Quem imaginaria dez anos atrás que hoje estaríamos novamente falando do significado de trabalho escravo ou pensando em futuras alforrias? O trabalho escravo que aproximou índios e pretos, os negócios no campo e toda a costura política de favores e benefícios políticos na configuração da turma liberal .
O professor Alfredo Bosi, certa vez, em texto no final da década de 80 sobre os meandros da escravidão no Brasil, aventou como se estabeleceu a palavra liberal em nosso meio pela história:
Uma análise semântico-histórica aponta para quatro significados do termo, os quais vêm isolados ou variamente combinados:
1) Liberal, para a nossa classe dominante até os meados do século XIX, pôde significar conservador das liberdades,conquistadas em 1808, de produzir, vender e comprar.
2) Liberal pôde, então, significar conservador da liberdade, alcançada em 1822, de representar-se politicamente;ou, em outros termos, ter o direito de eleger e de ser eleito na categoria de cidadão qualificado.
3) Liberal pôde, então, significar conservador da liberdade (recebida como instituto colonial e relançada pela expansão agrícola) de submeter o trabalhador escravo mediante coação jurídica.
4) Liberal pôde, enfim, significar capaz de adquirir novas terras em regime de livre concorrência, alterando assim o estatuto fundiário da Colônia no espírito capitalista da Lei de Terras de 1850. ,
…Analisando a conduta autodefensiva dos liberais, comentava Saint-Hilaire no ano em que se fazia a Independência:
“Mas são estes homens que, no Brasil, foram os cabeças da Revolução; não cuidavam senão em diminuir o poder do Rei, aumentando o próprio. Não pensavam, de modo algum, nas classes inferiores”
Agora, na segunda década do XXI, o Brasil foi notícia em várias manchetes e advertido em várias instâncias internacionais durante a semana passada. Os elos das correntes que nos prendem não apontam para o futuro, mas no ferro querem nos marcar. Entre velhos grafismos estampados em nossas cavernas e o DNA colonialista de nossa economia, onde o Agro dá as cartas nas transações de governo e o comando restringe todos investimentos em ciência e cultura necessários, Temer e os seus parceiros de latifúndios querem redefinir a palavra escravidão e trabalho, educação e saúde.
Não iremos em direção ao espaço sideral ou andaremos em carros voadores, elétricos, tudo nos direciona ao passado agora. Para o país querem as liteiras de volta, enquanto a soja germina no campo. Venderão praias, parques e reservas, ensaiam mazelas ao futuro. Irão ensinar o índio a pescar e plantar. No quilombo farão grandes condomínios. O aquífero será todo tragado pois a sede de poder dessa gente não tem sertão.
O jornalismo não irá calar-se, segue denunciando e unindo, queremos o futuro, os humanos, a democracia e um planeta Terra para viver.
Um grupo de 150 trabalhadores (jornalistas, gráficos e funcionários da administração) demitidos do jornal Hoje em Dia há mais de um ano ocupou na manhã de hoje (1/06) o antigo prédio do jornal, que pertence ao grupo JBS. Os trabalhadores não receberam os seus direitos trabalhistas e nem o salário referente ao último mês que trabalharam.
O prédio ocupado foi citado na delação do empresário Joesley Batista, da JBS. Segundo o seu depoimento, o imóvel foi comprado como forma de pagamento de propina para o senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG).
A negociação entre o político, o empresário e os antigos e atuais donos do jornal lesou os trabalhadores, que ficaram sem emprego, sem as indenizações trabalhistas e lutam na Justiça para receberem o que lhes é de direito.
Os profissionais elencaram 15 motivos que eles acreditam serem dignos de atenção, como o apoio do jornal Hoje em Dia a Aécio Neves durante a sua tentativa de chegar a presidência do país, com publicações que iam contra qualquer pesquisa de voto publicada, favorecendo sempre o senador afastado.
