Hoje vou entendendo que seu fim é sua glória. O ano passado morremos lentamente. Doença é assim, isso mesmo, realiza seu mau.
Felicidade de vírus, bactéria, fungo, pensamentos imbecis, é desestruturar.
É como um elefante marchando em um jardim de Burle Marx, apreciando outras estéticas, muitas cores, saberes, sabores e jeitos; tudo alimenta músculos primitivos, grandes membros, tradicionais articulações. Sutilezas não cabem em seres assim.
Sabedoria de fruto é a semente, é salvar-se, reservar, armazenar para arar depois. Ervas daninhas ocupam o roçado, alteram curvas de nível, causam voçoroca, acabrunham.
A gente se ilude, poetisa, crê a fundo, mas será uma longa euforia mercantil em solo tão rico, próspero à emoções adolescentes, pátria amada tão linda.
Não desanime.
Enfim, seguiremos, prosseguiremos, é fim de década, novo ano, longo ciclo.
Ontem foi celebrado um ato no Largo São Francisco, região central de São Paulo, em homenagem e apoio ao deputado Jean Willys (PSOL-RJ) que depois de sofrer seguidas ameaças decidiu abandonar o mandato e sair do país.
Jean lutou, durante dois mandatos, na Câmara dos Deputados pelos direitos LGBTs e de todas as minorias oprimidas. Sua vida pública foi marcada por campanhas de difamação e mentiras. Sua atuação incomodava fanáticos apoiadores de Jair Bolsonaro que, além de inventarem mentiras absurdas sobre ele, ameaçaram de morte sua mãe e seus irmãos. Um dos episódios marcantes da trajetória de Willys pelo congresso foi o cuspe em Jair Messias Bolsonaro durante a votação do Impeachment da presidenta Dilma, após o deputado Bolsonaro homenagear o torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra. Fernando Haddad, Manuela D’Ávila, Guilherme Boulos, Criolo, a deputada estadual ,Erica Malunguinho, o deputado estadual, Carlos Giannazi, Eduardo Suplicy, Ivan Valente, o presidente do PSOL, Juliano Medeiros, e centenas de militantes e políticos estavam lá juntos para lutar pela democracia e por Jean.
O ato ocorreu no salão nobre da Faculdade de Direito da USP, que fica no largo. Ao longo da noite várias falas foram realizadas pelos que estavam presentes, seja para relembrar momentos e vitórias de Jean como deputado ou para lamentar e ponderar sobre a decisão que ele foi obrigado a tomar.
Veja abaixo falas de alguns dos presentes.
Manuela D’Avila (ex-cadidata à vice-presidência do Brasil pelo PT)
“Trago um recado de Jean: ele disse que nunca, mesmo diante de tanto medo e de tanta adversidade que fizeram com que ele tomasse essa decisão, ele nunca teve tanta esperança pela onda de solidariedade que ele recebeu. Pediu que eu dissesse a vocês que mesmo doído, ele está bem.” “Eu acho que o exilio do Jean, diz muito sobre o que o Brasil vive, sobre o que viveu nos últimos anos e também sobre o que nós podemos viver nos próximos dias, nos próximos meses, no próximo período.”
“Nós precisamos dizer que a onda de fake News e as redes de ódio são responsáveis pelo exilio de Jean. “
“A mera existência de um homem gay político, gera ódio. A verdade. O homem gay, político, poderoso, subvertendo as estruturas de poder. Isso gera ódio. Por isso é fake News e ódio. E são muitos os anos que Jean sofre com isso. São muitos os anos. E não é por acaso. É porque ele é porta voz de um conjunto de ideias que causam medo. A mudança. A transformação. O tirar o poder das mãos dos mesmos que tem sempre o poder: os homens brancos heterossexuais.”
“Nós queremos uma democracia viva. Com o direito a debater todas as coisas e não queremos ser odiados. E nem sermos absolutamente destruídos porque defendemos o que quer que seja.”
“É preciso falar: o fascismo, o ódio, a desumanização. A ideia de que o outro é o inimigo, o inimigo único a ser combatido. Que façam com que venham aqui, que vão aos enterros, que vão aos hospitais, tentarem fazer escrachos com os que lutam pela democracia. O fascismo no Brasil se constrói a partir do ódio, das fake News financiadas por dinheiro sujo na internet. “
“Nós temos a obrigação de acolhermos as decisões das nossas companheiras e dos nossos companheiros sobre a melhor forma de resguardarem as suas vidas e a sua sanidade mental. “
Fernando Haddad (ex-cadidato à presidência do Brasil pelo PT)
“Primeiro dizer pra vocês todos que eu estou, desde sempre, mas a partir de hoje com mais vontade, eu estou disponível, eu estou disposto, eu estou animado, para reconstruir as condições para o Jean voltar para o Brasil amanhã, se ele quiser.”
Guilherme Boulos (ex-cadidato à presidência do Brasil pelo PSoL)
“Estao construindo esse ambiente, tão semeando o ódio, tão estimulando a violência, e a responsabilidade política das ameaças ao Jean, inclusive pela forma como reagiu, essa responsabilidade é do Bolsonaro e do seu governo e é ele que deve ser cobrado.”
