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  • Grupos antirracismo denunciam  parada Ku Klux Klan em Portugal

    Grupos antirracismo denunciam parada Ku Klux Klan em Portugal

    Menos de um mês depois da sede do SOS Racismo ter sido vandalizada em Lisboa, com a frase racistas e xenofóbicas “Guerra aos inimigos da minha terra”, a associação foi, mais uma vez, vítima de perseguição. No último sábado, 8 de agosto, um grupo neofascista de Portugal, nomeado “Resistência Nacional”, juntou seus membros em frente a sede do SOS Racismo para uma “parada Ku Klux Klan”, que exaltava os agentes da Política de Segurança Pública (PSP) e atacava a luta antirracista travada em Portugal pela SOS Racismo e outras associações, frentes, coletivos e partidos políticos.

    Para tal, o grupo utilizou máscaras brancas e tochas, numa iconografia semelhante à dos supremacistas brancos Ku Klux Klan, organização que surgiu no século XIX, nos Estados Unidos, para perseguir, assassinar, incendiar e espancar pessoas negras e quem mais defendia os direitos civís para os afrodescendentes norte-americanos.

    Segundo jornal Público, o grupo “Resistência Nacional”, que atacou a Associação SOS Racismo, tem nas suas fileiras ex-membros da suspensa Nova Ordem Social, organização neonazista criada por Mário Machado; o grupo supremacista Portugal Hammer Skins; o grupo de adeptos 1143, afeto ao Sporting; o Partido Nacional Renovador; e o partido de extrema-direita Chega, de André Ventura, que já organizou duas manifestações de cunho fascista em Portugal neste ano.

    O dirigente do SOS Racismo, Mamadou Ba, afirmou que a página da associação recebe centenas de ameaças da extrema-direita. A associação está a juntar todas estas ocorrências para uma queixa no Ministério Público de Portugal, por ofensa à integridade física, ofensas morais, danos patrimoniais e incitamento ao ódio e violência.

    “Nenhuma ação criminosa nem nenhuma manobra intimidatória nos desviará do combate sem tréguas contra o racismo”, afirmou Mamadu Ba.

    Coletivos e associações da luta antirracista de Portugal expressaram sua solidariedade aos companheiros de luta da SOS Racismo e não se intimidaram frente às ameaças fascistas e supremacistas dos grupos de Portugal.

    O Coletivo Esquerda Revolucionária postou  em suas páginas na internet o ato tinha a dupla finalidade de intimidar os militantes antirracistas e em defesa do insignificantes agentes dos órgãos de repressão do Estado burguês.

    “As manifestações anti-racistas e anti-fascistas deste ano mostram claramente não apenas que as camadas mais pobres e racialmente oprimidas do proletariado não vão mais tolerar que este tipo de violência continue impune – incluindo a violência racista de Estado, como o enorme potêncial revolucionário que têm — como se verificou em particular na manifestação de 6 de Junho onde marcharam mais de 20.000 trabalhadores e jovens negros. São os fascistas que vivem intimidados (…) nós, a classe trabalhadora, somos capazes de destruir o sistema capitalista, raíz de todas as opressões, e por conseguinte de os purgar da nova sociedade, da sociedade socialista. A Esquerda Revolucionária manifesta toda a sua solidariedade com os companheiros do SOS Racismo e compromete-se uma vez mais com a luta anti-racista e anti-fascista. Não passarão! Está na hora da organização e da luta!”

    O Coletivo Consciência Negra também expressou sua firmeza diante da polarização que está sendo criada em Portugal e enviou uma mensagem aos fascistas:

    “Aos fascistas, nomeadamente os ‘antigos elementos da Nova Ordem Social’: se sabem quem somos, onde moramos e o que fazemos, sabemos igualmente quem são, ondem moram e o que fazem e, sempre que se justificar, sem quaisquer hesitações, faremos uso da legítima defesa – artigo 32 do Código Penal. Nem um passo atrás! Não passarão!”

    https://www.instagram.com/p/CDwMZTFBY_i/
  • Assistir “…E o Vento Levou” com extras não nos impede de gostar do filme

    Assistir “…E o Vento Levou” com extras não nos impede de gostar do filme

    Por James Cimino, especial para os Jornalistas Livres de Nova York

    Era uma vez um filme, vencedor de oito Oscar, indicado a 13, um dos primeiros grandes épicos do cinema, que tinha como pano de fundo a guerra civil americana, mas que mostrava a escravidão como algo “benigno”, quase que um refúgio para os ineptos negros, cuja missão nobre na Terra era servir os seus senhores brancos. Está é uma versão de “…E o Vento Levou” que, digamos, o vento levou do catálogo da HBO Max após o roteirista John Ridley (“12 Anos de Escravidão”) publicar um editorial criticando o caráter revisionista do filme.

    Apesar do debate infundado de que o filme estaria sendo censurado, ele volta para o catálogo do serviço de streaming, apenas duas semanas depois, em uma nova versão: mais completa, mais honesta, mais informativa, mais histórica, tudo isso sem cortar ou adicionar uma cena, um diálogo sequer no corte original de 1939, dirigido por Victor Fleming e estrelado por Vivien Leigh, Clark Gable, Olivia de Havilland, Leslie Howard e Hattie McDaniel.

