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  • Perifericu no centro do Cinema Brasileiro

    Perifericu no centro do Cinema Brasileiro

    Desde o dia 1 de outubro iniciou-se em parceria com o SESC SP, a 8ª Mostra Tiradentes | SP, desdobramento da 23ª edição mineira do evento que ocorreu em janeiro de 2020. Na programação paulista, a mostra exibe entre outros filmes, os vencedores da edição mineira, como o curta-metragem “Perifericu”, um dos mais celebrados filmes do ano.

    Por André Okuma * André Okuma é mestre em História da Arte pela UNIFESP, faz filmes independentes, é arte-educador e mora em Guarulhos-SP

    A Mostra Tiradentes é um tradicional evento do calendário de festivais de cinema no Brasil, conhecido por uma curadoria atenta aos vislumbres e caminhos do pensamento e da produção cinematográfica no Brasil, tem apresentado uma diversidade de olhares e narrativas que extrapolam o centro expandido paulista e seus correlatos cariocas.

    Com o tema “Imaginação como Potência”, a curadoria tenta elevar os ideais da mostra aos limites das possibilidades estético-políticas em diálogo com o nosso tempo, diga-se de passagem, tempo este de ascensão neofascista, censura, negacionismo, desmonte de políticas culturais e destruição da Cinemateca Brasileira:

    A Imaginação como Potência é a temática que norteia esta edição do evento e propõe novas maneiras de ver, produzir e se relacionar com as imagens. Pretende gerar reflexão e ser propositiva diante de um cenário incerto, faz um convite para olhar adiante, desfrutar o cinema como arte e, em sua criação, vislumbrar os caminhos possíveis para a construção de novos rumos” (trecho do texto de apresentação do Catálogo da Mostra)

    Diante desta perspectiva, um dos filmes premiados desta edição, o curta-metragem “Perifericu” é de certa forma a síntese disso. Premiado também como melhor curta-metragem no 27º Festival Mix Brasil e no 31º Festival Internacional de Curtas-metragens de São Paulo, o filme ficcional conta a história de Denise e Luz duas amigas pretas, LGBTQIA+ e periféricas que vivem no extremo sul de São Paulo.

    Uma das qualidades aparentes à primeira vista no filme é seu desvio ante aos estigmas amplamente difundidos ao longo da história do cinema brasileiro, como as narrativas dramáticas das diversas violências sofridas, seja da desigualdade social, seja pelo preconceito sobre seus corpos, o filme, apesar de não ignorar estas questões, não é um filme-lamento, muito menos uma romantização disso, ele é uma insurgência estética e política profunda deste cinema já esgotado.   

    Ancorado na afetividade, o que emerge das imagens em movimento é de um universo profundamente real e honesto, sem divagações estéticas, porém intensamente poético e consequentemente político. Corpos pretos, LGBTQIA+ e periféricos se impõem, desafiando o mundo ao mesmo tempo que o abraçam. Numa das cenas mais emblemáticas do filme, a personagem Luz (Vita Pereira, que também é uma das diretoras), dubla uma música gospel, no melhor estilo “I Will Survive” em Priscilla, a Rainha do Deserto,  o corpo trans cantando um louvor gospel na frente de sua mãe religiosa enquanto ela trabalha embalando pedaços de bolo pra vender, seguida de um plano detalhe de uma imagem de Nossa Senhora ao lado de um Barbie descabelada em cima da geladeira, é um desbunde!

    O filme, ainda que seja “apenas” um curta-metragem, dá conta de imprimir uma certa potência estética do real em suas minúcias, mostrando cenas e situações tão usuais para quem é da quebrada, que soam mais realistas que muito documentário já feito, desde a arquitetura das casas e ruas, nos ruídos das discussões familiares, da presença do jornalismo sensacionalista policialesco nas salas de casa, do rap e das batalhas de mcs, e das influencia das igrejas nos moradores destes territórios. As cenas nos transportes públicos são um exemplo dessa impressão irremediavelmente real, quem mora longe do centro se identifica visceralmente, a diversidade dos corpos LGBTQIA+ se misturam aos amontoados de corpos trabalhadores comuns, enquanto outros trabalhadores informais preenchem os silêncios destes longos trajetos que ocupam grande parte da vida do trabalhador. A imagem da vida e da arte se fundem na espera do deslocamento.

    Outra caraterística relevante deste filme é o seu modus de produção, dirigido de maneira coletiva por Nay Mendl, Rosa Caldeira, Stheffany Fernanda e Vita Pereira, o curta conta ainda com uma equipe e elenco de mulheres, LGBTQIA+, pretos e periféricos, subvertendo todos os paradigmas da estrutura organizacional do cinema brasileiro feito até recentemente, no qual, o diretor, em geral um homem branco cis, hétero normativo e de classe média é o autor, e o resto da equipe, em sua maioria brancos, seus subordinados.

    O peso político do filme também se dá na escolha das locações, filmado quase todo no extremo-sul de São Paulo, território onde vive a maior parte das realizadoras, trazendo para o filme imagens profundamente carregadas de significado histórico e afetivo para a produção do filme. Outra locação importante é a da cena inicial do filme, gravado na Casa 1 importante espaço simbólico para a comunidade LGBTQIA+, pois é uma casa de acolhimento de LGBTQIA+ no centro da cidade que atende pessoas expulsas de casa e em estado de alta vulnerabilidade.

    O filme abre e fecha com as personagens olhando diretamente para a câmera encarando o público, o filme se posiciona sem hesitar e reivindica a partir das imagens em movimento e sons o controle de suas próprias narrativas, aqui, e como potência imaginativa para vislumbrar possíveis caminhos para o cinema no Brasil, inclusive nos seus métodos e procedimentos de produção, “Perifericu” reconfigura novas e genuínas representações antes invisibilizadas e marginalizadas, e a insere no centro do nosso melhor cinema feito nos dias atuais.

