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  • João Doria ainda perde no embate da Reforma da Previdência em SP

    João Doria ainda perde no embate da Reforma da Previdência em SP

    Servidores lotam a galeria do plenário na Alesp Saiba das últimas informações sobre a Reforma da Previdência de João Doria

    A tramitação da PEC 18/2019, da Reforma da Previdência do Doria, encontra-se em estado de suspensão, desde a sexta-feira, 6/12, quando o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu liminar em mandado de segurança impetrado pelo deputado Emidio de Souza (PT)

    O pedido é uma reivindicação de toda a bancada petista que se opõe ao fato de a PEC 18/2019 ter sido apreciada, não pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), mas por apenas um deputado, designado relator especial pelo presidente da Assembleia Legislativa, o deputado Cauê Macris (PSDB).

    Acontece que, na manhã desta quarta (11/12), o desembargador Alex Zilenovski, do Tribunal de Justiça de SP despachou um novo pedido ao deputado Emídio para que ele se manifeste, quanto ao agravo apresentado pelos governistas da Alesp, que tentam desesperados, derrubar a liminar a qualquer custo e assim, ter o projeto discutido e votado rapidamente.

    O prazo para que Emidio de Souza se manifeste é de quinze dias.

    Na prática, isso quer dizer que, se a manifestação de Emidio for aceita, é possível que a suspensão da tramitação do projeto se prolongue e neste ano, não entre mais na pauta, pois o recesso da Assembleia Legislativa de SP tem probabilidade de começar em 20 de dezembro. A partir daí os trabalhos só retornam em fevereiro de 2020.

    O tempo ganho pelos petistas abre a possibilidade de estabelecer, agora sim, um verdadeiro diálogo democrático entre todas as partes e isso inclui o governo.

    A ideia é esclarecer, de uma vez por todas, as dúvidas e possíveis melhorias no projeto. Sem falar que, uma matéria com esse peso, que mexe com a vida de milhares de trabalhadores dos serviços públicos não pode ser aprovada de maneira célere, sem que os principais atores, esses servidores avaliem os impactos financeiros.

    Se votar, não volta, lema dos servidores na AlespA Assembleia tenta derrubar a liminar e, enquanto isso, continua tentando impor a aprovação de outro projeto que também trata da reforma da previdência, um Projeto de Lei Complementar 80/2019, de autoria do governador Doria. O PLC igualmente tramita às pressas pelo parlamento e até agora não foi discutido pelas comissões, pois em todas as que deveria ter passado, por força do que estabelece o regimento interno da Assembleia Legislativa, o PLC teve relator especial indicado pelo presidente Cauê. Esse parecer apresentado por relator especial não precisa de de manifestação pela comissão, ele é aprovado automaticamente.

    O deputado Teonilio Barba, que é o líder da bancada do PT vem insistindo na estratégia petista de impedir que situações bizarras como esta aconteçam.

    Ao mesmo tempo, Barba conversa com os trabalhadores públicos no sentido de animá-los para a pressão positiva sobre os deputados. “Precisamos conseguir votos para mudar a PEC da previdência do Doria, mais dura e cruel até do que a do governo federal”, disse o petista

    Diariamente vamos continuar trazendo novas informações.

    O deputado Emidio de Souza se manifestou nas redes sociais e explicou os próximos passos dessa suspensão.

    A Alesp já recorreu, na data de hoje, ao Supremo Tribunal Federal para derrubar a liminar e o deputado Cauê Macris (PSDB) aguarda a resposta.

    Assista:

     

    https://www.facebook.com/EmidiodeSouzaOficial/videos/773918206462403/

     

  • The Economist implora: um reformador pelo amor de Deus!

    The Economist implora: um reformador pelo amor de Deus!

    Os malabarismos da revista The Economist, na matéria que publicou sobre o bicentenário de Karl Marx, constituem um belo exemplo do funcionamento da imprensa corporativa hegemônica no mundo capitalista que vivemos.

    A revista diz que uma biografia de Marx deveria ter como subtítulo “um estudo sobre o fracasso”. Afirma que sua filosofia foi responsável pela fome, pelos gulags e pelas ditaduras que acometeram parte da humanidade. “Ele foi um ser humano horroroso”, aponta o texto, ressaltando que engravidou sua empregada e mandou o filho para pais adotivos. Acrescenta ainda frase atribuída a Bakunin que Marx era ambicioso, vaidoso, briguento, intolerante e vingativo. A revista assegura que Marx explorava Engels, que era um racista inveterado e que seus erros superam de longe seus acertos. A revista não disse que Marx era barbudo, cabeludo e feio. Imagino que lhes ocorreu acrescentar essas qualificações, mas recuaram.