“A decisão do Jean é um grito, um grito de basta, de que não dá mais. E é importante a gente ouvir esse grito e transformar esse grito em disposição de luta, em unidade, em mobilização, para que a gente possa começar a virar esse jogo. Virar esse jogo para construir um Brasil onde alguém como Jean Wyllys seja valorizado e seja respeitado. Para construir um Brasil onde todas as formas de amor sejam valorizadas e sejam respeitadas. Para construir um Brasil onde o lucro não esteja acima da vida.“
Monica Benício (ex-mulher de Marielle Franco e militante do PSoL)
“Eu tenho um desacordo quando as pessoas dizem que o Jean teve que abandonar o seu mandato. Eu acho que ele foi obrigado a abandonar o seu mandato por essas pessoas.”
Ivan Valente (deputado federal pelo PSoL-SP)
“Bolsonaro na cadeia já, e não é só pelas transações tenebrosas, não é só pelos depósitos do Queiros, é porque a ligação direta com as milícias no Rio de Janeiro, lá no Escritório do Crime, em Rio das Pedras, e no globo de hoje esta muito claro, nos discursos de Bolsonaro em Brasília e do Flavio, na homenagem que ele faz, que nós podemos ter uma grande surpresa, Monica, fechando o circuito. Talvez a mão assassina que atirou em Marielle passe exatamente por ai, nesse que esta ai clandestino agora, neste que está foragido e que é homenageado. Miliciano homenageado. Nós não vamos permitir isso. Nós vamos dizer: Bolsonaro é ligado as milícias. Fora Bolsonaro”
Os Jornalistas Livres acompanharam a posse de Jair Messias Bolsonaro em Brasília no dia 01/01/2019. Os fotógrafos Matheus Alves, Leonardo Milano e Lucas Martins capturaram algumas cenas das pessoas que acompanhavam o cerimonial que aconteceu no Congresso e no Palácio do Planalto.
A cerimônia começou as 08:00h quando as diversas barreiras de revista, instaladas ao longo de toda a Esplanada, foram abertas e durou até cerca das 19:00h.
Impressões
Matheus deixou o seguinte relato:
“Às vezes eu olho as fotos que fiz e me pergunto: por que diabos eu fui num lugar desse? É, ainda não sei.
O momento que representaria a festa da democracia que é a posse de um presidente eleito, foi marcado pelas mensagens mais antidemocráticas que já pude ver por metro quadrado. Para eu, um homem negro, que se desafiou a fotografar o momento mais bizarro da democracia brasileira, com exceto a eleição de Jair Bolsonaro, alguns desses símbolos doeram no coração.
Pra começar a primeira imagem que apareceu na minha frente era aquele padrão kit meme madame + poodle andando pela rua, com uma regata de cores camufladas, como as do exército. Por um momento quis rir com uma amiga fotógrafa que estava ao lado e me acompanhou durante toda a cerimônia de posse, mas logo veio em mente o quão preocupante é essa situação toda. Ao entrar na Esplanada dos Ministérios, me deparei com duas filas quase quilométricas de pessoas esperando por uma revista policial ‘atípica’ pra quem estreava na capital federal. Sem paciência pra ‘isso daí’, muita gente ficou indignada (“porra, tá achando que eu sou petista? tira essa revista aí, pô”) e desistiu de esperar, voltando para a rodoviária e possivelmente comendo o tal “Pastel Bolsonaro”, ofertado pela pastelaria Viçosa, também acusada de transfobia em seus dois pontos na rodoviária. Mais a frente, rumo a segunda barreira policial, vejo um casal feliz fazendo uma selfie. O homem, com uma bandeira do Brasil monarquico estampada em suas costas como uma ‘capa de super homem’, contrastava com as cores da grama e o azul dialogava com duas placas logo atrás, que celebravam os 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, mostrando a contradição grandiosa que esse tempo representa para o povo brasileiro.
A esquizofrenia de um público que se diz nacionalista e cheio de saliva ácida que destilava todo seu cuspe para falar das políticas de relações internacionais dos governos anteriores, colocou as bandeiras dos países vizinhos no lixo, exaltando a bandeira dos EUA, o país símbolo do imperialismo mundial. As camisetas com “meu partido é o Brasil”, frase tão comum entre as ornamentações feitas pelos fanáticos, destoava quando misturada com as cores vermelha, azul e branca, fazendo que eu me perguntasse:
“cadê a bandeira do Brasil?”
O show de horrores continuava a mil: Bolsonaro desfilava rumo ao Palácio do Planalto aos gritos de “mito!, mito!” enquanto passara por uma frase escrita “Lula Livre” no asfalto, também reforçada de forma engraçada por um dos cavalos que se revoltou e chegou a trombar com o carro que carregava o ~capitão~, que ficou assustado e logo disfarçou. Segurei o riso, afinal, era eu contra uns 90 mil deles.
