Jornalistas Livres

Autor: Agatha Azevedo

  • Comunicar para lutar pela democracia

    Comunicar para lutar pela democracia

     

    Na emblemática Funarte MG, local que já foi Casa do Conde e hoje é ponto de resistência da cultura contra o golpe em diversos estados, representantes da comunicação do Coletivo Intervozes, da Rádio Inconfidência e do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra discutiram a importância da resistência da comunicação no momento político brasileiro e de lutar pela democratização dos meios.

    Como disse Mayrá Lima, representante da comunicação do MST: “A política também passa pelos meios de comunicação.”. No Festival Nacional, Mayrá ressalta a importância de discutir os impactos da não-democratização da comunicação, que são sentidos pelos movimentos sociais pela forma como são retratados nas mídias tradicionais, que detém o monopólio da comunicação brasileira.

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    Foto: Leandro Taques / Jornalistas Livres

    “A gente não está tratando de um assunto que é simples. Tratar de comunicação é lidar com a ideologia, a formação de ideologias e de cultura de um povo e nós estamos em maus lençóis. Eles tem a facilidade de padronizar discursos que podem até criminalizar os movimentos sociais.” – Mayrá Lima, comunicação do MST.

    Sobre a criminalização, Ana Cláudia Mielke, do Coletivo Intervozes, aponta a importância de resistir na luta pela democratização, ainda que o senso comum, endossado pelas reportagens de jornais, rádios e TVs hegemônicos, ainda julgue como censura a pluralidade de vozes.

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    Foto: Leandro Taques / Jornalistas Livres

    “Toda vez que nós que somos militantes da democratização da comunicação, falamos sobre o tema, nós somos carimbados como censuradores. Mas se formos olhar países liberais, eles já regulam a comunicação. A ideia é garantir que quando haja uma violação dos direitos humanos, as emissoras sejam punidas, e hoje isso não acontece no Brasil.” – Ana Cláudia Mielke, Coletivo Intervozes.

    Para ela, “uma das nossas lutas além de garantir a regulação dos meios, é a regulação do conteúdo. Os meios de comunicação, que são um bem nosso, devem nos garantir um bom conteúdo. Quando a gente fala em regular o conteúdo não falamos de censura, mas de um mecanismo para garantir um conteúdo de qualidade e que não fira os direitos humanos.”

    No campo da comunicação pública, Elias Santos fala do modo como a Rádio Inconfidência atua em Belo Horizonte e batalha pelas pautas que são de interesse público. ” Na Rádio Inconfidência trabalhamos sob os pilares da educação, cultura e cidadania, esta é uma batalha porque qualquer emissora que se ponha num contraponto ao que está acontecendo no país estará com problemas.”

    Elias também explica que “a comunicação é algo inerente ao ser humano. Nós todos temos a necessidade de comunicar”, e por isso, é importante discutir com as pessoas, principalmente com os jovens, sobre o tema da comunicação.

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    Foto: Leandro Taques / Jornalistas Livres

    “Há um incômodo numa parcela da juventude com o que está acontecendo na comunicação. Direito é uma batalha todo dia.” – Elias Santos, Rádio Inconfidência.

    Dentro da luta de classes, o MST enxerga que a comunicação é um tema que deve ser educador, propagandeador, formador e agitador. Para o movimento, a garantia de direitos só vem com luta. Se a resistência no campo, nos acampamentos e assentamentos, se dá com o plantio da terra, a necessidade de comunicar é o que garante ao movimento mais organicidade e leva para a população uma visão mais realista sobre a própria atuação do MST. E se depender do movimento, cada vez mais a voz da mídia estará na boca do povo.

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    Foto: Leandro Taques / Jornalistas Livres
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    Foto: Leandro Taques / Jornalistas Livres

     

  • Café, cachaça e mel: da reforma agrária às mesas do Brasil

    Café, cachaça e mel: da reforma agrária às mesas do Brasil

    Entre os dias 20 e 24 de julho, Belo Horizonte recebe iguarias de todos os cantos do país. Caminhões carregados com a cozinha e produtos da reforma agrária, vindos dos mais diversos assentamentos, trarão a produção do MST para a capital mineira.

    Legumes, frutas e grãos produzidos nos assentamentos e acampamentos serão comercializados em BH / Arquivo MST
    Legumes, frutas e grãos produzidos nos assentamentos e acampamentos serão comercializados em BH / Arquivo MST

    A Feira, que acontece na Serraria Souza Pinto, é parte da programação do Festival da Reforma Agrária e traz mais de 160 toneladas de alimentos para comercialização, dentre eles, produtos agroecológicos, orgânicos, artesanatos, agroindustrializados e in natura.