    Agora, quem assistir ao filme verá um prólogo de cinco minutos apresentado pela professora de cinema da Universidade de Chicago Jacqueline Stewart em que ela aponta ao mesmo tempo a grandiosidade da obra e seus erros históricos. Após essa pequena introdução, começam os créditos: primeiro Clark Gable, o cafajeste Rhett Butler, embora quem apareça em quase todas as cenas do longa que tem cerca de 3 horas e 40 minutos seja o segundo nome, a inglesa Vivien Leigh, que interpreta a inescrupulosa e cativante heroína Scarlet O’Hara. Em seguida, aparecem os nomes de Leslie Howard, que interpreta o melancólico Ashley Wilkes, e Olivia de Havilland, a íntegra Melanie Hamilton. De Havilland, aliás, é a única atriz viva do elenco e completou nessa quinta-feira (2) 104 anos.

    Após a ficha técnica, elenco é reapresentado por núcleos. Hattie McDaniel, Oscar Polk e Butterfly McQueen, respectivamente os escravos Mammy, Pork e Prissy, aparecem no núcleo de Tara, obviamente após os atores brancos.  Os créditos do filme, aliás, representavam as desigualdades raciais e de gênero existentes na indústria do cinema e em uma sociedade ainda racialmente segregada por força de lei.

    Mas também os créditos representam o tamanho do cacife do artista. Clark Gable era a estrela do filme, e Vivien Leigh, embora tenha dado uma das duas grandes performances de sua vida e certamente uma das melhores da história do cinema, era apenas uma atriz inglesa iniciante, por isso o nome dele aparece primeiro. No caso dos coadjuvantes, no entanto, tanto Leslie Howard quanto Olivia de Havilland tinham o mesmo quilate, embora Melanie seja uma personagem que também apareça muito mais que seu marido Ashley. Que o nome de Howard apareça antes de De Havilland nos faz pensar no machismo que em muitos casos ainda persiste em Hollywood.

    Logo em seguida vem a primeira fantasia do filme: um texto introdutório que explica ao espectador que mundo é esse em que ele está entrando. E este mundo à parte, como diz textualmente a personagem de Olivia de Havilland, é “uma terra de cavalheiros e campos de algodão chamada O Velho Sul”. E continua: “Aqui neste belo mundo, o cavalheirismo rendeu sua última homenagem. Aqui foram vistos os últimos cavalheiros e suas belas; escravos e seus senhores. Procure este lugar apenas nos livros, porque ele nada mais é que um sonho a se recordar. Uma civilização que o vento levou…”

    Antes de continuar a analisar suas falhas e destacar seus acertos, é importante destacar outros dois extras que aparecem no catálogo da HBO Max logo abaixo do filme, além do prólogo. Em 2019, quando o filme completou 80 anos de lançamento, o canal TCM promoveu um debate chamado “…E o Vento Levou — Um Legado Complicado” com a participação da produtora Stephanie Allain, de “Cara Gente Branca”, da autora do livro “Frankly My Dear”, Molly Haskell, além da professora Jacqueline Stewart.

    E para celebrar o legado de Hattie McDaniel, a Mammy, primeira atriz negra da história a ganhar um Oscar, há um episódio de cinco minutos da série do canal TCM “What a Character” (“Que Personagem”) dedicado à atriz.

    Os erros

    A grandiosidade do filme nos cega para suas falhas no que diz respeito à escravidão. Mas também é importante mostrar que o material extra nos abre os olhos para o esforço que o produtor do filme, David O. Selznick, teve em não repetir o legado de “Birth of Nation”, de D.W. Griffith, que provocou o renascimento da Ku Klux Klan. O uso da palavra “negro”, por exemplo, foi negociada com a NAACP (Associação Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor, na sigla em inglês), para, ironicamente, dar mais veracidade à história.

    Aliás, o longa elimina a Ku Klux Klan de uma sequência em que Scarlet é atacada ao atravessar de carroça pelo meio de uma favela. No filme, ela é salva por um ex-escravo de sua fazenda. Posteriormente, seu marido Frank Kennedy e o nobre Ashley Wilkes vão vingar sua honra e incendeiam a favela, não sem antes matar alguns negros. No livro, quem pratica essa vingança é a KKK, conforme explicar a professora Jacqueline Stewart. “No livro, aqueles personagens fazem parte da KKK.”

    A principal crítica feita durante o painel de 80 anos do filme, no entanto, é sobre o caráter dos escravos neste fantasioso mundo que ignora a brutalidade da escravidão sobre a qual essa sociedade foi erigida. Nele, os negros são ou serviçais, nobres por sua devoção a seus senhores brancos, ou ineptos.

    Segundo a professora da universidade de Chicago, a secessão é retratada como “causa perdida” não apenas na indústria do entretenimento, mas também na academia. Segundo ela, “…E o Vento Levou” relata uma “perda irreparável” desse modo de vida.

    Inclusive, quando os Yankees (os soldados da União) se aproximam de Atlanta, vemos uma cena em que Scarlet cruza com os escravos de Tara que estão marchando, sorridentes e felizes, para a linha de frente, onde irão cavar trincheiras para os confederados.