    Sobre o filme:

    Perifericu (2019)

    Sinopse: Denise e Luz cresceram no meio de canções de rap, louvores de igreja e passos de vogue. Da ponte para cá, é preciso aprender que o primeiro princípio para poder acessar a cidade é estar viva.

    Este filme faz parte da Mostra Foco da 8ª Mostra Tiradentes | SP.

    Brasil (SP) | 20 min. | Ficção | 14 anos

    Direção: Nay Mendl, Rosa Caldeira, Stheffany Fernanda e Vita Pereira

    Roteiro: Winnie Carolina e Direção

    Fotografia: Nay Mendl, Rosa Caldeira e Wellington Amorim

    Produção Executiva: Nayana Ferreira e Wellington Amorim

    Elenco: Ingrid Martins e Vita Pereira

    O filme pode ser visto no link: https://sesc.digital/conteudo/cinema-e-video/54371/perifericu disponível até o dia 05/10/2020.

    Mais informações sobre a mostra em http://mostratiradentessp.com.br/

    *André Okuma é mestre em História da Arte pela UNIFESP, faz filmes independentes, é arte-educador e mora em Guarulhos-SP

  • Festival Favela em Casa. Arte e cultura da periferia dentro da sua casa

    Festival Favela em Casa. Arte e cultura da periferia dentro da sua casa

    Festival Favela em Casa promove a difusão da arte e da ação cultural produzidas pelas periferias e favelas da Grande São Paulo. Na noite de abertura, show de Drik Barbosa será transmitido ao vivo pela série Música #EmCasaComSesc;

    Idealizada e produzida por Andressa Oliveira, Marcelo Rocha e Coletivo Favela em Casa, programação é gratuita e reúne música, teatro, dança, literatura e audiovisual , além de uma série de talks, em 12 horas de programação. Transmissões acontecem pelas redes sociais do Sesc São Paulo e do Festival Favela em Casa.

    Favela em Casa

    Expansão, ativação e colaboração

    Iniciativa busca expandir os espaços de produção e difusão artísticas, além de ativar coletivos, artistas e profissionais da cadeia da cultura que foram especialmente impactados pela crise sanitária atua .

    O Festival Favela em Casa é uma iniciativa de dois jovens produtores da Grande São Paulo, com o objetivo de promover a arte e a ação cultural nativas das periferias, e que utiliza a potencialidade dos meios digitais para divulgar a produção de artistas independentes em diferentes territórios, para além das bordas dos grandes centros urbanos. Idealizado por Andressa Oliveira, moradora do Campo Limpo, extremo sul da cidade de São Paulo, e pelo articulador cultural e fotógrafo Marcelo Rocha, da cidade de Mauá, no ABC Paulista, o evento de múltiplas linguagens artísticas vai reunir mais de 35 atrações, entre músicos, performances teatrais e dança, profissionais do cinema e da literatura, artistas visuais,e pensadores, nos dias 18, 19 e 20 de setembro, em uma maratona de 12 horas de programação.

    Favela em Casa
    Produtores do Festival, Andressa Oliveira e Marcelo Rocha

    Democratizações dos espaços para a cultura da periferia e da favela

    Comprometido com a democratização dos espaços de produção e difusão artísticas, o Sesc São Paulo direciona a estrutura de sua rede para realizar esse encontro entre o público e a produção de jovens que atuam nas periferias da Grande São Paulo, região afetada de maneira mais acentuada pela atual crise sanitária, e dar visibilidade à arte urbana e periférica, ampliando as condições de acesso aos conteúdos da cultura aos diferentes públicos. Com show de Drik Barbosa, a ação que marca a abertura do festival será transmitida ao vivo, no dia 18 de setembro, às 19h, pela série Música #EmCasaComSesc, exibida pelo Instagram Sesc Ao Vivo e pelo canal do Sesc São Paulo no Youtube. As demais atrações serão exibidas pelo canal do Festival Favela em Casa no Youtube e Instagram do Festival Favela em Casa. Nove unidades do Sesc também transmitirão trechos da programação em suas redes sociais. São elas: Campo Limpo, Carmo, Itaquera, Ipiranga, Parque Dom Pedro II, Santana, Santo André, São Caetano e Vila Mariana.

    Favela em Casa

    “Em decorrência da pandemia, as desigualdades sociais e econômicas têm se agravado, e os artistas e coletivos culturais das periferias da Grande São Paulo, região que chegou a ser o epicentro em volume de contágios no país, foram dramaticamente atingidos por essa situação, na medida em que que boa parte de suas iniciativas se realizam na ocupação da cidade, ruas, praças e outras áreas públicas destinadas ao encontro”, observa Danilo Santos de Miranda, diretor do Sesc São Paulo. E complementa: “A ativação dessa gama de profissionais das amplas práticas socioculturais, que são nossos parceiros na consecução de nossa missão institucional, é uma medida indissociável da atuação do Sesc, porque diz respeito à nossa responsabilidade socioeducativa, enquanto fomentadores que somos, inseridos na cadeia produtiva da cultura no estado de São Paulo e no país como um todo”.

    Favela em Casa. Gerando renda. Periferia consumindo periferia

    “O Favela em Casa foi pensado para ser uma vitrine para artistas independentes de favela que estão fora da bolha do mainstream e também gerar renda. Criamos um festival para ser gerenciado e produzido por uma equipe composta, majoritariamente, por pessoas periféricas, pretas e independentes, protagonistas e responsáveis pela condução da narrativa que queremos compartilhar”, conclui Andressa Oliveira, idealizadora do festival ao lado de Marcelo Rocha, que complementa: “O Festival surgiu do nosso sonho de movimentar e incentivar os artistas das nossas comunidades, especialmente nesse momento de pandemia. E esse nosso sonho se tornou maior com com a parceria do Sesc, que foi fundamental para a visibilidade dos nossos artistas e da nossa causa, que também passa pela sustentabilidade socioeconômica dos trabalhadores da cultura nas favelas”.