    Produtos especiais

    Uma das atrações principais é o Café Guaií, produzido no Sul de Minas Gerais. O famoso cafezinho mineiro é produzido por 500 famílias – de 3 assentamentos e 11 acampamentos – que vivem e trabalham na terra desde 1996.

    O estado que será palco do Festival Nacional também é produtor da cachaça Veredas da Terra, que vem da região das melhores cachaças do Brasil, o norte de Minas. A região também é produtora de rapadura, açúcar mascavo, geleia de umbu e o saboroso doce de castanha de baru. Uma das floradas de mel mais apreciadas vem da árvore Aroeira, típica do cerrado e preservada nos assentamentos do norte e jequitinhonha.

    Culinária da Terra

    Da partilha da terra, ocupada e conquistada com o suor dos trabalhadores do campo que lutam pelo direito a ter um espaço para produzir alimentos, nasce uma larga produção, que abrange itens como feijão, café, cana, milho, banana, frutas, leite, gado de corte, dentre outros.

    Primeiro dia da 1ª Feira Nacional da Reforma Agrária, em São Paulo, na manhã desta quinta-feira (22). Foto: Joka Madruga/MST
    Foto: Primeiro dia da 1ª Feira Nacional da Reforma Agrária, São Paulo, 2015. Foto: Joka Madruga/ Arquivo MST

    Produtores de 25 estados, distribuídos em mais de 100 cooperativas, 96 agroindústrias e 1,9 mil associações, trarão pratos típicos de cinco regiões do país para a Feira Gastronômica do MST. Quem passar pelo local poderá provar Pato no Tucupi, Churrasco de Bode, Tapioca, Frango com Pequi, Acarajé, Arroz Carreteiro, o famoso tropeiro mineiro e outras iguarias dos assentamentos.

    Além de apresentar os produtos da reforma agrária, a Feira Gastronômica terá atrações no palco Balaio Cultural Cora Coralina, uma homenagem a poetiza, que remete à forte veia artístico-cultural do movimento, que segue os seus passos repartindo o que sabe e aprendendo o que ensina.

    Para mais informações, acesse o evento: https://goo.gl/P9qI8j

  • “DEMOCRACIA É RESPEITAR IDENTIDADE DE GÊNERO: não nos apaguem com a política”

    “DEMOCRACIA É RESPEITAR IDENTIDADE DE GÊNERO: não nos apaguem com a política”

    Fotografia por Caio Santos
    Foto: Caio Santos/ Jornalistas Livres

    Nas ruas, povo liberto, sem medo de amar. Beijos, carinhos e afetos ocuparam a Praça da Estação para reivindicar o direito de ser LGBT e não sofrer nenhum ataque por isso.

    O tema da Parada LGBT deste ano veio pautar o respeito à identidade de gênero, e a bandeira trans foi aberta pela primeira vez na multidão que, com orgulho, ajudou a levá-la pela cidade, junto com a clássica bandeira do arco-íris, símbolo da luta LGBT.

    Pessoas trans e travestis sofrem violências, silenciamentos e exclusões todos os dias, e o cenário político da indícios de retrocessos ainda maiores. Por isso, na linha de frente da Parada, o carro do CELLOS-MG (Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual) trazia importantes figuras da luta trans, como a militante Anyky Lima, vice-presidente do CELLOS-MG e Carlos Magno, atual presidente da ABGLT.

    As militantes da APROSMIG (Associação das Prostitutas de Minas Gerais) também estiveram presentes pedindo pelo fim da putafobia, e estão na luta pelos direitos das profissionais do sexo, que sofrem discriminação e violência na sociedade e no meio LGBT.

    Fotoografia por Caio Santos
    Foto: Caio Santos/ Jornalistas Livres 

     

    Desde 1998 nas ruas de Belo Horizonte, a Parada é a maior do estado e uma das mais antigas do país. Este ano, o Fora Temer esteve presente em placas e adesivos e o ato sócio-político-cultural mostrou seu poder de mobilização. Durante todo o trajeto, que passou pela Avenida dos Andradas, Rua da Bahia, Avenida Amazonas e terminou na Avenida Olegário Maciel, mais de 65 mil pessoas estiveram presentes na Parada.