    “No filme, a escravidão é vista como benigna. Há uma suposta nobreza nisso, porque mantém o negro em seu lugar devido, que na verdade é um lugar feliz e seguro, enquanto que após a guerra, no período imediatamente posterior à abolição, a reconstrução, tudo cai por terra. Ou seja, os negros não têm capacidade de se guiarem a si mesmos”, complementa a professora.

    A autora Molly Haskell também aponta esse retrato “demonizante” do pós guerra, segundo ela como se a abolição tivesse sido uma falha completa, já que os negros acabam se tornando ou favelados ou se aliando aos malvados Yankees. No entanto, Haskell destaca que o filme dá ao sul o que eles não tiveram na vida real: a fantasia da vitória.

    Mas o filme também deixa implícito que o trabalho dos escravos nos campos de algodão não era necessariamente honrado. Quando Scarlet e as irmãs trabalham na colheita de algodão após Tara ter sido saqueada pelos Yankees, vemos elas ficarem com as mãos calejadas, emagrecendo, terem os cabelos desgrenhados, os vestidos sujos e rasgados e cada vez menos parecerem com aquelas beldades do começo do filme que disputavam os “cavalheiros” nos churrascos na fazenda.

    No entanto, logo depois, vemos o pai de Scarlet, já delirante após a guerra, falando para a filha que não estava gostando do jeito que ela tratava Mammy e Prissy. “Devemos tratar muito bem os nossos servos, especialmente os escurinhos (darkies, em inglês)”, num diálogo que claramente tem como intuito dizer que os escravos eram tratados com humanidade.

    Isso não era verdade nem mesmo nos bastidores do filme, quando nem havia mais escravidão. Butterfly McQueen, que interpreta a mentirosa Prissy, teve que negociar com o diretor uma cena em que Scarlet a esbofeteia. Segundo os debatedores, durante a filmagem, Vivien Leigh foi orientada a bater de verdade em McQueen. Em resposta, ela não estava entregando o resultado desejado pelo diretor. Ela então disse ao diretor que só daria a performance desejada se aquela branca não batesse mais em sua cara.

    A força do filme é feminina

     

    Apesar de tudo isso, como ainda conseguimos gostar do filme e nos emocionar com ele? Essa foi a primeira questão respondida pelas debatedoras: a força das personagens femininas, especialmente, Scarlet e Mammy, mas também Melanie.

    “Scarlet é inescrupulosa, maltrata todos que ela ama, mas além da excitação de ver uma mulher tão dona de si, especialmente no sul, onde os homens brancos não possuíam apenas os escravos, mas também suas mulheres, eu acho que a gente torce por ela porque Rhett, Mammy, Melanie e Ashley a amam apesar de todos seus defeitos”, analisa Molly Haskell.

    A produtora Stephanie Allaine diz que o que sempre a atraiu no filme foi o fato de Scarlet ser uma personagem que não é submissa, mas que se coloca em pé de igualdade com os homens. Mesmo em uma cena em que Rhett Butler, ferido de ciúme, ameaça esmagar sua cabeça com as próprias mãos, ela não se intimida: “Tire suas mãos de mim, seu bêbado idiota!”, diz a altiva personagem.

    “Ela é resiliente, não desiste nunca. Mas o filme tem outra personagem que me atrai muito que é a Mammy, que é inteligente, sábia e destemida. Ela é a consciência do filme. E, além disso, ela é a única que enfrenta Scarlet e, com astúcia, a convence a fazer o que é certo.”

    No filme, aliás, Mammy é um papel muito maior que no livro, graças ao produtor David O. Selznick e à performance cativante de Hattie McDaniel, que em inglês não tem os cacoetes ridiculamente racistas da dublagem brasileira. Até a autora do livro, Margareth Mitchell, apontou que, na plantation, nenhuma escrava, por mais status que tivesse dentro de casa, gritaria da janela com uma sinhazinha como acontece no filme.

    Filme é anti-guerra

     

    “…E o Vento Levou” pode ser um filme que romantiza a escravidão, mas seus dois protagonistas são os maiores críticos da Confederação e da guerra que dela se sucedeu. Isso fica bem claro na primeira aparição de Rhett Butler, quando os sulistas estão reunidos na fazenda de Ashley Wilkes se vangloriando de um ataque do general Robert E. Lee que forçou o exército do presidente Lincoln a recuar. Butler, um homem de reputação duvidosa, explica que o sul não tem sequer uma fábrica de canhões e que a única coisa que eles têm são escravos, algodão e arrogância. Em uma cena posterior, ele diz a Scarlet que aquela guerra é um desperdício em nome da teimosia em se manter no passado.

    Mas, novamente, é o no cinismo de Scarlet O’Hara que vemos talvez a maior declaração de repulsa ao regime escravagista do sul. Quando ela assume a madeireira de seu marido, contrata prisioneiros de guerra sulistas para cortar árvores para seu negócio. Eles lhes são apresentados por um feitor, que lhe pede “carta branca” para lidar com eles.

    O nobre Ashley faz uma objeção dizendo a ela que a tal carta branca significa liberdade para bater e subnutrir os prisioneiros, que ele prefere contratar negros libertos, mas Scarlet se opõe dizendo que o preço que eles cobram iria quebrar o negócio. Ashley então diz que se recusa a lucrar às custas de trabalho forçado e do sofrimento dos outros. Ela, então, lhe dá um xeque-mate: “Você não era tão seletivo assim quando possuía escravos.”

