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Tag: PSDB

  • A revolução da educação na quebrada é feita pela própria quebrada

    A revolução da educação na quebrada é feita pela própria quebrada

    “Nasci no escadão da Vila Solange, Guaianazes e tudo que sei sobre a vida aprendi aqui.”

    Assim começa o bate papo online que tive, na tarde desta sexta (19/06), com Pamela Vieira, bióloga e gerente de baladas que encontrei num grupo de Whatsapp.

    A postagem que estimulou esse contato trazia uma série de fotos de crianças da zona Leste de São Paulo estudando juntas, dentro de uma casa simples, como se fosse uma sala de aula improvisada. As imagens, em ampla maioria, mostravam mulheres negras da comunidade orientando as crianças em atividades recreativas e educacionais. Vi ali um cenário tão organizado – ou até melhor – que uma sala de aula de escola particular de um bairro de classe média da capital. O post havia sido publicado no grupo pelo professor de artes negro João Tody. 
    Imediatamente, lembrei do Ensino à Distância tão vangloriado por João Doria, governador de SP, e que tem sido seriamente criticado não só por pais e professores como, também, por estudantes que desde o início da pandemia do novo Coronavírus denunciam dificuldades absurdas para acessar as aulas.
    Além do improviso pedagógico e da falta de estrutura para amparar educadores nessa nova modalidade de ensino, não foram levados em consideração problemas inerentes à uma proposta de ensino universal; como a falta de acesso a computadores pelos alunos ou as péssimas conexões de internet, especialmente, em bairros das periferias de São Paulo.
    Tudo feito pela comunidade
    Aquelas fotos que retratavam a iniciativa em Guaianases me emocionaram. Resolvi saber mais sobre aquelas crianças e os métodos de organização das atividades. De cara, descobri que tudo é completamente autônomo, sem o incentivo de nenhuma empresa e subsidiada pelos próprios moradores do local. Algumas doações de materiais escolares vieram de pessoas próximas ao bairro.
    A bióloga, Pamela Vieira é a idealizadora do projeto

    Quando perguntei a Pamela o porquê de ter iniciado a atividade, ela trouxe a realidade de sua infância. “Parei um dia para observar a vida das crianças ao meu redor, inclusive do meu filho, e vi que por mais que ainda existam as brincadeiras, faltava educação de escola mesmo. Lembrei que quando pequena eu sempre brincava de escolinha com minhas primas e assim aprendia muitas coisas. No início dessa pandemia, me sentia muito triste e para não me entregar a uma depressão, decidi me ocupar dando amor e atenção a essas crianças e recebendo em dobro.“ 

     

    A iniciativa educativa atende cerca de 25 crianças e adolescentes que vivem nessa região da cidade e muitas ainda não são alfabetizadas. Algumas famílias têm mais de 5 filhos, todos crianças pequenas e muitos pais não conseguem, durante a pandemia, manter em seus lares o ritmo de aprendizado das escolas onde estudam. Assim, Pamela conta que o intuito do projeto é fazer com que esse tempo fora das “salas de aula oficiais” seja produtivo. Ela acha imprescindível ensinar e reforçar de forma divertida e criativa o papel da escola. As aulas acontecem entre 10h e 14h, de segunda a sexta.
    A maioria das crianças vive o dia inteiro em seus quintais, algumas são órfãs de pai ou mãe ou às vezes dos dois. Algumas moram com avós. O perfil predominante é daqueles que não têm o pai presente e, neste caso, suas mães trabalham em casa mesmo. Em tempos de pandemia, crise e fome crescentes, a situação anda cada vez mais trágica.
    A bióloga defende que o projeto vai fortalecer a educação dessas crianças, não só no tema da alfabetização, mas filosoficamente, pois uma visão sobre quem eles são e tudo que podem ser começa a ser ampliada.
    O professor João Tody vai doar para as crianças suas experiências na arte

    O professor João Tody, que me alertou sobre a iniciativa, também vai se juntar às crianças e na próxima semana, iniciará aulas de artes para a molecada por lá. “Antes nós achávamos que a revolução seria feita quando algum senhor de terno, barba e óculos aparecesse na quebrada e criasse um projeto social, mas ninguém com essas características chegou por aqui e percebemos que a revolução teria de ser uma iniciativa de nós mesmos.” diz, Tody