Chegando no palácio, Temer aparece posicionado esperando por Bolsonaro na porta do Planalto através de um grande telão de led. O público vaiava… vish! “Fora Temer!” “Ladrão!” “Sanguessuga!” era o que mais se ouvia dali, que logo em seguida mudava seus gritos e comemorava quando seu presidente aparecia meio segundo depois.
Passando o rito do planalto, o público saia da praça dos três poderes. O sol quente, o céu médio nublado e a falta de vento, provocaram uma série de desitratações que fizeram os desabituados ao cerrado passarem mal. O fluxo de gente era grande o suficiente para as filas dos tanques de água potável serem furadas pelos ‘cidadãos de bem’, que pouco se importavam com a necessidade do próximo de beber um copo d’água. No geral, a posse que vi foi uma verdadeira mistura de inconsciência, caricatices e a demonstração de que o ‘zap zap’ fez um ótimo trabalho de lavagem cerebral naqueles que, por exemplo, desfilaram com uma bandeira LGBT estampada com o rosto de Jair Bolsonaro. No fim da tarde, a vestimenta em verde e amarelo, se misturou com o vermelho – não da bandeira, mas da pele daquelas pessoas tão brancas que de tanto sol, ficaram tão vermelhas quanto; da maquiagem borrada e do sapato nas mãos como o fim de uma grande (e bizarra) festa.”.
Leonardo Milano deixou o seguinte relato:
Bandeiras dos EUA e de Israel em todas as partes, pessoas fantasiadas de militares, muita gente branca (e algumas negas), camisetas da CBF, Nike, Faustão, apoio à ditadura, Moro e Cia. Gritos de “mito, mito, mito” durante a fala do Eleito. Eleito em nome do combate aos privilégios (aqueles que ele faz questão de manter para sua família e apoiadores), aos comunistas e terroristas imaginários, que parecem ter saído de algum filme Hollywoodano de ação do período da guerra fria (não por acaso, muitas camisetas do Batman, e do Capitão América durante a Posse) . Em seu discurso vazio, mas cheio de ódio às diferenças e ao pensamento crítico, Bolsonaro deixou muito claras as suas intenções: perseguir incansavelmente os movimentos sociais, culturais indígenas, e a tudo represente uma ameaça aos ditos “de bem”, defensores da família tradicional, dos bons costumes e da civilidade (curiosamente, nas enormes filas para água potável, foram inúmeros os bolsonaristas que fumaram fila). Aliás, o mesmo tipo de pensamento que habitava as mentes dos apoiadores do nazismo na Alemanha. A tradicional família brasileira quer acabar com o que chamam de privilégios (mas que não são) das minorias, daqueles que secularmente foram oprimidos e esquecidos pelo estado e pelo patriarcado. Desse Brasil, que agora tem voz num presidente que frequentemente ataca
LGBTs, quilombolas, indígenas, mulheres, ambientalistas e pessoas que lutam por igualdade e justiça, não quero fazer parte. Meu lugar é nas ruas, no campo, na floresta, ao lado daqueles que lutam por um país sem desigualdades.
No Brasil está em jogo nada menos do que o futuro da política de todo o Ocidente – e do Sul global.
Despojadas até a sua essência, as eleições presidenciais brasileiras representaram um choque direto entre a democracia e um neofascismo do início do século XXI, entre a civilização e a barbárie.
Embate dramático entre Haddad e candidato fascista
As repercussões geopolíticas e econômicas mundiais serão enormes. O dilema brasileiro ilumina todas as contradições que rodeiam a ofensiva populista de direita do Ocidente, justapondo-se ao inexorável colapso da esquerda. Os riscos não podem ser maiores.
Jair Bolsonaro, apoiante ferrenho das ditaduras militares brasileiras do século passado, que tem sido apresentado simpaticamente como o “candidato de extrema-direita”, ganhou a primeira volta das eleições presidenciais no domingo com mais de 49 milhões de votos. Foram 46% do total, a pouca distância da maioria necessária para uma vitória imediata. Isto, só por si, já é um desenvolvimento incrível.
O seu opositor, Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores (PT), só recebeu 31 milhões de votos, ou seja, 29% do total. Vai agora enfrentar Bolsonaro numa segunda volta em 28 de outubro. Uma tarefa digna de Sísifo aguarda Haddad: para igualar Bolsonaro, precisa de cada um dos votos dos que apoiaram os candidatos situados em terceiro e quarto lugares, mais uma substancial parte de quase 20% dos votos brancos e nulos.
Entretanto, nada menos de 69% dos brasileiros, segundo as últimas sondagens, manifestam apoio à democracia. Ou seja, há 31% que não a apoiam.
Um Trump tropical? Não.
Revista britânica que defende o o liberalismo econômico considera Bolsonaro a ameaça para a América Latina
A Distopia Central nem sequer o qualifica. Os brasileiros progressistas sentem-se aterrorizados com a ideia de enfrentar um deserto intelectual mutante, como no filme “Brazil” ou Mad Max, devastado por fanáticos evangélicos, capitalistas gananciosos do casino neoliberal e militares raivosos inclinados a recriar uma ditadura 2.0.