Os trabalhadores afirmam que pagam pela corrupção endêmica no país. “Fomos vítimas de uma negociata política, que envolve figurões da República, e pagamos a conta por projetos de poder, falta de ética e escrúpulos”
Nos meus tempos de ZN, um dia conheci o Centro Cultural São Paulo, na Vergueiro. Achei o máximo. Aí, conheci o MASP. Foi a glória. Sentei na frente de um quadro e redesenhei numa folha de papel. Soube pela minha professora que era de um tal de Van Gogh. Conheci a arte. Atravessei a ponte e cheguei no centro. Conheci a cidade. Vivenciei a noite e fui trabalhar num bar. Conheci Itamar Assumpção, Chico Cesar, Gigante Brasil, Edu Rocha, os irmãos Nardo. Conheci Paulo Freire, Julio Dojcsar, Silvana Marcondes, Jards Macalé, Jorge Mautner. Um mundo novo. Arte verdadeira, engajamento político, pensamento coletivo. Conheci e criamos a casadalapa. Conheci o movimento estudantil. Me envolvi. Conheci Orlando Silva, a família Petta. Passei a acreditar que podemos mais. Que somos atores dessa grande tragédia e comédia humana. Que estamos no volante de nossos destinos. Conheci Erundina num restaurante da Vila Mariana, Marina num aeroporto em minha primeira viagem para o exterior. Conheci Haddad na CasaRodante e Dilma em sua campanha de reeleição. Faltava um cabra.
Ontem foi o dia que conheci o Lula. Já tinha visto ele de longe na Paulista logo depois da aclamação do primeiro presidente operário desse País. Ouvi seu discurso atentamente. Mas enxergava um ponto perdido em meio a fumaça, serpentina, confete e carnaval. Ontem, não. Fiquei próximo ao palco da quadra do Sindicato dos Bancários durante todos os discursos. Estava exausto. O dia foi cansativo a valer e meu joelho atropelado me dizia que estava precisando de descanso. Nessa hora, ouvi que ele viria. Resolvi ficar ali, no meio da multidão e do calor que sempre me enche de suor e sede.
Chegou a hora. Como numa plateia dos Beatles, a geral explodiu em êxtase e desespero. Gritaria, empurra-empurra, pisões em dedos mindinhos, celulares nas cabeças alheias, lágrimas e barulho. Muito barulho. O dono da bola pediu silêncio como uma simples anedota de um domingo de festa familiar. E o silêncio se fez.
Foto: Mídia NINJA
Olhei pra ele, pro cara, pro homem, pro chefe. Mas vi um velhinho, baixinho, barriguinha saliente, a dor estampada no seu rosto, o cansaço visível. Um senhor frágil, às portas de um desmaio ou de um tchau de desistência. Começou a falar. A voz rouca e falha me deixou mais preocupado ainda. Buda meu, toda aquela força que já vi pelos monitores que passaram pela minha vida, discursos inflamados, a minha dorsal em completo frisson, onde estaria? Onde estaria todo o poder do mentor de uma mudança que vi com meus próprios olhos? O cara que transformou um País? Onde estaria?
Então, o cabra começou a falar. A voz rouca e frágil foi se repetindo como um mantra. Uma reza. Oração. E todos com seus espíritos. Falou sobre indignação e respeito. — É verdade…, comentou baixinho alguém por perto. Lembrou da sua caminhada, da campanha difamatória da TV Globo na disputa com Collor. Lembrou do jogo de esconde-esconde do FHC. E veio. Água mole em pedra dura…
A voz foi ganhando força ou eu mesmo deixei que a força daquela voz entrasse em meus ouvidos. E falou das pessoas do andar de baixo, dos degraus conquistados. Negros, índios, domésticas, a periferia. — O Nordeste, Lula!, gritou uma senhora ao meu lado. Eu mesmo pude conhecer nos rincões do Ceará, da Bahia, de Goiás e do Amazonas um brasileiro de peito aberto, certo de sua história, sua cultura, sua importância. As conquistas. Um governo pra todos. Lembrou que trabalhador teve aumento todo ano, aposentado, todo mundo. Também ganhou o banqueiro, ganhou o empresário. Ah, Lula, banqueiro e empresário? Mas se o governo era pra ser de todos, todos tinham que ser, ou não?
