A medida do novo governo paralisa 1,7 mil processos para identificação e delimitação de territórios quilombolas e 250 processos de obtenção de terras.
Por Maura Silva
Da Página do MST
Desde a última quinta-feira (3), circula na internet um memorando – assinado pelo ex-diretor do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) Clovis Figueiredo Cardoso – que determina o sobrestamento de todos os processos de aquisição, desapropriação, adjudicação ou outra forma de obtenção de terras.
Segundo o texto o motivo para a decisão são as “novas diretrizes adotadas pelo novo governo no tocante ao processo de reforma agrária e demais ações pertinentes à Autarquia”, além do processo de transição pelo qual o Incra passará em “todas as suas instâncias”.
O texto também afirma levar em consideração a “recente mudança organizacional na Estrutura Regimental do Incra, bem como sua vinculação ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento”.
Segundo Alexandre Conceição da direção nacional do MST, o governo Bolsonaro já começa implementando medidas que vão levar a um acirramento e a uma geração de conflitos ainda maior no campo.
“O Brasil é o segundo maior país em concentração de terra, ficando atrás apenas do Paraguai, logo, atitudes como essa tem como principal objetivo proteger esses latifundiários em detrimento das mais de 120 mil famílias acampadas. É uma opção do atual governo”, afirma.
Jogo de interesses
Um segundo documento, também enviado no dia 3 de janeiro e assinado por Cardoso, determinou que as superintendências regionais disponibilizem, até amanhã (9), a relação de todos os imóveis que podem ser destinados para a reforma agrária. A exigência se escora na vinculação do órgão ao Ministério da Agricultura, chefiado por Tereza Cristina (DEM-MS)
Em 2008, Clóvis Figueiredo Cardoso, que foi exonerado logo após a veiculação dos documentos, foi indiciado pelo Ministério Público suspeito de participar de um esquema que fraudava a desapropriação de terras. A fraude, que ficou conhecida como: “a farra com terras da União”, era operada da sede do Incra de Mato Grosso. Na ocasião, 30 pessoas foram condenadas no caso, exceto Cardoso que, anos mais tarde, indicado pelo deputado federal Carlos Bezerra (PMDB-MT), esteve no comando do órgão.
Para fechar a primeira semana de desmandos do novo governo, um terceiro memorando dessa vez assinado pelo agora diretor de Ordenamento da Estrutura Fundiária Cletho Muniz de Brito, reforça o pedido para suspender os processos de compra e de desapropriação de terras, com exceção daqueles que tramitam na Justiça, e detalha que a determinação também vale para as áreas da Amazônia Legal.
Ainda segundo Conceição, ao contrário do que se propaga, a luta pela terra é inerente a qualquer governo, ela é uma reação natural ao desemprego, ao não desenvolvimento e a desigualdade social.
“A cultura latifundiária no Brasil subiu ao poder com o único objetivo de concentrar terra e aumentar ainda mais a desigualdade social. Esse é mais um passo do governo que vai caminhar em direção a extinção da Reforma Agrária”.
Ele completa:
“Ainda assim, a luta pela terra não vai cessar por conta dessa medida. Nós repudiamos veementemente essa atitude do atual governo que, embora não nos surpreenda, será combatida. De nossa parte vamos continuar organizados, lutando e denunciando no Brasil e no mundo a situação agrária no país”.
Líder do MST é sequestrado e assassinado no interior do Paraná
Neste final de semana, mais um militantes do MST foi assassinado, desta vez em Rio Bonito do Iguaçu, no interior do Paraná. Ênio Pasqualin foi executado a tiros, depois de ter sido retirado de casa por sequestradores. O MST divulgou nota cobrando o esclarecimento dos fatos, a investigação e prisão dos envolvidos.
“Há tempo a violência no campo é realidade no Paraná. Com a eleição de Bolsonaro e Ratinho Jr as coisas só pioraram”, afirma a presidenta do PT, Gleisi Hoffmann. O MST divulgou nota denunciando e cobrando o esclarecimento dos fatos, a investigação e prisão dos envolvidos
Bolsonarismo estimula violência no campo
Neste final de semana, mais um militantes do MST foi assassinado, desta em Rio Bonito do Iguaçu, no interior do Paraná. Ênio Pasqualin foi executado a tiros, depois de ter sido retirado de casa por sequestradores. O MST divulgou nota cobrando o esclarecimento dos fatos, a investigação e prisão dos envolvidos. A presidenta do PT e deputada federal (PR), Gleisi Hoffmann repudiou o bárbaro crime também cobrou apuração.