Bolsonaro, um antigo paraquedista, tem sido retratado pelos media ocidentais dominantes como o Trump Tropical. Os factos são muito mais complexos.
Bolsonaro, um membro medíocre do Congresso durante 27 anos, sem nada que se destaque no seu currículo, demoniza indiscriminadamente negros, a comunidade LGBT, a esquerda no seu todo, a “fraude” ambiental e, sobretudo, os pobres. Confessou abertamente ser a favor da tortura. Apresenta-se como um Messias – um avatar fatalista que aparece para “salvar” o Brasil de todos os “pecados” atrás referidos.
A Deusa do Mercado, previsivelmente, abre-lhe os braços. Os “investidores” – essas entidades semidivinas – consideram-no bom para “o mercado”, com a sua ofensiva de última hora nas sondagens, refletidas numa recuperação do real brasileiro e do mercado de ações de São Paulo.
Bolsonaro pode ser o “salvador” clássico de extrema-direita, segundo o molde nazi. Pode encarnar o populismo de direita até ao âmago. Mas não é, de modo algum, um “soberanista” – o lema de eleição no debate político em todo o Ocidente. O seu Brasil “soberano” será governado mais como uma ditadura retro-militar, totalmente subordinada aos caprichos de Washington.
O vice-presidente proposto por Bolsonaro é um general reformado, escassamente letrado, um homem que se envergonha da sua origem mista e é abertamente a favor da eugenia. O general António Hamilton Mourão até já ressuscitou a ideia de um golpe militar.
Por detrás desta equipa, encontramos enormes interesses económicos, ligados a recursos minerais, agroindústrias e a quase todos os “Cinturões Bíblicos” brasileiros. Acompanham-nos os esquadrões da morte contra os brasileiros nativos, os camponeses sem terra e as comunidades afro-americanas. É um paraíso para a indústria do armamento. Chamem-lhe a apoteose do cristão-sionismo tropical neopentecostalista.
Louvado seja o Senhor
O Brasil tem 42 milhões de evangélicos – e mais de 200 representantes nos dois ramos do Parlamento. Não se metam com os seus jihadistas. Eles sabem como exercer uma influência maciça entre os mendigos do banquete neoliberal. A esquerda de Lula não sabia como os seduzir.
Assim, mesmo imitando Mike Pence, Bolsonaro só é o Trump brasileiro até um certo ponto: as suas técnicas de comunicação – falar duro, de forma simplista — são uma linguagem que até um miúdo de sete anos percebe. Os italianos instruídos comparam-no a Matteo Salvini, o líder do partido Lega, hoje ministro do Interior. Mas também não é exatamente esse o caso.
Bolsonaro é um sintoma de uma doença muito maior. Só atingiu este nível, um frente a frente na segunda volta contra Haddad, candidato de Lula, por causa duma Guerra Híbrida judicial/congressional/industrial/media, refinada e contínua, desencadeada contra o Brasil.
Bastante mais complexa do que qualquer revolução colorida, a Guerra Híbrida no Brasil caracteriza-se por um golpe lawfare sob a cobertura da investigação anticorrupção da Lava Jato que levou ao impeachment da presidente Dilma Rousseff e à prisão de Lula, com acusações de corrupção sem quaisquer provas.
Em todas as sondagens Lula ganharia estas eleições. Os conspiradores conseguiram metê-lo na prisão e impedi-lo de se candidatar. O direito de Lula a candidatar-se foi defendido por toda a gente, desde o Papa Francisco ao Conselho dos Direitos Humanos da ONU, assim como por Noam Chomsky. No entanto, numa deliciosa reviravolta histórica, o cenário dos conspiradores rebentou-lhes na cara quando o primeiro candidato a governar o país não é nenhum deles, mas um neofascista.
“Um deles” seria idealmente um burocrata sem rosto, um apaniguado dos antigos sociais-democratas, o PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira –, neoliberais radicais viciados em colocar-se no centro-esquerda, quando são “aceitáveis” perante os neoliberais da direita. Chamem-lhes Tony Blairs brasileiros. As contradições específicas brasileiras, mais o avanço do populismo de direita no Ocidente, levaram à sua queda.
Até a Wall Street e a City de Londres (que apoiaram a Guerra Híbrida no Brasil, depois de ela ter sido desencadeada pela NSA, que espionou a gigantesca petrolífera Petrobrás) começaram a mudar de opinião quanto ao apoio a Bolsonaro para presidente duma nação BRICS, que é líder do Sul Global, e que, até há poucos anos, estava em vias de ser a quinta maior economia do mundo.
Tudo depende do mecanismo da “transferência de votos” de Lula para Haddad e na criação de uma Frente Democrática Progressiva séria e multipartidária na segunda volta para derrotar o crescente neofascismo. Têm menos de três semanas para o realizar.
Steve Bannon. O efeito Bannon
Não é segredo nenhum que Steve Bannon é conselheiro da campanha de Bolsonaro no Brasil. Um dos filhos de Bolsonaro, Eduardo, encontrou-se com Bannon em Nova Iorque dois meses depois de o campo de Bolsonaro ter decidido aproveitar a supostamente inigualável visão de engenharia social de Bannon.