    Neste ponto da narrativa, Scarlet já havia jurado por Deus que jamais passaria fome novamente, nem que precisasse matar, roubar ou trair. Também havia decidido vencer os Yankees em seu próprio jogo, ou seja, ela se torna uma yankee, nem que seja às custas de seu próprio povo.

    Para as debatedoras, essa postura da personagem torna o filme um crítica à guerra civil americana. “Scarlet não é mais aquela menina simplória, mas sobrevivente como é ela vai fazer de tudo para vencer. Porque no fundo ela não acredita na guerra nem naquela filosofia ultrapassada que a originou. Scarlet na verdade se torna a antítese do sul.”

    Portanto, a experiência de assistir a “…E o Vento Levou” com todo esse debate e contextualização não apenas é mais rica intelectualmente, como tampouco nos impede de gostar do filme apesar e também, por que não, por causa de suas contradições. Ao contrário, todo esse material nos abre os olhos para o caráter insidioso daqueles que usam o cinema para moldar a realidade e reescrever a história, como bem aponta, ao fim do debate, uma pessoa da plateia.

    “Acho que estamos sendo muito tolerantes com o retrato que se faz dos confederados, não apenas no filme. Hoje você faz uma tour por Charleston e eles mostram um lugar onde foi um mercado, mas não dizem que era um mercado ‘de escravos’. Nas plantations, a mesma coisa. Você vê em algumas delas uma placa explicando que ‘aquela plantation foi construída com trabalho não remunerado’, como se aquelas pessoas tivessem ido voluntariamente trabalhar ali.”

  • Sérgio Camargo: KKK, nazismo e perseguição política

    Sérgio Camargo: KKK, nazismo e perseguição política

    Reportagem de Nataly Simões e Pedro Borges I Ilustração de Vinicius de Araújo – Do Alma Preta Jornalismo 

    *Todos os nomes utilizados na reportagem são fictícios e foram adotados como forma de preservar a identidade das fontes. Os nomes escolhidos são meramente ilustrativos.

    “Quando a diretoria da Fundação Cultural Palmares (FCP) ia se reunir, a gente comentava que era a reunião da KKK”, diz em sigilo Beatriz*, ex-funcionária do órgão de promoção à cultura negra vinculado à Secretaria Especial da Cultura.

    O comentário sobre a Ku Klux Klan, organização supremacista branca dos Estados Unidos, começou no início de 2020 após uma crise dentro do órgão público.

    Em fevereiro, Sérgio Camargo ocupou as manchetes de grandes jornais do país por ter demitido por telefone diretores negros com trajetória em políticas públicas em prol da cultura afro-brasileira. Como resposta, convocou sua tropa de choque para definir o que fazer diante da cobertura da imprensa acerca das demissões.

    “É um grupo de pessoas, na sua maioria brancas, que acredita em racismo reverso, não tem conhecimento sobre a história da Fundação e vê em Sérgio Camargo a oportunidade de colocar tudo o que pensa para fora”, conta Beatriz*, sobre o perfil da direção do órgão.

    Perseguição aos profissionais

    O presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Camargo, mantém vínculo próximo com um pequeno grupo de pessoas, descrito pelos funcionários como o núcleo da KKK. O objetivo, de acordo com Beatriz*, é “limpar a Palmares”.

    “O Sérgio Camargo quer tirar o pessoal que ele considera ‘esquerdista’, porque para ele todo mundo é ‘esquerdista’. Se não concordar com a extrema direita logo é de esquerda”, acrescenta a ex-funcionária.

    Apesar de passar uma imagem de segurança nas redes sociais, a funcionária Sueli* reitera a insegurança de Sérgio Camargo diante do cargo. “A gente sabe que ele sente medo, sabe que as coisas que são postadas nas redes sociais e na imprensa o afetam de fato. Ele tem medo de muita coisa”, pontua.

    O padrinho nazista

    O ex-secretário da Cultura, Roberto Alvim, é o padrinho político de Sérgio Camargo. Alvim foi o nome dentro do governo de Jair Bolsonaro (Sem partido) que indicou Camargo ao cargo mais importante da Fundação Cultural Palmares.

    Ex-funcionários ouvidos pelo Alma Preta recordam que, no primeiro dia após sua nomeação em 27 de novembro, Sérgio Camargo fez uma visita a todos os setores do órgão para conhecer e se apresentar aos profissionais.

    Já no dia 29, o novo presidente foi alvo de um protesto de organizações do movimento negro. Diante da ação, Camargo se trancou em uma sala e se recusou a dialogar com os manifestantes ali presentes. Após o fim do protesto, contatou seu padrinho político, Alvim.

    O então secretário da Cultura foi até a sede da Fundação Cultural Palmares e convocou todos os funcionários. “Nesse dia, Alvim fez uma série de ameaças aos servidores. Foi de uma agressão impressionante. Não era uma visita de boas vindas, era uma visita para dizer que quem estava envolvido com aquele movimento seria punido”, recorda Beatriz*. “Alvim disse que não aceitaria nenhuma influência ‘esquerdista’ dentro da Fundação e que todas as pessoas de esquerda que estavam ali seriam demitidas”, lembra a ex-funcionária.

