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  • URGENTE: Quilombolas de Rio dos Macacos (BA) gritam por socorro

    URGENTE: Quilombolas de Rio dos Macacos (BA) gritam por socorro

    Por Tatiana Scalco/Ciranda em parceria com os Jornalistas Livres 

    Na última madrugada (10/12), estranhos cercaram o quilombo Rio dos Macacos em Simões Filho/BA, região metropolitana de Salvador, mais uma vez. Circulando em volta das casas, tentaram forçar portas e janelas. A comunidade ficou em pânico, apavorada.

    Áudio 1: “a gente tá cercado aqui agora…Tem gente que tá em crise de pânico”

     

     

     

     

    Áudio 2: momento de desespero dos quilombolas de Rio dos Macacos, na noite de 10/12

     

    Áudio 3: “um dos assassinos está aqui, próximo da minha casa, pelo amor de Deus!”

     

     

     

     

     

    Os níveis de tensão no quilombo Rio dos Macacos se elevaram após o assassinato do Sr. Vermelho (José Esidio dos Santos, 80 anos, liderança local), em 25 de novembro último.  Hoje, a Polícia Civil informou que as investigações em relação ao assassinato do Sr. Vermelho estão em curso e há “indicativo de motivação e autoria”, contudo “mais detalhes não podem ser divulgados para não interferir na apuração do caso”. A 22ª Delegacia Territorial de Simões Filho é a responsável pelas investigações.  Sobre outras ameaças à comunidade quilombola de Rio dos Macacos, a Polícia Civil informou que “não há registro na unidade policial”.

    A deputada estadual Neusa Cadore, presidente da Comissão de Direitos Humanos e Segurança Pública da Assembleia Legislativa da Bahia, informou que está monitorando a situação e conversando com as autoridades do governo.

    A comunidade espera a ação das autoridades. E que as ameaças sejam levadas a sério.

    A Associação Quilombola Rio dos Macacos divulgará hoje a tarde nota sobre a situação.

     

    Entenda o caso

    Foto: reprodução Facebook

     

    O quilombo de Rio dos Macacos está localizado em Simões Filho/BA – região metropolitana de Salvador.

    Desde os anos 1950, a União tenta espoliar esse território quilombola. Nos anos 1960, a Marinha recebeu como doação do poder público parte do território tradicional da comunidade e construiu a Barragem do Rio dos Macacos. Nos anos 1970, instalou a Vila Naval de Aratu e impôs uma dinâmica social marcada pelo racismo, práticas abusivas e violações de direitos humanos. Desde então, há inúmeros casos registrados de violência física e sexual e de exploração do trabalho. Em 2009, a União ingressou com ações judiciais buscando expulsar a comunidade de seu território tradicional. A partir de então, as ameaças e violência cotidiana aumentaram. 

    Foto: Conac

    Nos últimos 10 anos a luta em defesa do território e pela vida negra quilombola ganhou outros contornos. A articulação política avançou. Os movimentos se articularam. Entre outros, foi apresentada denúncia de Violação de Direitos à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) em 2017, que destacou o sofrimento da comunidade “com espancamentos, tortura e ameaças cotidianas dos militares contra seus/as integrantes”.

    Até hoje a Marinha utiliza múltiplas estratégias de guerra contra a Comunidade. Sendo que muitas delas ultrapassam os processos judiciais e outras estão sendo legitimadas oficialmente pelo estado brasileiro. Até hoje moradores/as são impedidos de construírem ou reformarem suas casas, têm suas lavouras de subsistência saqueados. Além disso, não gozam de pleno acesso à água, saneamento básico e energia elétrica. As manifestações culturais e religiosas no quilombo Rio dos Macacos foram proibidas. Terreiros de candomblé foram fechados e destruídos, afetando diretamente seu patrimônio simbólico. 

     

     

     

  • Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência se diz contrária ao acordo para uso da Base de Alcântara (MA)

    Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência se diz contrária ao acordo para uso da Base de Alcântara (MA)

              Em carta enviada ao ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação, a Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência (SBPC) criticou o Acordo de Salva-Guardas Tecnológicas assinada entre o governo Bolsonaro e os EUA, acordo este que viola frontalmente o direito à consulta prévia, livre e informada, assegurada na Convenção 169 (C169) da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Estado Brasileiro em 22 de julho de 2002 e incorporada ao ordenamento jurídico pelo Decreto n. 5.051 de 09 de abril de 2004.
    Leia na íntegra a carta da SBPC, enviada no dia 06 de setembro para o ministro.