    Importante dizer que além de aprender, as crianças recebem o lanchinho todos os dias. “A gente faz um pão com manteiga e nescau, ou bolacha com suco. A maioria das coisas que eles comem eu mesma compro e outros doam bolachas e doces. Para arrecadar algum dinheiro eu vendo geladinhos aqui em casa. As vezes, acham que somos salvadores dessas crianças, mas são elas é quem nos salvam.” Finaliza, Pamela

    Importante: no retorno às suas casas, crianças e pais cumprem rigorosamente todos os protocolos de assepsia e cuidados contra o COVID-19
  • O fim da Comissão de Constituição, Justiça e Redação na Alesp

    O fim da Comissão de Constituição, Justiça e Redação na Alesp

    Janaina Paschoal (PSL) fez levantamento dos mais de cinco mil projetos que tramitam na Assembleia Legislativa e concluiu que muitos deles não contem correção técnica e formal. Propõe liquidá-los no plenário e reiniciar do zero, seja lá o que signifique isso para a deputada.

    O assunto continuou durante a sessão de 28/3 e o líder do governo, Carlão Pignatari (PSDB), concordou com a observação. Propôs inclusive que os procuradores da Alesp, que são, segundo ele, muito competentes, formem com os deputados “uma pequena comissão, com uns três deputados”, e passem um pente fino nos projetos em tramitação no parlamento paulista e, em especial, nos vetos. O presidente da Assembleia, Cauê Macris, do PSDB, achou boa a ideia.

    O parlamento é espaço de disputa. E projetos de lei, mais do que proposta de ordenamento legal, podem ser instrumentos para essa disputa. Por isso, não pela primeira vez, são lançadas propostas de controle sobre essa prerrogativa parlamentar.

  • Dilúvio, falta de obras anti-enchentes e prefeito passeando pelo mundo

    Dilúvio, falta de obras anti-enchentes e prefeito passeando pelo mundo

    Por Vereador Antonio Donato (PT)

     

    Enquanto a população contabiliza os prejuízos com a chuva entre a noite de domingo (10) e a madrugada de segunda-feira (11), uma olhada nos gastos da Prefeitura de São Paulo em combate às enchentes mostra queda de investimentos nessa área e explica o caos vivido na cidade.

    A gestão Doria/Bruno Covas reduziu em 34% a média dos investimentos em manutenção e obras de combate às enchentes e alagamentos. Dos R$ 630 milhões em média entre 2013-2016, os recursos para esses serviços caíram para R$ 413 milhões na média no período 2017-2018. Os dados são do SOF – Sistema de Orçamento e Finanças – da Prefeitura de São Paulo.

    E o motivo não é falta de recursos. De 2014 para 2018 a receita municipal cresceu 31%, enquanto os investimentos tiveram queda de 49% .

    O mais lamentável de tudo isso é constatar que, enquanto a cidade de São Paulo vive um verdadeiro caos – e boa parte dos problemas se deve à inaptidão do PSDB para administrar o maior município do Brasil –, o prefeito Bruno Covas está mais uma vez ausente. No sábado (9) o tucano entrou em licença “por motivos pessoais” durante sete dias.

    Desde 1º de janeiro de 2017, quando ainda era vice-prefeito, Bruno Covas se ausentou 108 dias da cidade de São Paulo. Desse total, 46 dias foram para tratar de assuntos particulares. O fato é que Bruno Covas gosta muito de viajar, mas não demonstra o mesmo apetite na administração da cidade. Vide os problemas com zeladoria (limpeza e manutenção de espaços públicos) da cidade, que tem deixado muito a desejar, embora tenha sido eleita como prioridade da gestão Doria/Covas.

    São Paulo sofre com a Síndrome do Abandono Tucano. Prefeitos eleitos do partido fogem do cargo e adoram viajar, em vez de trabalhar pela cidade. É o caso de José Serra, João Doria e agora Bruno Covas.

    Vereador Antonio Donato (PT)
    Câmara Municipal de São Paulo

     

    VEJA AQUI A VOLTA AO MUNDO DO PREFEITO AUSENTE

  • A REFUNDAÇÃO DO ANTIPETISMO

    A REFUNDAÇÃO DO ANTIPETISMO

     

    Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História da Universidade Federal da Bahia, com ilustração de Edu

     

    Que o antipetismo é elemento eleitoral decisivo no Brasil não é nenhuma novidade. Mas nessas eleições aconteceu algo diferente. Assistimos a refundação do antipetismo. O antipetismo se transformou, foi tratado em outros termos e passou a ter novo dono. É esse novo antipetismo que analiso neste ensaio.