    Na ocasião, Roberto Alvim também disse uma frase que se confirmou nos meses seguintes. “Eu posso cair, mas o Sérgio não cai”. No dia 17 de janeiro deste ano, Alvim foi exonerado da Secretaria Especial da Cultura após ter feito um pronunciamento similar ao de Joseph Goebels, ministro da propaganda na Alemanha nazista.

    Goebbels, antissemita radical e um dos idealizadores do nazismo ao lado de Adolf Hitler, havia afirmado em meados do século XX que a “arte alemã da próxima década será heroica” e “imperativa”. Em vídeo publicado nas redes sociais da Secretaria Especial da Cultura, Alvim afirmou que a “arte brasileira da próxima década será heroica” e “imperativa”.

    Sérgio Camargo, por sua vez, nomeado presidente da Fundação Cultural Palmares em 27 de novembro de 2019, foi afastado do cargo após ser alvo de uma ação da 18ª Vara Federal de Sobral, no Ceará, em 4 de dezembro. Segundo a ação, a nomeação contrariava os motivos determinantes para a criação da Fundação Cultural Palmares e colocava a instituição “em sério risco”, visto que a gestão podia entrar em “rota de colisão com os princípios constitucionais da equidade, da valorização do negro e da proteção da cultura afro-brasileira”.

    Ao retomar o cargo, em 20 de fevereiro de 2020, por decisão do presidente do Superior Tribunal de Justiça, o ministro João Otávio de Noronha, Camargo voltou com seu discurso de extrema-direita alinhado ao presidente Jair Bolsonaro. As colocações mais recentes em consonância ao presidente foram os ataque às medidas de isolamento social devido à pandemia do Covid-19.

    “O Alvim não está mais no governo, então, quem está segurando ele lá? Aparentemente existe um respaldo forte da presidência da República, que parece que coaduna com aquele discurso negrofóbico do Sérgio Camargo”, reflete em sigilo Sueli*, funcionária da fundação.

    Fundação Cultural Palmares

    Alma Preta procurou a Fundação Cultural Palmares para saber o posicionamento do órgão sobre as reuniões entre diretores conhecidas pelos funcionários como “reuniões da KKK”, a perseguição a funcionários com pensamentos diferentes aos do presidente Sérgio Camargo, e quais medidas têm sido tomadas para tornar o ambiente de trabalho confortável para todos. A reportagem também perguntou sobre as intimidações feitas pelo ex-secretário da Cultura, Roberto Alvim. Até a publicação deste texto, os questionamentos da reportagem não foram respondidos.

    A reportagem também tentou buscar um posicionamento de Roberto Alvim sobre as intimidações feitas aos funcionários do órgão enquanto ocupava o cargo de secretário especial da Cultura, mas não o localizou.

     

     

  • Eleições 2018: a escuta necessária para levar às urnas os que não foram no primeiro turno

    Eleições 2018: a escuta necessária para levar às urnas os que não foram no primeiro turno

    Quando um ex-líder da Ku Klux Klan faz a seguinte declaração sobre o candidato fascista das eleições presidenciais do Brasil: “ele soa como nós”, uma pergunta se impõe diante do apoio popular que o fascista recebe: “onde nós, do campo progressista, erramos”?

    A resposta que encontro é atravessada (para além do projeto de conquista do poder pelos políticos evangélicos)pela ausência de escuta, nem falo de escuta qualificada, falo de escuta simples, cotidiana, aquela do café, do almoço, dos afazeres domésticos, do fim do dia de trabalho, do dia de folga.

    É uma resposta que nasce do mundo de vista da autocrítica, não aquela proposta pelo irmão mais novo do clã Gomes, da colérica conexão Pindamonhangaba-Sobral-Fortaleza, não, não falo sobre esse tipo de autocrítica. Trato de uma perspectiva séria, propositiva, transformadora.

    Vejo muitos depoimentos de pessoas que estão conquistando votos para o campo democrático em conversas com desconhecidos nas ruas, no transporte coletivo, em outras situações públicas e isso é muito importante, pois soma, robustece nosso campo, contudo, me pergunto se estamos conversando (ouvindo) nossos próprios familiares. Estamos? E aqui me refiro diretamente às famílias negras, aquelas que são verbal e fisicamente violentadas pelo fascista, mas parecem votar nele e apoiá-lo, como Ronaldinho Gaúcho e Rivaldo.

    Que contradição é essa? Nocaute dado por um paradoxo incompreensível, indecifrável. Ouço nessa pequena morte, um grito de socorro, um apelo desesperado de ajuda que se manifesta no apoio a um desequilibrado mental, inflado por estratégias ultradireitistas de mídia, disseminadas pelas mídias que sustentam o projeto e se beneficiarão dele, caso seja vitorioso. Um grito dado por pessoas comuns que nunca são ouvidas e se iludem achando que o fascista as representa de algum modo..

