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  • Abaixo-assinado propõe nome de estilista negra para diretoria da Vogue Brasil

    Abaixo-assinado propõe nome de estilista negra para diretoria da Vogue Brasil

    Baiana, Carol Barreto teve seu nome defendido por instituição para ocupar posto deixado por Donata Meirelles, socialite flagrada em festa de aniversário racista

    Yuri Silva

    O Coletivo de Entidades Negras (CEN), instituição nacional do movimento negro brasileiro, com capilaridade em 17 Estados do País e em três nações latinas, além de representação nos Estados Unidos, está viralizando na internet um abaixo-assinado online para emplacar o nome da estilista negra baiana Carol Barreto (festejada por suas coleções ativistas, inspiradas na cultura afro-brasileira) no cargo de diretora da Vogue Brasil. Para assinar, é preciso clicar aqui.

    A função ficou vaga após a socialite e esposa do publicitário Nizan Guanaes, Donata Meirelles, pedir demissão da publicação. Donata deixou a revista após um caso de racismo envolvendo a festa do seu aniversário de 50 anos, realizada em Salvador semana passada.

    Na ocasião, sentada em uma cadeira de ‘sinhá’, a agora ex-diretora da Vogue brasileira foi fotografada cerca de mulheres negras vestidas de ‘escravas mucamas’. O caso ganhou repercussão internacional, o que tornou insustentável a permanência dela no cargo.

    Agora, ativistas negros defendem que uma mulher negra deve ocupar a direção da revista de moda, conhecida por seu conteúdo racista e eurocentrado. “Donata feriu a imagem dos privilegiados quando posou de sinhá e ostentou as negras que lhes serviam. Ultrapassou o limite do ‘aceitável’”, diz o texto da petição, criada na plataforma Avaaz.

    No documento, o CEN propõe “tomar as riquezas da Casa Grande”. Carol Barreto, o nome defendido pela entidade, é Designer de Moda Autoral, Colunista da Revista RAÇA e Professora do Departamento de Estudos de Gênero e Feminismo da Universidade Federal da Bahia.

    Oriunda de Santo Amaro da Purificação – BA, trabalha com a relação entre Moda e Ativismo Político, construindo um trabalho de visibilidade internacional nas passarelas de Dakar, Paris, Luanda, e em galerias de arte em Chicago, Toronto, Nova York, Cidade do México, Williamsburg, Rio de Janeiro e Salvador.

    “A Vogue Brasil, ao obrigar a saída de Donata Meirelles da cadeira de diretora de estilo, pode agora fazer com que aquelas que são herdeiras da ancestralidade negra do Brasil retomem seus assentos”, diz o texto da instituição do movimento negro.

    “Essa cadeira pertence às negras e negros que construíram e constroem as riquezas do Brasil e que, em virtude do racismo, não participam dos dividendos”, afirmam.

    Caroline Barreto de Lima – conhecida no mundo da moda como Carol Barreto após trabalhos icônicos envolvendo a temática racial – também é membro do Colegiado do Bacharelado em Estudos de Gênero e Diversidade da Universidade Federal da Bahia (UFBA), atrelada ao do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (NEIM), órgão suplementar da UFBA.

    Doutora pelo Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade – PosCultura, também na UFBA (2015), mestre em Desenho, Cultura e Interatividade pela UEFS (2008) e Especialista em Desenho pela UEFS (2007), possui graduação em Licenciatura em Letras com Inglês pela UEFS (2004).

    É integrante da linha de pesquisa Gênero, Cultura e Arte do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (NEIM/UFBA), tem experiência na área dos estudos de Gênero, Sexualidade, Relações étnico/raciais e Moda, atuando principalmente nos seguintes temas: aparência, cultura, gênero e suas interseccionalidades.

    Desenvolve, ainda, trabalhos relacionados aos processos de redesenho na moda, averiguando as relações entre a linguagem, moda, o vestuário e a construção dos caracteres do gênero e das identidades sexuais. É colaboradora no programa de pós-graduação em Desenho, Cultura e Interatividade da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e graduada em Design de Moda da Unime.

  • Donata Meirelles foi obrigada a pedir demissão para Vogue Brasil não demiti-la

    Donata Meirelles foi obrigada a pedir demissão para Vogue Brasil não demiti-la

    A festa de aniversário de Donata Meirelles, diretora da Vogue Brasil, é exemplo de “racismo recreativo”. A “comemoração” dos 50 anos de Donata, que ocorreu em Salvador na sexta-feira (8), lembrava a escravidão. Tinha até um ‘trono de sinhá’ para que os convidados tirassem fotos ao lado de mulheres negras caracterizadas como ‘mucamas’

    Yuri Silva

    A socialite Donata Meirelles, esposa do publicitário baiano Nizan Guanaes e agora ex-diretora de estilo da revista Vogue Brasil, foi obrigada a pedir demissão da publicação internacional após o caso de racismo envolvendo sua festa de aniversário de 50 anos, realizada no Palácio da Aclamação, em Salvador, na última semana. O Baile da Vogue, festa que reúne artistas e personalidades próximo ao Carnaval e em 2019 aconteceria no dia 21, com o tema de antigas óperas, também foi cancelado.

    Denunciado por ativistas negros e personalidades antirracistas, o caso polêmico de mulheres vestidas de ‘escravas mucamas’ na comemoração, enquanto Donata sentava-se em uma cadeira de ‘sinhá’, tornou insustentável a permanência dela na revista.

    Segundo informações de bastidores, a única alternativa para ela foi pedir desligamento da função que exercia. Assim, contaram pessoas próximas, Donata evitou ser demitida – o que geraria ainda mais desgaste público para sua imagem e do marido.

