Tanto a atenção do governo brasileiro aos indígenas quanto o combate à pandemia do novo coronavírus, são alvo de representações no Tribunal Internacional de Haia por crime de genocídio. Assim, os povos originários estão sendo duplamente atingidos.
Por isso, e a partir de uma ideia da doutora Isabel Teresa Cristina Taukane, primeira indígena formada pelo ECCO-UFMT, professores do Departamento de Comunicação da universidade montaram um projeto de extensão desenvolvido em conjunto por voluntários, indígenas e alunos da UFMT para promover a divulgação de informações importantes sobre o novo coronavírus aos povos indígenas de, pelo menos, sete etnias em Mato Grosso.
Já que a base da cultura dos povos indígenas é a comunicação oral e qualquer material impresso poderia ser vetor do vírus nas aldeias, a ideia foi criar pequenos arquivos de áudio, com quatro a seis minutos nas línguas faladas pelas etnias, para serem distribuídos em mensagens e grupos de WhatsApp.
Batizado de ÁudioZap Povos da Terra, o projeto visa fortalecer a rede de informações preventivas para o enfrentamento da COVID-19 por meio da produção e distribuição de conteúdo informativo direcionado para comunidades das etnias indígenas Bororo, Chiquitano, Kurâ-Bakairi, Paresí, Tapirapé, Umutina e Xavante, localizadas no estado de Mato Grosso.
Em cada “programa”, especialistas e profissionais de saúde dão orientações e a respeito das formas de transmissão e contágio do novo coronavírus e as complicações decorrentes da COVID-19 e as formas de tratamento e combate. Além dessas informações, há a fala de representantes dessas comunidades em português e também nas línguas das respectivas etnias, contando as experiências das comunidades com a pandemia e suas estratégias de combate e prevenção.
Até o momento, foram produzidos dois episódios-piloto e dois finais. Cada um têm versões inteiramente em português (compreendido também pelos Umutina), e também mesclando a língua nacional às dos Xavante, Bororo, Chiquitano e Kurâ-Bakairi.
As locuções em português são realizadas pelos integrantes do projeto de extensão e as falas nas línguas indígenas são capitadas por celular junto a líderes de seus povos. São eles e elas que traduzem as informações científicas sobre a doença e sua prevenção de maneira a ser melhor compreendida pelos indígenas de sua nação. O material finalizado volta às lideranças e já está correndo as aldeias, de celular em celular, ampliando dia a dia a rede que recebe e transmite os conteúdos.
Os próximos passos do projeto, que vai até dezembro, são a criação de um site para disponibilizar os materiais também na internet e a distribuição dos áudios para as rádios comunitárias de Mato Grosso.
Ora, diferente das universidades privadas, que nem sempre desenvolvem pesquisa e na maioria das vezes preparam profissionais para “o mercado”, as universidades públicas formam para a cidadania e se baseiam no tripé ensino-PESQUISA-extensão. Nenhuma pesquisa científica é feita isoladamente. Todas as pesquisas sérias, seja para o desenvolvimento de vacinas, produtos, sistemas ou análises políticas e sociológicas, envolvem grupos de pesquisadores (normalmente professores e alunos) que precisam necessariamente mostrar suas hipóteses, metodologias e resultados para outros pesquisadores de modo a validar as descobertas e divulgar o conhecimento. Os eventos acadêmicos, nacionais e internacionais, são exatamente o espaço para essa troca indispensável para o progresso da ciência. As universidades públicas são responsáveis por mais de 80% da pesquisa científica desenvolvida no Brasil e as federais ocupam a maioria dos lugares no ranking das 20 melhores instituições de ensino superior do país, dividindo o topo apenas com as estaduais paulistas.
Proibir pesquisadores e pesquisadoras de instituições federais de participarem de congressos, seminários e encontros é um tiro de canhão na pesquisa nacional. Aliás, o tiro de misericórdia num setor que vem tendo cortes cada vez mais profundos nas verbas desde o golpe que derrubou a ex-presidenta Dilma Rousseff. Nenhum país do mundo jamais admitiria que seu governo tomasse uma atitude dessas numa era em que conhecimento e informação são os ativos mais valiosos que uma nação possa ter. Sem pesquisa, sem inovação, sem desenvolvimento, a pátria voltará a ser unicamente uma exportadora de matérias-primas e recursos naturais, como era até 1808. Somente com a vinda da família real portuguesa ao Brasil, fugindo do exército francês, é que foram permitidas atividades como ensino superior, além de impressão de jornais e tecelagem. É para uma era anterior à independência, quando nossa economia era baseada em cana de açúcar e trabalho escravo, que estamos voltando sob o silêncio cúmplice da elite e da mídia hegemônica.