“Há tempo a violência no campo é realidade no Paraná. Com a eleição de Bolsonaro e Ratinho Jr as coisas só pioraram”, afirma Gleisi. “As ameaças de despejo são frequentes na Justiça e contra a vida de militantes, por parte de fazendeiros”, denuncia Gleisi. “O governo do PR tem obrigação de manifestar sobre o crime, apurá-lo e garantir segurança aos militantes da Reforma Agrária”, advertiu Gleisi em suas redes sociais.
De coordenador de base a dirigente estadual do MST Paraná, Ênio participou de diversas atividades e ocupações de terra na região de Rio Bonito do Iguaçu, segundo o MST. Líder dos assentados na região, Ênio comemorou seus 48 anos de vida junto a sua família, no dia 15 de outubro. “Tiraram a vida de um pai de um marido, deixando suas duas filhas, o filho e a esposa com uma dor inexplicável e inaceitável”, diz a nota da Direção Estadual do MST-PR.
NOTA DO MST
É com profunda tristeza que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) do Paraná comunica o falecimento do companheiro Ênio Pasqualin. O militante foi executado a tiros no município de Rio Bonito do Iguaçu, onde vivia com a família, no assentamento Ireno Alves do Santos. Ênio foi retirado de sua casa por sequestradores na noite deste sábado, e seu corpo foi encontrado na manhã deste domingo nas proximidades do assentamento, com claras evidências de execução.
O companheiro iniciou sua militância no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no ano de 1996, em Saudade do Iguaçu/PR. No mesmo ano, mudou-se para o acampamento Buraco, em Rio Bonito do Iguaçu/PR, fazendo parte de uma das maiores ocupações de terra do MST, em 17 de abril de 1996, quando três mil famílias Sem Terra ocuparam o latifúndio da Giacomet Marodin, atual madeireira Araupel.
De coordenador de base a dirigente estadual do MST Paraná, Ênio participou de diversas atividades e ocupações de terra na região de Rio Bonito do Iguaçu. Ênio Pasqualin sempre foi um camponês aguerrido na luta.
Em Rio Bonito do Iguaçu, Ênio e sua família criaram raízes, assentados no Assentamento Ireno Alves dos Santos no final de 1996. Ele continuou ajudando a construir a luta por Reforma Agrária, seja no âmbito da produção e na organização dos assentados quando foi Presidente da Central de Associações Comunitárias do Assentamento Ireno Alves dos Santos (Cacia), ou quando ajudou os filhos e filhas dos assentados e assentadas a se organizarem para continuar a luta pela terra na extensa área da Araupel.
No dia 15 de outubro, Ênio comemorou seus 48 anos de vida junto a sua família e hoje, 10 dias após seu aniversário, deixa sua família de forma inaceitável. Tiraram a vida de um pai de um marido, deixando suas duas filhas, o filho e a esposa com uma dor inexplicável e inaceitável.
À família e aos companheiros e companheiras enlutados os mais profundos sentimentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Cobramos o esclarecimento dos fatos, a investigação e prisão dos envolvidos. Aos nossos mortos nenhum minuto de silêncio, mas uma vida toda de luta!
Rio Bonito do Iguaçu/PR, 25 de Outubro de 2020. Direção Estadual do MST-PR
Os repórteres Katia Passos e Fernando Sato, dosJornalistas Livres conversaram com o poeta GOG, Genival Oliveira Gonçalves, no último dia 5, sobre sua carreira, que completa trinta anos em 2020, política, RAP e seu novo lançamento. O artista nascido em Sobradinho, no Distrito Federal, é conhecido como poeta do RAP Nacional e tem um grande histórico de contribuição para a construção do estilo no país, tendo sido o primeiro a abrir o próprio selo.
Ao relembrar os trinta anos de carreira, GOG destacou o papel político de suas canções ao abordar o racismo e os partidos de esquerda:
“Nossa carência política é de lideranças. Cadê as pessoas, a sororidade? Você não percebe isso nem na esquerda nem na direita. Quem está fazendo, quem está nas quebradas, hoje é o movimento social, é o MST que está produzindo.”