Foto: Mídia NINJA
E ele falando, falando, pareceu mais magro, mais alto. Seus cabelos completamente brancos, em vez de velhice, agora me pareciam brancos de sabedoria e experiência e sua voz cada vez mais forte, mais contundente. Falou do pobre ocupando shopping, comendo hamburger, frequentando teatro, cinema. –Aí, mexeu com nós! Outro respondeu. Falou do pobre chegando no Parque do Ibirapuera, andando de avião. — Avião, avião! Surgiu num coro. Meus braços já estavam cansados, levantados para fotografar no celular uma imagem potente. Mas ele continuou falando. Falou que pobre agora podia escolher onde ir, onde estar. Falou que o pobre não era um problema, que pobre virou a solução! Nessa hora, não segurei. Lula, seu fela! Me fez chorar, porra! Eu sabia. Era aquela voz, aquela oração, aquele mantra.
Fotos: Sato do Brasil para Jornalistas Livres
E quanto mais eu ficava cansado, mais forte o cabra ficava. E sua voz, que antes me parecia frágil, agora gritava impávida, sobre histórias incríveis. Falou alto do desgosto da elite quando o Estado começou a emprestar cinquenta reais pra pobre comprar arroz, feijão, carne, e falou do desgosto da elite aumentando vendo esses empréstimos gerando emprego, arrecadação e investimento. Gritou sobre um país de futebol e carnaval que elegeu um torneiro mecânico e se tornou independente dos cofres internacionais, de um governo que criou 22 milhões de empregos, com aumento real de salário, de um governo que construiu mais universidades que qualquer outro. Gritou sobre a vontade alheia do seu fracasso. Gritou sobre suas companhias na jornada, os sem terra, os sindicatos, a CUT, os catadores de papel, as mulheres. — Não chora, não! Alguém pede. Mas ele chorou. Humanos choram também. Assim mesmo, continuou. Berrou sobre um Palácio e seus moradores diários. E que ele era o outro, e o outro era ele.
Foto: Mídia NINJA
Eu já exaurido, agora sua voz chegava mansa e tranquila. Falou baixinho de sua ignorância, seu desconhecimento, mas falou também de seu poder de escutar o que se precisava ouvir. Falou de quem não tinha luz e agora tem, de quem não tinha onde vender e agora tem, falou de quem não tinha crédito e agora tem. Cochichou sobre a primeira mulher presidenta do País. E mais, sobre o preconceito contra as mulheres, uma sociedade machista e a luta para combater tudo isso. E soprou sobre o absurdo de um retirante que chegou à Presidência da República e foi considerado “o cara”.
Quando tudo chegou ao fim, olhei de novo para o palco e vi um gigante. Um gigante ferido pela batalha em curso, mas com uma guerra a vencer. Um guerreiro criado no pau a pique e que junto a seu exército de fortes, ainda tem muito sangue a jorrar um País governado por todos.
2015 foi o ano da criação dos Jornalistas Livres. Ano de luta e resistência, por certo. Mas também ano de reencontros, da descoberta de novos parceiros, grandes amigos, de lindos amores e excitantes paixões. Ano de luta pela Democracia, contra o racismo, pelos direitos dos trabalhadores, das mulheres, da juventude. Ano de começo da retomada da escola pública e gratuita. Ano de atualização das utopias e sonhos – porque sem isso a vida fica áspera demais. Neste momento de festa, Jornalistas Livres querem agradecer a todos os guerreiros e às entidades que, com seu exemplo de vida-obra, nos inspiraram a prosseguir. São as Carmens, os Adrianos, as Jomarinas, os Raimundos, os Chicos, os Heudes, as Laurinhas, as Dandaras, as Suelis, as Isabéis, os Beneditos, os Andersons, as Vilmas, os Guilhermes e tantos mais do solo do Brasil. A esperança está com vocês! E nós queremos estar juntos! Abaixo, algumas lembranças de momentos da luta dos Jornalistas Livres…
Foto: Vinicius Carvalho
Por Maria Carolina Trevisan
A rede Jornalistas Livres não nasceu de um plano. Surgiu do desejo de narrar as histórias desde outro ponto de vista: o olhar dos movimentos sociais, a defesa dos direitos humanos e sociais, o jornalismo democrático, a luta por um país mais justo. Não cabem o ódio e a intolerância no trabalho que fazemos. Jornalistas Livres germinou, cresceu e ganhou relevância porque encontrou um público sedento por um novo noticiário, que se mantém fiel e crescendo. Tive o privilégio de participar de reportagens sensíveis — e fortes, ao mesmo tempo — que trataram de temas como a redução da maioridade penal, o racismo, a violência contra jovens negros, a resistência das mulheres negras, a busca por moradia digna, o movimento dos estudantes secundaristas, a escalada do ódio e da intolerância e a resposta de quem não abre mão da democracia. Foram matérias que marcaram essas coberturas e, muitas vezes, acabaram por pautar a mídia corporativa. Por acreditar nos princípios do jornalismo como peça fundamental no xadrez que garante um Brasil livre é que seguimos dedicados a esse trabalho. Tem sido uma honra.