    No line up, a presença de artistas das diferentes regiões da Grande São Paulo indica a diversidade de identidades e sotaques que compõem a programação, selecionada por um time de curadores atentos à multiplicidade de estilos e à inserção de trabalhos ainda não contemplados por outros editais de incentivo durante o período de pandemia. Com formato híbrido, as transmissões revezam-se entre performances ao vivo e gravações realizadas no Estúdio Curva, na capital paulista, e incluem, além de apresentações artísticas, uma série de talks sobre carreira, memória e literatura com convidados, das quais participam artistas e outras figuras que tem trago novos olhares para a produção cultural e intelectual da cidade.

    Favela em Casa

    Confira mais informações sobre a programação aqui:

    https://www.instagram.com/festivalfavelaemcasa/

    MÚSICA Emcee lê, Tasha e Tracie, Wera MC, Rap Plus Size, Sóbatuke, Red Lion, Tonyyymon, Bia Doxum, Ôbigo.

    LITERATURA Felipe Marinho, Kimani, Jessica Campos, Eleison Leite, Roberta Estrela D’alva.

    DANÇA Aline Constantino, Babiy Querino, Djalma Moura, Vanessa Soares, Keyson Idd, Débora Regi.

    TEATRO William Sampaio, Grupo Identidade Oculta, Ícaro Pio.

    AUDIOVISUAL Preto no Branco, de Valter Rege

    TALKS encontros com duração de 20 minutos, gravados pela plataforma zoom. Versões mais enxutas e editadas serão veiculadas no Festival. As versões completas (cerca de 1h de duração) ficarão disponíveis posteriormente no canal do youtube do Favela em Casa, junto com toda a programação.


    SERVIÇO

    FESTIVAL FAVELA EM CASA

    Idealização e produção: Andressa Oliveira, Marcelo Rocha e Coletivo Favela em Casa

    Apoio: UNIFESP – Universidade Federal de São Paulo

    Realização: Sesc São Paulo

    18 a 20 de setembro. Sexta e sábado, 19h às 23h. Domingo, 15h às 19h.

    Abertura: Instagram Sesc Ao Vivo | Canal Sesc São Paulo no Youtube | Canal Festival Favela em Casa no Youtube

    https://www.youtube.com/channel/UC0pxYjXo9QzRWn7NkyG9u0g/featured

    Programação: Canal Festival Favela em Casa no Youtube | Facebook Festival Favela em Casa e redes sociais das unidades do Sesc Campo Limpo, Carmo, Itaquera, Ipiranga, Parque Dom Pedro II, Santana, Santo André, São Caetano e Vila Mariana.

  • Novo normal: Brasil tem mais de mil mortes por dia e governantes festejam o tal “platô”

    Novo normal: Brasil tem mais de mil mortes por dia e governantes festejam o tal “platô”

    Por Ricardo Melo*

    A pandemia do coronavírus está fora de controle em todo o planeta. Sintomático: o país considerado o mais desenvolvido do mundo, os Estados Unidos, meca do capital financeiro, é incapaz de deter as mortes que se acumulam aos milhares. Lidera o ranking da morbidez. Atrás dele, disputando o pódium do genocídio, está o Brasil de Jair Bolsonaro.

    Tem se falado muito sobre o primado da ciência, bla, bla bla. É bom que se aposte na certeza científica contra as feitiçarias, charlatanices e vendedores de remédios contra piolhos como salvação da humanidade. Ou contra mercadores de cloroquina que só fazem encher os bolsos(naros) de um dinheiro extra.

    Os fatos, porém, ultrapassam este debate. Vamos falar do Brasil. Um governador como João Dória comemora que São Paulo aparentemente atingiu um tal “platô”. “Temos y infectados, x mortes e a situação parece estar se estabilizando.”   

    Ei, que negócio é este? Como assim? Tem gente morrendo. E não é madame que acha que morador de rua é folgado e gosta de viver ao relento. São na maioria trabalhadoras e trabalhadores abandonados à própria sorte e sem condições de se defender. Os números são inequívocos. Há um corte social evidente entre as vítimas. Aqui no Brasil, nos EUA e pelo mundo afora.

    Há dinheiro de sobra rodando pelo mundo para debelar uma pandemia como esta. Ninguém de bom senso acredita que a colaboração entre cientistas de ponta de todo o mundo não poderia achar uma saída rápida para aplacar um vírus. Mas o que se vê é uma guerra entre laboratórios multinacionais gananciosos para ver quem vai chegar primeiro à pedra filosofal. 

    Enquanto isso, além das vítimas do vírus, assiste-se ao sacrifício desumano de milhares de profissionais de saúde que tentam fazer o que o capitalismo predador não faz. Salvar vidas. Eles trabalham sem proteção, em sistemas públicos de saúde desmantelados e entregues ao olho gordo do dinheiro grosso.  As histórias de enfermeiros e médicos que morreram vítimas do vírus ou se mataram por não conseguir impedir a morte de pacientes recheiam as páginas dos principais jornais do mundo. 

     

    Novo normal no Jornal Nacional

    Por aqui, a tragédia também virou o novo normal. O Jornal Nacional, da Rede Globo, já trata o assunto como uma seção. Colocou um apresentador que parece ter saído de uma impressora 3D para falar sobre os números do dia. Como se estivesse falando das cotações da bolsa ou do dólar. Ou da previsão do tempo. “Amanhã vão morrer tantos, sobreviver outros. Agora é com você, Bonner”. A rede Globo sempre será a Globo, a mesma que “descobriu” que havia uma ditadura no Brasil com quase meio século de atraso.