    O artigo tem como título, entretanto, um incentivo para que os governantes do mundo o leiam e, como subtítulo, que seu diagnóstico sobre as falhas do capitalismo é surpreendentemente relevante. Como assim? Aquela pessoa horrível e fracassada deve ser lida pela classe dominante pois tem ensinamentos importantes? Sua análise do capitalismo, feita há mais de 150 anos, continua indispensável? Bem, estamos começando, afinal, a nos acostumar com o método de desmerecer a pessoa para tentar contornar o que é incontornável.

    O que deveriam os reformadores liberais fazer? The Economist responde:

    “Eles deveriam usar o 200º aniversário do nascimento de Marx para se familiarizarem com o grande homem – não apenas para entenderem as falhas sérias que ele identificou brilhantemente no sistema, mas para se lembrarem do desastre que os espera se não conseguir confrontá-lo.”

    Uai? Marx saiu de sujeitinho desprezível para “grande homem” em algumas linhas. Fizeram “copipeist” de escritos de mais de uma pessoa? Ou esperavam que a maioria só lesse o começo da matéria?

    A matéria coloca em evidência a tendência, apontada por Marx, do capitalismo em direção ao monopólio, já que as empresas mais fracas são impiedosamente engolidas. Lembremos que não existe preço de mercado no monopólio: o monopolista coloca o preço, e por decorrência seu lucro, onde quiser. “O Facebook e o Google sugam dois terços da receita publicitária online da América. A Amazon controla mais de 40% do crescente mercado de compras online do país”, salienta o artigo para exemplificar a concentração do nosso tempo.

    Tem mais. A revista aceita que os reformadores liberais “salvaram o capitalismo de si mesmo” e, mais ainda, que o modo de produção capitalista tende ao descontrole: “a globalização e a ascensão de uma economia virtual estão produzindo uma versão do capitalismo que mais uma vez parece estar fora de controle”. É preciso ser muito pessimista para achar que esse modo de produção, que sai frequentemente do controle e que precisa ser protegido de si mesmo, é o ponto mais alto de desenvolvimento social que os humanos são capazes de arquitetar, não é verdade?

    Embora a revista seja assumidamente conservadora e incentivadora da crença neoliberal, a matéria descortina certo temor com o andar da carruagem. Ele lembram que Marx ensinou que o capitalismo produzia um exército de trabalhadores de reserva que rodopiavam de uma ocupação a outra e complementam:

    “A economia gig [termo usado para a economia em que há grande número de trabalhadores temporários, sem vínculo empregatício] está reunindo uma força de reserva de trabalhadores atomizados que esperam ser convocados, por meio de capatazes eletrônicos, para entregar a comida das pessoas, limpar suas casas ou atuar como seus motoristas…O proletariado de Marx está renascendo como o ‘precariato’.”

    A revista mostra-se seriamente apreensiva:

    “Até agora, os reformadores liberais estão se mostrando tristemente inferiores aos seus antecessores em termos de compreensão da crise e de sua capacidade de gerar soluções.”

    Acho que essa frase me permitiu entender o objetivo da matéria. Era preciso, no entendimento deles, puxar as orelhas das classes dominantes para reformarem rapidamente o capitalismo, para dar-lhe uma sobrevida que traga conforto à “nobreza”. Os ensinamentos de Marx servem perfeitamente para este fim. Contudo, era preciso tirar da cabeça de todos aquelas ideias socialistas “pecaminosas” que caminham coladas com as críticas de Marx.

    Devem ter ficado com dores na coluna pelo contorcionismo excessivo. O custo, porém, não deve ter sido muito alto. O importante, para eles, é que o artigo permaneceu fiel à sua ideologia, ultraconservadora e neoliberal.

    Nota
    O artigo da revista The Economist está em https://www.economist.com/news/books-and-arts/21741531-his-bicentenary-marxs-diagnosis-capitalisms-flaws-surprisingly-relevant-rulers

  • Como a execução de Marielle se encaixa na crise

    Artigo de Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História da UFBA, com ilustração de Genildo

    Um dos maiores desafios para quem tentar interpretar a realidade no calor das circunstâncias é a compreensão do processo.