    Os fascistas como ele, os que sempre nos odiaram e nos mataram, e agora se sentem legitimados pelo líder a expressar todo o ódio e a matar mais, são outra coisa, outro setor. Me atenho às pessoas comuns que não apoiam essas ideias e práticas, mas declaram voto nele. Como alcançá-las? Como tocá-las? A resposta é mais simples do que possa parecer. É preciso nos colocarmos num lugar de sensibilidade e escutar pessoas que se sentem como móveis velhos encostados, como objetos inúteis exauridos pelo tempo, pelo uso e pelo abandono daqueles aos quais um dia elas dedicaram muito afeto.

    É hora de conversar com o pessoal mais velho que não votou no primeiro turno, que tem mais de 65 anos e que se sente como esses móveis abandonados. É hora de conversar com eles como seres humanos que talvez nos mostrem (se os escutarmos) o abandono insuportável a que nós mesmos os relegamos.

    Em alguma medida isso vale também para os jovens que podem escolher votar ou não porque têm entre 16 e 17 anos. É outro grupo sem escuta.

    É hora de lembrar que conversar implica em escutar, em dar atenção ao que a outra pessoa diz. Depois disso, a gente pode pedir e conquistar o voto. Pode inclusive oferecer carona ou companhia aos mais velhos no dia da votação. Vem com a gente, ainda dá tempo.

    Cidinha da Silva vai publicar diáriamente textos sobre as eleições que serão aqui reproduzidos.

     

     

  • “As raízes do fascismo estão enterradas no solo dos EUA”

    “As raízes do fascismo estão enterradas no solo dos EUA”

    Mark Karlin, Truthout, entrevista David Neiwert

    De onde surgiram as figuras de extrema direita que, de repente, aparecem em toda a paisagem política americana? O repórter investigativo David Neiwert vem acompanhando a violência e a ideologia fascista e de extrema direita há décadas, e ele revela como esses grupos cresceram, em poder e em influência, no livro Alt-America: The Rise of the Radical Right in the Age of Trump [Alt-America: a ascensão da direita radical na era do Trump].

    Como o sapo na água fervente, é possível que os estado-unidenses não percebam, antes que seja tarde demais, que a democracia acabou e que o país afundou no fascismo. Nesta entrevista, David Neiwert diz ao Truthout o que há de novo na chamada “direita alternativa” (“alt-right”) e, em que medida, é uma continuação da supremacia branca americana. O autor de Alt-America também descreve como Donald Trump ganhou o apoio de grupos de extrema direita e deu, à visão de mundo desses grupos, um lugar na Casa Branca.

     

     

    Mark Karlin: O termo “alt-right” é uma nova marca de um movimento de supremacia branca que está em vigor há décadas ou deve ser reconhecido como uma entidade distinta?

    David Neiwert: Definitivamente é uma nova marca do pensamento da supremacia branca, mas é muito mais do que apenas isso – é uma reforma completa do movimento e uma expansão dele também, e é por isso que simplesmente chamá-los de “nazistas” não é preciso. Este não é o Klan do seu avô. Isso foi feito para não apenas aproveitar a tecnologia e suas mudanças rápidas, mas alavancá-las como armas. Também foi reformatado inteiramente para atrair os jovens, ou seja, machos brancos com idades compreendidas entre os 16 e 30 anos – usando recursos não tão tradicionais como humor e ironia e “inteligência viva” abertamente transgressiva.

    No final, quando você se aprofunda nos pensamentos deles e examina a ideologia que eles estão promovendo, não há nada realmente novo, nada que os eugenistas e os supremacistas brancos de outros tempos já não tenham dito. Mas é apresentado nas mídias sociais de maneiras hábeis e novas que são muito eficazes com os jovens cuja exposição, desde logo, à história real é superficial.

    O que nas declarações e ações de Donald Trump habilitaram a “direita alternativa”, que você chama de um universo alternativo “há muito desacreditado” e aqueles grupos que precederam a “direita alternativa”, para sentir que esse é o momento deles?

    As origens de Trump como político em 2011 giram em torno de sua adoção de uma teoria de conspiração de extrema direita (e profundamente intolerante), a saber, a chamada conspiração “birther”, que afirma que o certificado de nascimento do presidente Obama foi de alguma forma forjado.

    Mas, se por um lado, essa teoria de conspiração quanto ao local de nascimento de Obama atraiu inicialmente uma turma do Tea Party [ala de extrema direita do Partido Republicano] em sua direção,

    por outro, foi seu discurso de abertura de campanha denunciando imigrantes mexicanos como “estupradores” que animou o contingente nativista / nacionalista branco. O evento que realmente conectou Trump à “direita alternativa” foi o lançamento, em 16 de agosto de 2015, de seu “plano de imigração” – um documento que bem pode ter sido escrito por Ann Coulter ou por seu assessor, o nacionalista branco Stephen Miller, porque repete, quase perfeitamente, como um papagaio as agendas de imigração previamente delineadas por brancos nacionalistas e nativistas, como Coulter, Jared Taylor ou Patrick Buchanan. Esse foi o momento em que vimos a “direita alternativa”, quase completamente, saltar a bordo do vagão de Trump. E nada que ele fez desde então os persuadiu a sair.

    Por que os seguidores da extrema direita têm um sentimento de vitimização tão extremo?