    Pra isso, apresento uma breve história do antipetismo. Aquela velha e boa síntese histórica que sempre ajuda a colocar as ideias em ordem. O conhecimento histórico é útil à vida.

    O primeiro antipetismo

    O primeiro antipetismo explica em parte a vitória de Fernando Collor de Melo, lá nas eleições de 1989. Naquela altura, o antipetismo ainda estava muito marcado pelo anticomunismo típico dos tempos da Guerra Fria, algo que na bibliografia especializada costuma ser chamado de “marcarthismo”.

    Na época, Lula era pintado pela grande mídia como um revolucionário comunista que atacaria a propriedade privada.

    Aqueles eram os tempos do “Consenso de Washington”, que em 1989 reuniu o FMI, o Banco Mundial e o Departamento de Tesouro dos EUA para apresentar uma agenda de austeridade econômica e desmonte do Estado para o mundo, especialmente para a América Latina.

    A candidatura de Fernando Collor de Melo representava a agenda do Consenso de Washington. O PT era o antagonista dessa agenda. Temos aí a origem do antipetismo. Na real mesmo, não tinha nada a ver com o “comunismo”, mas sim com a atuação do PT na resistência à implantação de uma agenda neoliberal no Brasil.

    Esse ranço anticomunista sobreviveu e continua sendo um dos elementos formadores do novo antipetismo. Esse é um ponto em comum entre o primeiro antipetismo e o antipetismo refundado.

    O curioso é que em nenhum momento dos últimos 30 anos, o PT nem sequer chegou perto de ser comunista. No começo, a proposta era ser um partido capaz de libertar os trabalhadores da tutela do sindicalismo corporativo herdado da Era Vargas, assumindo claramente o compromisso com o respeito à ordem democrática. Por isso, os fundadores do PT falavam em um “novo sindicalismo”. O objetivo do PT, lá na década de 1980, era construir hegemonia na sociedade civil e depois ganhar o território das instituições, no Legislativo e no Executivo, sempre por meio do voto e dos ritos da democracia liberal representativa.

    O segundo antipetismo

    Na década de 1990, aconteceram importantes mudanças na cena política brasileira, que resultaram na transformação do antipetismo. Essa foi a segunda geração do antipetismo. Entre essas mudanças, destaco o transformismo tucano. Quando falo em tucanos, obviamente, estou falando do PSDB.

    O PSDB nasceu em 1988 como uma dissidência de esquerda do PMDB. É isso mesmo, leitor e leitora, o PSDB surge como um partido progressista e até os primeiros anos da década de 1990 dividiu com o PT esse campo político. É estranho para quem começou a acompanhar política nos anos 1990 saber que, em algum momento, PT e PSDB estiveram próximos, foram aliados. Pois foram. O tempo passa e o mundo gira.

    Essa aliança terminou quando o PSDB adotou as diretrizes do Consenso de Washington, aderindo à agenda do neoliberalismo internacional. Isso aconteceu com clareza nas eleições presidenciais de 1994. A partir daí, cada vez mais o PSDB foi indo para a direita e abandonando a social-democracia, o que acabou fazendo com que o PT ocupasse sozinho o campo progressista.

    Na prática, ser progressista na década de 1990 e no início dos anos 2000 significava ser opositor de uma agenda econômica baseada nas privatizações, no alinhamento geopolítico com os EUA e no ataque aos direitos trabalhistas e previdenciários.

    O novo antipetismo

    O terceiro antipetismo surgiu agora, em 2018, mas vem sendo plantado desde 2005. Esse novo antipetismo tem a particularidade de ser alimentado pelos 13 anos de governos petistas.

    Como eu já disse antes, alguns elementos da primeira geração do antipetismo sobreviveram, como o anticomunismo marcarthista. Fico impressionado com o fato de que ainda hoje há quem diga que o PT seja comunista. Mesmo depois do governo Lula, que tão dócil foi com os interesses do capitalismo financeiro nacional e internacional, que com tanto empenho sustentou o tripé macroeconômico herdado dos anos de Fernando Henrique Cardoso, ainda existe gente que chama o PT de comunista.

