Renata Souza: “A política de segurança pública no Brasil tem uma lógica de guerra”

Entrevista com Renata Souza na Casa do Brasil em Lisboa - Foto: Adja Marcela Barros

          Bruno Falci, correspondente dos Jornalistas Livres, em Lisboa

 

A deputada estadual do Rio de Janeiro Renata Souza esteve em Lisboa e  concedeu entrevista na Casa do Brasil, onde proferiu uma palestra sobre os defensores e defensoras dos direitos humanos no Brasil no dia 16/07.  Ela veio à Europa com o objetivo de  cumprir diversas agendas internacionais, com instituições oficiais e movimentos sociais. Em Lisboa cumpriu agendas politicas com partidos de esquerda e movimentos sociais. Participou também de um debate na Casa Ninja Lisboa, com outras mulheres negras, lideranças politicas em Portugal.

Arte do evento com a deputada Renata Souza na Casa do Brasil de Lisboa
Debate com a deputada Renata Souza e outras mulheres negras, lideranças politicas em Portugal. Na Casa Ninja Lisboa

A deputada esteve na no Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos da ONU, em Genebra, sendo recebida por Agnès Callamard, que atua como relatora sobre execuções extraoficiais, direitos das mulheres e movimentos de refugiados, e onde fez um informe sobre a situação da política pública de segurança no Brasil. Esteve também nos parlamentos francês e espanhol, onde manteve contatos com deputados progressistas que manifestaram preocupação com os rumos políticos do Brasil.

Renata Souza iniciou sua trajetória política como assessora da vereadora Marielle Franco. É jornalista, feminista, negra, militante dos direitos humanos e foi eleita em 2018,  Doutora em Comunicação e Cultura pela ECO/UFRJ, é a  primeira mulher negra presidenta da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Nesta entrevista, ela menciona também sua experiência no ativismo político iniciado no campo da comunicação comunitária.

Inicialmente, a deputada comenta sua participação como assessora de Marielle Franco:

“Foi uma atuação que já vem de longa data. Eu e Marielle crescemos juntas na Maré. Fizemos ali uma articulação e um ativismo em defesa dos direitos humanos da população negra e da juventude negra. Começamos a trabalhar juntas há doze anos com a Comissão de Direitos Humanos presidida naquela época pelo deputado Marcelo Freixo. Conseguimos construir uma metodologia de trabalho que foi o atendimento de pessoas que têm seus direitos violados. Nós nem éramos filiados ao PSOL e já fazíamos um debate sobre a importância das pessoas da favela, da periferia estarem em um partido. Fizemos também um trabalho com as mulheres negras que pudessem despertá-las para entrar na linha de frente da política e optamos pela candidatura de Marielle Franco. Eu coordenaria a campanha dela e pensando em estratégias de comunicação, pois essa é a minha área. Quando a elegemos, ela me convidou para ser chefe de gabinete diferente por ser mais participativo, muito compartilhado. Meu trabalho foi de coordenar a área de juventude e favela, que foi essencial no mandato de Marielle”.

Indagada sobre o assassinato de Marielle e a prisão dos executores, mas sem solução do crime, visto que os mandantes não foram revelados, Renata Souza diz:

“É estranho haver uma investigação da investigação, o que quer dizer que, em algum momento, alguém foi protegido, não nos fornecendo informações exatas para se chegar ao mandante do crime. Enquanto não soubermos quem mandou matar Marielle, o estado democrático de direito está em risco e não vejo vontade de quem está no poder hoje de dar solução ao caso”.

Na condição de especialista em segurança pública no Rio de Janeiro, Renata Souza  afirma que a  segurança pública no Brasil é um desafio há algum tempo:

“Temos números alarmantes. Em 2018, 65 mil pessoas foram mortas e nesse dado é muito simbólico que a cada dez assassinatos, sete são negros, pobres da favela ou periferia. Por outro lado, está colocada uma política pública de segurança que tem como principal instrumento uma lógica de guerra, nos termos de uma guerra contra as drogas, que devem ser tratadas como uma questão de política de saúde e não de segurança. O que  mata hoje no Rio de Janeiro e no Brasil não são as drogas, mas mas as armas  e os fuzis. É gritante que não temos ainda uma política pública de prevenção que utilize da inteligência para a policia chegar a quem deve chegar. Quem são os grandes traficantes no Brasil?  Um dos assassinos de Marielle tinha uma arsenal em casa, 117 fuzis. Trata-se de uma política que investe numa lógica de guerra, de enfrentamento, que prejudica sempre os mesmos, os pobres, os negros que estão nas favelas e nas periferias, que o Estado olha como a grande mazela da sociedade”.

A deputada conclui:

“Existe no Brasil de hoje uma grande polarização em relação aqueles que defendem  intransigentemente o direito à vida e aqueles que menosprezam a vida do outro, isso porque esse outro não está colocado numa mesma classe social ou numa mesma lógica meritocrática. Marielle é uma vitima concreta dessa relação, desse Estado que é muito perseguidor daqueles que defendem a vida de maneira muito intransigente”.

Entrevista na íntegra a seguir:

Agradecimentos a colaboração de Caroline Cicarello na filmagem e Adja Marcela Barros na fotografia.

 

COMENTÁRIOS

2 respostas

  1. a polícia militar aqui no Paraná ta matando sem piedade! é um extermínio cruel!

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