O filho de Bolsonaro escreveu num tweet , nessa altura: “Estamos em contacto para reunir forças, especialmente contra o marxismo cultural”. Isto foi seguido por um exército de bots, que vomitaram uma avalanche de notícias falsas até ao dia das eleições.
Um espectro assombra a Europa. Chama-se Steve Bannon. Este espectro mudou-se para os trópicos.
Na Europa, Bannon está agora apostado em intervir como um anjo da perdição num quadro de Tintoretto, anunciando a criação duma coligação populista União Europeia-toda a direita.
Bannon recebe publicamente os maiores elogios do ministro do Interior italiano, Salvini; do primeiro-ministro húngaro Viktor Orban; do nacionalista holandês Geert Wilders; e do flagelo do establishment de Paris, Marine Le Pen.
No mês passado, Bannon fundou O Movimento; à primeira vista apenas uma start-up política em Bruxelas, com uma pequena equipa. Mas falamos em ambição sem limites: o seu objetivo é nada menos do que virar as eleições parlamentares europeias em maio de 2019 de pernas para o ar.
O Parlamento Europeu em Estrasburgo – um bastião de ineficácia burocrata – não é exatamente um nome familiar na União Europeia. O parlamento está impedido de propor legislação. As leis e os orçamentos só podem ser bloqueados através de uma maioria de votos.
Bannon pretende captar pelo menos um terço dos assentos em Estrasburgo. Está apostado em aplicar métodos ao estilo americano, já testados, tais com sondagens intensivas, análise de dados e intensivas campanhas sociais nos media – tal como no caso de Bolsonaro. Mas, claro, não há garantias de que vá funcionar.
Steve Bannon – o estrategista de Trump e de Bolsonaro – rei das notícias falsas
A pedra basilar de O Movimento, segundo tudo leva a crer, foi colocada em duas importantes reuniões no início de setembro, organizadas por Bannon e pelo seu braço direito, Mischael Modrikamen, presidente do pequenino Partido Popular Belga (PP). A primeira reunião realizou-se em Roma com Salvini e a segunda em Belgrado com Orban.
Modrikamen define o conceito como um “clube” que vai “angariar fundos de doadores, na América e na Europa, para assegurar que as ideias ‘populistas’ sejam ouvidas pelos cidadãos da Europa que se apercebem cada vez mais que a Europa já não é uma democracia”.
Modrikamen insiste: “Somos todos soberanistas”. O Movimento vai martelar quatro temas que parecem formar consenso em partidos políticos diferentes, de toda a União Europeia: contra uma “imigração descontrolada”; contra o “islamismo”; a favor da “segurança” na União Europeia; e em apoio a “uma Europa de nações soberanas, orgulhosas da sua identidade”.
O Movimento deverá ganhar velocidade depois das intercalares do próximo mês nos EUA. Em teoria, poderá congregar diversos partidos da mesma nação à sua sombra. Poderá ser uma ordem muito alta, ainda mais alta do que o facto de os principais atores políticos já terem programas divergentes.
Wilders quer rebentar com a União Europeia. Salvini e Orban querem uma União Europeia fraca, mas não querem ver-se livres das suas instituições, Le Pen quer uma reforma da União Europeia seguida por um referendo “Frexit”.
Os únicos temas que unem este saco de gatos de populismos de direita são o nacionalismo, um confuso impulso anti-establishment e — muito popular — o desencanto com a pesada máquina burocrática da União Europeia.
Encontramos aqui terreno comum com Bolsonaro, que se apresenta como nacionalista e contra o sistema político brasileiro – apesar de estar no Parlamento há séculos.
Manifestação organizada pelo grupo Mulheres Unidas Contra Bolsonaro em Campinas
Não há uma explicação racional para o avanço de última hora de Bolsonaro nas duas secções do eleitorado brasileiro que o desprezam profundamente: as mulheres e a região nordeste, que sempre foi discriminada pelo sul e pelo sudeste, mais ricos.
Tal como a Analítica de Cambridge nas eleições norte-americanas de 2016, a campanha de Bolsonaro visou eleitores indecisos nos estados do nordeste, assim como as mulheres, com uma barragem de notícias falsas, denegrindo Haddad e o Partido dos Trabalhadores. Funcionou como mágica.
A ação italiana
Estive no norte de Itália para ver até que ponto Salvini é popular. Salvini define as eleições para o Parlamento Europeu em maio de 2019 como “a última hipótese para a Europa”. O ministro italiano dos Estrangeiros, Enzo Moavero, considera-as as primeiras “verdadeiras eleições para o futuro da Europa”. Bannon também acha que o futuro da Europa está em jogo na Itália.
É espantoso apreender a energia conflituosa no ar em Milão, onde o partido Lega de Salvini é muito popular enquanto, simultaneamente, Milão é uma cidade globalizada, a abarrotar de bolsõess ultraprogressistas.