    Analisar um evento aqui e outro acolá não é exercício dos mais difíceis. A dificuldade está em conectá-los, em perceber relações de causa e consequência, em entender o “princípio orientador do processo”.

    Por exemplo, não é necessário ser um grande estudioso da política brasileira para saber que a execução da vereadora carioca Marielle Franco (PSOL), em 14 de março de 2018, foi um crime político motivado pela militância da parlamentar em defesa dos direitos humanos e pelas suas denúncias contra a violência policial.

    Mas qual é o lugar do assassinato de Marielle Franco na crise institucional que desde 2013 desestabiliza o sistema político brasileiro?

    Essa é a pergunta que tento responder neste ensaio e, para isso, reconstruo parte da história da crise brasileira, com o objetivo de destacar aquele que, na minha interpretação, é o seu aspecto mais elementar, o seu princípio orientador: a ofensiva do neoliberalismo contra o Estado.

    A quem deve servir o Estado? À sociedade civil ou aos interesses de uma elite financeira que descobriu ser mais lucrativo especular na Bolsa de Valores do que investir na cadeia produtiva?

    O mercado financeiro é instável, perigoso. Do dia para noite fortunas são acumuladas e perdidas. Quem coloca muito dinheiro nessa roleta russa precisa de segurança, de garantia. É por isso que o capital especulativo quer o Estado com contas públicas equilibradas, atuando como fiador da especulação. O rentismo é conservador, não gosta de correr riscos.

    Está aí o núcleo duro da crise, de uma crise que não é apenas brasileira, que é mundial.

    Ainda que a crise seja mundial, não tenho dúvidas de que o Brasil é o seu principal palco de manifestação. Hoje, o Brasil é um laboratório para o experimento neoliberal 3.0. Em nenhuma parte do mundo, os ataques do capital especulativo ao Estado foram tão violentos e chegaram tão longe como aqui.

    É por isso que a presidenta Dilma foi golpeada.

    É por isso que Lula foi condenado e, provavelmente, será preso.

    É por isso que Marielle foi executada.

    O golpe parlamentar que destituiu a presidenta Dilma, o rito jurídico viciado que condenou Lula e a execução de Marielle são partes de um mesmo processo. Não é possível tratá-los como eventos isolados.

    Começamos pelo golpe parlamentar travestido de impeachment.

    Muitas críticas podem ser feitas à presidenta Dilma Rousseff. A desonestidade e o envolvimento com práticas de corrupção não estão entre elas. Mas de nada serviu a conduta pública ilibada da presidenta, pois desde 2011 Dilma estava apostando muito alto.

    Ou, na feliz formulação de André Singer: Dilma “cutucou onças com vara curta”.

    Dilma provocou o sistema financeiro, onça raivosa, na famosa “batalha dos spreads”, quando mandou os bancos públicos reduzirem os juros operacionais.

    Resultado?

    Os bancos privados, para não perderem mercado, tiveram que competir com os bancos públicos e em meados de 2013 a economia brasileira tinha a menor taxa de juros em anos.

    Em setembro de 2013, Dilma sancionou a lei que destinava 75% dos royalties do petróleo para a educação e 25% para a saúde. O texto determinava ainda que 50% do Fundo Social do Pré-Sal seria direcionado para educação.

    Com Dilma, o Estado brasileiro foi longe demais nas suas pretensões de tutelar o desenvolvimento nacional. Soma-se essa ousadia à insistência da presidenta em combater à corrupção da classe política e teremos a explicação para o golpe parlamentar de agosto de 2016.

    O motivo do impedimento foi falacioso, uma invenção, mas bem representativo dos interesses do neoliberalismo. Dilma foi criminalizada por fazer política econômica anticíclica, por preservar a função social e civilizatória do Estado em um momento de crise de acumulação.

    E Lula?

    Por que o golpe neoliberal o persegue tanto se ele foi bem mais tímido que Dilma no confronto aos interesses do neoliberalismo nacional e internacional? Não podemos esquecer que Henrique Meirelles, ministro da Fazenda do governo golpista e principal liderança do neoliberalismo brasileiro, foi presidente do Banco Central durante toda a “Era Lula”.

    A relativa aproximação de Lula com a agenda neoliberal pode ser interpretada de duas formas: como indício de “traição” ou como maturidade política.