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    Excelentíssimo Senhor
    Ministro MARCOS PONTES
    Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) Brasília, DF.

    Senhor Ministro,

    Encaminhamos, abaixo, cópia de Moção aprovada por unanimidade pela Assembleia Geral Ordinária de Sócios da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada em 25 de julho de 2019, na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), em Campo Grande, por ocasião da 71a Reunião Anual da SBPC.

    Se possível, gostaríamos de receber manifestação de Vossa Excelência sobre o assunto, para divulgação aos sócios da SBPC.

    Título: Moção em discordância com os termos do acordo de salvaguardas tecnológicas Brasil e Estados Unidos

    Texto da moção: A Assembleia Geral da SBPC manifesta sua discordância em relação aos termos doAcordo firmado entre os governos de Donald Trump e Jair Bolsonaro sobre “salvaguardas tecnológicas”, relacionadas aos Estados Unidos com lançamentos a partir do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), assinado em Washington, em 18 de março de 2019. Este Acordo, além de não transferir tecnologia e silenciar sobre o destino das comunidades quilombolas, viola os direitos territoriais ao preconizar a expansão do centro espacial, ameaçando de deslocamento compulsório centenas de famílias quilombolas.

    A titulação da terra das comunidades quilombolas é garantida na Constituição Brasileira de 1988, no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). A luta das comunidades quilombolas de Alcântara pela titulação de seu território já se estende por quase 40 anos. O CLA foi instalado em território quilombola pela ditadura militar na década de 80 do século passado. Se for ratificado pelo Congresso brasileiro, esse Acordo vai permitir aos Estados Unidos implantar instalações relacionadas ao lançamento de foguetes e ampliar a área do CLA, que não possui licenciamento ambiental, deslocando comunidades quilombolas. Este Acordo foi assinado à revelia dos procedimentos legais que preveem a consulta prévia, informada e de boa fé.

    Mediante essas ameaças de direitos, vimos manifestar nossa oposição a este Acordo e em solidariedade às comunidades quilombolas de Alcântara.

    Atenciosamente,

    ILDEU DE CASTRO MOREIRA Presidente da SBPC

  • Deputadas do PSOL lançam plataforma para garantir os direitos dos quilombolas de Alcântara (MA)

    Deputadas do PSOL lançam plataforma para garantir os direitos dos quilombolas de Alcântara (MA)

    Para pressionar o Congresso para que seja realizada consulta prévia junto às comunidades quilombolas sobre exploração comercial do Centro de Lançamentos de Alcântara (CLA), as deputadas federais Áurea Carolina (PSOL-MG) e Talíria Petrone (PSOL-RJ) lançaram a plataforma Consulta Quilombolas Já.

    A situação dos povos quilombolas em Alcântara, no Maranhão, é grave.

    Precisamos reagir!

    Assine o abaixo-assinado!

    A plataforma, além de conter informações detalhadas sobre o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas – em tramitação na Câmara dos Deputados, apresenta um abaixo assinado para pressionar os congressistas para que as comunidades sejam consultadas – antes da votação – sobre um empreendimento que afetará dramaticamente a vida de mais de 800 famílias.

    Entenda o caso: 

    Via https://www.consultaquilombolaja.com.br

    No litoral maranhense, no município de Alcântara e sob a Linha do Equador, o Brasil mantém uma base estratégica para lançar foguetes e satélites. É o Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), construído no início da década de 1980 pelo regime militar.

    Para que o CLA fosse instalado, mais de 300 famílias quilombolas foram removidas de seus territórios ancestrais e realocadas em sete agrovilas afastadas do mar. Perderam, com isso, acesso direto à sua principal fonte de segurança alimentar e sustento econômico e tiveram seus modos de vida profundamente alterados. Essas comunidades aguardam até hoje a devida indenização e a titulação de suas terras.

    Essa história de violência pode estar prestes a se repetir caso o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST) entre Brasil e EUA para a exploração comercial do CLA, assinado em março deste ano, seja efetivado.