Num debate político sobre um livro publicado pelo Instituto Bruno Leoni, acerca da saída do euro, Roberto Maroni, antigo governador da poderosa região da Lombardia, observou: “A Italexit está fora do programa formal do governo, do Lega e do centro-direita”. Maroni lá sabe, afinal de contas, ele foi um dos fundadores do Lega,
Mas deu a entender que há no horizonte importantes mudanças. “Para formar um grupo no Parlamento Europeu, os números são importantes. Este é o momento para aparecer com um único símbolo dos partidos de muitas nações”.
Não são só Bannon e Modrikamen de O Movimento. Salvini, Le Pen e Orban estão convencidos de que podem ganhar as eleições de 2019 – com a União Europeia transformada numa “União das Nações Europeias”. Isso incluirá não só algumas das grandes cidades onde se passa toda a ação, com o resto reduzido a um estatuto de observadores. O populismo de direita argumenta que a França, a Itália, a Espanha e a Grécia já não são nações – apenas meras províncias.
O populismo de direita sente-se imensamente satisfeito por o seu principal inimigo ser o auto-intitulado Macron “Júpiter” – ridicularizado por alguns em França como “o pequeno Rei-Sol”. O presidente Emmanuel Macron deve andar aterrorizado por Salvini surgir como a “luz principal” dos nacionalistas europeus.
É para isto que a Europa parece estar a caminhar: um destruidor desafio de Salvini contra Macron.
A luta entre Salvini e Macron, na Europa, pode ser uma repetição da luta entre Bolsonaro e Haddad, no Brasil. Alguns espíritos agudos brasileiros estão convencidos de que Haddad é o Macron brasileiro.
Na minha opinião, não é. Tem formação em filosofia e foi um competente prefeito de São Paulo, uma das mais complexas metrópoles do planeta. Macron é um banqueiro Rothschild de fusões e aquisições. Ao contrário de Macron, que foi engendrado pela instituição francesa como o perfeito lobo “progressivo” a ser largado entre as ovelhas, Haddad encarna o que resta da esquerda realmente progressista.
Haddad no enfrentamento com o nazismo mais grave da história do Brasil
Para mais – ao contrário de todo o espectro político brasileiro – Haddad não é corrupto. Terá que oferecer a exigida porção de carne aos suspeitos habituais, se ganhar a corrida. Mas não será uma marioneta nas mãos deles.
Comparem o trumpismo de Bolsonaro, evidente na sua mensagem de última hora, antes do dia das eleições: “Tornem o Brasil Grande de Novo!”, com o trumpismo de Trump.
Os instrumentos de Bolsonaro são o elogio persistente da Pátria Mãe, das forças armadas e da bandeira.
Mas Bolsonaro não está interessado em defender a indústria, os empregos e a cultura do Brasil. Pelo contrário. Um exemplo gráfico é o que aconteceu num restaurante brasileiro, em Deerfield Beach, na Flórida, há um ano: Bolsonaro saudou a bandeira americana e entoou “USA! USA!”
Isso é puro MAGA (Make America Great Again) – e sem a letra “B”.
Jason Stanley, professor de Filosofia em Yale e autor de How Fascism Works , leva-nos mais longe . Stanley sublinha como “a ideia no fascismo é destruir a política económica… Os empresários alinham com os políticos que usam táticas fascistas porque tentam desviar a atenção das pessoas das forças reais que causam a genuína ansiedade que elas sentem”.
Bolsonaro domina estas táticas de diversão. É excelente em denegrir o alegado marxismo cultural. Bolsonaro encaixa na descrição de Stanley, tal como é aplicado aos EUA:
“O liberalismo e o marxismo cultural destruíram a nossa supremacia e destruíram esse maravilhoso passado em que governávamos e as nossas tradições culturais eram as que dominavam. Depois, militariza o sentimento de nostalgia. Toda a ansiedade e perda que as pessoas sentem na sua vida, digamos por causa da perda do serviço de saúde, da perda das suas reformas, da perda da sua estabilidade, é enraizada numa sensação de que o verdadeiro inimigo é o liberalismo, que levou à perda do seu passado mítico”.
No caso brasileiro, o inimigo não é o liberalismo, mas o Partido dos Trabalhadores, ridicularizado por Bolsonaro como “um monte de comunistas”. Ao celebrar a sua espantosa vitória da primeira volta, disse que o Brasil estava à beira de um “abismo” comunista corrupto e podia escolher entre uma via de “prosperidade, liberdade, família” ou “a via da Venezuela”.
A investigação Lava Jato consagrou o mito de que o Partido dos Trabalhadores e toda a esquerda é corrupta (mas a direita não). Bolsonaro ainda ampliou mais o mito: todas as minorias e classe social é um alvo – na sua cabeça são “comunistas” e “terroristas”.
Faz-nos recordar Goebbels – no seu texto fundamental “A Radicalização do Socialismo”, em que ele sublinha a necessidade de retratar o centro-esquerda como marxistas e socialistas porque, como Stanley assinala, “a classe média vê no marxismo não tanto a subversão da vontade nacional, mas sobretudo o ladrão da sua propriedade”.