    E seguem os enterros. Literalmente.

    Vamos falar claro: as medidas de relaxamento do isolamento social são criminosas. Isto mesmo, senhor Dória e outros governadores e prefeitos. Vejam o caso da Índia e de outros países. Enquanto não houver uma vacina ou uma solução intermediária, a exposição de cidadãos a céu aberto equivale a uma sentença de morte distribuída por amostragem.

    Sobre Bolsonaro é inútil falar. Faz tempo, cerca de trinta anos, que ele tá pouco se lixando para o Brasil. Tá mais preocupado com Queiróz e dona Márcia (a propósito: para quem não sabe, a avó da mulher dele, Michelle Bolsonaro, foi recolhida no meio da rua com o coronavírus. Neste momento, luta contra a morte num hospital ).

    Enfim, é um escândalo. Os culpados estão identificados. São as autoridades, aliadas do capital gordo, que menosprezam a vida dos que não têm como se proteger e pregam o libera geral. Dane-se o povo. Aquelas excelências estão resguardadas por grandes hospitais, planos de saúde e benesses de todo tipo. Trump, Bolsonaro e Dória estão sãos e salvos. 

    Para a maioria, sobra o “platô” das covas.

     

    *Ricardo Melo, jornalista, foi editor-executivo do Diário de S. Paulo, chefe de redação do Jornal da Tarde (quando ganhou o Prêmio Esso de criação gráfica) e editor da revista Brasil Investe do jornal Valor Econômico, além de repórter especial da Revista Exame e colunista do jornal Folha de S. Paulo. Na televisão, trabalhou como chefe de redação do SBT e como diretor-executivo do Jornal da Band (Rede Bandeirantes) e editor-chefe do Jornal da Globo (Rede Globo). Presidiu a EBC por indicação da presidenta Dilma Rousseff.

    Leia mais Ricardo Melo em:

     

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    Jair Bolsonaro é um assassino —agora de papel passado

     

     

    ENEM: BOLSONARO QUER DESTRUIR OS SONHOS DA JUVENTUDE POBRE DO BRASIL

     

     

  • Rede Urbana de Ações Socioculturais já ajudou mais de 3 mil famílias na periferia do DF

    Rede Urbana de Ações Socioculturais já ajudou mais de 3 mil famílias na periferia do DF

    A Rede Urbana de Ações Sociais vem atuado em diversas frentes para amenizar os impactos da COVID-19 nas periferias do Distrito Federal. Partindo de ações de conscientização, a RUAS contribui também com a distribuição de cestas básicas, produtos de higiene e pequenos auxílios que já ajudaram mais de 3.000 famílias no Distrito Federal.

    Conheça o projeto, e saiba como colaborar.

    Conversamos com Max Maciel, um dos fundadores da RUAS

    JL – O que é a RUAS?

    MM – O RUAS é uma Organização Social, que atua há mais de 18 anos no território do DF . A história do grupo que fundou a Rede Urbana de Ações Socioculturais – R.U.A.S começou em 2006, no Distrito Federal, com encontros periódicos para dialogar sobre o jovem brasileiro e suas necessidades. Atuamos em Rede, somos Urbanos e acreditamos que o social não sobrevive sem a cultura, sem o esporte, sem o lazer comunitário e o respeito ao meio ambiente. Acreditamos, acima de tudo, na juventude e no seu poder de transformação. Atualmente somos os gestores do Programa Jovem de Expressão núcleo Ceilândia.

    JL- O Brasil ainda não chegou no pior momento da pandemia, e já estamos mais acelerados do que a Espanha, quando ela estava na mesma fase em que estamos. Considerando as gigantescas desigualdades sociais, e a crise política sem precedentes que abala o país, como você vê os impactos que a covid-19 pode causar nas periferias?

    MM – A convid-19 veio para mostrar escancaradamente toda a fragilidade e a ausência das políticas sociais em nossos territórios. Ausências estas que sempre denunciamos. Sem dúvidas a periferia é uma das grandes impactadas. Primeiro,  pelo direito de ficar em casa. É muito difícil falar para quem vive da renda quase que diária isso. Sem contar que os nossos continuaram na linhas de frente dos serviços essenciais como: motorista dos ônibus; atendentes de mercado; da limpeza urbana…O drama fica entre não ter renda e em se contaminar por causa de que precisam trabalhar…Por isso, é urgente uma política de renda universal e redução das desigualdades”.

    JL – Como você avalia a atuação do GDF no combate à pandemia, e como está a atuação do governo fora do plano piloto e das regiões mais ricas do DF?

    MM – No início o GDF acertou com as medidas preventivas, o que fez com que não se alastrasse muito pelas cidades. Mas afrouxou antes do tempo, sem contar com a irresponsabilidade do Bolsonaro em vir na Ceilândia e assim estimular que as pessoas saíssem de casa. o DF é um caso a sempre se olhar. Como a Covid-19 iniciou nas áreas “nobres”, a resposta foi automática e a não contaminação nas periferias se deu justamente pela quarentena, uma vez que a região central concentra mais de 60% dos contaminados.

    JL – Fale um pouco sobre a atuação do RUAS no Distrito Federal, e como a periferia do DF está lidando com a pandemia? O que as pessoas pensam sobre isolamento social, e quais são as preocupações dessas pessoas?

    MM – A RUAS, em 18 anos de atuação, nunca fez esse tipo de ação. Nossa luta sempre foi pela redução das desigualdades, luta pela igualdade de oportunidades, por emprego e renda dignos. Acontece que, neste momento, não podemos ficar parados,  e então fizemos uma frente com foco em fazer com que os nossos consigam passar por essa pandemia com mais tranquilidade.