    Ou Lula foi um traidor da classe trabalhadora ou foi uma liderança astuta o suficiente para perceber que melhor seria dar os anéis para preservar os dedos. Vale lembrar que Lula não foi golpeado, terminou dois mandatos e elegeu a sucessora.

    Que o leitor e a leitora tirem suas próprias conclusões.

    Mas, seja como for, se por estratégia de sobrevivência política ou se por traição à causa dos trabalhadores, fato mesmo é que nos últimos anos Lula se tornou símbolo de um dos valores fundacionais do imaginário político brasileiro: a definição do Estado como agente provedor de direitos sociais.

    É por isso que Lula é o principal alvo do golpe neoliberal, que com a adesão de parte do Judiciário brasileiro utiliza a narrativa do combate à corrupção como estratégia de perseguição política.

    Ao associar Lula à corrupção, a mídia hegemônica, fábrica de narrativas do golpe neoliberal, pretende vender a imagem de um Estado arcaico que é naturalmente corrupto e corruptor.

    Lula é representado como a personificação desse Estado.

    Se no imaginário popular Lula personifica o Estado provedor de Direitos, na narrativa elaborada pelo golpe neoliberal ele representa um Estado patrimonialista e corrupto.

    E a solução para o problema? Simples: prender Lula e desmontar o Estado, o que na prática significam dois objetivos de um mesmo projeto. Por isso, o golpe neoliberal não fecha sem a completa destruição política e simbólica de Lula.

    Já a execução de Marielle se deu num outro momento da cronologia da crise, quando o golpe neoliberal, nas vésperas das eleições (ao que tudo indica, teremos eleições), tenta ganhar alguma popularidade, visando sua legitimação eleitoral.

    A intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro é a última cartada do governo golpista visando a legitimação eleitoral do golpe neoliberal, que sendo uma conspiração palaciana, em nenhum momento teve a sanção popular, como mostram todas as pesquisas de opinião, segundo as quais a aprovação de Michel Temer é uma margem de erro, algo próximo a zero.

    A população brasileira, cujo imaginário político é atravessado pela ideia de que cabe ao Estado prover direitos, reprova as reformas neoliberais efetivada na marra pelo governo golpista.

    Por isso, a Reforma da Previdência não passou, nem sequer chegou perto disso. Os deputados não quiseram colocar suas assinaturas num projeto tão impopular nas vésperas de uma eleição. A resistência não ocorre apenas nas ruas, fazendo greve e fechando o trânsito. A resistência acontece também no plano do imaginário.

    Por outro lado, as mesmas pesquisas mostram que a “Segurança Pública” já é a principal preocupação dos brasileiros, dado que é mais do que relevante em ano de eleição. As pessoas estão assustadas, querendo respostas.

    Por isso, está acontecendo a tal intervenção federal no Rio de Janeiro. O governo golpista não quis ficar refém do fracasso da Reforma da Previdência, o que o tornaria um cadáver político apodrecendo em praça pública até janeiro de 2019, quando (espero) tomará posse o novo governo, um governo eleito.

    Mas o que o assassinato de Marielle tem a ver com isso?

    Tudo!

    A vereadora Marielle Franco seria a relatora de uma comissão parlamentar destinada a acompanhar os rumos da intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro.

    Como socióloga especialista no tema, Marielle era uma crítica da intervenção, pois sabia perfeitamente que militares na rua só servem para aumentar a violência, sempre mais violenta nas comunidades carentes, sempre mais violenta com pessoas pobres e pretas.

    Como liderança política de esquerda, Marielle sabia perfeitamente o que estava em jogo com a tal intervenção.

    Por isso, Marielle foi morta, com quatro tiros na cabeça, sem nenhuma tentativa de dissimulação.

    Marielle foi silenciada, pois seria uma voz poderosa na denúncia do golpe, na denúncia da estratégia do golpe em utilizar a intervenção no Rio de Janeiro como palanque político, visando transformar Michel Temer num candidato viável ou, no mínimo em um cabo eleitoral influente.

    A morte de Marielle está sendo politizada por todos os lados, como não poderia deixar ser. Afinal, foi uma morte política.

    O golpe neoliberal tem uma narrativa para a morte de Marielle, que está sendo difundida pelo seu porta-voz, pelo departamento de jornalismo da Rede Globo: Marielle seria mais uma vítima da violência urbana no Rio de Janeiro, o que justifica a intervenção, o que confirma a necessidade da intervenção. Essa narrativa violenta a trajetória pública de Marielle Franco. É uma segunda execução. O cinismo golpista não tem limites.