    Mas há novidades nesse novo antipetismo. O sentimento anticorrupção é uma delas.

    Desde 2005, existe uma aliança entre a mídia hegemônica, os atores políticos de oposição ao PT (o PSDB e o DEM, principalmente) e algumas instituições jurídicas e policiais do Estado, como o Ministério Público e a Polícia Federal.

    Essa aliança veio se solidificando ao longo dos anos, até estar plenamente estabelecida em 2013, nos eventos que aprendemos a chamar de “jornadas de junho”. Chamo essa aliança de “frente antipetista”.

    É claro que essa aliança não está imune às crises internas. Ora ou outra o Ministério Público troca farpas com a Polícia Federal. A imprensa hegemônica, por sua vez, solta umas matérias sobre os supersalários e sobre o auxílio moradia, só pra mostrar quem manda no cabaré. Como acontece com toda aliança, as partes disputam entre si, pra decidir quem é mais forte, quem vai ter a hegemonia. De vez em quando, algum político do PSDB é fritado, só pra criar a aparência da imparcialidade. Aécio Neves quem o diga.

    O modus operandi dessa aliança sempre esteve muito claro: a espetacularização seletiva dos escândalos de corrupção.

    Há mais de dez anos, a sociedade brasileira é bombardeada diariamente com a espetacularização seletiva de escândalos de corrupção envolvendo lideranças petistas. Nem sempre as investigações foram concluídas, nem sempre os acusados foram condenados. Pouco importa: depois que a manchete é estampada no Jornal Nacional e no Fantástico, todo acusado é culpado.

    O objetivo da frente antipetista sempre foi destruir o PT, para que o Estado brasileiro fosse refundado nos moldes ditados pelo neoliberalismo internacional. Com todos os seus erros (que não foram poucos), o PT se tornou o principal obstáculo à plena realização do neoliberalismo no Brasil. Por isso, foi alvo do ódio, dos ataques.

    Especialmente no governo de Lula, o PT cedeu ao neoliberalismo. Mas foi pouco. O lobo neoliberal é faminto, apressado e a partir de 2013 desistiu de negociar. A paciência acabou e a frente antipetista colocou em movimento uma máquina de destruição.

    A frente antipetista descarregou toda sua munição em cima do PT. Quase deu certo em 2014. Por pouco, o PSDB não voltou ao poder pelas urnas. Toda a campanha de Aécio Neves foi alimentada pelo antipetismo. Mesmo assim, ficou no quase. Dilma Rousseff foi reeleita. Aqui, a frente antipetista começou a perder o controle da situação. Com o golpe de 2016, a frente antipetista tentou retomar o controle. Não conseguiu e as eleições de 2018 mostram isso com clareza.

    Sem dúvida alguma, o colapso do PSDB foi a grande novidade das eleições de 2018, o dado novo que fez muito analista cair do cavalo. Estou incluído nesse tombo coletivo.

    Quem podia imaginar que o PSDB desidrataria dessa forma? Um dos principais partidos políticos da Nova República foi exposto a um verdadeiro vexame eleitoral. Por que isso aconteceu?

    É que o antipetismo foi refundado. O bolsonarismo se apropriou de todo o antipetismo cultivado e alimentado desde 2005. E o bolsonarismo ainda trouxe outro elemento para esse novo antipetismo: o fator moral, manifestado nos ataques, tão delirantes como o anticomunismo, à “ideologia de gênero” e ao “kit gay”.

    Creio que hoje a frente antipetista esteja em um momento de reflexão, assustada com o monstro que criou e sobre o qual perdeu o controle. O presidente do Supremo Tribunal Federal se vê obrigado a cortejar os militares, a chamar golpe militar de “movimento”. Os procuradores do Ministério Público estão apreensivos, com medo de perder as prerrogativas que lhes foram atribuídas pela Constituição de 1988. A mídia hegemônica está assustada com a aliança firmada entre o bolsonarismo e a TV Record, do temível Edir Macedo.

    Não duvido que estejam todos eles com saudades dos tempos em que a disputa se dava no território da política e o adversário era o PT, que sempre foi leal, previsível, que sempre jogou com as regras da democracia. Que pelo menos fique a lição para o futuro. É perigoso demais brincar com as instituições em um país de tradição democrática tão frágil como é o Brasil.