    Além das cestas, estamos ajudando a fazer seus cadastro e acessar o auxílio emergencial. Sobre o isolamento, ele é novo pra todo mundo e tem gerado dramas, uma vez que a estrutura geral da cidade e das casas dificulta uma boa quarentena. inclusive para as crianças.

    JL – Como está o setor cultural nas RAs, diante da pandemia e como os artistas têm se mantido nesse cenário?

    O setor da cultura, talvez seja a última a ser normalizada. Estão parados, sem norte. Abrimos uma frente de auxílio para estes. Hoje nosso cadastro tem 200 trabalhadores e trabalhadoras da cultura. Eles não estavam no CadÚnico, nem nas listas de vulnerabilidade, mas entraram, devido a Covid-19. A a ajuda vem da rede de apoio e solidariedade, ainda mais para quem não pode ta em uma live..

    JL – A Papuda tem o maior número de casos confirmados, em presídios,  para Covid-19 no país. O que vc pensa disso, e como está a atuação do GDF para mitigar os impactos na população carcerária?

    MM – Os presídios Brasileiros estão lotados e nossa política de encarceramento em massa é um erro. Denunciamos sobre o risco da pandemia chegar e dizimar a população carcerária. Hoje a Papuda tem 161 casos. É terrível. A saída era liberar os mais de 200 mil presos provisórios, que aguardam o julgamento. A superlotação gera tantos outras problemáticas e que agora, a falta de espaço, todos juntos e sem circulação de ar razoável, é o cenário perfeito para proliferação.

    Alguns dirão que eles merecem, o que é triste,  porque ninguém quer que não paguem pelo que fizeram, mas a maior punição para quem comete crimes é a privação da sua liberdade…

    JL – Como estão os números de casos de violência doméstica no contexto de isolamento? Esses números têm aparecido? As denúncias estão sendo feitas?

    MM – Não tem aparecido publicamente. Esse é outro fator, a pessoa ficar em casa com seu agressor. Há um movimento que vem disseminando informações de como denunciar online e mesmo o que fazer caso sofra violência.

    JL – Como os jovens estão enfrentando a Quarentena?

    MM – A galera, por ter poucos sintomas, tem relaxado muito. Infelizmente.

    JL – O que vc acha da atuação do Governo Federal no enfrentamento do Covid-19?

    MM – Um completo desastre. Um governo que minimiza as orientações internacionais, minimiza seu próprio Ministério da saúde e os dados. E que, se dependesse dele, não ofereceria suporte algum ao povo. A preocupação é apenas com o setor financeiro.

    JL – O país tem um gigantesco abismo social, que tende a crescer com a pandemia. Tem ficado evidente que é preciso um estado forte forte e atuante, ao contrário do que prega o ultraliberalismo de Paulo guedes. Como você vê a economia e as relações sociais, depois da pandemia? 

    MM – Que inclusive, essa agenda neoliberal não tem respostas à crise e mais do que nunca ficou evidente que precisamos fortalecer o Estado. Imagina a gente sem um SUS, neste momento…

    JL – A periferia é o centro?

    MM – Sempre! De criatividade, de superação, de tecnologias sociais. A Nossa periferia é que faz toda essa cidade se movimentar.

    Foto: Coletivo DUCA

    Sobre Max Maciel

    Morador da cidade de Ceilândia-DF, 37 anos. Dezoito destes dedicados à militância juvenil. Empreendedor  social, pedagogo de Formação, especialista em Gestão de Políticas Públicas em gênero e raça pela UNB. Foi candidato a Deputado Distrital pelo PSOL/DF em 2018, sendo o segundo mais votado do partido com 8.515.

     

     

  • E o preto que se vire!

    E o preto que se vire!

    Estamos aí na luta diária, luta por direitos que nos são negados, luta por assistência que alguns dizem ser básica, mas eu prefiro a palavra essencial.

    Não é fácil ser pobre no Brasil, mas ser pobre e favelado (opa, favelado é feio falar, né?) é pior ainda, pois se para o pobre falta poder aquisitivo para ter o que deseja ou ir a lugares específicos, ao favelado falta água, saneamento, proteção, água potável, assistência à saúde. Se o pobre é mal visto por ser pobre, ele se disfarça de classe média e vai embora, já o favelado carrega em si marcas que não o permitem ir além de certos limites.

    Se o pobre tem direito ao isolamento, o favelado se isola do mundo, pois em sua casa muitas vezes tem um cômodo só, além do banheiro, onde é possível se acomodar, então, se um adoece, adoecem todos juntos.

    Solidariedade?

    Falta de opção, falta de cuidado, falta de respeito.

    Sim, pois o favelado faz seus corres rezando para ter uma casa para voltar, enquanto a sociedade se queixa pois acha que merece mais.

    Que precisa mais, que deve ter sempre mais, porém, não é para o favelado que o povo olha, não é para a favela que o mundo olha em tempos de crise, não é na favela que as pessoas agem, não é para a favela que o governo trabalha, pelo contrário, o favelado trabalha para nós, todos os dias, mas por suas vestes ou jeito de falar são discriminados, investigados, temidos, maltratados.

    Quantas vezes você deu “Bom Dia” ao motoboy?

    Quantas vezes você franziu o nariz para o trabalhador braçal após um dia na labuta, enquanto você vinha de um ar-condicionado para outro?

    Quantas vezes você escondeu sua bolsa ao passar perto da favela?

    Quantas vezes você deu “Bom Dia” ao motoboy?

    Ah, mas o baile pode

    Viva o baile funk, viva a favela, viva os “crias”, naquele momento quero ser “cria” também, mas só ali, naquelas horinhas em que desço do meu pedestal e subo a favela de moto, compro meu combo, danço a noite toda e mostro para o mundo através do meu celular caro.