    Fotografia por Agatha Azevedo
    Foto: Agatha Azevedo/ Jornalistas Livres e Mídia NINJA

  • Seis meses depois da Tragédia de Mariana, as respostas ainda não foram dadas

    Seis meses depois da Tragédia de Mariana, as respostas ainda não foram dadas

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

    A cidade de Mariana, conhecida antes como polo de minérios desde os tempos de Tiradentes, é hoje lembrada pelo vazamento de 55 milhões de m³ de lama, pelos estragos ambientais na bacia do Rio Doce e no mar, perdas impossíveis de calcular. De Bento Rodrigues, restou somente a memória de um distrito de 300 anos inundado em menos de 10 minutos, enterrado sob uma camada expressa da lama, agora seca, mas que ainda levanta um pó fino e denso, por irresponsabilidade de uma mineradora instalada ali perto há somente 39 anos.

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

    A tragédia/crime ambiental foi provocada pelo rompimento da barragem de Fundão, pertencente à mineradora Samarco, controlada pelas empresas BHP Billiton e Vale S.A. O desastre segue impune depois de 6 meses desde que o seu rompimento atingiu violentamente várias comunidades da região, matou 19 pessoas, prejudicou a economia de dezenas municípios atingidos, além da produção agrícola de diversas famílias camponesas. A lama de rejeitos acabou com a produção dos peixes que alimentava os ribeirinhos e os indígenas, contaminou e destruiu a vida na bacia do Rio Doce, afetando milhões de pessoas que vivem e dependem dessa água e dessas terras. Essa é, sem dúvida alguma, a maior catástrofe socioambiental na história do Brasil e uma das maiores geradas pela megamineração de ferro no mundo.

    Passados 6 meses do crime, o problema ainda persiste. Todos os desabrigados do distrito de Bento Rodrigues e Paracatú de Baixo, segundo distrito destruído totalmente pela lama, já foram realocados em casas dentro da cidade de Mariana(MG), com um contrato assinado por um ano pela empresa responsável. Entretanto, eles vem sendo tratados com preconceito e discriminação na cidade para onde foram compulsoriamente deslocados. Apesar da assistência imediata dos atingidos destes dois distritos, a grande maioria dos atingidos são habitantes de toda a região da Bacia do Rio Doce, que vai desde Mariana até Estado do Espírito Santo. Muitos destes ainda não receberam nenhuma forma de auxílio por parte da empresa ou do governo ou a devida atenção por parte da mídia tradicional.

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

    ” A gente tinha que ter uma TV pra mostrar tudo que a gente falou aqui porque a imprensa fugiu e já foi comprada.” (fala de uma das moradoras em reunião com o MAB e Ministério Público)

    Depois de percorrer quilômetros pela bacia e após ouvir várias famílias, foi possível perceber que muitas continuam sem atendimento, não recebem nenhum tipo de reparação, sequer foram considerados atingidos pela empresa.  A maioria das mulheres ouvidas nas cidades e comunidades visitadas, se veem em território hostil, se sentem culpadas pela tragédia e inconformadas com a humilhação e constrangimento da discriminação de parte dos conterrâneos, mas principalmente por terem seus direitos violados e agora estarem correndo atrás da empresa para conquistarem algum reparo que lhes garantam sossego para prosseguir a vida como era antes. Uma das moradoras relatou a falta de participação e informações dos atingidos no processo indenizatório proposto pela empresa Samarco, que não está sendo democrática, priorizando assistência e indenizações aos fazendeiros atingidos, enquanto a população mais pobre sofre diretamente com a perda da fonte de renda e com o aumento no custo de vida, enquanto continua se mantendo com um cartão cedido pela empresa, onde é depositado mensalmente o valor de R$ 880, mais 20% de um salário por dependente, além de uma cesta básica. Esse é o exemplo prático do que essas empresas, ao negligenciarem os direitos devidos aos moradores, fazem quando criam acordos individualizados que dificultam uma negociação em prol de um bem comum para a comunidade em geral.

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

    Além da questão indenizatória, as mulheres moradoras das cidades vizinhas atingidas, questionam o fato de não serem escutadas e consultadas sobre a construção da nova moradia que gostariam de ter, se sentem constrangidas com o tumulto que as obras causam com muitas máquinas e homens circulando na região, muitas vezes sentindo medo de circularem sozinhas onde antes conviviam tranquilamente em ambiente harmonioso.