    A expansão do CLA para toda a costa de Alcântara, prevista pelo acordo, pode resultar na remoção de outras centenas de famílias. Para piorar, tudo tem acontecido sem qualquer diálogo com essas comunidades, desrespeitando a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Além disso, o Acordo pode comprometer a soberania brasileira

    Neste momento, o acordo tramita no Congresso Federal e os parlamentares podem evitar que esse histórico se repita.

    Não queremos mais violações aos direitos das comunidades quilombolas. Pressione os deputados a exigirem a realização de uma consulta às comunidades!

     

     

    De acordo com a Convenção 169 da ONU, da qual o Brasil é signatário e que tem força de lei no país, os povos e comunidades tradicionais devem ser consultados previamente sempre que qualquer decisão impactar seus territórios e modos de vida.

    No último dia 04/09 o plenário da Câmara aprovou o regime de urgência para tramitação do AST. Com isso, o texto fica pronto para ser discutido e votado pelos deputados.

    Até o momento, não há movimentação do governo Bolsonaro para cumprir a Convenção 169. Por outro lado, os quilombolas da região elaboram, por conta própria, um protocolo que permitirá referendar – ou não – a legitimidade da consulta promovida pelo poder público, caso ela ocorra.

     

    O VAI E VEM DO ACORDO:

    Achismos

    Até o momento, não foram apresentados estudos confiáveis sobre a rentabilidade do Acordo de Salvaguardas Tecnológicas e suas reais vantagens para o país. O que temos são apenas projeções vagas e sem qualquer fundamentação técnica.

    Desinformação

    O governo tem divulgado informações contraditórias sobre a expansão territorial da base – enquanto o Ministério da Ciência e Tecnologia garante que não haverá ampliação, o Ministério da Defesa afirma que isso deverá acontecer.

    Sem conversa

    A Convenção 169 da OIT – da qual o Brasil é signatário – determina que povos e comunidades tradicionais sejam consultados de forma prévia, livre e informada sobre projetos que afetem seus territórios e modos de vida. Não é o que vemos em Alcântara. Sem informações confiáveis sobre o que está por vir, os quilombolas de Alcântara estão temerosos sobre seu futuro.

    Auto-organização

    Enquanto o Estado brasileiro permanece omisso, os quilombolas de Alcântara estão elaborando, de forma autônoma, um protocolo para essa consulta. Isso permitirá a eles referendar – ou não – a legitimidade da consulta oficial do poder público. Os parlamentares são fundamentais para garantir que essa escuta aconteça!

    Marcas profundas

    As remoções da década de 1980 deixaram uma herança perversa para as comunidades. Adoecimento físico e mental, destruição de vínculos comunitários, migração de famílias para as periferias de São Luís, desemprego, escassez de alimentos, pobreza e proliferação da violência são apenas alguns dos problemas.

    Fracassos

    Não é a primeira vez que o CLA é objeto de acordos internacionais. Em 2000, o presidente FHC assinou com os EUA um acordo praticamente idêntico ao AST, rechaçado pelo parlamento sob a alegação de que ele feria a soberania nacional. Três anos depois, o presidente Lula firmou um acordo com a Ucrânia para o desenvolvimento aeroespacial do Cyclone-4 no CLA, encerrado em 2005 sem êxito financeiro ou operacional.

    Mais problemas

    Além dos impactos devastadores para as comunidades quilombolas, o acordo abre brechas para o uso bélico e militar do CLA pelos EUA. Também cria áreas restritas no interior da base que dependem da permissão do governo americano para ingresso. Tudo isso compromete aspectos de soberania do Estado brasileiro.
  • Comunidades quilombolas não foram consultadas sobre acordo para a base de Alcântara, no Maranhão

    Comunidades quilombolas não foram consultadas sobre acordo para a base de Alcântara, no Maranhão

    Em carta enviada ao Congresso em junho deste ano, o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Alcântara (STTR), o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar de Alcântara (SINTRAF), a Associação do Território Quilombola de Alcântara (ATEQUILA), o Movimento dos Atingidos pela Base Espacial (MABE), e o Movimento de Mulheres Trabalhadoras de Alcântara (MOMTRA) demonstram profunda preocupação com os impactos negativos que cerca de 800 famílias quilombolas sofrerão caso o “Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST) Brasil – Estados Unidos da América e Comunidades Quilombolas de Alcântara/MA” seja aprovado.

