “hoje a gente está discutindo também com o LGBT e passando o Luiz XV nesta sociedade que nos usa e não nos assume”.

    Ao fim da Parada, os paetês parecem seguir de volta pra caixa, o fazem e eles continuam a reluzir, porém, distantes. Ainda brilhando em resistência, eles deixam claro que não se pode ofuscar aqueles que nasceram pra brilhar.

    Pedro Gontijo / Jornalistas Livres 

     

  • Dicionário muda definição de ‘casamento’ para integrar LGBT

    Dicionário muda definição de ‘casamento’ para integrar LGBT

    No último dia 29 de junho, uma das maiores plataformas de petições e abaixo-assinados da Internet, a Change.Org, circulou um abaixo-assinado feito pelo internauta Eduardo Santarelo. No documento, Santarelo pedia à editora Melhoramentos que mudasse, em seu dicionário, a definição de “casamento”, em respeito aos casais LGBTs. Até então, o dicionário do grupo, Michaelis, definia casamento como a “união legítima de homem e mulher”. Nesta quarta-feira (8), o grupo LGBT conquistou mais uma vitória: a Melhoramentos melhorou seu dicionário online, definindo casamento como “ato de união entre duas pessoas”. O diretor superintendente da editora, Breno Lerner, respondeu diretamente a Santarelo, prometendo, ainda, fazer a modificação do significado do verbete nas próximas edições impressas do dicionário.

    O abaixo-assinado na Change.Org foi lançado três dias depois de o casamento LGBT ter sido aprovado pela Corte Suprema dos Estados Unidos da América. Com apenas dois dias de circulação, o documento já havia conseguido mais de três mil assinaturas.

    Na descrição do abaixo-assinado, Santarelo relatou: “Sou casado há quase três anos com o Maurício. O casamento entre pessoas do mesmo sexo tem desafios jurídicos e também simbólicos. Por isso, fiquei muito chocado ao constatar que o dicionário Michaelis ainda define a palavra ‘casamento’ como a ‘união legítima de homem e mulher’. Peço que o dicionário compreenda o momento histórico que vivemos e mude esta definição, em respeito aos milhões de brasileiros que, como eu, constroem seus casamentos homoafetivos. É inaceitável que, até hoje, eu, meu companheiro e muitos outros casais ainda não sejam representados em um dos mais respeitados e influentes dicionários da Língua Portuguesa”.

    NO MUNDO — No dicionário Cambridge (dictionary.cambridge.org), a palavra “casamento” é definida como “um relacionamento legalmente aceito entre duas pessoas” (“a legally accepted relationship between two people”). O Oxford (oxforddictionaries.com), por sua vez, afirma que casamento é “a união legal ou formalmente reconhecida de um homem e uma mulher (ou, em algumas jurisdições, duas pessoas do mesmo sexo) como parceiros em um relacionamento” (“the legally or formally recognized union of a man and a woman [or, in some jurisdictions, two people of the same sex] as partners in a relationship”. Já o Collins (collinsdictionary.com) traduz o verbete “casamento” como “união legal ou contrato feito por duas pessoas” (“the legal union or contract made by two people”).