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    “ A cidade virou um canteiro de obras, poeira, barulho excessivo causado pelas máquinas que desde a tragédia, circulam dentro da cidade. Além disso, já foram identificados 14% dos moradores atingidos por dengue e alguns casos de estupro” – relata Raissa, moradora e voluntária da cidade de Barra Longa –MG.

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

    Tão resistente como as marcas da lama, são as memórias na vida dos afetados: muitos têm problemas para dormir, alguns ainda sonham com a tragédia. Relatos sobre a perda do convívio social e brigas entre os moradores, transtornos psicológicos, aumento das tentativas de suicídio, casos de alcoolismo, violência doméstica e estupro, além do surgimento de problemas respiratórios nas crianças e depressão. Dados preocupantes que evidenciaram também os problemas de saúde que a tragédia causa diariamente na população desde o incidente.

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

    Há uma desconfiança nas informações fornecidas por instituições públicas e privadas a respeito da potabilidade da água para consumo humano e utilização produtiva. Abastecida com a água captada no Rio, a população relata coceiras na pele e processos alérgicos. Ainda houve um aumento das tarifas de água, e transmissão do custo do “tratamento” para os atingidos. Um parecer do Ministério Público de Minas Gerais aponta que a lama da Samarco não parou de poluir os afluentes do rio Doce, mesmo após determinação judicial que obriga a empresa a adotar medidas para cessar o vazamento.
    A empresa vem abandonando as negociações iniciadas com os movimentos sociais e ignorou diversos espaços de negociação coletiva, visando promover acordos individuais e desiguais. O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e o Movimento dos Atingidos por Mineração (MAM) acompanham mais de perto o caso dos atingidos desde o incidente e se propõem a organizá-los para que sejam feitos acordos coletivos que garantam seus direitos, porém já fizeram junto aos atingidos inúmeras reuniões com a Samarco, que não encaminha nenhuma ação efetiva que agregue os interesses coletivos. Esses movimentos denunciam a atuação e as omissões das instituições públicas na defesa dos sujeitos, bem como repudiam o acordo celebrado e feito à portas fechadas entre as empresas culpadas e os governos Estadual e Federal ao criar uma fundação que pretende definir todas as questões relacionadas à reparação das família atingidas. Esta mesma que definiria quem são e o que devem receber cada um dos sujeitos, sem que haja nenhuma consulta popular, fugindo das responsabilidades civis, criminais e financeiras, e querendo controlar os investimentos sociais e de recuperação do Rio Doce, sem ferir os interesses da mineração e desse modelo de desenvolvimento.

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

    Depois desses 6 meses de impunidade e injustiças que nos atingem, a pergunta que não cala é: Que tipo de desenvolvimento uma empresa bilionária oferece para ganhar a licença pra matar e destruir? Que alternativas temos para construir uma sociedade mais soberana, justa, que respeite de forma igual a natureza, a cultura e o trabalho de homens e mulheres? Lamentavelmente, o cenário que estamos presenciando há 6 meses não mudou muito desde a nossa primeira visita à região. É portanto, a criminosa quem continua velando a cena do crime!

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

     

    Por Isis Medeiros/ Levante Popular da Juventude

  • Lya*: um retrato da falta de casas abrigo em Belo Horizonte

    Lya*: um retrato da falta de casas abrigo em Belo Horizonte

    Na Ocupação Tina Martins, casos como o narrado aqui se repetem, escancarando a potência e autenticidade da luta por casa abrigo na cidade.

    Foto: Agatha Azevedo/ Mídia NINJA
    Foto: Agatha Azevedo/ Mídia NINJA

    Lya* é um nome fictício, que protege a protagonista desta história, uma mulher que sofreu abusos do homem e do Estado durante a trajetória que a trouxe até a Ocupação.

    Foto: Agatha Azevedo / Mídia NINJA
    Foto: Agatha Azevedo / Mídia NINJA

    Mais uma manhã começava na Tina Martins, uma ocupação urbana de caráter feminista e propositivo que começou na madrugada do dia da mulher, em BH. Para aquelas que despertavam no prédio, que um dia pertenceu à UFMG e hoje, após 10 anos de abandono, cumpria novamente uma função social, esta era mais uma quinta-feira de luta e resistência.

    Já são mais de 45 dias de Ocupação. Simbolicamente, 8 de março foi o primeiro deles.  E porque esta data? Era só olhar ao entorno. Nos sorrisos e na pele marcada das mulheres recebidas pelo Movimento Olga Benário se estampava a razão de estar no antigo prédio abandonado: a luta contra o machismo e a violência contra a mulher.