    Para o advogado e cientista político Jorgem Rubem Folena de Oliveira, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST) que trata do uso da base de Alcântara, assinado em março pelos presidentes Jair Bolsonaro e Donald Trump, dos Estados Unidos, é “completamente inconstitucional por atentar contra a soberania do Brasil”. No acordo assinado, não está previsto o repasse de tecnologia aeroespacial para o Brasil.

    A votação do requerimento de urgência do ATS está na pauta de amanhã da Câmara dos Deputados.

    “O governo também faz propaganda que “toda a região adjacente ao CLA será beneficiada pelo incremento imediato do desenvolvimento social e econômico refletido na geração de empregos, na criação de novas empresas e na ampliação do empreendedorismo e negócios de base local como restaurantes, hotéis, postos de gasolina, barbearias. Perguntamos: quantos e quais empregos serão gerados? Quantas novas empresas serão criadas? Quem financiará restaurantes e hotéis? Quais os serviços básicos de saúde, educação, saneamento e transporte que beneficiarão as comunidades quilombolas? Não há um estudo sequer, apresentando ou elaborado por especialistas independentes ou pelo governo que responda a estas questões. Ademais, como todas estas empresas e iniciativas serão instaladas na área sem o consentimento prévio das comunidades quilombolas de Alcântara, proprietárias do território?”

    Para os quilombolas, que não foram consultados como determina a Lei, o bem estar, a segurança alimentar e o direito de ir e vir estão ameaçados. Veja o documento na íntegra:

     

    Prezados Congressistas,

    O Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Alcântara (STTR), o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar de Alcântara (SINTRAF), a Associação do Território Quilombola de Alcântara (ATEQUILA), o Movimento dos Atingidos pela Base Espacial (MABE), e o Movimento de Mulheres Trabalhadoras de Alcântara (MOMTRA), em representação e atenção às comunidades quilombolas de Território Quilombola de Alcântara e as demais instituições subscritas vêm, pela presente, apresentar demandas e solicitar providências relativas à proteção de seus direitos territoriais e aos recursos naturais e contra deslocamentos forçados frente ao ACORDO DE SALVAGUARDAS TECNOLÓGICAS CELBRADO COM OS ESTADOS UNIDOS e consequente expansão do Centro de Lançamentos de Alcântara (CLA):

    1. Como é de conhecimento público, o Governo da República Federativa do Brasil assinou Acordo com o Governo dos Estados Unidos da América sobre Salvaguardas Tecnológicas Relacionadas à Participação dos Estados Unidos da América em Lançamentos a partir do Centro de Lançamento de Alcântara, em Washington, em 18 de março de 2019, pelo Ministro de Estado das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, pelo Ministro de Estado da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes, pelo Ministro de Estado da Defesa, Fernando Azevedo, e pelo Secretário Assistente, Escritório de Segurança Internacional e Não Proliferação do Departamento de Estados dos Estados Unidos da América, Christopher A. Ford.

    2. O referido Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST) foi enviado aos membros do Congresso Nacional pelo governo federal em 23 de maio de 2019, para aprovação, por meio da Mensagem n. 208.

    3. Para a efetivação do AST será necessário expandir a atual área do CLA– de 08 mil para 20 mil hectares – e, consequentemente, deslocar aproximadamente 02 mil quilombolas.1 Nenhum/a destes integrantes das 219 comunidades quilombolas, que vivem no território de Alcântara há mais de 200 anos, ou suas entidades representativas, foram consultadas sobre a assinatura do referido acordo, cujo efeito impacta diretamente a vida destas comunidades. A assinatura do AST sem consulta às comunidades quilombolas viola frontalmente o direito à consulta prévia, livre e informada, assegurada na Convenção 169 (C169) da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Estado Brasileiro em 22 de julho de 2002 e incorporada ao ordenamento jurídico pelo Decreto n. 5.051 de 09 de abril de 2004.