    Mas e quando acaba o baile?

    Subo de volta na moto e dou as costas para o problema, pois eu subir está ok, o favelado descer, aí já não gosto não, é que esses não servem para se relacionar, namorar, apresentar para a família, esse serve para ser o amigo que me leva pro baile, mas, suave, ele sabe que o papel dele é esse e nem liga.

    Liga sim!

    Ele queria mais e você poderia ofertar mais do que sua companhia em noite de baile. Ele queria emprego digno, moradia digna. Ele queria não ser temido ou marginalizado. Ele queria os mesmos diretos que você, queria ser bem tratado e ter um teto para morar sem o receio de que ele pode não estar ainda no lugar quando voltar.

    Ele queria ser visto, ele queria ser ouvido, enquanto isso, a vida para apenas pra você, pois ele, sim, o favelado, ele segue na luta, sem quarentena e sempre inserido num sistema, sistema de quem? Isso é você quem vai me dizer.

    Menos hipocrisia, mais humanidade. Lute pelo povo de verdade!

    Nota: Matéria originalmente escrita no Jornal Empoderado!

  • MTST vai ocupar a Câmara de São Paulo

    MTST vai ocupar a Câmara de São Paulo

    O MTST (Movimento Trabalhadores Sem Teto) se propõe a mais uma ocupação de peso em São Paulo, mas desta vez sem lonas, buscando uma construção coletiva para a câmara municipal da maior cidade do país. A chapa, formada por três mulheres negras do movimento, é um dos maiores desafios lançados depois de o coordenador nacional do movimento, Guilherme Boulos, ter saído pelo PSOL para a presidência, em 2018.

    Débora Pereira, Jussara Basso e Tuca (Valdirene Cardoso) formarão a chapa que vai ser lançada pelo PSOL. O anúncio de que pretendem concorrer aconteceu no Teatro Oficina, região central de São Paulo, no dia 11 de dezembro de 2019, e contou com a presença de Guilherme Boulos e Juliano Medeiros, presidente nacional do PSOL, entre outros.

    As três candidatas coordenam ocupações em diferentes regiões da cidade e, com isso, buscam trazer experiências de cada um desses espaços das “periferias de São Paulo que são, quase, municípios diferentes” e que, distantes e diversos, compõem a cidade. Cada uma trilhou um caminho diferente, mas chegaram até o MTST buscando encontrar sua casa. Ao que parece encontraram mais do que isso, como espaço para falar e serem ouvidas “nesse movimento que empodera mulheres”.

    Na cidade que tem hoje uma câmara municipal com 9 vereadoras entre 55 cadeiras, a chapa coletiva tem conceito similar à chapa coletiva estadual na Assembleia Legislativa de São Paulo, (Alesp), a Bancada Ativista, formada hoje por vinte uma pessoas. A novidade da chapa proposta pelo MTST é que Débora, Jussara e Tuca são do movimento e buscam trazer “aquilo que a gente aprendeu dentro do MTST, todas as nossas lutas, é o que vamos procurar garantir para nosso povo. Não só o povo do MTST, como todo o povo comum, que luta. Todo o povo periférico, trabalhador”.

    A câmara tem sido, desde o começo dos mandatos atuais, em 2016, um espaço de forte apoio para o prefeito Bruno Covas (PSDB), que no final de 2018 conseguiu aprovar a reforma da previdência no município e tem visto diversos projetos seus aprovados  Dos 55 vereadores apenas nove são do PT e dois do PSOL.

     

    Quem são

    MTST vai ocupar a Câmara de São Paulo
    Débora Pereira durante ato no Teatro Oficina
    Foto de Lucas Martins / Jornalistas Livres

    DÉBORA

    “Meu primeiro contato com MTST foi em 2007. Em uma ocupação perto da casa dos meus pais, em uma região construída com mutirão. Meu pai foi ver como se organizava e depois de conhecer fiquei um tempo, mas depois me afastei. Já em 2012 eu resolvi entrar no movimento para fazer minha luta por moradia, na ocupação Novo Pinheirinho do Embu, que levou o nome por conta do massacre que aconteceu no despejo violento do Pinheirinho original, em São José dos Campos. Eu fui somente como acampada, na época eu trabalhava no E.C. Banespa como cozinheira e à noite eu fazia minha faculdade. Nessa ocupação, eu queria ser coordenadora, mas as condições não permitiram, porque tinha meu filho e as questões da faculdade. E algo me encantou muito nessa ocupação: eram as mulheres que tocavam, mulheres que cumpriam o papel da coordenação, mulheres que faziam assembleia. Eu fui com objetivo da moradia, mas fazíamos lutas diversas: lutávamos por vaga na creche para crianças da região, por melhoria de transporte e por melhoria de saúde. Isso me instigou, chamou minha atenção. Em todas as lutas que a gente foi, nessa ocupação, a gente saiu com alguma conquista, resultado. Isso me encantou no MTST. Eu queria muito, muito mesmo, entender direito o movimento. Em 2013 terminei minha faculdade e a gente foi ajudar uma galera em outra ocupação, na região do Campo Limpo, a ocupação Dona Deda. E decidi que queria ser coordenadora, nesse movimento que empodera mulheres. Antes de conhecer o MTST eu não falava, era travada. A gente vive numa sociedade que fala ‘lugar de voz, lugar de liderança, não é de mulher’ e nas rodas de conversa nas ocupações sempre o movimento empoderava isso. Hoje eu organizo a ocupação Marielle Vive, na zona norte. Essa ocupação é um grande orgulho, foi o povo que escolheu esse nome, já que a ocupação aconteceu pouco tempo depois da morte da Marielle e todo mundo estava muito revoltado. Escolhemos o nome porque Marielle seria o exemplo da luta para a gente. Uma mulher, mulher negra, que veio da periferia e lutava pela periferia. Que denunciava o genocídio, o massacre do povo negro. O povo todo clamou para que o nome fosse Marielle Vive, pra que a gente não deixasse cair no esquecimento a luta dela e que a ocupação fosse uma semente de Marielle.”