Isto está no centro da estratégia de Bolsonaro de denegrir o Partido dos Trabalhadores – e a esquerda em geral. A estratégia é encharcada em notícias falsas – mais uma vez refletindo o que Stanley escreve sobre a história dos EUA: “Todo o conceito de império baseia-se em notícias falsas. Toda a colonização baseia-se em notícias falsas”.
A direita contra o populismo? Como já escrevi num artigo anterior , a esquerda no Ocidente é como um encadeado encadeado por faróis, quando se trata de combater o populismo de direita.
Espíritos atentos, de Slavoj Zizek a Chantal Mouffe estão a tentar conceptualizar uma alternativa – sem conseguir arranjar o neologismo definitivo. Populismo de esquerda? Popularismo? Idealmente, devia ser “socialismo democrático” – mas ninguém, num ambiente pós-ideologia, pós-verdade, se atreveria a usar a palavra temida.
A ascensão do populismo de direita é uma consequência direta do aparecimento de uma profunda crise de representação política em todo o Ocidente; a política de identidade erigida como um novo mantra; e o esmagador poder das redes sociais, que permitem – na definição inigualável de Umberto Eco – a ascensão do “idiota da aldeia à condição de oráculo”.
Como já vimos, o lema central do populismo de direita na Europa é contra a imigração – uma variante mal disfarçada do ódio contra o Outro. No Brasil, o tema principal, realçado por Bolsonaro, é a insegurança urbana. Pode ser o Rodrigo Duterte brasileiro – ou Harry Duterte: “Atreve-te, idiota”.
Ele intitula-se o Legítimo Defensor contra uma elite corrupta (apesar de fazer parte dessa elite); e o seu ódio de todas as coisas politicamente corretas, do feminismo, da homossexualidade, do multiculturalismo – tudo isso são crimes imperdoáveis contra os “valores da família”. Um historiador brasileiro afirma que a única forma de nos opormos é “traduzir” para cada setor da sociedade brasileira como a posição de Bolsonaro os afeta: “o armamento alargado, a discriminação, os empregos, (e) os impostos”. E isso tem que ser feito em menos de três semanas.
Penso que o melhor livro que explica o fracasso da esquerda por toda a parte para lidar com esta situação tóxica é o livro de Jean-Claude Michea, Le loup dans la Bergerie (O lobo no curral) publicado em França há uns dias.
Michea mostra, concisamente, como as profundas contradições do liberalismo, desde o século XVIII – políticas, económicas e culturais – o levaram a VIRAR-SE CONTRA SI MESMO e a separar-se do espírito inicial de tolerância (Adam Smith, David Hume, Montesquieu). É por isso que estamos mergulhados profundamente no capitalismo pós-democrático.
Chamadas eufemisticamente “a comunidade internacional” pelos “media” dominantes ocidentais, as elites, que têm sido confrontadas desde 2008 com “as dificuldades crescentes que o processo da acumulação globalizada do capital enfrenta”, parecem agora dispostas a fazer tudo para manter os seus privilégios.
Michea tem razão quando diz que o mais perigoso inimigo da civilização – e até da vida na Terra – é a dinâmica cega da acumulação infindável do capital. Sabemos para onde este bravo Mundo Novo neoliberal nos está a levar.
O único obstáculo é um movimento autónomo, popular “que não esteja submetido à hegemonia ideológica e cultural de movimentos ‘progressistas’ que, durante mais de 30 anos, defendem apenas os interesses culturais das novas classes médias em todo o mundo”, diz Michea.
Por agora, um tal movimento mantém-se no reino da utopia. O que resta é tentar remediar uma distopia iminente – como o apoio a uma verdadeira Frente Democrática Progressista – para bloquear um Brasil Bolsonaro.
Um dos pontos altos da minha estadia em Itália foi uma reunião com Rolf Petri, professor de História Contemporânea na Universidade Ca’ Foscari, em Veneza, e autor do livro absolutamente essencial A Short History of Western Ideology: A Critical Account .
Passando da religião, da etnia e do colonialismo, para o projeto iluminista de “civilização”, Petri tece uma tapeçaria devastadora de como “a geografia imaginada de um ‘continente’ que nem sequer era um continente, oferecia uma plataforma para a afirmação da superioridade europeia e da missão civilizadora da Europa”.
Durante um longo jantar numa pequena trattoria veneziana longe das hordas galopantes de selfies, Petrie observou como Salvini – um pequeno empresário da classe média – descobriu astuciosamente como canalizar uma profunda saudade inconsciente de uma harmoniosa Europa mítica que nunca voltará, tal como o pequeno-burguês Bolsonaro evoca um regresso mítico ao “milagre brasileiro” durante a ditadura militar de 1964-1985.
Todos os seres conscientes sabem que os EUA mergulharam numa desigualdade extrema “supervisionada” por uma plutocracia implacável. Os trabalhadores norte-americanos continuarão a ser lixados, tal como os trabalhadores franceses com o “liberal” Macron. O mesmo acontecerá aos trabalhadores brasileiros com Bolsonaro. Como dizia Yeats, que besta imunda, nesta hora tão negra, se lança à liberdade de nascer?