    O campo progressista também tem suas narrativas: Marielle era mulher, negra, lgbt, socialista, favelada e, por isso, foi assassinada, executada, simplesmente executada. É como se os assassinos estivessem dando um recado para os iguais de Marielle: “Fiquem nos seus lugares e calados!”.

    A narrativa progressista está incompleta, pois falta a conexão do evento ao processo, da morte da Marielle ao movimento do golpe neoliberal.

    A narrativa progressista falha quando polariza com o bolsonarismo, quando trata o bolsonarismo como o grande inimigo da democracia brasileira.

    Segundo uma pesquisa da FGV, apenas 8% das postagens que na internet comentaram a morte de Marielle tiveram conteúdo ofensivo. Jair Bolsonaro não tem a adesão de 50% da população brasileira. Acredito mesmo que quando as urnas forem abertas, ele não terá mais do que 15% dos votos, o que em si já é um problema civilizacional gravíssimo, mas tá longe de ser uma situação de polarização eleitoral.

    De todos os sentimentos humanos, o ódio é o mais barulhento e, por isso, tendemos a superestimá-lo.

    A polarização é outra: de um lado estão aqueles que defendem o protagonismo do Estado na gerência do desenvolvimento nacional. Do outro lado, estão as forças motoras do golpe neoliberal, estão “os do Mercado”.

    Também não se trata de uma polarização eleitoral, pois a agenda neoliberal é rejeitada pela população brasileira. Hoje, nenhum candidato que defenda explicitamente as reformas neoliberais seria eleito. Disso todos têm certeza, com a exceção de Rodrigo Maia, Henrique Meirelles e Michel Temer, que parecem viver em uma realidade paralela.

    A polarização tem a forma de um conflito, de um conflito violentíssimo, pois o neoliberalismo controla as forças policiais, controla a grande imprensa, controla os três poderes da república. O neoliberalismo golpeia, condena sem provas e mata.

    O impedimento ilegal de Dilma, a condenação de Lula e a execução de Marielle representam o golpe neoliberal em movimento. O golpe neoliberal não é um evento. É um processo.

     

  • De um lado da avenida, militantes históricos, do outro, jovens que constroem uma história

    De um lado da avenida, militantes históricos, do outro, jovens que constroem uma história

     

    Vídeo de Laura Capriglione e Katia Passos e Fotos: Caio Chagas e Karla Boughoff

    A segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018, pode não ter sido um dia de milhões de pessoas nas ruas, de metrô, ônibus e trens paralisados em SP, mas sem dúvida, foi um dia histórico para novos e experientes militantes da esquerda contra a Reforma da Previdência e a intervenção militar no Rio de Janeiro. Já para mim, foi um dia de renovação.

    Desde muito cedo, movimentos sociais fizeram diversos trancamentos em grandes avenidas da cidade, panfletagens e caminhadas. Profissionais de educação pública, metalúrgicos e algumas outras categorias aderiram em peso aos protestos, para depois, se somarem às centrais sindicais e movimentos de moradia que estavam concentrados no vão livre do MASP.

    Mas de tudo que vi como jornalista livre nesta segunda, nada me deixou mais feliz, do que dois extremos geracionais que me encheram de esperança na Avenida Paulista.

    Numa ponta do ato, um grupo de militantes históricos da esquerda erguiam uma faixa que trazia os dizeres “Abaixo a Ditadura” e do outro, uma reunião de militantes muito jovens pintavam o asfalto com a frase “Intervenção militar no Rio é Ditadura”. Da maneira como descrevo agora, parecem ações muito simples, mas não são. Presencialmente, senti uma força amorosa no ar.

    Curiosa com a faixa que destoava daquelas confeccionadas em gráfica, fui logo conversar com um dos militantes “da velha guarda”.

    Eles me contaram que haviam passado o final de semana, criando a faixa de maneira “artesanal” e aproveitaram para debater sobre a formação de um comitê em defesa da candidatura de Lula que será lançado, em março, de maneira simbólica, na frente da casa do ex-presidente.

    O outro grupo, de jovens militantes batucava e cantava funks, sambas, tudo transformado em versões políticas contra a Reforma da Previdência, a prisão de Rafael Braga e o principal, simultaneamente, bradavam as rimas de luta e faziam, também de maneira bastante artesanal, uma intervenção usando rolo de pintura de parede e tinta branca no asfalto em frente ao vão livre do MASP.