Moradores de Bento Rodrigues, subdistrito de Mariana, desesperam-se ao ver suas casas soterradas pela lama da Samarco. Foto: Gustavo Ferreira
Por Laura Capriglione
“E é um crime ainda terem se apoiado na imprensa imunda, terem se deixado defender por toda a canalha de Brasília, de modo que é essa canalha que triunfa insolentemente, diante da derrota do direito e da simples probidade. É um crime terem acusado de perturbar o Brasil aqueles que o querem generoso, na vanguarda das nações livres e justas… É um crime confundir a opinião pública, utilizar para uma sentença fatal essa opinião pública que foi corrompida até o delírio. É um crime envenenar os pequenos e humildes, exasperar as paixões de reação e de intolerância… É um crime explorar o patriotismo para as obras do ódio.”
O texto é de Émile Zola. Está no artigo “Eu Acuso!”, publicado no jornal “L’Aurore” do dia 13 de janeiro de 1898. Apenas troquei Paris (como estava no original) por Brasília; e a França pelo Brasil. Estranhamente atual neste 2015, não é? Pois os Jornalistas Livres nasceram inspirados nos ideais de uma outra imprensa, aquela mesma de Zola, que ousou unir a informação de qualidade à defesa apaixonada da democracia, da liberdade e dos direitos. Foi um remédio dos mais eficazes contra o cinismo e a acomodação. Garanto que nenhum Jornalista Livre sofreu de tédio neste ano. Que venha 2016!
Foto: Sérgio Silva
Por Larissa Gould
2015: o ano que não será esquecido
Daqui a alguns anos, quando os professores de história e geografia entrarem em suas salas e encontrarem adolescentes secundaristas, irão narrar lutas históricas dos abolicionistas, contarão da bravura de Zumbi, e dos valorosos militantes do período da ditadura; contarão da conquista da democracia, explicarão como um metalúrgico virou presidente e uma guerrilheira a primeira presidenta do Brasil.
Eles irão falar também das jornadas de junho de 2013, quando milhões tomaram as ruas e de 2015.
Muita coisa terá mudado. Espero que o sistema de ensino seja uma delas. Espero que o jornalismo seja uma delas.
2015: um ano que não falou oi, nem tchau.
Um ano que começou com a posse da presidenta Dilma Rousseff em Brasília, no dia 1º de janeiro. Que começou com muita esperança, para todos nós. Eu estava lá.
Um ano marcado pelo avanço conservador, pela ameaça constante de retrocesso. O ano no qual barramos o golpe.
Nos bares, nós já não tão jovens, lembraremos de um 2015 marcado por mobilizações. O povo nas ruas, às vezes diariamente, para defender os direitos populares conquistados a duras penas.
Lembraremos de um janeiro ao lado da juventude, nas ruas contra o aumento do transporte. Um fevereiro em que os sem teto tomaram as ruas em protesto pela falta de água, fruto da má gestão do governo tucano.
Falaremos de março, e quem sabe, falaremos de um grupo chamadoJornalistas Livres. Não sei se ele ainda existirá, se terá mudado o nome, o formato, as pessoas. Mas eu poderei contar com orgulho que estive lá, naquele 12 de março de 2015, quando algo em torno de 30 comunicadores se reuniram e decidiram montar uma rede de comunicação colaborativa.
Poderei contar então uma outra história, uma outra narrativa do Brasil. Uma diferente dos grandes veículos corporativos.