    A parte boa desse jogo é que ele nunca acaba. As lições são sempre úteis.

     

  • E o PT não acabou!

    E o PT não acabou!

    O Partido dos Trabalhadores, que estava marcado para morrer, terá, a partir de 2019, a maior bancada na Câmara Federal: 56 deputados. Bem verdade que tinha 61 e perdeu cinco cadeiras na Câmara. Contudo seus algozes tiveram um destino bem pior. O que terá acontecido?

    O PSDB perdeu 41% de suas cadeiras: foi de 49 para 29. O MDB encolheu um terço, perdeu 17 cadeiras, de 51 para 34. O DEM, de ACM Neto e do fugaz Ministro da Educação, Mendonça Filho, que não se reelegeu, caiu 14 posições: de 43 para 29 cadeiras. O Partido Progressista, da retrógrada Ana Amélia, candidata a vice de Alckmin, perdeu 13 cadeiras, ficando com 37.

    Por que será que o feitiço virou contra os feiticeiros? Vamos um pouco para trás na história?

    Tudo começou em 2006 com a Ação Penal 470, que ficou conhecida como Mensalão, mas não conseguiu provar nem a existência de algo que justificasse esse apelido. Depois de quebrarem todos os sigilos possíveis de Zé Dirceu, nada conseguiram comprovar, mas o condenaram assim mesmo. Nós nos lembramos das palavras da hoje presidenta do Tribunal Superior Eleitoral, Rosa Weber: “Não tenho prova cabal contra Dirceu, mas vou condená-lo porque a literatura jurídica me permite”. As provas de que não houve o desvio de milhões de reais do Banco do Brasil foram escamoteadas pelo STF e pelo Ministério Público. Há até recibos da Globo provando que os recursos da Visanet foram devidamente aplicados em marketing.

    Adiantando rapidamente o relógio para 2018, nos deparamos com a prisão de Lula, condenado somente com base na delação de um sujeito preso e que diria qualquer coisa para se livrar. Da mesma forma que no ensaio do golpe final, feito na Ação Penal 470, Lula foi sacado da disputa eleitoral e encarcerado sem qualquer prova de que fosse dono do apartamento do Guarujá.

    Nem conceder entrevista antes da eleição de ontem,07/10, foi permitido a Lula. Toffoli cassou a ordem de seu par Lewandowski como se houvesse uma hierarquia no Supremo Tribunal Federal na qual os votos do presidente e do vice-presidente da corte valessem mais do que os votos dos ministros. Essa hierarquia não existe e é ilegal.

    Faltando três dias para a eleição, Moro, em mais uma atuação com fins políticos, levantou o sigilo da delação premiada de Palocci, outro que falou e falará o que for preciso para ver-se livre da cadeia.

    Essa perseguição do Judiciário do país ao Partido dos Trabalhadores teve apoio e cumplicidade das empresas de comunicação tradicionais e dos partidos que orquestraram o golpe contra Dilma Rousseff. Inúmeras denúncias com provas ainda esfriam nas gavetas de dona Raquel Dodge e de ministros do STF. Malas de dinheiro e gravações de conversas telefônicas não valem como prova o mesmo que delações de reconhecidos criminosos.

    Lembremos, por fima que, ainda antes do impeachment, foi amplamente divulgada a conversa gravada, em que Romero Jucá diz, a Sérgio Machado, que o “governo Temer” estancará as investigações em um pacto “com o Supremo, com tudo”. Jucá não se reelegeu, ontem, a senador pelo estado de Roraima.

    O bombardeio tirou Lula da disputa e provocou importantes baixas no Senado. Mesmo assim, o Partido dos Trabalhadores será o maior partido da nova Câmara dos Deputados. Ah! E está no segundo turno das eleições presidenciais com Fernando Haddad, que pôde fazer campanha como candidato à presidência por 20 dias.

    Será que o povo percebeu a injustiça perpetrada por quem deveria zelar pela justiça? Parece que sim. Parece que o povo puniu o golpismo, puniu alguns corruptos que o Judiciário insiste em deixar soltos, puniu vários daqueles que retiraram seus direitos trabalhistas e que entregaram bens que nos pertencem a preços de banana.

    Certamente o povo punirá também o ódio e o desrespeito aos direitos humanos e à democracia.