    É um componente essencial do autoritário de direita [RWA – right-wing authoritarian], que apresenta pensamento compartimentado e uma abordagem de soma zero [se um lado ganha é porque o outro perde, a soma é sempre zero] em questões de raça e gênero. Inevitavelmente, os autoritários de direita se concebem como heroicos e um componente essencial da dinâmica de construção do heroísmo é que não só requer a criação de um inimigo, mas também reivindicações de vitimização por ações desse inimigo.

    Minha própria experiência, tendo crescido em torno desse tipo de personalidade, é que a vitimização é, em última instância, uma espécie de projeção, porque os autoritários de direita sempre criam classes inteiras de vítimas em virtude de seus comportamentos, frequentemente intolerantes, pessoas cujas vidas são afetadas negativamente pelo seu preconceito e desdém pelos valores da igualdade – e assim eles reivindicam a vitimização como uma espécie de projeção, uma defesa contra o que é evocado por seus próprios atos ruins.

    Não é um equívoco pensar que as pessoas nos EUA devem estar mais preocupadas com o terrorismo islâmico fanático do que os atos frequentes de terrorismo doméstico?

    Sim. Na verdade, passei cinco anos compilando uma base de dados definitiva sobre terrorismo doméstico nos Estados Unidos como parte de um projeto do Reveal News / Center for Investigative Reporting e do Nation Institute Investigative Fund, que foi publicado no verão passado e detalhou precisamente o quanto a ameaça é maior – quase uma diferença de dois a um na violência política interna americana de extrema direita do que a infligida por islamitas radicais nos últimos nove anos. No entanto, nosso aparelho de aplicação da lei e nosso foco na mídia estão direcionados de forma esmagadora para qualquer pessoa com um fundamento muçulmano, mas trata os terroristas de direita como Dylann Roof como “incidentes isolados”. Em muitos aspectos, essa inclinação é o produto de uma mídia dominante extremamente irresponsável.

    Em que sentido a ascensão das forças da “direita alternativa” para o nível da Casa Branca é compartilhado por movimentos ao redor do mundo?

    O surgimento da direita radical nos EUA é apenas uma peça de uma sombria maré global, e é realmente um fenômeno assustador. Na Europa, a extrema direita está crescendo, não apenas no Reino Unido, onde o voto de Brexit refletiu um nacionalismo crescente, mas na Alemanha, onde o partido de extrema-direita ganhou uma crescente participação nos assentos no Parlamento recentemente e em lugares como a Polônia, onde milhares de jovens nacionalistas xenófobos marcharam recentemente em massa, assim como a Hungria, onde o novo primeiro-ministro, Viktor Orbán, também é um nacionalista descarado ao molde de Trump.

    Já vimos um aumento do autoritarismo em regimes na Ásia, além do maior regime autoritário de todos eles, a China. Em Myanmar, por exemplo, onde a junta militar no poder está liderando uma campanha de limpeza étnica contra o povo muçulmano Rohingya; e nas Filipinas, onde o presidente populista lidera abertamente uma campanha de violência assassina e extermínio contra “usuários de drogas” e jornalistas.

    Por que é importante notar, como você faz em seu livro, que o que o Trump desencadeou é uma descida incremental no fascismo?

    Os americanos sempre se imaginaram imunes ao fascismo. Após a Segunda Guerra Mundial e os horrores do Holocausto foram revelados, nós nos demos tapinhas nas costas e dissemos: “É impossível acontecer aqui!” E, ao nos dizermos isso, mentimos – porque as próprias raízes do fascismo estão enterradas, em lugares, no solo [dos EUA]: as Leis de Nuremberg foram modeladas em Jim Crow; os Brownshirts foram inspirados pela Ku Klux Klan; e tanto o programa Lebensraum de Hitler como o próprio Holocausto foram construídos sobre a admiração dos nazistas pelo genocídio dos nativos americanos nos Estados Unidos.

    Nos anos seguintes, nos tornamos cada vez mais complacentes com o significado e com o funcionamento do fascismo, projetando-o como um insulto fácil e, em última instância, torcendo seu significado com propósitos político-partidários, como fizeram figuras de direita como Jonah Goldberg e Dinesh D’Souza nos últimos anos.

    O fascismo nunca foi nada além do populismo de direita ter se tornado ido metastático – uma manifestação cancerígena de uma visão de mundo já tóxica. Mas, como permitimos que esse populismo, muitas vezes sob o disfarce de “libertarianismo”, se infiltre em nossa política dominante, nos tornamos vulneráveis a sua profunda hostilidade em relação a todas as nossas instituições democráticas, bem como a sua manipulação cínica de tais princípios básicos de democracia como a liberdade de expressão.

    Os americanos querem acreditar que sua democracia continuará funcionando como sempre, mas é como qualquer outro sistema quando se trata de um ataque direto – em última análise, é um sistema tão vulnerável quanto permitimos que ela seja.

    Nota

    1 Entrevista por Mark Karlin, publicada na Truthout em 19/11/2017, no endereço: http://www.truth-out.org/opinion/item/42644-the-american-roots-and-21st-century-global-rise-of-fascism

    2 Tradução de César Locatelli, Jornalistas Livres

     

  • A violência racista é tão norte-americana quanto a torta de maçã

    A violência racista é tão norte-americana quanto a torta de maçã

    Por Kali Holloway / AlterNet com tradução de César Locatelli

    Lembre-se de que Donald Trump congelou os recursos que deveriam ir para grupos que combatem a violência neonazista.