Contarei como a juventude protagonizou a luta contra a redução da maioridade penal. Contarei da greve dos 92 dias dos professores da rede estadual de São Paulo em defesa da educação. Lembraremos de um abril vermelho, quando a capital paulista acordou ocupada pelos movimentos de moradia. Das mobilizações dos indígenas em defesa do pouco que ainda possuem. Da organização dos trabalhadores contra o ajuste fiscal e a terceirização. Falarei dos petroleiros e da defesa da soberania nacional da principal empresa do país, a Petrobras. Lembrarei das mulheres, que durante todo ano tomaram redes e ruas contra o machismo. Poderei falar da luta dos estudantes secundaristas, contra a reorganização tucana do ensino.
Da reedição da marcha dos 100 mil em defesa da democracia. Poderemos até rir de um homenzinho que se achava rei, um tal de Cunha.
Daqui a alguns anos, muita coisa terá mudado. Espero que o sistema de ensino seja uma delas, fruto também da luta de professores e estudantes em 2015. Espero que o jornalismo seja uma delas, com uma pequena ajuda de uma rede chamada Jornalistas Livres.
Jornalistas Livres surgiram em resposta ao avanço conservador e como uma proposta de um novo jornalismo possível. 2015 será um ano marcante para todos, para mim será o ano que eu me tornei uma Jornalista Livre.
Foto: Ennio Brauns
Por Léo Moreira Sá
Tornei-me Jornalista Livre porque acredito que só uma mídia alternativa pode fazer o enfrentamento ao retrocesso democrático que se tenta impor ao Brasil, apoiado pela grande mídia dominada pelas máfias de direita.
Tornei-me Jornalista Livre para livremente poder expressar minha indignação com as injustiças sociais e meu total apoio à defesa dos Direitos Humanos.
Tornei-me Jornalista Livre para denunciar toda forma de violência baseada nos discursos de ódio, e também para poder trazer as narrativas e denúncias da comunidade LGBT , em especial da comunidade de travestis, mulheres transexuais e homens trans à qual pertenço.
Tornei-me Jornalista Livre para ser LIVRE !!! Destaco, dentre as matéria que assinei, a denúncia do espancamento e exposição da travesti Verônica Bolina por policiais militares nas dependências de uma delegacia do centro de SP, e a sórdida tentativa do governo Alckmin de isentar os policiais de seus crimes.
Nós, os Jornalistas Livres, estivemos entre os primeiros que denunciaram essa violência, e cobrimos outros crimes, como o assassinato de Laura Vermont. Mesmo com as represálias e os assédios morais por parte de pessoas poderosas ligadas ao governo de SP, continuarei nas denúncias de todos os crimes cometidos contra nossa comunidade no Brasil.
Infelizmente, este país a quem muitos julgam gentil e cordial, é o país que mais mata travestis e pessoas transexuais do mundo. Mas eu acredito que possamos mudar essa realidade se conseguirmos formar uma grande rede de todas as populações socialmente vulneráveis. Porque só a construção de uma luta coletiva pode desconstruir o estado opressor em que vivemos.
Considerado “herói” por manifestante de direita, Carlos Alberto Augusto, o “Vovô Metralha”, foi um dos executores do Massacre da Chácara São Bento, ocorrido em 1973 em Pernambuco, quando seis militantes da Vanguarda Popular Revolucionária foram executados por policiais comandados pelo delegado Fleury. Foto: Jornalistas Livres
Por Adriano Diogo
Foi um ano para os bravos. Para os de coração forte e alma guerreira. Logo para o dia 15 de março, um domingo, foi marcada uma manifestação contra a presidenta Dilma Rousseff, que acabara de ser reeleita e mal iniciara o seu segundo mandato. Rapidamente ficou claro o sentido dessa movimentação: uma tentativa de golpe contra a vontade popular, contra a nossa democracia.
Assim, sindicatos e militantes corajosos, apoiadores do governo ou não, marcaram para o dia 13 uma grande marcha em defesa dos resultados das eleições. A postura da mídia tradicional diante dos dois atos era descaradamente clara: o ato do dia 15 de março tinha de ser um sucesso, o do dia 13 de março tinha de ser escondido.