    Jussara Basso durante ato no Teatro Oficina
    Foto de Lucas Martins / Jornalistas Livres

    JUSSARA

    “Entrei no movimento buscando minha moradia, em 2012, na ocupação Novo Pinheirinho de Embu das Artes. E identifiquei com as propostas políticas do MTST e estou até hoje. Acho que o que me seduziu a permanecer foi essa construção coletiva, essa ideia de você fazer parte de algo muito maior do que você mesmo.”

    Tuca durante ato no Teatro Oficina
    Foto de Lucas Martins / Jornalistas Livres

    TUCA

    “Tenho 46 anos. Nasci em São Paulo. Sou de uma família de sete irmãos, comigo. Filhos de pais mineiros. Conheci o MTST em 2014 quando se instalou aqui em Itaquera a [ocupação] Copa do Povo. Em 2014 tivemos a conquista do terreno e lutamos ate hoje para a conquista da obra. Em 2 de junho de 2015 foi fundada a ocupação Dandara dos Palmares, no Jd Alto Alegre. Nisso fui até lá com companheiros e passamos a tocar aquela ocupação. Que já tem o empreendimento pronto, para ser entregue no próximo ano. Para 216 famílias.”

    O que é a mandata do MTST?

    Tuca: “Tudo aquilo que a gente aprendeu dentro do MTST, todas as nossas lutas, é o que vamos procurara garantir para nosso povo. Não só o povo do MTST, como todo o povo comum, que luta. Todo o povo periférico, trabalhador. É o que a gente pretende buscar, fazer a mudança, dentro da câmara. Ocupando a câmara enquanto mulheres. MTST ocupando. Mostrar o valor que nós mulheres temos, nós do MTST, nós que lutamos. Até onde podemos chegar e revolucionar em cima disso tudo. É um mandato coletivo de mulheres, pra isso mesmo. A câmara não foi feita para as pessoas ficarem lá. Se aposentarem lá dentro, ocupando a bancada, sem ao menos darem os nossos direitos. Chegou a hora de a gente chegar lá e fazer essa mudança, com o mandato coletivo de mulheres. Estamos lá para ocupar, não para ocupar por um espaço de tempo indeterminado, mas sim pra fazer a mudança e renovação.”

    Jussara: “A principal ideia, principal bandeira, é a representatividade. A gente tem apenas nove mulheres vereadoras hoje na câmara. Nenhuma delas é negra. A principal experiência que surge de tudo isso é que nós três atuamos na construção coletiva. Na desconstrução dessa cultura de colocar a mulher em segundo plano na sociedade. A experiência de luta do MTST traz esse sentido do coletivo, da construção da unidade. Da solidariedade. O dialogar com a quebrada e saber o que rola e quais são as mazelas. Aquilo que dói na pele de quem mora do lado de cá. Isso é uma característica muito nova e principal. E retomar o trabalho de base, que foi abandonado por uma parte da esquerda, que é você estar nas bases, estar com as bases e, a partir disso, construir propostas de políticas que atendam reinvindicações que estão esquecidas. Você anda na quebrada e vê a falta de segurança e aqueles que deveriam garanti-la são os primeiros a oprimir, violentar e assassinar jovens. Você anda na quebrada e vê a falta de saneamento básico, de iluminação, de lazer, de cultura. Vê que a saúde pública está cada vez mais sucateada. Vê que as pessoas estão se virando como podem pra gerar renda para suas casas e que não existe uma política que realmente incentive isso. Tem muita coisa para fazer. Muita coisa. E ouvir as pessoas vai trazer elementos para a construção de políticas públicas muito efetivas e potentes. Eu acredito que, sinceramente, ocupar a câmara vem no sentido de ocupar a política com consciência. Consciência social – é isso que significa. Imagino que seja muito necessário que, no debate eleitoral de 2020, a gente traga muita qualidade a discussão sobre esse avanço neoliberal, que vem retirando direitos. E esse avanço de uma direita radical que persegue o pobre, o preto, o favelado, a mulher, o homossexual. A gente precisa ser a resistência dentro dos espaços institucionais. É um grande desafio, sem dúvida, mas acho que tudo que a gente construiu até aqui, enquanto MTST, vai ser uma ferramenta importante pra dentro da instituição.”

    Débora: “O que as pessoas podem esperar é que haverá vereadoras que, de fato, vão representar os seus interesses. A gente sabe que a luta não vai ser fácil, mas estando lá dentro vamos dar voz ao povo da periferia, vamos pontuar as dificuldades e trazer melhorias para a periferia, porque na maioria das vezes grande partes dos políticos que estão lá, não estão para representar o interesse da maioria do povo da periferia. Estão lá para representar interesses individuais ou de uma minoria. Se a gente chegar lá, com certeza, na câmara vai ter voz da periferia. Vai ter voz dos sem teto. Vai ter voz das mulheres. Vai ter voz do povo negro.”