    4. O governo faz propaganda de que os serviços de lançamentos a serem realizados desde o CLA, contratados com empresas, são muito lucrativos. Estima que em “20 anos, devido a não aprovação do AST [assinado pelo então presidente, Fernando Henrique Cardozo, em 2001 e não aprovado pelo Congresso Nacional], o Brasil perdeu aproximadamente U$ 3,9 bilhões em receitas de lançamentos não realizados, considerando apenas 5% dos lançamentos ocorridos no mundo neste período, além de não desenvolver opotencial tecnológico e de turismo regional”.2 Não há um estudo sequer, elaborado por especialistas independentes ou pelo governo que corrobore esta afirmação. No Acordo firmado entre Brasil e Ucrânia em 2003 houve prejuízo de R$ 500 milhões ao Brasil sem que nenhum foguete tenha sido lançado. O insucesso desta empreitada é atribuído à pressão dos Estados Unidos sobre a embaixada da Ucrânia no Brasil para não transferir tecnologia espacial ao nosso país; justamente o que aquele acordo propiciava e o que o presente, com os EUA, veta. Documentos secretos filtrados pela organização Wikileaksrevelam que o governo americano escreveu à embaixada da Ucrânia no Brasilinformando que eles “não apoiavam o programa nativo dos veículos de lançamento espacial do Brasil” e que “[…] os EUA não se opõem aoestabelecimento de uma plataforma em Alcântara, desde que a atividade não resulte na transferência de tecnologia de foguetes ao Brasil”.3 Ademais, o atual AST é mais restritivo quanto ao acesso às áreas restritas, controladas, ou seja, a movimentação de pessoal brasileiro nas áreas restritas da base só vai acontecer com permissão e comum acordo do governo dos Estados Unidos.

    5. O governo também faz propaganda que “toda a região adjacente ao CLA será beneficiada pelo incremento imediato do desenvolvimento social e econômico refletido na geração de empregos, na criação de novas empresas e na ampliação do empreendedorismo e negócios de base local como restaurantes, hotéis, postos de gasolina, barbearias. Perguntamos: quantos e quais empregos serão gerados? Quantas novas empresas serão criadas? Quem financiará restaurantes e hotéis? Quais os serviços básicos de saúde, educação, saneamento e transporte que beneficiarão as comunidades quilombolas? Não há um estudo sequer, apresentando ou elaborado por especialistas independentes ou pelo governo que responda a estas questões. Ademais, como todas estas empresas e iniciativas serão instaladas na área sem o consentimento prévio das comunidades quilombolas de Alcântara, proprietárias do território?

    O documento de Wikileaks está disponível em

    https://wikileaks.org/plusd/cables/09STATE3691_a.html

    6. Os direitos das comunidades quilombolas não se referem apenas às compensações financeiras para aquelas que foram forçadamente deslocadas para as agrovilas há 30 anos, como entende o governo. O direito das comunidades é presente e atual, se estende a todo território quilombola de Alcântara já identificado e demarcado pelo INCRA, bem como aos recursos naturais nele inseridos, além do acesso ao mar. A propriedade quilombola é, por sua vez, imprescritível, impenhorável e inalienável.

    7. A Constituição Federal reconhece às comunidades quilombolas como patrimônio cultural imaterial da sociedade brasileira (Art. 216, § 5o) e assegura a emissão de títulos de propriedade definitiva de suas terras pelo Estado (Art. 68 ADCT).

    8. Diferentemente do que o governo prega, o AST afeta as questões fundiárias. As comunidades quilombolas aguardam há mais de 10 anos, a titulação coletiva da propriedade do território étnico, determinada pela 5a Vara da Justiça Federal do Maranhão em 27 de setembro de 2006 e nunca concluída pelo INCRA. Em 04 novembro de 2008, o INCRA publicou o Relatório Técnico de Identificação e Demarcação (RTID) do Território Quilombola de Alcântara, identificando 78 mil hectares como terras pertencentes às comunidades quilombolas, excluindo a área atualmente ocupada pelo CLA. Desde a desapropriação da área de 62 mil hectares pelos Governo do Estado do Maranhão e Federal, em 1982, para instalação do Centro de Lançamentos de Alcântara (CLA), as comunidades quilombolas têm sido sujeitas a toda a forma de violação de direitos, individuais e coletivos, por ação ou omissão do governo e suas empresas ou instituições, e ainda aguardam reparações.