    Até agora, não disse nada além do factual, mas é importante contextualizar para trazer quem não foi à manifestação em SP ou em outras cidades, para essas realidades.

    Ontem foi um dia importante para eu perceber que há tempos, eu, jornalista não milito verdadeiramente em protestos. Há tempos eu, jornalista não grito sequer um “Fora Temer”. E, embora eu viesse caminhando por esse Brasil, ouvindo de amigos próximos que estava fazendo a tal luta, eu, mesma, na realidade, acho que preciso fazer mais e muito mais.

    Aliás, quero dizer que depois do impeachment eu tive pensamentos sobre o que é ficar em paz ou alcançar alguma espécie de calma. Fiquei imaginando que poderia me dar ao luxo de ficar inerte, de parar de ter o gás dos militantes históricos que carregam hoje a faixa contra a Ditadura, que poderia deixar de fazer intervenções com a disposição da juventude.

    Depois da queda de Dilma, passei tempos e tempos pensando que tudo o que eu poderia fazer era ficar ali, no cafofo do meu apartamento, ouvindo Música Popular Brasileira e curtindo minha canabis. Saindo de lá, durante a semana para a redação e na portaria do prédio, eu me imaginava cega e surda para o mundo. Ia, voltava e tudo estaria bem. Na mediocridade do viver, eu deixando o tempo passar para não sofrer mais, revoltada com os mandos e desmandos de um país, que tem um Vampiro Neoliberal na presidência, revoltada por viver em uma terra que amo, mas que não me representa mais.

    Ah! Mas ontem eu acordei.

    Despertei de um pesadelo, daquele de cair da cama, onde eu estava mergulhada, desde, pelo menos, 2015, eu despertei!

    Aliás, desde sábado, depois de um post nas redes sociais, realizado por uma amiga preocupada sobre o que fazer para ajudar a população dos morros no RJ, na intervenção do Temer, acho que eu comecei a acordar.

    Mas, ontem, na Paulista aqueles dois grupos me balançaram. De dentro de mim, reviveu a militante negra de esquerda que estava querendo viver deixando a tal luta para depois. Saiu de mim a reação que a gente deve ter, frente a tempos de Temer, MBL, bancada da bala, bancada da bíblia, intervenção militar, lama, lama e lama. Os grupos de jovens e velhos que estavam ontem nas ruas podem agora sim, voltar a contar comigo. E eu queria muito contar com você que está em dúvida se agora é luta ou não. Revolta agora, só se for pra defender nossas irmãs e irmãos que estão sendo trucidados com ações temerosas.

    Como diz Oswald de Andrade, no Manifesto Antropófago “Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente”

    Eu vou fazer a minha Antropofagia por aí.

    Veja vídeo dos grupos que me empolgaram para novas e velhas formas de luta, todas lindas:

    https://youtu.be/gUVoFjBWcHA

     

     

  • ENTENDA O QUE MUDA NO SISTEMA DE APOSENTADORIAS DA ARGENTINA, SEGUNDO A PROPOSTA DE MAURICIO MACRI

    ENTENDA O QUE MUDA NO SISTEMA DE APOSENTADORIAS DA ARGENTINA, SEGUNDO A PROPOSTA DE MAURICIO MACRI

     

    Por Úrsula Asta especial para Jornalistas Livres

     

    Atualmente, as aposentadorias são modificadas duas vezes por ano (em março e setembro) pela chamada “lei de mobilidade da aposentadoria”. É uma norma que foi aprovada em 2008. Antes desta lei, aprovada durante a administração Kirchner, o governo nacional decidiu discricionariamente quanto se aumentaria as pensões.

    Segundo o projeto aprovado no Senado, e que agora pela segunda vez o governo argentino pretende adotar na Câmara para que se torne lei, a fórmula de aumento de aposentados e pensionistas, ou seja, dos veteranos da Guerra das Malvinas, pessoas com deficiência e beneficiários do plano social Atribuição Universal por Criança, seria alterada.