    Foto: Agatha Azevedo/ Mídia NINJA
    Foto: Agatha Azevedo/ Mídia NINJA

    A situação atual do Movimento é a de estar à procura de um local para continuar o trabalho de cuidado e acompanhamento de casos de violência. Como um grito por ajuda para as mulheres agredidas, a Ocupação Tina Martins é uma estratégia provisória, já que o prédio ocupado é no centro da cidade e locais de atendimento à vítimas de violência devem ser afastados e de difícil acesso para evitar novas agressões.

     

    Porém, apesar das tentativas de negociação das militantes do Olga Benário, o risco de desocupação é iminente e não há uma proposta por parte do governo de um local para que o trabalho que elas vêm fazendo, com a ajuda de médicos, psicólogos, advogados e outros profissionais possa continuar.

    Foto: Mídia NINJA
    Foto: Mídia NINJA

     

    Conheci Lya* por acaso. Desde que nasceu a Ocupação, a Mídia NINJA e os Jornalistas Livres têm acompanhado o trabalho das mulheres do Movimento Olga Benário, que reivindicam que o poder público cumpra o seu dever para com as mulheres, cidadãs de direito, e deem à elas suporte, cuidado, atendimento médico e psicológico e abrigo nos casos de abuso e outras formas de violência de gênero.

    Neste processo, tive a oportunidade de dormir e acordar ao lado delas por alguns dias. Me propus, junto com outras colegas, a somar nas equipes de trabalho da Tina, e comecei a ajudar na Comunicação e nas Redes Sociais da Ocupação. Num gesto simples, enquanto eu corria para fotografar uma ação cultural que ocorria no primeiro piso da Ocupação, fui interpelada pelo sorriso de Lya*, uma jovem transsexual, com seus aparentes vinte e poucos anos de idade, e a seguinte pergunta: posso te maquiar?

    Tímida, deixei. Fomos para perto de seu colchão, uma acomodação simples,  que ela dividia com suas duas companheiras – um caso de poliamor -, mas tão reconfortante  quanto o sorriso vitorioso dela, que estava de pé mesmo após ter passado por tantos baques na vida.

    Foto: Caroline Andrade/ Mídia NINJA
    Foto: Caroline Andrade/ Mídia NINJA

    O batom ia ser azul. Enquanto ela escolhia qual tom de sombra passar, foi me contando um pouco da sua vida. Carioca, ela deixou seu estado para vir para Minas em busca de recomeçar a vida. Seu trabalho? É muito difícil conseguir emprego sendo transexual no Brasil. Lya* já faz tratamento hormonal há 10 anos, segundo ela, os hormônios “deixam as pessoas meio loucas”.

    Entre uma pincelada e outra de sombra de tons azul e prata, escolhas dela para combinar com o meu jeito, Lya* ia narrando suas relações, a negação da família, o fato de a mãe não reconhecê-la como mulher mesmo sendo algo visível desde a infância, e a ausência da figura materna. As duas não se falam há mais de 10 anos, e quando ela entra em contato, só recebe silêncio como retorno.

    Com o cabelo trançado e longo e o toque delicado, Lya* continuava a me maquiar com paciência, limpando os borrados do meu olho, que não conseguia ficar parado durante nossa conversa. Ela era casada há 4 anos, em uma relação com duas mulheres. Uma transexual lésbica. E foi para a Ocupação Tina Martins após ter sofrido violência sexual em um abrigo público da prefeitura.

    Ao tentar denunciar, ela teve sua voz calada. “Não vai dar em nada mesmo”

    Lya, como tantas outras mulheres, negras, lésbicas, trans, mães, mulheres do interior, donas de casa, se encontra hoje amparada pela iniciativa do Movimento Olga Benário. E, fora da Ocupação Tina Martins, elas seriam engolidas pelo sistema, que não conseguiria encaixá-las em nenhum lugar e negligenciaria suas dores e as violências que elas sofreram e ainda sofrem na sociedade.

    Foto: Mídia NINJA
    Foto: Mídia NINJA

    O local precisa de doações de alimentos e de mais pessoas dispostas a embarcar no combate ao machismo e construir a casa abrigo. Enquanto isso, a resistência de Tina continua, com os braços aguerridos de muitas Lyas, Marinas, Claras, Isabelas e Carolines.

    Foto: Agatha Azevedo / Mídia NINJA
    Foto: Agatha Azevedo / Mídia NINJA
  • Democracia com arte e cultura pra barrar o golpe

    Democracia com arte e cultura pra barrar o golpe

    Mais uma vez o recado em Belo Horizonte foi dado: impeachment sem crime de responsabilidade fiscal é golpe. Mais 60 mil pessoas e mais de 30 artistas passaram pela Praça da Estação nessa quinta-feira, 31 de março. Parecia mais uma comemoração. E de fato era.

    Foto: Sô Fotocoletivo
    Foto: Sô Fotocoletivo

    Tanto artista reunido: do samba, do rock, do funk, da viola, do hip hop, da MPB. Haviam artistas clássicos da capital mineira, como Vander Lee e Titane, assim como expoentes juventude que tem mostrado muito talento, como Gustavito, Djambê, Bárbara Sweet, Sarah Guedes e outros.

    Foto: Lucas Bois
    Foto: Lucas Bois / Jornalistas Livres

    “Nós não fazemos música somente para entreter. Fazemos música para questionar aquilo que nos incomoda. E quando a gente tem a oportunidade de falar pra muita gente, é uma responsabilidade para o artista. A banda Djambê se apresentou aqui hoje porque acredita na democracia”, declarou a jovem cantora e compositora Priscilla Glenda.

    Foto: Alessandra Malachias / Jornalistas Livres
    Foto: Alessandra Malachias / Jornalistas Livres

    “Estamos em um momento claro que mostra que a arte transforma as pessoas, transforma a sociedade. Nós, enquanto artistas, temos a oportunidade de falar pra muita gente. O que está acontecendo: uma vitória e união de artistas pela democracia. Temos conseguido mostrar para as pessoas como a grande mídia está errada”. Gustavito Amaral – cantor e compositor

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    Fotos: Lucas Bois, Sô Fotocoletivo e Mídia NINJA

    “Nós, brasileiros, nunca tivemos a oportunidade de ter um governo de esquerda. Por isso, agora, queremos o direito de aprovar ou não nossa escolha. Sem golpe, sem violência e sem agressão moral!”. Vander Lee – cantor e compositor

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    Foto: Lucas Bois / Jornalistas Livres

    Durante toda a noite, a Praça era só alegria e vibração. Ali era um lugar para a troca, para o afeto, e o mais importante: para o reconhecimento da democracia.Foto: Nicole Marinho / Jornalistas Livres

    A diversidade era imensa e do alto do palco era possível visualizar a periferia presente, as mulheres, os LBGT, negros e negras, mostrando a força do povo brasileiro para construir um país mais justo e não ter retrocesso.

    Ao chamarem ao microfone do palco pelas regiões de Belo Horizonte, o grito do público mostrava que todas elas estavam representadas: de norte a sul. Também haviam pessoas de todas as idades.

    Foto: Sô Fotocoletivo
    Foto: Sô Fotocoletivo

    “O movimento está muito bonito. Esse apoio à democracia e à legitimidade é muito importante. Mas mais importante que tudo isso que está acontecendo hoje no Brasil éa opção pelas causas sociais. Isso que está em jogo. O empresariado, a Globo, a Fiesp, eles estão plantando essa crise no Brasil. Os grandes empresários estão diminuindo o lucro e estão querendo boicotar as programas sociais”. Júlio Costa – compositor e sociólogo.

    Foto: Mídia NINJA
    Foto: Mídia NINJA

    A Polícia Militar não compareceu à Praça da Estação, onde aconteceram o shows. Alguns carros, com a Tropa de Choque, ficaram na avenida ao lado, de sobreaviso. O comando era aproximar somente em caso de confusão, o que não ocorreu.

    Os mais lembrados naquela manifestação, e tidos como golpistas, foram a Rede Globo, que era maioria nos cartazes e ganhou projeções em paredes e prédios, o presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, e outros políticos, como o senador mineiro Aécio Neves. As críticas ao prefeito de Belo Horizonte Márcio Lacerda também não foram poupadas.

    O brilho do Canto da Democracia esteve presente no sorriso das pessoas, que foram e irão às ruas quantas vezes for necessário para barrar o golpe.

    Foto: Mìdia NINJA
    Foto: Mìdia NINJA
    Foto: Nicole Marinho / Jornalistas Livres
    Foto: Nicole Marinho / Jornalistas Livres