    Lembre-se de que o Departamento de Justiça anunciou recentemente que sua divisão de direitos civis estará concentrando suas energias não no aumento exponencial de crimes de ódio contra negros e muçulmanos que se seguiram à eleição de Trump, mas em “políticas de admissão de ação afirmativa consideradas discriminatórias contra candidatos brancos”.

    Lembre-se de que o homem que chefia o Departamento de Justiça foi rejeitado para o cargo de juiz federal, há 30 anos, por ser muito racista e disse, certa vez, a um advogado negro que ele era totalmente indiferente à Ku Klux Klan “até [ele] descobrir que fumavam maconha”

    Lembre-se de que David Duke, um ex-líder máximo da Ku Klux Klan (Imperial Wizard em inglês), que em 1990 ganhou votos suficientes para se tornar deputado do estado da Louisiana, disse: “votamos por Donald Trump porque ele disse que tomaria nosso país de volta”.

    Lembre-se que o que aconteceu em Charlottesville não foi uma consequência inesperada das eleições presidenciais de 2016, mas exatamente o que Trump prometeu e para o que 63 milhões de pessoas votaram.

    Lembre-se de que 53 por cento das mulheres brancas ajudaram a eleger Trump porque viram a perda da supremacia branca como uma afronta mais grave do que a perspectiva de suas filhas serem pegas pela xoxota.

    Lembre-se de que alguns dos jovens neonazistas com suas camisas polo calças caqui em Charlottesville irão se tornar juízes e policiais e diretores de escolas e diretores executivos de empresas e controladores de todos os tipos de acessos.

    Lembre-se de que muitos desses caras têm namoradas e esposas e irmãs e tias e mães – algumas delas também estavam lá – que apoiam e concordam com eles.

    Lembre-se de que as mulheres brancas ajudaram a manter o poder branco desde a fundação deste país, razão pela qual as mulheres negras e latino-americanas tiveram que inventar seus próprios feminismos.

    Lembre-se de que, em 1955, Emmett Till foi espancado até a morte, os olhos arregalados, uma bala alojada em seu cérebro porque ele assobiou para uma mulher branca, sem contar que era mentira que ele tivesse assobiado.

    Lembre-se que 60 anos depois, antes de assassinar nove pessoas negras que o receberam em sua igreja, Dylann Roof disse: “Vocês estupram nossas mulheres e estão assumindo o controle do nosso país. E vocês têm que ir.”

    Lembre-se de que depois que Roof ceifou aquelas vidas negras, no único espaço seguro que os negros já tiveram nesse país, a polícia comprou para ele um lanche no Burger King.

    Lembre-se de que as vidas de Eric Garner, Akai Gurley e Walter Scott eram tão desvalorizadas que, quando estavam morrendo, a polícia nem sequer se preocupou em realizar uma ressuscitação cardiopulmonar.

    Lembre-se de que um júri votou por dar à família de um cachorro baleado por policiais a quantia de 1,26 milhões de dólares, aproximadamente o mesmo montante dado à família de Michael Brown.

    Lembre-se de que, horas depois da decisão do Supremo Tribunal de 2013, de derrubar partes-chave da Lei de Direitos de Voto, o Texas, a Carolina do Sul, a Virgínia, o Mississípi e o Alabama avançaram com leis de identificação de eleitores que negam o direito de votar de pessoas negras e latinas.

    Lembre-se de que a Lei de Direitos de Voto passou em 1965, o que significa que os negros só conseguiram legalmente votar em todas as partes deste país durante um pedacinho do tempo que somos americanos.

    Lembre-se de que as pessoas foram assassinadas por tentar votar, às vezes por linchamento, eventos que foram celebrados e comemorados em cartões postais.

    Lembre-se de que através de táticas de supressão de eleitores, a milhões de pessoas negras ainda é negado o direito de voto e lembre-se de quem se beneficia disso.

    Lembre-se de que os realizadores do “Game of Thrones” sofrem de tamanha falta de imaginação que estão fazendo uma série de televisão sobre como seriam os Estados Unidos se o Sul tivesse vencido a Guerra Civil, como se o racismo tivesse desaparecido em 1865, em vez de continuar a crescer e prosperar, e como se não pudéssemos, com apenas um olhar para este país em tempo real, preparar, nós mesmos, um roteiro para a série.

    Lembre-se de que a América foi fundada no genocídio dos nativos americanos e na escravidão negra e que Richard Spencer ainda está enriquecendo com as fazendas de algodão e o trabalho negro.

    Lembre-se que aqueles caras brancos em Charlottesville, que reclamam que estão cansados de ouvir sobre a escravidão, estavam lá para protestar contra a remoção de uma estátua de um confederado, o que é meio engraçado quando você pensa na ironia do fato, embora não tenha a menor graça.

    Lembre-se de tudo isso quando você ouvir alguém responder aos eventos de Charlottesville dizendo que a violência racista é “não-americana” ou que isso “não é quem somos”, porque essa é uma mentira deslavada.

    Na verdade, é isso o que esse país tem sido desde o primeiro dia. Este é os Estados Unidos no seu modo mais transparente. E ninguém mais consegue fingir ficar chocado.