    De acordo com o projeto de reforma das pensões, a mobilidade (aumentos) será baseada em uma variação de 70% da inflação e em um aumento de 30% de acordo com a correção dos salários, que será aplicado trimestralmente nos meses de março, junho, setembro e dezembro de cada ano. Com este cálculo, os aumentos seriam inferiores do que até agora. Por exemplo, o próximo aumento dos aposentados será de 5,7%, em vez de um aumento de 12%, que seria o aumento de acordo com a fórmula atual. O que implicaria milhares de pesos em perdas para o bolso anualmente.

    Além disso, a nova lei concederia ao empregador o poder de intimar o trabalhador a se aposentar, uma vez que este último alcance 70 anos e atenda aos requisitos de aposentadoria.

    Além disso, o estado nacional diz que garante aos aposentados com 30 anos de contribuições o pagamento de um suplemento monetário até atingir uma pensão equivalente a 82% do valor do salário mínimo, vital e móvel. No entanto, o aumento não seria significativo uma vez que, atualmente, a aposentadoria mínima representa 81,8% desse salário mínimo. Ou seja, é quase nulo.

    Finalmente, é importante enfatizar que essa reforma – ou ajuste a aposentados e a todos que recebem pensões – vai de mãos dadas com outros projetos, a reforma tributária e a reforma trabalhista. Todos os três envolvem perdas de direitos e do poder de compra para a maioria.

  • “Porque no Carnaval eles não fizeram greve?”

    “Porque no Carnaval eles não fizeram greve?”

    Manhã de quarta-feira, Belo Horizonte, 09h44, e o rosto trabalhador que diz essa frase ao vento, sem destinatário, mas de certo modo endereçada à mim, já está na metade de sua jornada. Tanto hoje como no carnaval, ele teve que madrugar para servir de cobrador no trajeto que vai do bairro Xangrilá à estação Pampulha. Dormiu pouco, mas menos do que muitos outros cujas linhas iniciam mais cedo, essa tem seu primeiro horário pouco antes das 06h da manhã.

    No carnaval, nosso sujeito passível de análise também despertou no mesmo horário, e enquanto todos iam para as festas, ele nos arrancava os R$2,85 como quem tira doce de criança. Prazer sórdido? Não, falta de diálogo. Agora, este mesmo sujeito, que está na base de nossa sociedade trabalhadora, serve aos interesses de quem quer que ele se aposente mais tarde, e tenha apenas seis meses de expectativa de vida após pendurar o uniforme.

    Foto: Maxwell Vilela/ Jornalistas Livres

    “Se a gente não lutar, a aposentadoria vai acabar!”

    Essa é a frase mais falada do ato que começou na Praça da Estação e foi até a Praça da Assembleia em Belo Horizonte. Porém, o trocador não grita, nem ele e nem muitos outros trabalhadores. Nos quatro cantos do país, os movimentos sociais, estudantes, professores, sindicatos e trabalhadores a repetem como um mantra que escancara uma verdade: a de que o governo Temer não terá piedade nem de nós, que protestamos, quiçá dos trabalhadores que estão na base da sociedade.

    Nosso carnaval, símbolo deste povo que resiste, do corpo que performa desejo negado, foi a maior demonstração de que a política se faz nas ruas, com a ocupação do espaço público. Como diz Cristal Lopes, musa do carnabelô: “a política tem que aprender muito com o carnaval”.

    Foto: Maxwell Vilela/ Jornalistas Livres

    Fomos de Fora Temer em Fora Temer, negando o assédio estrutural que insiste em violar os corpos das nossas mulheres, dizendo sim ao funk e à voz da periferia, fazendo poética e festa com nossas próprias mãos e provando o que já foi dito pelo companheiro carnavalesco José Guilherme: “nosso carnaval foi conquistado.”

    Dentre os reajustes propostos para a previdência, está o caso do nosso amigo de todos os dias, o trocador. Hoje, 4 milhões de idosos de baixa renda, com mais de 65 anos, recebem um salário mínimo. Se a reforma passar a idade mínima será de 70 anos. Nós, mulheres, que trabalhávamos até 55 anos, iremos até os 65, junto com os homens, que iam somente até os 60. Isso sem contar os 25 anos obrigatórios de contribuição, um aumento de 10 anos da exploração de nossos corpos trabalhadores, que não tem nem o direito de festejar o carnaval.

    Diante desse cenário, me vem à cabeça a palavra de ordem dos nossos companheiros argentinos, que traduzida, fica mais ou menos assim:

    “Vamos à luta companheiros, vamos em frente, que isso nos pede toda gente.”

    Foto: Maxwell Vilela/ Jornalistas Livres