A violência racista é tão norte-americana quanto a torta de maçã

Foto por Eugene Gu / Twitter

Por Kali Holloway / AlterNet com tradução de César Locatelli

Lembre-se de que Donald Trump congelou os recursos que deveriam ir para grupos que combatem a violência neonazista.

Lembre-se de que o Departamento de Justiça anunciou recentemente que sua divisão de direitos civis estará concentrando suas energias não no aumento exponencial de crimes de ódio contra negros e muçulmanos que se seguiram à eleição de Trump, mas em “políticas de admissão de ação afirmativa consideradas discriminatórias contra candidatos brancos”.

Lembre-se de que o homem que chefia o Departamento de Justiça foi rejeitado para o cargo de juiz federal, há 30 anos, por ser muito racista e disse, certa vez, a um advogado negro que ele era totalmente indiferente à Ku Klux Klan “até [ele] descobrir que fumavam maconha”

Lembre-se de que David Duke, um ex-líder máximo da Ku Klux Klan (Imperial Wizard em inglês), que em 1990 ganhou votos suficientes para se tornar deputado do estado da Louisiana, disse: “votamos por Donald Trump porque ele disse que tomaria nosso país de volta”.

Lembre-se que o que aconteceu em Charlottesville não foi uma consequência inesperada das eleições presidenciais de 2016, mas exatamente o que Trump prometeu e para o que 63 milhões de pessoas votaram.

Lembre-se de que 53 por cento das mulheres brancas ajudaram a eleger Trump porque viram a perda da supremacia branca como uma afronta mais grave do que a perspectiva de suas filhas serem pegas pela xoxota.

Lembre-se de que alguns dos jovens neonazistas com suas camisas polo calças caqui em Charlottesville irão se tornar juízes e policiais e diretores de escolas e diretores executivos de empresas e controladores de todos os tipos de acessos.

Lembre-se de que muitos desses caras têm namoradas e esposas e irmãs e tias e mães – algumas delas também estavam lá – que apoiam e concordam com eles.

Lembre-se de que as mulheres brancas ajudaram a manter o poder branco desde a fundação deste país, razão pela qual as mulheres negras e latino-americanas tiveram que inventar seus próprios feminismos.

Lembre-se de que, em 1955, Emmett Till foi espancado até a morte, os olhos arregalados, uma bala alojada em seu cérebro porque ele assobiou para uma mulher branca, sem contar que era mentira que ele tivesse assobiado.

Lembre-se que 60 anos depois, antes de assassinar nove pessoas negras que o receberam em sua igreja, Dylann Roof disse: “Vocês estupram nossas mulheres e estão assumindo o controle do nosso país. E vocês têm que ir.”

Lembre-se de que depois que Roof ceifou aquelas vidas negras, no único espaço seguro que os negros já tiveram nesse país, a polícia comprou para ele um lanche no Burger King.

Lembre-se de que as vidas de Eric Garner, Akai Gurley e Walter Scott eram tão desvalorizadas que, quando estavam morrendo, a polícia nem sequer se preocupou em realizar uma ressuscitação cardiopulmonar.

Lembre-se de que um júri votou por dar à família de um cachorro baleado por policiais a quantia de 1,26 milhões de dólares, aproximadamente o mesmo montante dado à família de Michael Brown.

Lembre-se de que, horas depois da decisão do Supremo Tribunal de 2013, de derrubar partes-chave da Lei de Direitos de Voto, o Texas, a Carolina do Sul, a Virgínia, o Mississípi e o Alabama avançaram com leis de identificação de eleitores que negam o direito de votar de pessoas negras e latinas.

Lembre-se de que a Lei de Direitos de Voto passou em 1965, o que significa que os negros só conseguiram legalmente votar em todas as partes deste país durante um pedacinho do tempo que somos americanos.

Lembre-se de que as pessoas foram assassinadas por tentar votar, às vezes por linchamento, eventos que foram celebrados e comemorados em cartões postais.

Lembre-se de que através de táticas de supressão de eleitores, a milhões de pessoas negras ainda é negado o direito de voto e lembre-se de quem se beneficia disso.

Lembre-se de que os realizadores do “Game of Thrones” sofrem de tamanha falta de imaginação que estão fazendo uma série de televisão sobre como seriam os Estados Unidos se o Sul tivesse vencido a Guerra Civil, como se o racismo tivesse desaparecido em 1865, em vez de continuar a crescer e prosperar, e como se não pudéssemos, com apenas um olhar para este país em tempo real, preparar, nós mesmos, um roteiro para a série.

Lembre-se de que a América foi fundada no genocídio dos nativos americanos e na escravidão negra e que Richard Spencer ainda está enriquecendo com as fazendas de algodão e o trabalho negro.

Lembre-se que aqueles caras brancos em Charlottesville, que reclamam que estão cansados de ouvir sobre a escravidão, estavam lá para protestar contra a remoção de uma estátua de um confederado, o que é meio engraçado quando você pensa na ironia do fato, embora não tenha a menor graça.

Lembre-se de tudo isso quando você ouvir alguém responder aos eventos de Charlottesville dizendo que a violência racista é “não-americana” ou que isso “não é quem somos”, porque essa é uma mentira deslavada.

Na verdade, é isso o que esse país tem sido desde o primeiro dia. Este é os Estados Unidos no seu modo mais transparente. E ninguém mais consegue fingir ficar chocado.

 

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