GOG também não poupou de suas críticas o governo Bolsonaro:
“Se tivesse teste psicotécnico, o Bolsonaro não seria presidente. Qualquer gestor público tem que passar por provas de inteligência emocional.”
O poeta ressaltou que o presidente perdeu a oportunidade de unir o país neste momento. Para ele a crise política dos partidos esquerda pode ser resolvida quando ela se voltar para si mesma, esquecer o Bolsonaro e voltar e para as base.
GOG destacou a importância das mídias independentes e como essa contra-narrativa dialoga com o próprio RAP, como forma de comunicação crítica de de produção de narrativas marginalizadas. Ao longo da entrevista, o rapper cantou alguns de seus sucessos, como ‘Assassinos Sociais’ e ‘Brasil com P’. GOG respondeu diversas perguntas dos internautas ao longo da entrevista, além das perguntas dos repórteres.
Ao falar de RAP, o poeta mencionou as importância das rappers, e o papel feminino na cena:
“É muita gente, a começar pela Ellen Oléria. Eu gosto muito tanto da música quanto da postura da Preta Rara. Ela me traz uma cena que passa pela transversalidade da música e da mulher negra mais empoderada”.
Para ele, o RAP é anti-sistêmico por natureza, por emocionar ao falar das realidades em que é feito. Sobre seu novo trabalho, o 12º disco, com sete faixas, terá participação de Renan Inquérito e Fábio Brazza. O foco é ancestralidade e nesse ponto contará com a participação, também, de Milton Barbosa do MNU (Movimento Negro Unificado).
Sobre o COVID-19, GOG lembrou:
“Nessa pandemia do coronavírus, tem que ter atitude. Mas qual o papel do governo e porque o estado mínimo não serve? O Estado tinha que estar preparado para receber, também, o que é emergência e o que não foi esperado”.
GOG insistiu sobre a importância de permanecer em casa, mesmo entendendo a preocupação de quem tem que sair para trabalhar: “Sem saúde você não traz o alimento”.
Na última terça-feira, 17, os acampamentos Zequinha e Pátria Livre, em São Joaquim de Bicas, na Grande Belo Horizonte, foram invadidos por viaturas da Polícia Militar que, sem nenhum mandado judicial, montaram um cerco intimidando as 5 mil pessoas que lá residem. A PM chegou até a armar uma tenda no acampamento. A invasão durou 42 horas, até as 6 horas desta quinta-feira, 19, quando a tropa de choque deixou o local duas horas após o horário estabelecido em acordo.
Porém, os policiais não saíram sem deixar a marca da violência na área, uma fazenda improdutiva do empresário mineiro Eike Batista. Na noite de quarta-feira, a PM destruiu uma bandeira do MST e avançou para dentro dos lotes atropelando os moradores e apoiadores, além de destruir jardins e plantações. Logo após um ato político inter-religioso celebrado pelo bispo Dom Vicente, os policiais desrespeitaram a liderança religiosa da Diocese de Belo Horizonte, atuando de forma desmoralizante e agressiva, afirmando que continuariam a invasão se fosse necessário.
Em uma ação de criminalização dos pobres e dos movimentos populares, a Polícia Militar reproduz na região metropolitana de Belo Horizonte a mesma violência aplicada às famílias Sem Terra de Felisburgo, no Vale do Jequitinhonha, de Campo do Meio, no Sul de Minas, e do Vale do Rio Doce. A responsabilidade das vidas colocadas em risco nesses territórios é do governo de Romeu Zema (NOVO) e do general Mário Lúcio Alves de Araújo, secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública, por serem coniventes com a violência da ação irregular irresponsável.
“O que nós vivemos aqui é uma reintegração de posse forçada, na tentativa de nos desestabilizar com tiros e com ameaças, da mesma forma que aconteceu e acontece no acampamento Quilombo Campo Grande, no Sul de Minas, e no acampamento Terra Prometida, no Jequitinhonha. Nós estamos aqui para denunciar o crime da Vale em Brumadinho e a exploração do território pela mineração que não traz riquezas para os municípios, e a única saída para o conflito é a garantia da terra”, disse Mirinha Muniz, da direção estadual do MST.
“A luta continua, seguimos ocupando as terras improdutivas de corruptos, terras da especulação imobiliária e da mineração predatória, combatendo o agronegócio e o capital que nos violenta, contra todas as formas de opressão. A justiça na terra se faz com reforma agrária e não com violência” acrescentou Mirinha.