É passada a hora da comunidade acadêmica e da sociedade se unirem contra esse processo de terra arrasada do qual sobreviverão apenas as seis pessoas que sozinhas possuem o equivalente ao rendimento da metade mais pobre da população. Sem pesquisa, sem universidades, nem a iludida classe média alta que gerencia aqui os interesses do grande capital transnacional sairá impune. Se não brecarmos esse processo, em breve viveremos todos em um país distópico entre um fundamentalismo medieval e os mais caros serviços de acesso, por exemplo, à internet. Os poucos que não estiverem na miséria absoluta terão de enfrentar níveis cada vez maiores de violência, empobrecimento, doenças e falta de serviços públicos e proteção social. Preservar a pesquisa e o conhecimento nacionais é tão importante quanto preservar o meio-ambiente, o que, obviamente, também só se faz com ciência e tecnologia.
Em evento sobre escolas militares, sinistro da educação mente para professoras municipais dizendo que seu salário é baixo porque os professores das universidades federais ganham muito e trabalham pouco. Foto: www.mediaquatro.com
Veja abaixo a nota da principal entidade de pesquisa em comunicação no Brasil sobre o tema:
Nota de Repúdio à Portaria MEC 2.227, de 31 de dezembro de 2019
A Compós, por meio de sua diretoria e Conselho Geral, vem a público manifestar repúdio à publicação da Portaria MEC n° 2.277, de 31 de dezembro de 2019.
O documento, assim como outras ações encaminhadas pelo atual governo, denota o completo desconhecimento dos processos de desenvolvimento da pesquisa e do fazer científico na medida em que restringe, conforme indicado no Art. 55 caput e parágrafo único, a participação de pesquisadores de uma mesma Unidade em eventos nacionais e internacionais.
Travestida de interesse público, declara foco no controle e redução de gastos, mas opera via burocratização a restrição e o cerceamento da participação de pesquisadores em eventos mesmo em situações onde não há ônus para o erário.
Conjugada com a Medida Provisória 914, de 24 de dezembro de 2019, que interfere nos processos de escolha de dirigentes das IFES, possibilitando o aparelhamento das instâncias superiores e ferindo o princípio da autonomia universitária, tal ação institucionaliza a censura na medida em que determina a ampliação da participação “somente em caráter excepcional e quando houver necessidade devidamente justificada, por meio de exposição de motivos dos dirigentes das unidades, o número de participantes poderá ser ampliado mediante autorização prévia e expressa do Secretário-Executivo”.
Mais do que isso, ao declarar que “a participação de servidores em feiras, fóruns, seminários, congressos, simpósios, grupos de trabalho e outros eventos será de, no máximo, dois representantes para eventos no país e um representante para eventos no exterior, por unidade, órgão singular ou entidade vinculada” demonstra não compreender que eventos científicos são espaços onde pesquisadores apresentam resultados de seus trabalhos, favorecendo trocas com seus pares e constituição de redes de pesquisa, nacionais e internacionais, denotando desconhecimento da capacidade e importância de nossos pesquisadores e suas pesquisas.
Também repudiamos veementemente o desprezo com o debate e a transparência, denotados pela publicação de documentos de tamanha relevância sem diálogo prévio e na véspera de importantes feriados nacionais, aproveitando a desmobilização própria deste período.
Diante deste quadro, conclamamos toda a comunidade acadêmica, em especial a vinculada aos Programas de Pós-graduação em Comunicação, a atuar junto às respectivas Pró-Reitorias no sentido de constituir pressão contrária a tais ações com vistas à suspensão de tais documentos.
Informamos ainda que a Compós está atenta e alinhada às ações promovidas pela SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, que busca medidas jurídicas e políticas para a suspensão e reversão dos perversos efeitos desta portaria.
Diretoria e Conselho Geral da Associação Nacional dos Programas de Pós-graduação em Comunicação – Compós
O Ministro da educação se recusa a ouvir a opinião dos estudantes sobre os cortes na educação na reunião dos deputados, mesmo estes sendo convidados. O ministro disse que “Câmara não é lugar de estudante falar”, porém, as ruas ninguém cala.
O governo Bolsonaro não gosta de cultura, de educação, de pensamento crítico e desenvolvimento democrático, por isso vem fazendo ataques às universidades federais brasileiras. Assista o vídeo, e entenda porquê é absurdo cortar verbas das universidades públicas. #EleNão