    9. A figura abaixo indica a área de 12 mil hectares pretendida pelo governo para expansão da área do CLA.

    10. Entretanto, em novembro de 2008 a 5a Vara da Justiça Federal do Maranhão homologou acordo entre o Ministério Público Federal, a União e a Agência Espacial Brasileira, em que estas se comprometeram em não expandir a atual área utilizada pelo CLA (8,713 mil hectares). De igual modo, compreende-se que o CLA não poderá ser expandido para a implantação do Acordo com os EUA, ainda mais sem consultar as comunidades quilombolas.

    11. O governo nunca atentou, ou reconheceu, ao fato de que há uma conexão intrínseca, documentada pela perícia antropológica realizada pelo Ministério Público Federal,4 entre terra, território, meio ambiente, vida, religião, identidade e cultura enraizada nas comunidades quilombolas de Alcântara. Essa conexão se expressa pela rede de todas as comunidades quilombolas que promovem um intercâmbio social, cultural e econômico permanentemente que consolida um sistema de intercâmbio e uso dos recursos naturais de forma equilibrada. Ainda que cada comunidade possua limites sociais e tradicionalmente identificados por marcos concretos, os limites físicos não restringem o acesso aos recursos naturais, como ocorre no caso da propriedade privada de imóveis rurais. O domínio exercido pelas comunidades no território propicia que, em contextos de escassez, uma comunidade suprasua necessidade mediante o uso dos recursos naturais das outras, e vice- versa. É extremamente difícil estabelecer os marcos físicos da área de influência de cada comunidade. Quando se trata de roças e plantações, os limites são mais fáceis de identificar porque são estabelecidos em comum acordo entre as comunidades. Mas quando se fala em relações sociais, intercâmbios matrimoniais, econômicos ou rituais, as fronteiras entre as comunidades se alargam.

    12. Isso significa que a expansão da área do CLA para os 12 mil hectares pretendidos pelo governo federal vai afetar o equilíbrio das relações econômicas, sociais e culturais entre as comunidades quilombolas. Ela limitará o livre e permanente acesso das comunidades às áreas do litoral de Alcântara frente à proposta de criação de corredores nas áreas de lançamento. A restrição de acesso a recursos naturais essenciais como o mar, nascentes de água potável, árvores frutíferas, babaçuais, cocais, dentre outros, presentes nos 12 mil hectares, afetará a conexão e os fluxos econômicos entre as comunidades e o desaparecimento das fronteiras que identificam as territorialidades atuais especificas constituídas historicamente pelos quilombolas. A intensidade deste impacto negativo sobre as comunidades quilombolas, entretanto, nunca foi objeto de estudo técnico pelo governo federal, o que também viola a C169. E o mais grave, se instalará em Alcântara uma situação de insegurança alimentar sem precedentes.

    13. Mesmo frente à magnitude do AST e da proposta de expansão do CLA, o único estudo técnico realizado até o momento se refere ao grau de interferência da presença das comunidades (nos 12 mil hectares) na segurança dos lançamentos de foguetes pretendidos. Este estudo demonstra que há incompatibilidade entre a permanência das comunidades no território, suas moradias e roças, com a expansão do CLA.

    14. É de se destacar ainda que o CLA funciona há quase 40 anos sem licenciamento ambiental. Inexiste EIA/RIMA do CLA. Não é admissível que as operações de lançamento de foguetes ocorram sem que a comunidade alcantarense e a sociedade brasileira possam mensurar ou dimensionar os possíveis e reais danos à saúde e ao meio ambiente, gerados a partir das atividades espaciais no CLA. Entendemos que não se pode avançar nas tratativas referidas ao AST sem que esta questão do CLA seja resolvida.

    15. Após a assinatura do AST com os EUA, muitas audiências públicas, reuniões e seminários têm sido realizados em Brasília e no Maranhão, sem a efetiva e plena participação das comunidades e suas organizações representativas. As comunidades reiteram que querem e devem ser consultadas e incluídas nos debates sobre a expansão e o uso comercial do CLA, posto que é seu direito à consulta prévia, livre, informada e de boa-fé sobre quaisquer obras, projetos ou programas que se objetive realizar em seus territórios, tal como determina a C169 da OIT.