  • OS USOS ELEITORAIS DO ANTI-PETISMO

    OS USOS ELEITORAIS DO ANTI-PETISMO

    RODRIGO PEREZ OLIVEIRA, professor de Teoria da História na Universidade Federal da Bahia, com charge de Aziz 

    Neste texto, quero analisar os usos eleitorais do anti-petismo, tratando especificamente das estratégias adotadas pelas candidaturas de Geraldo Alckmin e Ciro Gomes.

    Vou fazer de conta que as eleições estão acontecendo em uma situação de normalidade democrática. Com algum constrangimento, finjo que não sei que o principal candidato foi retirado da disputa em um processo questionado pela comunidade jurídica nacional e internacional.

    Analiso as eleições mesmo tendo seríssimas duvidas se os perdedores aceitarão o resultado. Tenho muitas dúvidas se o vencedor será, de fato, empossado. A mídia hegemônica está tratando general do Exército como interlocutor político, o que é um absurdo em qualquer democracia saudável. O presidente da suprema corte trouxe um militar para o seu gabinete de trabalho, em um comportamento inédito na história recente brasileira. Ainda assim, prossigo examinando a corrida eleitoral, falando das campanhas, das estratégias mobilizadas pelos candidatos.

    Sigo com a análise, um tanto envergonhado, confesso.

    As candidaturas de Ciro Gomes e Geraldo Alckmin se encontram diante do mesmo impasse: não estão conseguindo construir hegemonia dentro dos seus respectivos campos ideológicos. Ao que tudo indica, a crer nos dados divulgados pelas pesquisas, Geraldo Alckmin será derrotado no campo da direita e Ciro Gomes será derrotado no campo da esquerda.

    Hoje, o cenário mais provável aponta para uma disputa de segundo turno entre Fernando Haddad e Jair Bolsonaro.

    As candidaturas de Geraldo Alckmin e Ciro Gomes, como não poderia deixar de ser, tentam reverter a situação, usando o anti-petismo como o retórica eleitoral.

    Alckmin tenta recuperar os votos anti-petistas que Bolsonaro abocanhou, usando como trunfo as simulações de segundo turno realizadas pelos principais institutos de pesquisa, principalmente o Ibope e o Datafolha.

    Os dados apresentam Bolsonaro empatado com Haddad, enquanto Alckmin venceria com alguma facilidade o candidato petista.

    É como se Alckmin estivesse dizendo para o eleitor anti-petista: “Comigo, teremos mais chances de derrotar o PT”.

    Já Ciro Gomes tem um outro fantasma na manga: Jair Bolsonaro.

    Desde o início da campanha, Ciro Gomes vem apostando alto, com coragem, tentando romper com o lulismo e estabelecer um novo alinhamento de forças dentro do campo progressista. Tal como Alckmin, Ciro Gomes também utiliza as simulações de segundo turno como trunfo eleitoral. Como já sabemos, os dados mostram Haddad empatado com Bolsonaro. Já Ciro venceria todos os outros candidatos.

    Ciro Gomes tem ainda outra narrativa: se vencer, diz a campanha cirista, Haddad não conseguirá governar por causa do anti-petismo.

    O argumento está colando em parte do eleitorado progressista, machucado e esgotado com uma crise que se arrasta há cinco anos.

    Cinco anos de crise esgota as energias de qualquer um.

    Mas o que seria mesmo esse anti-petismo? Trata-se de um problema com o PT? Algo semelhante a uma antipatia pessoal?

    Penso que situação seja muito mais complexa, que o buraco seja muito mais fundo, que o problema seja muito mais grave.

    Explico com um exercício de síntese histórica. O conhecimento histórico é útil à vida.

    Entre meados dos anos 1970 e fins dos anos 1980, o Brasil viveu aquilo que costumamos chamar de redemocratização. Foi a transição da ditadura para o governo democrático. O processo foi longo, cheio de idas e vindas, teve perfil conservador e foi tutelado pelos próprios militares.

    Se é verdade que nem tudo na vida são flores, também podemos dizer que nem tudo são espinhos. Mesmo sendo conservadora, a transição trouxe algo de bom: a mobilização de setores importantes da sociedade brasileira na crítica ao autoritarismo.

    Foram anos animados, com grandes atos públicos, engajamento de artistas e intelectuais, greves gerais, milhares de pessoas nas ruas. Desse clima, saíram dois partidos políticos que, cada um a seu modo, passaram a representar as demandas da sociedade civil por um país mais justo e democrático: PT e PSDB, que se tornaram os principais ocupantes do campo político progressista.