Grupo protesta contra a homenagem fascista do deputado ao torturador Coronel Brilhante Ustra, durante votação da admissibilidade do impeachment na Câmara dos Deputados, no último domingo. Ustra foi chefe do DOI-CODI e responsável pela morte de mais de 50 pessoas, além de inúmeras torturas, inclusive da presidente Dilma Rousseff.
A estratégia do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, de separar por estados os votos pela admissibilidade do processo de impeachment da Presidenta Dilma Roussef, começando pelo Sul onde teria mais votos a favor, e depois por ordem alfabética, colocou na sequência as falas de três parlamentares do Rio de Janeiro, todos de posições firmes e ideológicas: Jair Bolsonaro, Jandira Feghali e Jean Wyllys. E a reação do público na Paulista que assistia à votação nos telões e palco montados pela Federação das Indústrias de São Paulo são um claro indicativo do que os golpistas preparam para aqueles que não comungam do seu ideário. Tudo sob aplausos e vaias de milhares de brasileiros enfeitiçados por retóricas vazias de hipócritas que, sob os holofotes da imprensa venal, dedicavam seus votos a deus e à família.
O palco em frente à Fiesp, entidade cujo presidente em 1964 pagou US$ 1 milhão ao ex-ministro da guerra e comandante do 2º Exército Amaury Kruel para trair o
Presidente da República João Goulart e consolidar o golpe (camara.sp.gov.br/blog/fiesp-pagou-us-1-milhao-para-ajudar-golpe-de-64-diz-coronel/), foi montado do lado direito do grande pato amarelo “contra os impostos” cujo design foi plagiado do artista holandês Florentijn Hofman (bbc.com/portuguese/noticias/2016/03/160329_pato_fiesp_fs). Entre pato e palco, um varal trazia cópias de capas e recortes de artigos e “reportagens” de veículos como Veja, Estadão e outros acusando o governo e, principalmente, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de corrupção.
Bem no meio a montagem com a imagem de Lula vestindo uma camisa listrada de “presidiário”que serviria de inspiração para o boneco inflável cuja presença é indispensável nos protestos contra o governo. Uma bem traçada estratégica midiática-imagética cujo objetivo final, mais do que derrubar o atual governo, é eliminar o ex-presidente da disputa política.
Em cima do palco, um animador de público contratado para comentar os votos, puxar gritos de guerra, vaias e aplausos vibra quando Bolsonaro diz que seus adversários “perderam em 64, perderam agora em 2016”e quando dedica seu voto à “memória do Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Roussef”, fazendo referências a um dos pouquíssimos assassinos e torturadores do regime militar reconhecido como criminoso condenado pela justiça brasileira a indenizar a família de uma das vítimas (http://brasil.elpais.com/brasil/2015/10/15/politica/1444927700_138001.html). Em seguida puxa um “quem não pula é petista, quem não pula é petista”.
No meio da fala da deputada pelo PCdoB Jandira Feghali, o animador “informa” a plateia que ela é “a socialista que tem loja que vende a Coca Cola a R$ 9,00” pouco antes de puxar uma vaia e em seguida orquestrar um novo coro para o público: “Não é mole, não. É socialista de iPhone e de carrão”. O pior, entretanto, ainda estava por vir. Ao ouvir o nome do próximo deputado a votar, o animador dá um gritinho: “ ahhh Jean Wyyyylyyyyyyyyyysssssss”. E pede “a maior vaia que essa avenida Paulista já deu! Cadê, cadê, cadê? Vaia, vaia, vaia! Vaia nele, vaia nele, vaia nele! Não deixa ele falar, não!! Não deixa ele falar, UUUUUUUUUUUU!!! A maior vaia da Paulista, agora, agora agora!!!”. E a única coisa que o povo em frente à Fiesp conseguiria ouvir, se tivesse interesse, seria a última frase do deputado pelo Psol: “Durmam com essa, canalhas!!”.
Bolsonaro está certo em uma coisa. As forças democráticas perderam em 1964. Muitas vozes, como a de Jean Wyllys hoje, foram silenciadas durante a ditadura. Não por vaias, mas por torturadores e assassinos como Ustra, em associação com empresários da Fiesp como Henning Boilesen, então presidente da Ultragaz, que ajudou a financiar a Operação Bandeirantes (Oban) que serviria como modelo para as ações dos DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações-Coordenação de Defesa Interna) e famoso por fazer questão de assistir pessoalmente as sessões de tortura (https://www.youtube.com/watch?v=U4O0_BqNZKQ ) de dissidentes comunistas e socialistas como são hoje Feghali e Wyllys.
Mas 2016 não é 1964. A vitória ainda não está dada. Já há luta, resistência e organização que só aconteceriam na ditadura a partir de 1968. Além disso, ainda que percamos a guerra no final, vale sempre a pena lembrar a famosa citação do antropólogo Darcy Ribeiro que, aliás, foi ministro da Educação e Chefe da Casa Civil de João Goulart até o golpe de 31 de março:
“Fracassei em tudo o que tentei na vida.
Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui.
Tentei salvar os índios, não consegui.
Tentei fazer uma universidade séria e fracassei.
Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei.