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  • Eduardo Cunha e os Ditadores em Miniatura: Não é só a Maioridade Penal

    Eduardo Cunha e os Ditadores em Miniatura: Não é só a Maioridade Penal

     

    Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil

    “A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa” (Constituição Federal, Artigo 60, parágrafo 5)

    Mesmo que você seja favorável à redução da maioridade penal (não acho que todo mundo que defenda essa ideia seja um “fascista” ou um “sacana que quer matar as crianças brasileiras”), deveria estar preocupado com o que aconteceu na Câmara do Deputados neste dia primeiro de julho, sob a presidência de Eduardo Cunha.

    O Brasil levou tempo para construir uma ordem democrática. Os mais velhos talvez se lembrem de Ulysses Guimarães (PMDB) presidindo a Assembleia Constituinte. Ouvia todo mundo, jamais atropelava a minoria, conduzia o processo como um árbitro. Eduardo Cunha é de outra estirpe. É venenoso, ardiloso, bilioso, nefasto para a Democracia.

    Com o projeto de redução da maioridade derrotado na véspera por cinco votos, Cunha decidiu atropelar a Constituição e colocar a mesma matéria em votação — pela segunda vez. Não se sabe que tipo de pressões ocorreram nos bastidores. O que sabemos é que Cunha deu um golpe, virou 15 ou 20 votos — e conseguiu o que queria (ao fim desse post, transcrevo um texto que traz explicação simples sobre a gravidade do que fez Eduardo Cunha).

    O mais chocante é que o nefasto Cunha tenha recebido o suporte do PSDB (partido que já foi de Montoro e Covas, mas que hoje é o PSDB do coronel Telhada e dos tresloucados Aécio e Carlos Sampaio) para atacar a Constituição.

    “Os tucanos, por grosseiro cálculo político (“ah, o PT é contra a redução da maioridade, então vamos derrotar o PT”), embarcaram na aventura. Sem perceber que o veneno que ajudaram a inocular no sistema político vai atingir todas as instituições.”

    Lembro sempre de Carlos Lacerda, o golpista da UDN que durante mais de dez anos adotou a tática do vale-tudo contra o trabalhismo, contra Vargas e Jango. Em 64, Lacerda alinhou-se com os militares golpistas acreditando que (afastados os trabalhistas do poder) logo se daria nova eleição — em que ele, Lacerda, seria o vitorioso. Não. Lacerda deu o golpe, inoculou o veneno do golpismo no Brasil, e depois também virou vítima da ditadura que lhe cassou os direitos políticos.

    O PSDB vai pelo mesmo caminho…

    Existem duas maneiras de atentar contra a Democracia. Uma é botar tanques e tropas nas ruas. Foi o que se fez em 1964. Outra é solapar lentamente a ordem democrática. No Brasil de 2015, assistimos a essa segunda modalidade de golpe. É o que se chama de golpe em câmera lenta.

    Vejamos…

    1 — Sob a direção da Globo, setores do Judiciário agem à revelia da lei. O juiz deixa de ser um intérprete da lei, e passa a pré-julgar: já tem o roteiro montado, e usa todas as ferramentas (delações, chantagem e prisões arbitrárias) para obter as “provas” que endossem sua tese. Anti-petistas e obtusos em geral aplaudem: “Ah, tudo bem, o que vale é botar esses vagabundos na cadeia”.

    Só que um dia, tudo isso pode-se virar contra qualquer cidadão comum. Um juiz sem limite é um ditador em miniatura. E já temos um deles em ação, em Curitiba.

    2 — A polícia atira, mata, executa. E muita gente aplaude, sob incentivo criminoso de certos jornalistas: “Ah, tudo bem, são vagabundos que merecem morrer”.

    Só que um dia esse “vagabundo” pode ser um filho seu, um amigo, um cidadão qualquer. A polícia não pode julgar e executar. Quem aceita isso aceita a barbárie e o rompimento da ordem democrática. Temos centenas de ditadores em miniatura nas ruas, armados e incentivados a matar pela histeria midiática do medo.

    3 — O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, atropela as regras e a Constituição. E de novos há aplausos: “Ah, tudo bem, essa esquerdalha que defende bandido precisa ser derrotada mesmo, danem-se as regras”.

    “Só que depois que o cristal se rompe, não colamos mais os cacos.”

    Eduardo Cunha, outro ditador em miniatura, quebrou o cristal da institucionalidade democrática. Se o Senado e/ou o Supremo Tribunal Federal não colocarem um basta a esse processo, o golpe terá caminhado mais alguns passos.

    O incrível é que a chefe do poder Executivo, eleita com 54 milhões de votos, não enfrente o golpe abertamente. E não o faz porque errou de forma absurda na política. Eleita pela esquerda, começou governando pela direita, e hoje afunda em 10% de ótimo/bom — segundo as pesquisas.

    Em 1964, a direita precisou botar tanques nas ruas para destituir um governo que era popular, que tinha levado milhares às ruas no Comício da Central, um governo que encaminhara propostas de Reformas de Base. Ainda assim, houve pouca resistência ao golpe.

    No Brasil de 2015, Dilma perdeu apoios, perdeu base popular. O golpe em câmera lenta não precisará de tanques e tropas para se consolidar. Ele vai avançando — passo a passo.

    “O final dessa escalada depende da capacidade de resistência da esquerda, dos movimentos sociais e do centro democrático, mas depende muito mais das contradições que existem do lado conservador.”

    Alckmin e o PSDB paulista querem que o governo permaneça fraco — de olho em 2018. Cunha também prefere o governo fraco. A derrubada de Dilma (último estágio do golpe em câmera lenta) hoje interessa só aos tresloucados de direita e a Aécio.

    Relembremos: se a presidente e o vice caem na primeira metade do mandato, há novas eleições diretas (e Aécio hoje lidera as pesquisas, até pelo “recall” de 2014). Mas se o impeachment ocorre na segunda metade do mandato (ou seja, a partir de janeiro de 2017), aí acontece eleição indireta pelo Congresso: um mandato-tampão até 2018.

    Cunha, o ditador em miniatura, é hoje quem decide a hora de consolidar o lento golpe. Ele é quem decide se abre ou não processos de impeachment.

    Minha aposta: o peemedebista vai avançar em sua agenda conservadora, chantageando o executivo, deixando Dilma e o PT em frangalhos. A hora do impeachment, se depender de Cunha, será entre fins de 2016 e início de 2017. Com a economia no chão, o governo sem base social, o PT derrotado nas eleições municipais: aí, será tirar doce da boca de criança. O ditador em miniatura acerta-se então com os tucanos, e vira presidente num mandato-tampão.

    O PSDB vai sonhar com a vitória nas urnas em 2018, nesse obscuro acerto conservador? Esse, parece-me, é o roteiro da direita. Os tucanos pensam em usar Cunha. Mas há razoes para acreditar que Cunha sairá mais forte que os tucanos em 2018, com uma agenda abertamente de direita.

    Nem todas as cartas estão jogadas. A cada vez que avança no golpe em câmera lenta, Cunha também gera contradições e arestas.

    De toda forma, a situação é tão ou mais grave do que a vivida entre 1961 e 1964. Não nos resta outra alternativa, a não ser resistir. Dialogando com setores de centro (inclusive no PSDB) que precisam entender os riscos dessa aventura.

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    por Yuri Carajelescov*, no Facebook

    Sobre a mais recente manobra de Eduardo Cunha…

    Diz a Constituição Federal que a matéria constante de proposta de emenda constitucional rejeitada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa [artigo 60, parágrafo 5].

    Notem: a “matéria” não pode ser objeto de nova proposta.

    Logo, a matéria “redução da idade de responsabilização criminal” não pode, por ofensa ao devido processo constitucional de emendar a CF, que se constitui em super-cláusula ou limitação formal ao poder constituinte derivado, ser objeto de nova deliberação nesta noite, mas somente no próximo ano legislativo.

    Firulas de redação legislativa, excluindo um ou outro termo presente na proposta rejeitada ontem, são meros jogos de palavras que não mudam essa realidade.

    Ao contrário, tornam ainda mais evidente a intenção ladina de se burlar a lei constitucional.

    Se isso ocorrer, caberá ao STF declarar a medida inconstitucional, mesmo sem examinar o mérito da proposição.

    Sempre é bom lembrar que no estado de direito os meios e processos validam os fins e não o contrário. E o respeito às regras do jogo constitui-se elemento essencial à vida democrática.

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    • Yuri Carajelescov é advogado e professor da FGV/SP

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  • José Bonifácio 380: 74 dias de resistência

    José Bonifácio 380: 74 dias de resistência

    Por Larissa Gould, do Barão de Itararé, especial para os Jornalistas Livres

     

    PUM PUM PUM. Às 6h25 o eco das batidas no portão metálico marca o início da reintegração de posse da Ocupação José Bonifácio, 380. Os policiais militares chegam cedo. Às 5h30, parte da rua já está fechada pela CET. Faltando 5 minutos para às 6h da manhã, seis caminhões chegam em procissão e param em fila indiana em frente ao prédio.

    Foto: Mídia NINJA

    Rosivaldo, um dos motoristas, explica que uma empresa é contratada para fazer o transporte: “Não sei para onde vão as coisas. Acho que o morador que vai indicar”. Nos caminhões, lê-se a identificação: A serviço da Justiça Eleitoral. Válido para 25.06.2015.

    A mesma Justiça que deixará na rua 120 famílias e 500 pessoas. Os móveis, seu Rosivaldo não sabe, vão para um deposito. A verdade é que a maioria das famílias não tem para onde ir, muito menos para onde carregar seus pertences. Alguns vão para a casa de familiares e amigos, ficar de favor em condição temporária. Nem todos ficam para a reintegração — parte dos que conseguiram se realocar antes da data, preferiu sair do prédio antes, por medo da repressão violenta.

    Mas a maioria não tem nenhuma alternativa. É o caso de Ivan Donisete, a esposa e os dois enteados: “Não sabemos para onde vamos. Talvez algum viaduto”. Ivan também não sabe se recuperará os móveis. Ajudante geral desempregado, está na ocupação desde abril: “Não temos condições de pagar aluguel”.

    Foto: Mídia NINJA

    Carmem da Silva Ferreira, líder do Movimento dos Sem-Teto do Centro (MTSC), que integra a Frente de Luta por Moradia (FLM), explica que grande parte das famílias já estão cadastradas em projetos de habitação, mas a demora e a impossibilidade de pagar aluguel fazem com que muitas acabem nas ruas, ou em ocupações. “São Paulo é refém da especulação imobiliária. Estamos aqui para lutar por um direito. O direito à moradia digna”.

    Embora Dona Carmem tenha em mãos um ofício (nº 576/SEHAB G/2015) no qual a Secretaria de Habitação do Município designa um funcionário para acompanhar a reintegração, ninguém aparece. Tampouco garantem seguro aluguel ou qualquer tipo de auxílio.

    Foto: Lina Marinelli

    Às 6h25 Dona Carmem abre o portão metálico e informa ao representante da Justiça Federal que todos sairão pacificamente.

    — As crianças estão acordando. Se o senhor puder esperar que tomem o café…

    — Meia hora, senhora?

    — Isso, uns 40 minutos.

    A verdade é que algumas daquelas pessoas nem sequer sabem onde (e se) vão almoçar. Dona Carmem sobe para o térreo e apressa os moradores:

    — Todos tomem o café e arrumem as coisas.

    José Patrocínio, 63 anos, era cozinheiro, mas uma patologia o impede de trabalhar. Ele não pode subir as escadas, e aguarda sentado em um banco improvisado que lhe tragam o café.

    — É muita humilhação.

    Fotos: Lina Marinelli

    Às 6h45, enquanto a maioria ainda come e arruma os poucos pertences, Carmem começa a última assembleia da José Bonifácio, 380. Fica decidido que, após a saída, seguiriam rumo a porta da Secretaria do Patrimônio Público. A assembleia termina ao som das palavras de ordem “Quem Não Luta… Está Morto”, repetida em coro por todos.

    Foto: Lincoln K.

    Às 7h, Carmem sai do prédio, à frente de todos “Por gentileza, cadê o oficial? Quero lhe entregar o prédio”.

    Enquanto as famílias saem em marcha, munidos de bandeiras e faixas, Carmem proclama “Esse é o povo que está indo para a rua por falta de políticas públicas de moradia”. Eles seguem atrás de uma grande faixa com os dizeres: Contra a Corrupção Imobiliária.

    Enquanto eles saem, o oficial do TRE (Tribunal Regional Eleitoral), atual proprietário do prédio, entra para fazer a vistoria. Para trás ficam os móveis. Nas paredes, os cartazes com as regras de convivência ainda ficam colados, como que à espera que os moradores voltem antes da meia noite.

    José Bonifácio, 380: 74 dias de resistência

    Na madrugada do dia 12 para o dia 13 de abril, cerca de 200 pessoas ocuparam, de baixo de bombas de gás e ameaças de tiros, o prédio da Rua José Bonifácio, nº 380.

    No dia seguinte, um homem de terno, um mecânico e mais 11 motoristas sem nenhuma identificação, se apresentaram como funcionários do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo. E informaram que o prédio estava alugado pelo TRE, que o usava para o estacionamento de 11 veículos.

    Uma semana depois que estavam alojados, cortaram a energia e água das famílias por duas semanas. Mas eles resistiram. Resistiam também a uma ameaça de reintegração ilegítima do TRE, no dia 28 de abril.

    Quando a reintegração oficial chegou, fruto de processo que está na 21ª Vara Federal, as famílias já estavam divididas em apartamentos individuais. A cozinha comunitária havia sido desmontada, mas não o convívio.

    Letícia de Abreu tem 19 anos, veio do interior para a Capital há 2 anos para tentar estudar, ainda não conseguiu, atualmente trabalha como atendente. Para ela o processo da reintegração é doloroso, principalmente por separar as famílias já habituadas ao convívio diário: “Nós nos acostumamos com as crianças, com todos”. Se ela tem medo de morar em ocupação? “É a luta né, temos que lutar por nossos direitos”, e dá de ombros.

    Um prédio sem uso social

    O prédio, com 8 pavimentos e subsolo, divididos em 3 lojas e 7 salões, foi tomado pela União depois que a proprietária Moinho Curitibano S/A a penhorou para a Companhia Internacional de Seguros em 2008, por R$732.868,90. Afundado em dividas e abandonado há 5 anos, o prédio da década de 1970 acabou sob a responsabilidade da Secretária de Patrimônio da União. De acordo com Carmem, para que o prédio passasse das mãos desse órgão para o TRE deveria ter passado pelo conselho da entidade. “Passou de um órgão para outro por meio de uma carta-contrato”.

    Foto: Lina Marinelli

    E finaliza “O prédio está abandonado há 5 anos, sem função social, e deve ser usado para a moradia. Nós lutaremos por isso”.


    Veja:

    José Bonifácio, 380 – 

    O primeiro dia de uma ocupação vista por dentro

     

     

  • O Evangélico e a Esquerda

    O Evangélico e a Esquerda

    por Carmen da Silva Ferreira, do Movimento dos Sem-Teto do Centro (MSTC), especial para Jornalistas Livres com foto de Taba Benedicto

    Procuro mais uma vez entender as minhas atitudes como evangélica que sou e não posso deixar de expressar novamente a minha indignação. Porque Deus pôs a Sua mão na Humanidade e esta está desperdiçando mais uma grande oportunidade de viver um mundo melhor e igualitário.

    Eu vou fazer minhas ponderações e peço que reflitam comigo.

    No meu humilde conhecer e temente a Deus como sou, analiso que, ao criar o mundo em sete eras (para nós, sete dias), o conjunto da perfeição do Universo não poderia ficar somente sob o jugo do unitário. Deus, em sua infinita sabedoria, compreendeu a necessidade de povoar e de criar o coletivo, concebido de forma a dividir e compartilhar tudo na santa paz e harmonia.

    Os primeiros habitantes, Adão e Eva, procriaram, nasceram seus filhos e a descendência. Mas começou a ganância, gerada pela inveja de Caim contra Abel. E aí foi a derrocada do homem, a semente do capitalismo e da injustiça.

    A descendência de Caim levou a maldição pelo crime cometido por seu ancestral.

    O preconceito imperando, a descendência de Caim foi maldita. Sobre seus filhos, netos e bisnetos recaiu a culpa pelas mazelas do ancestral. E seguiu o homem, firme em seu propósito e povoando o mundo, mundo este já dominado pelo capitalismo.

    Até que Deus, na sua intensa perseverança com sua criação, arrebatou um justo, Noé, e o incumbiu da tarefa de povoar o mundo de novo… Veio o dilúvio que destruiu todos, só ficando a família de Noé e os animais.

    Foi uma oportunidade de pensar e de refletir sobre o propósito de Deus, que é o de uma sociedade igualitária, justa e benéfica a todos.

    A descendência de Noé procriou e novamente povoou. Para melhor coordenar o povo, veio a ideia de partilha. E começaram as 12 tribos.

    Mas, mas na sua infinita curiosidade e anseio de querer mais, o homem logo começou a cultuar a prática do escravagismo, da opressão. Surgiram os grandes reis, com suas ostentações e a prática e exercício de guerrear.

    A peleja fez avançarem as fronteiras mais e mais. E foi assim, com guerras e a prática do escravismo, que os faraós do Egito ampliaram seu império de ostentação.

    Incomodado com tais práticas, Deus promoveu um libertador –Moisés — e enviou as sete pragas ao Egito. Ao fim de 40 anos, com muita peleja, Moisés conseguiu libertar seu povo do cativeiro do faraó, porém sem a liberdade do “Eu”, sem a libertação do egoísmo, da ingratidão.

    Pensando nessa passagem da Bíblia e nos dias de hoje, não posso deixar de comparar os tempos de Moisés com outras formas de escravidão modernas. Como a opressão do FMI sobre os povos, a Inflação, a falta de leite, a falta de carne, a falta de emprego, os baixos salários, as faculdades caríssimas em que só ricos podem estudar, etc, etc.

    Moisés, como homem preparado por Deus que nunca perdeu sua identidade humana, esbravejou, construiu a libertação de um povo, mas não pôde entrar com este povo na Terra Prometida. Castigo de Deus? Não, não. Deus é amor, é sábio. Ele não permitiria que um servo tão devoto e fiel em suas causas e objetivos tivesse mais uma decepção com o povo que ele tanto amou; e que visse em que se tornaria o lugar que ele tanto almejou, transformado em palco do crescimento da devastação humana, do consumismo desenfreado, da opressão de guerras, de preconceitos.

    Antes de morrer, Moisés recapitulou as leis de Deus e o Amor d’Ele pelos homens. E dessa mensagem viva surgiram novos homens, líderes aguerridos que não quiseram deixar morrer o objetivo maior de Deus na criação do homem e do mundo, que é o coletivo, o amor, a unidade no viver e a divisão dos bens.

    Esses homens de bem, bravejando sua revolta com o rumo das coisas, conseguiram fazer aflorar a esquerda como o grito de almas que não se sujeitavam a tanta descrença, ingratidão, negação e até desobediência ao próprio Deus.

    E assim é possível ver que a esquerda aflorou das injustiças, quando a corrente de amor e de fé de um povo foi quebrada, e esse fato foi enfrentado pelo Justo que não se aquietou, formando uma corrente de oposição ao sistema opressivo
    e escravagista.

    É sobre essa base moral que se assentam os objetivos da esquerda. E a esquerda torna-se ainda mais necessária porque, com o crescimento demográfico, aprofundam-se os problemas da humanidade, tornando imprescindíveis os homens e mulheres que gritem em favor dos mais fracos, que se oponham aos grandes e opressores.

    Se meditarmos e compararmos a situação bíblica com a dos dias de hoje, a diferença está no processo, nas ferramentas modernas, mas o contexto é o mesmo. Deus lançava homens aguerridos para alertar a humanidade sobre o que é o bom para todos, sobre como podemos viver conjuntamente, promovendo a vida igualitária e uma sociedade justa. E isso é o mesmo que hoje em dia fazem os cidadãos de bem.

    É papel do evangélico ser de esquerda, porque ele se contrapõe aos erros do opressor, do ganancioso, do invejoso, do dominador. É papel do evangélico alertar que o propósito do Criador sempre foi o bem comum.

    Assim como a humanidade que nos antecipou, desde a criação o homem caiu na escravidão e ao sair dela se esqueceu das dores que o afligiram. Passamos por uma ditadura que matou e aniquilou a muitos que gritaram e exaltaram a Justiça, pelo direito de viver sem leis arcaicas dominadoras. Apesar disso tudo, hoje, depois de tantos sacrifícios, ainda existem cidadãos que têm a coragem de pedir a volta dessa ditadura.

    É como o povo de Deus na época das guerras e da escravidão. Quando recebeu o anúncio de um novo tempo, esse povo esqueceu-se das prioridades de Deus, que eram reconstruir um novo templo, recomposto em amor, cheio de ação para o coletivo e bem comum a todos.

    A esquerda é o portador de um futuro melhor. Vem cheia de intenções de bem. É um pequeno remanescente para abençoar o mundo inteiro. Quando Deus se fez homem, para sentir as nossas dores, as nossas mazelas, ele quis afastar a religião do homem, porque esta afastava o homem de Deus quando se transformava em religião preconceituosa, gentrificadora e elitista.

    Por isso, façamos como Jesus Cristo e preguemos o amor e a partilha. O apóstolo Paulo pediu que os homens abandonassem suas superstições, referindo-se aos preconceitos e elitismos, e que fizessem da doutrina do amor de Cristo o centro de sua vida.

    Eu sou evangélica de esquerda. Acredito na mensagem de Deus e de Jesus para o mundo. Tenho minhas limitações, sou humana, sou pecadora, erro e acerto. Mas tento todos os dias ser melhor. Eu tenho que ser melhor.

     

  • Rio de Janeiro tem dia histórico contra a redução da maioridade penal

    Rio de Janeiro tem dia histórico contra a redução da maioridade penal

     

    “É isso: se tiver violão, se tiver funk, se tiver cultura, não vai precisar de faca em Copacabana. Não à redução!”. Assim o Dream Team do Passinho encerrou seu show para milhares de pessoas na Praça XV, na noite de domingo (14).

    O movimento Amanhecer contra Redução surgiu em meados de abril, inspirado na campanha uruguaia No a la Baja, que impediu a redução da maioridade penal no país vizinho. Uma iniciativa de jovens criativos, principalmente estudantes secundaristas, para resistir à redução, de uma forma didática e leve, com a cultura.

    Foi algo dessa natureza que deixou o centro da Cidade Maravilhosa mais colorido na manhã deste domingo. O Festival Amanhecer, fruto da construção colaborativa de coletivos, movimentos sociais e artistas, reuniu cerca de 80 atrações de música, dança, teatro, grafite, debates, fotografia e poesia na Praça XV, para um público total de mais de 20 mil pessoas.

    Foram 5 palcos espalhados pela tradicional Praça XV, que se coloriu com cartazes, sorrisos, faixas, pipas, murais, grafites, adesivos, brincadeiras, tecidos e danças ao longo do dia. Uma ação de resistência, que não seria possível senão com um posicionamento decisivo dos estudantes.

    “Assim que a PEC da Maioridade passou na Comissão de Constituição e Justiça, nós reunimos um grupo de amigos aqui no Rio de Janeiro para fazer uma campanha contra a redução. Nossa expectativa era que fosse uma campanha pequena, mas acabou crescendo e chegou a 400 cidades em todo o país!” afirma Daniela Orofino, que tem 22 anos e é estudante de Ciências Sociais. De lá para cá não pararam. Em maio, o grupo realizou um grande sarau na Lapa, que reuniu 600 pessoas.

    Além da programação cultural, o domingo foi marcado por intensos debates com a presença de artistas, ativistas e parlamentares, como Marcelo Freixo, deputado estadual pelo Rio de Janeiro.

    Mais de 20 mil reais foram arrecadados para o evento, através do financiamento coletivo: “É a força da juventude mostrando que a gente acredita na cultura e na educação como alternativas para todos esses jovens do Brasil que têm poucas oportunidades”, conclui Daniela.

    Outra estudante, Mariana Monteiro, tem 16 e começou a participar da campanha a partir de um convite feito pelos colegas. Seu grupo colaborou para o financiamento realizando um sarau na escola para arrecadar fundos: “Doamos R$1.000 para o Festival e foi muito bem investido”.

    Assim como ela, Clarice Pessoa, 14, também faz parte da Campanha e participou da produção do evento: “A redução, na verdade, é a seletividade penal, pois serão os jovens em situação de vulnerabilidade que pagarão, e não nós. Estamos aqui hoje para
    lutar por direitos”.

    Gisela, estudante de Comunicação, destacou a importância de se unir ao movimento cultural: “Pela cultura conseguimos dialogar com muito mais gente”.

    O Levante Popular da Juventude foi um dos movimentos que compuseram o festival, com uma oficina de bateria. Para Felipe Haua, estudante e militante do grupo, é fundamental a união de todas as forças contra a PEC da maioridade. “É uma pauta que está sendo empurrada no Congresso e que afeta diretamente a juventude. Se não estivermos unidos não teremos chance”.

    Nada deve parecer impossível de mudar..

    Se o festival queria atingir corações e mentes para ganhar forças na luta contra a redução, conseguiu. Gilvan tem 42 anos e é empresário. Passou sem querer na praça e a curiosidade fez com que ficasse, para mudar de opinião:

    “Era a favor da redução. Ouvi um debate, li as faixas e cartazes e me permiti refletir sobre a questão. Principalmente sobre a frase ‘Redução não é solução’. Não é mesmo. Na verdade, ela traz muitos problemas, como o aumento desmedido da população carcerária”, afirmou.

    Não é a solução porque desvia o foco do que é realmente importante: a proteção dos direitos das crianças. É o que pensa Átila Roque, diretor da Anistia Internacional no Brasil. “Hoje o adolescente é vítima da violência, não quem causa violência. Os jovens são mais de 50% dos mortos no país, totalizando 30 mil jovens mortos por ano na faixa dos 15 aos 29. Grande parte deles entraria nessa faixa da redução. Ou seja, já existe uma penalização gigantesca para esses jovens”, afirma.

    A Campanha Jovem Negro Vivo, da Anistia, levanta ainda um dado assombroso na matemática da pátria educadora: dos 30 mil mortos, 70% são negros.

    A marcha dos desprovidos

    Atualmente, o Projeto de Emenda Constitucional — PEC 171, que altera a imputabilidade penal, está no Congresso Nacional. A Comissão Especial criada para a discussão do tema possui 70% dos deputados a favor da redução. Jandira Feghali, deputada federal pelo PCdoB, esteve presente no festival e concorda que a conjuntura não é favorável:

    “No Congresso, infelizmente, nós estamos andando para trás. Todas as pautas que vão se estruturando e vão se estabelecendo são pautas profundamente retrógradas, de anulação de um período longo de conquistas em todas as áreas.”

    Ativistas do movimento estudantil são expulsos da Câmara dos Deputados durante a semana, ao se manifestarem contra o projeto de redução da maioridade penal. Fotos: Mídia NINJA

    Mas acredita que a batalha não está perdida. “Muitos dados mostram que não é só o jovem infrator grave que está no alvo desses caras. Mudar a Constituição é mudar as regras para a juventude inteira. Vai mudar a relação do Estado brasileiro com a sociedade”.

    Nas próximas semanas, a Campanha e as ideias propagadas nesse domingo viajam para Brasília, para pressionar os parlamentares da Câmara e dialogar com uma comissão especial do Senado sobre o tema.

    Maria de Fátima, mãe do dançarino D.G., executado pela Polícia Militar carioca em abril de 2014, é categórica na importância da campanha continuar sua caminhada contra a PEC 171:

    “O Brasil é dividido em dois: o país dos privilegiados e o país dos desprovidos. A redução só atingirá os desprovidos”

    Foto: Felipe Paiva / Rua Foto Coletivo

    texto Larissa Gould para Jornalistas Livres
    fotos Cobertura Colaborativa Amanhecer Contra Redução

     

  • Fragmentos da terra da água

    Fragmentos da terra da água

     

    Era muito cedo ainda para o dia, mas a noite já não escurecia tanto. Pegamos as vacinas, o médico cubano , a enfermeira, técnicos e agentes indígenas de saúde, nossa grande equipe conta 10 pessoas e dois barcos e um só rumo: vacinar e identificar todos os índios em todas as diversas aldeias e suas etnias. Agora, estamos nas antigas terras dos índios Kalapalo, território esse evacuado as pressas por eles no século passado, contam em histórias tristes que as mulheres e as crianças, seus velhos também, iam morrendo pelo caminho padecidos de sarampo. Hoje voltam para as terras em pequenas novas aldeias, lugares sagrados e miscigenados com Matipu, Nafukuá, Kuikuro.

    Foto: Hélio Carlos Mello

    Estamos abrigados no Culuene, uma aldeia ponto de apoio e vigilância com o limite sul do PIX, a membrana de contato com o território dos povos da terra do Alto Xingu.

    Os muitos dias intensos de trabalho já realizado são recortados pelo radical silêncio das noites, pois todos dormem cedo em suas redes. Do sono que perco nas madrugadas percebo que há hoje um certo trânsito de barcos naquele trecho de rio, algo incomum nas terras indígenas.

    Na manhã seguinte vejo onde de fato estou, pois alta noite se fazia quando aportamos a água limpa dos rios que navegávamos cede aqui espaço a imensas manchas de espuma marrom rodeando os cantos do rio Culuene. Ao longo do dia vou entendendo a enorme pressão que se faz no limite do parque com a sociedade envolvente, no caso moradores, fazendeiros e turistas que frequentam intensamente as pousadas de pescarias que se contituem nas margens do rio no município de Gaúcha do Norte e com estradas de acesso as cidades de Canarana e Querência.

    Foto: Hélio Carlos Mello

    Passei a transitar esse trecho com meus amigos indígenas, a apreender os limites da área e toda a voracidade, ainda insipiente, dos investimentos no setor hoteleiro que tendem a se intensificar com o poder do apelo do turismo da pesca. Nosso achado foi a antiga placa da FUNAI, que anuncia o limite da Terra Indígena soterrada no leito do rio, entre a mata. Bravamente houve o desterro da placa pelos Waurá, Kuikuro e Kamaiurá que me acompanham. Colocamos a placa toda enferrujada no local, mesmo sabendo que cabe a FUNAI anunciar e zelar pelos limites das terras indígenas, bem como mediar conflitos nas zonas de pressão. Fica evidente que o município de Gaúcha do Norte tem que criar um legislação ambiental para a ocupação das margens do Culuene. Ao IBAMA cabe fiscalizar o resguardo dos recursos naturais.

    Foto: Hélio Carlos Mello

    A poluição das águas vinda pelo turismo e a invasão de pescadores é apenas uma das ameaças que começam a interagir com as aldeias e as etnias e seus clãs. Hoje os jovens estão animados com a grande pescaria em rede, e a rede é o wi-fi que seduz a todos. As motos passaram a ser fundamentais também, facilitando o trabalho nos caminhos de roça e no percurso do rio. Grandes TVs também encontraram seu lugar na grande casa ovalada em sapé habitada por muitos. A mercantilização das grandes festas e rituais também salta aos olhos.

    Foto: Hélio Carlos Mello

    O incrível mundo novo da tecnologia passa a se mostrar como uma eficiente arma inventada pelo homem branco, cabendo apenas aos índios decidirem que caminho tomar para preservar a cultura originária da sedução das parafernálias que o mercado renova a cada dia.

     

     

  • Palestino-brasileiro mantém greve de fome há 55 dias

    Palestino-brasileiro mantém greve de fome há 55 dias

    Islam Hamed, um palestino-brasileiro de 30 anos, se mantém em greve de fome há 55 dias em sua cela, na Palestina ocupada. Ele havia sido preso pela Autoridade Nacional Palestina em 2010, sem nenhuma acusação, tendo sua pena expirada em 2013.

    Islam foi também preso em 2002 por Israel, aos 17 anos, por jogar pedras contra os tanques das forças de ocupação. Em 2007, somente nove meses após sua soltura, foi mais uma vez preso por Israel, sob a acusação de que apresentava uma “ameaça à segurança”, sendo libertado três anos depois. O estado de saúde do palestino-brasileiro tem se deteriorado, e, de acordo com membros de sua família, ele tem sofrido tortura física e psicológica. Na última quarta-feira a prima de Islam, Aline Baker, e a ativista Soraya Misleh concederam entrevista durante coletiva de imprensa realizada em São Paulo.

    Aline Baker segura foto de primo ‐ Foto: Pedro Marin / Revista Opera.

    Aline afirmou que a Embaixada Palestina havia prometido libertá-lo até a última terça-feira (2), o que não ocorreu. Segundo a ANP, Islam segue preso para que se evite uma nova prisão por parte de Israel, e exige salvo-conduto para libertá-lo. Aline afirmou também que o Governo brasileiro declarou estar “intensificando as negociações”. A família pede que ele seja levado até a Embaixada brasileira até que se resolvam os trâmites para seu retorno ao Brasil.