    16. Na prática, privilegiar o debate com o foco apenas na ótica comercial e tecnológica, predominante hoje no debate travado sobre o AST, só corrobora para assolar o cenário de invisibilidade e insegurança jurídica a que as comunidades quilombolas de Alcântara estão expostas. Solicitamos que o Congresso Nacional não adote prática similar.

    17. Neste contexto as comunidades quilombolas têm resistido às tentativas do governo federal de expandir a atual área do CLA, considerando que o objetivo principal da expansão é a exploração comercial do território – que alegam ser ultra bem localizado para lançamentos de veículos espaciais com economia de combustível – cujo mercado será dominado pelos EUA, já que o Acordo não prevê a transferência de tecnologia de lançamentos para o Brasil. A defesa dos direitos das comunidades quilombolas tem encontrado apoio no Ministério Público Federal, na Defensoria Pública da União, na Justiça Federal, na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), na Organização Internacional do Trabalho (OIT) e em organizações da sociedade civil. Duas denúncias internacionais contra o Estado Brasileiro tramitam na CIDH e na OIT por violações à Convenção Americana de Direitos Humanos e a C169.

    18. Por fim, cumpre informar que as comunidades quilombolas de Alcântara encontram-se em processo de elaboração do seu Protocolo Comunitário sobre Consulta Prévia, Livre e Informada.

    As comunidades quilombolas de Alcântara e suas instituições representativas, e as organizações que subscrevem esta carta, solicitam ao Congresso Nacional:

    1. a)  Que se abstenha de votar o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas firmado entre o Brasil e os Estados Unidos da América até que seja concluída a titulação do Território Quilombola de Alcântara às comunidades quilombolas, nos termos do Relatório Técnico de Identificação e Demarcação publicado pelo INCRA em novembro de 2008;
    2. b)  Que se abstenha de votar o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas antes da realização, pelo Executivo Federal, do Estudo de Impacto Ambiental e o respectivo Relatório de Impacto Ambiental do CLA;
    3. c)  Que se abstenha de votar a aprovação do Acordo de Salvaguardas Tecnológicas firmado entre o Brasil e os Estados Unidos da América até que seja realizada consulta prévia, livre e informada, com base na C169, com base no protocolo de consulta elaborado pelas comunidades;
    4. d)  Que desautorize qualquer deslocamento forçado de quilombolas frente à decisão do governo federal de excluir 12 mil hectares da área a ser titulada como propriedade quilombola em benefício da expansão do CLA;
    5. e)  Que, após cumpridos os itens acima, realize no mínimo 03 audiências públicas no Senado e na Câmara Federal, com ampla e efetiva participação das comunidades quilombolas e suas entidades representativas, para discutir o AST.

    Pedem e esperam deferimento.

    ASSOCIAÇÃO DO TERRITÓRIO QUILOMBOLA DE ALCÂNTARA (ATEQUILA).

    MOVIMENTO DE MULHERES TRABALHADORAS DE ALCÂNTARA (MOMTRA).

    MOVIMENTO DOS ATINGIDOS PELA BASE ESPACIAL (MABE).

    SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS NA AGRICULTURA FAMILIAR DE ALCÂNTARA (SINTRAF).

    SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE ALCÂNTARA (STTR).

    CENTRO DE CULTURA NEGRA DO MARANHÃO – CCN/MA.

    COORDENAÇÃO NACIONAL DE ARTICULAÇÃO DAS COMUNIDADES

    NEGRAS RURAIS QUILOMBOLAS (CONAQ).

    DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO/ DEFENSOR REGIONAL DE DIREITOS HUMANOS NO MARANHÃO (DPU/MA).

    FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES DA AGRICULTURA FAMILIAR DO MARANHÃO (FETRAF/MA).

    FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES RURAIS AGRICULTORES E AGRICULTORAS DO ESTADO DO MARANHÃO (FETAEMA).

    JUSTIÇA GLOBAL (JG).

    MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA/MA (MST/MA).

    REDE SOCIAL DE JUSTIÇA E DIREITOS HUMANOS.
    SOCIEDADE MARANHENSE DE DIREITOS HUMANOS.