    Projetos

    Débora: “Existem questões que são diferentes e outras que são iguais. As questões da violência policial contra a periferia e de falta de creche são iguais. Mas, conversando entre nós três, percebemos que outras questões manifestam-se de forma diferente. Por exemplo. Na zona leste e norte temos um problema sobre algumas escolas que estão sendo fechadas por conta do argumento de não ter demanda e a gente que mora na região sabe que tem muita demanda. Muitas pessoas que tinham escola do lado de sua casa estão tendo que procurar escola em lugares mais distantes, por conta do fechamento. Outra coisa que é muito forte na zona norte é a questão da saúde, da falta de médicos ou cada dia um médico diferente, além de remédios faltando, da falta de saúde voltada para mulher ou conseguir consultas especializadas. A infraestrutura também é outra falta grave. Na sul, a Ju pode comentar melhor, a questão muito forte na luta da mobilidade e o trânsito para chegar ao centro. Não é que na Norte não exista essa luta, mas sem tanta força. E na Leste, pelo que já escutei da Tu, tem muito da questão da saúde e fechamento de escola. O legal de serem três regiões diferentes é que as lutas que têm em comum a gente pode pegar as experiências de uma região para a gente tentar aprender e nos fortalecer. Ver que a gente vive numa mesma cidade, com regiões diferentes e vários problemas diferentes.”

    Tuca: “O contraponto agora é o olhar da periferia, trazendo as pautas da periferia pra cidade. Como a da saúde, educação, transporte e segurança. Esse é nosso ponto de vista, trazer as pautas periféricas enquanto MTST.”

    Jussara: “Existe uma diversidade nas periferias de São Paulo que são, quase, municípios diferentes. Não dá pra você pautar a periferia de São Paulo, sem singularidade. É muito diferente. As pautas de reivindicações basicamente são as mesmas. Mas as pautas prioritárias dessas regiões diferem. Se pegamos o extremo sul, já mais pro Jd Ângela, é muito forte o debate sobre a mobilidade urbana, lá tem um afunilamento do trânsito local, na estrada do M’Boi Mirim que liga, inclusive, as cidades da região metropolitana (Embu, Embu-Guaçu, Itapecerica da Serra) ao município de São Paulo e a região central. Por outro lado, é uma região extremamente populosa, com a necessidade de transporte público muito grande o que causa problemas gravíssimos. São debates muito antigos, como a duplicação da M’Boi e as remoções necessárias para essa duplicação, já que famílias inteiras vão perder suas casas e precisam ser indenizadas. Outro debate antigo, como o Metrô JD Angela, e as remoções necessárias para a ampliação necessária da linha Lilás do Metrô. E se você for para a zona leste o debate é muito grande sobre os fechamentos dos cursos noturnos das escolas. Houve uma mobilização muito grande dos estudantes, nesse sentido. Lá também é crescente a discussão sobre saúde pública, sendo uma região superpopulosa. Já na região norte você tem outras caraterísticas de debate, que também traz as suas prioridades mais locais. As companheiras vão poder trazer elementos que eu não tenho acúmulo suficiente. Mas você percebe que existe essa diversidade e mesmo aqui na sul, onde moro, você tem três extremos (Grajaú, Jd Angela e Macedônia, que está no limite da cidade, o que traz mais carências porque o poder público não alcança os limites municipais). A cidade de São Paulo tem uma diversidade de debates e necessidades muito grande e de prioridades. A gente precisa trazer essa pluralidade para dentro do institucional. Os vereadores, os políticos de carreira, essas pessoas que estão sentadas há décadas na cadeira do poder público, elegem a sua região, seu curral eleitoral, e ali eles fazem políticas de acordo com seu eleitorado, mas sem atender toda a população local. E só se pautam no período eleitoral, depois esquecem. Outra questão é o orçamento que vem das emendas parlamentares e muitas vezes é destinada para um grupo específico e não atende a população. Precisamos, realmente, democratizar a política. Para além da candidatura do companheiro Guilherme Boulos, ano passado, essa nova candidatura, esse novo período eleitoral traz pra nós a possibilidade de trazer pra pessoas, claramente, o que é o cargo, quais são as competências do cargo.”

    Como vai ser a pauta da moradia e a relação com o MTST?

    Tuca: “Isso vai depender de nós mesmos, MTST, enquanto ocupação lá dentro da câmara. Tudo vai depender de nós. A influência vai ser muito forte e positiva. Vai fortalecer mais ainda os movimentos sociais, não só o MTST. Estaremos lá por todos.”

    Débora: “No nosso programa político uma das pautas principais vai ser a questão da moradia. A gente está vivendo uma situação em que não existem mais políticas habitacionais. O foco na nossa mandata vai ser a questão de moradia”

    Jussara: “O município lançou agora uma proposta de COHAB faixa 1, que vai seguir os mesmos métodos do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV), no sentido de produzir habitação no município. Uma grande questão é pautar as leis de zoneamento, como temos áreas municipais que podem se tornar ZEIS [Zonas Especiais de Interesse Social], que podem atender a moradia popular. Existem famílias cadastradas há mais de trinta anos e nunca foram atendidas. Você precisa produzir habitação de acordo com o déficit. Também a questão do número de imóveis na cidade que permanecem vazios e precisam ser discutidos – de que forma a gente consegue estabelecer políticas públicas de combate à especulação imobiliária para que tenha casa para quem precisa de casa? A população de baixa renda precisa acessar os espaços centrais da cidade. Entrar na discussão do direito à cidade é de extrema importância. O exemplo do que aconteceu em Paraisópolis, aquilo que aconteceu com aqueles jovens, está ligado a essa ausência de acesso. Um transporte caro que as pessoas não conseguem acessar a cultura, o lazer, que estão mais presentes na região central. Assim procuram da forma que podem morar, se divertir, estudar, trabalhar. Essa mandata não pode e não vai ser um mecanismo exclusivo do MTST, mas sim um mecanismo de discussão de todas as políticas necessárias para atender todas as pessoas que precisam de políticas sociais. É de fundamental importância que a gente tenha interlocução com diversos movimentos, com diversos personagens que atuam no sentido de trazer mais direitos para as pessoas.”

    As futuras candidatas durante ato no Teatro Oficina
    Foto de Lucas Martins / Jornalistas Livres