    Mas o que é o campo político progressista?

    São os grupos políticos que partem do princípio de que o Estado deve amparar o sofrimento dos mais vulneráveis, daqueles que no conflito social são mais frágeis.

    Os mais frágeis?

    Mulheres, pretos e pretas, comunidade LGBT e, principalmente, pessoas pobres.

    Do outro lado do campo progressista está o campo do atraso.

    O objetivo do campo do atraso é direcionar a riqueza social para uma minoria, justamente aqueles que já são mais poderosos: homens, pessoas brancas e, principalmente, ricos.

    Partidos diferentes, cada um com sua proposta: o PT mais próximo dos movimentos sociais de base. O PSDB mais preocupado em tomar a via da política institucional. Mesmo com as diferenças, não era raro ver PT e PSDB dividindo o mesmo palanque naqueles tempos da redemocratização.

    Isso ficou claro nas eleições de 1989, quando Mário Covas, importante liderança tucana, apoiou Lula no segundo turno das eleições.

    Mas por que fui lá atrás, na redemocratização, se o objetivo é abordar os usos eleitorais do anti-petismo hoje, em 2018?

    É que síntese histórica é igual a canja de galinha e cafuné. Sempre faz bem. Sempre ajuda.

    Estou querendo dizer pra vocês que nos anos da redemocratização o campo progressista brasileiro era formado por alguns partidos políticos: PT, PSDB, PDT e alguns outros com relevância menor.

    Ao longo da década de 1990, com o envelhecimento de Brizola, o PDT se tornou um partido pequeno. Já o PSDB aderiu à agenda do neoliberalismo internacional e se tornou um partido de centro-direita.

    Sobrou quem no campo progressista? Apenas o PT.

    O PT passou a ocupar sozinho esse campo político e, assim, chegou ao governo em 2002. Com todas as contradições e defeitos dos governos petistas, não dá pra negar que eles foram progressistas. Os números são muito reveladores.

    Pessoas pretas, pobres, mulheres tiveram suas vidas melhoradas por meio de políticas públicas. Foi menos do que precisava ser. Foi mais do que tinha sido feito até então.

    E o campo do atraso?

    Cada vez mais passou a odiar o PT. Como esse campo do atraso controla a maioria dos canais de comunicação, esse ódio se difundiu também para setores das classes médias. A espetacularização seletiva das denúncias de corrupção se tornou o combustível desse ódio. Temos aqui o tão falado ‘anti-petismo’.

    Vejam bem, leitor e leitora: não se trata, apenas, de um ódio ao PT. O ódio é direcionado ao grupo político que desde os anos 1990 ocupa sozinho o campo progressista. O ódio é direcionado à agenda progressista, a certo conceito de política, à ideia de que os recursos públicos devem ser usados em benefício dos mais vulneráveis.

    Se a estratégia corajosa de Ciro Gomes funcionar, veremos o estabelecimento de um novo equilíbrio de forças dentro campo progressista. Em questão de meses, o anti-petismo se tornará anti-cirismo, ou anti-pedetismo. Sei lá.

    Se Ciro Gomes vencer e implementar o seu plano de governo (um plano progressista), passará a ser ele o alvo das forças do atraso. Não à toa, bastou Ciro Gomes se destacar nas pesquisas para que aparecesse uma delação que o coloca na mira da Operação Lava Jato.

    Quem acha que o problema das forças do atraso é específico com o PT ainda não entendeu o Brasil.

    Não se trata de anti-petismo, meus amigos e minhas amigas. É só o velho Brasil tentando destruir todos os que modificaram as regras de distribuição da riqueza social. Nem carece de ter modificado muito. Basta ter bulido só um pouquinho.

    Pra concluir meu argumento: à direita e à esquerda, o anti-petismo é retórica eleitoral. Na campanha do PSDB, a retórica é até coerente com o projeto de Brasil das forças do atraso. Basta saber se o PSDB ainda representa essas forças.

    Já na campanha de Ciro Gomes, a retórica do anti-petismo combina oportunismo com ingenuidade. Oportunismo é normal em política, principalmente em época eleitoral. A ingenuidade é o pior defeito que uma pessoa adulta pode ter.