    Após o assunto tomar conta das redes sociais, Donata já havia compartilhado comunicado da Vogue Brasil informando que um grupo de ativistas (espécie de fórum editorial negro) seria criado para ajudar a definir critérios de escolha de conteúdos que combatam a desigualdade. O anúncio, contudo, não foi suficiente e a pressão de ativistas sobre o comando da publicação continuou na internet.

    Até a cantora Elza Soares, porta-voz de pautas negras em seus trabalhos, escreveu um texto crítico à festa da socialite, que tinha como tema o ‘Brasil Colônia’. Entidades do movimento social negro brasileiro também emitiram nota e pediram a cabeça da socialite.

    Na tarde desta quarta-feira, 13, contudo, a notícia do pedido de demissão de Donata Meirelles veio a público. A informação já circulava entre pessoas próximas e artistas ligados à família Guanaes desde a noite de terça-feira, 12, mas não se sabia em que formato se daria a saída da diretora de estilo da Vogue Brasil.

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  • Um dia o engenho das ‘Donatas’ pega fogo

    Um dia o engenho das ‘Donatas’ pega fogo

     

    Por Marcos Rezende*

    Foram muitas as justificativas da “Casa Grande” para manter as suas posturas de mitológicos(as) democratas raciais. Ouvimos dizer que Donata, a diretora da Vogue é “boa e carinhosa” (Ivete Sangalo), que o sentimento dos críticos e das críticas era algo de rancor ou desrespeito, algo de quem os olhos “espreitavam por detrás do buraco da fechadura das redes sociais, muitos indignados, […] porque privados de participação no convescote […]” (Raul Monteiro, jornalista baiano).

    Achando pouco concordar com o projeto punitivo de Moro que amplia o excludente de ilicitude para policiais e reforça o extermínio do povo negro, Rui Costa, o governador do Estado mais negro do Brasil, participa da festa faz dancinha e posta nas redes sociais.

    Bom senso mesmo quem teve foi o Terreiro do Gantois, que cancelou a continuação da festa (sim, a última etapa do aniversário seria no espaço religioso) em respeito à ancestralidade do nosso povo.

    Enquanto isso, nessas últimas duas semanas, nos Estados Unidos, vários fatores demonstram como personalidades negras tem se comportado ou deveriam se comportar. A exemplo da cantora Rihanna, que não aceitou cantar no maior evento esportivo do País, a final do Superbowl, em respeito e homenagem ao jogador Kaepernick, que durante a execução do hino nacional se ajoelhava em sinal de protesto contra o racismo existente nos Estados Unidos e acabou sendo criticado por Trump e hoje está sem contrato.

    Também o rapper Drake protestou, ontem à noite, ao ganhar o Grammy e, ao aparecer de surpresa na premiação, estabeleceu forte crítica à indústria da música e valorizou as pessoas que reconhecem os artistas. O mesmo fez o ator e cantor Childish Gambino, que ganhou 2 Grammys e não foi buscar. Kendrick Lamar também não compareceu em protesto.

    Inclusive os três foram convidados para se apresentar na cerimônia e não aceitaram acusando a instituição Grammy de racista.

    Com certeza os brancos no Brasil fazem questão em não tratar disso. Como se essa realidade não existisse.

    Estamos cansados deste racismo que prega uma bondade que nunca inclui negros e negras, salvo quando na condição de serviçais, aqueles que sempre são dignos dos subcontratos, ou ainda quando na condição de quem conseguiu se adequar às regras da “Casa Grande” (por uma questão de sobrevivência, eu prefiro pensar). Não adianta pregar (falso) altruísmo, quando não se abre mão de seus próprios privilégios para que haja reparação.

    As críticas não se dão pela pobreza da Bahia, Raul Monteiro, pois ela não é pobre. Muito pelo contrário! A Bahia é de uma riqueza incomparável, seja pela grandeza de sua população, composta majoritariamente por mulheres negras, seja pelas suas riquezas naturais. As desigualdades que existem na Bahia, no Brasil e em grande parte do mundo se dão pelo racismo e pela concentração das riquezas nas mãos de uma minoria branca, ainda resquício do patriarcado de um Brasil colonial e escravocrata.

    Afeto, amor ao próximo ou qualquer altruísmo não são compatíveis com um país que foi o último a abolir o trabalho escravo. Ou melhor, a abolir o trabalho escravo do ponto de vista formal, já que a escravização dos corpos e da força de trabalho da população negra ainda se mantém como uma constante no Brasil. Negros e negras não são alvo da afetividade da elite branca brasileira, pois uma relação afetiva não permite a concentração de tantos privilégios para uns (umas) em detrimentos de outros (as). O nome que se dá a isso é subjugação, como estratégia do racismo de manter negras e negros no lugar do ostracismo serviçal.

    A perversidade é tão grande que as profissionais, baianas negras, sentem-se obrigadas a sair em defesa dos seus algozes, assim como negras e negros eram “obrigados” a serem “pretos (as) da “Casa Grande”. Assim, o racismo se retroalimenta, com um altruísmo deletério e seletivo, onde negras e negros são queridos quando se encontram nas “senzalas” contemporâneas, preferencialmente com vestes e poses que fazem alusão à condição de mucamas. O racismo que estrutura o nosso País não pode se naturalizar nem muito menos ser atenuado por um pedido de perdão e sob a justificativa de (falso) afeto.

    Já que não abrem mão das heranças e privilégios do processo de escravização, se assumam racistas e entendam que um dia o engenho pega fogo!

    *Marcos Rezende, Ogan, Historiador, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Social pela UFBA e Coordenador de Relações Internacionais do Coletivo de Entidades Negras (CEN)