Aos poucos, quem achava que aquilo tudo era muito estranho foi se juntando para entender o que estava acontecendo. Éramos uns poucos jornalistas e militantes. Eu ainda estava zonzo com perda da minha a eleição para Deputado Federal e também com a força que os partidos de direita haviam conquistado no Congresso Nacional, onde o famigerado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) já ocupava a cadeira mais importante.
Para o dia 12 de março, véspera da manifestação da esquerda, a jornalista Laura Capriglione organizou uma grande reunião, juntando jovens e não tão jovens jornalistas e militantes que já previam uma cobertura tendenciosamente golpista nos dias seguintes. Os convidados foram convidando mais e mais jornalistas independentes, e a sala, numa casa charmosa no Bixiga, lotou.
De cara, foi apresentada a proposta: realizar, com a força de uma série de coletivos de jornalistas e ativistas e de sites independentes uma cobertura livre da pressão da grande mídia. Uma cobertura que se aproveitasse da velocidade e da capilaridade das coberturas ao vivo de junho de 2013, da capacidade de análise de sites já estabelecidos, da experiência de jornalistas que, com passado na grande mídia, podiam organizar a potência que vinha de jovens estudantes, que sabem tudo de mídia digital e de compartilhamentos em redes sociais.
Houve uma rápida discussão sobre o nome que a rede teria. Alguém falou em Jornalistas Pela Democracia, mas era um nome muito grande. As sugestões foram pululando, até que um nome se estabeleceu: Jornalistas Livres. Uma síntese do que deveria ser a cobertura, livre e jornalística. Parece redundante, mas é justamente o que estava faltando na grande mídia, em que o cerceamento ao trabalho dos jornalistas independentes é cada vez maior.
Começou então a organização das coberturas. Grupos se dividiram e se integraram: reportar, dividir tarefas e estabelecer meios de comunicação com os outros grupos, difundir uma narrativa independente. Era preciso defender a verdade e os direitos humanos, a vontade do povo, a democracia. Só jornalistas realmente livres poderiam fazer uma cobertura real dos acontecimentos, sem preconceitos, sem ideias reacionárias. Uma outra narrativa.
A cobertura do dia 13 foi excelente. Evitou que a mídia escondesse a presença de pelo menos 50 mil pessoas nas ruas. Mas ela foi apenas um aquecimento.
Dia 15 de março, os Jornalistas Livres simplesmente arrasaram: mostraram a fragilidade dos argumentos contra Dilma, as ligações perigosas dos jovens golpistas com os criminosos da ditadura militar — um deles, Carlinhos Metralha, apareceu na Paulista usando um chapeuzinho ridículo dos paulistas de 1932 e gravata borboleta, a mesma indumentária com que se apresentou em dezembro de 2014 no lançamento do livro “A casa da vovó”, de Marcelo Godoy, na Assembleia Legislativa, durante uma sessão que eu presidia da Comissão Estadual da Verdade Rubens Paiva.
Eduardo Nunomura fez uma foto emblemática: um casal que foi protestar com a babá, que cuidava do filho, expondo o caráter classista e patriarcal do protesto da direita. Além disso, falou com diversos manifestantes, e demonstrou todo o seu incômodo com a desenfreada vontade de todos os entrevistados de enganar o jornalista.
Mas esse foi só um caso. Os JLs, dezenas nas ruas naquele dia, deram a tônica e frearam o golpe contra a democracia no dia 15. De lá para cá, o movimento não parou. Tivemos reuniões em quase todas as semanas, discutindo e organizando coberturas de movimentos populares e estudantis, defesa de direitos humanos — e, claro, protestos e manifestações da direita antipopular e da esquerda democrática.
Para mim também foi uma libertação participar dos encontros e reuniões dos Jornalistas Livres. Aos poucos, e ao longo do ano, eu, que sou geólogo de formação, também me senti no direito de me chamar de Jornalista Livre. Pude contribuir com minha experiência e minha luta contra a ditadura militar, escrevi textos, discuti organização, o papel da mídia corporativa, o papel dessa imprensa alternativa que se tornou tão importante nos dias de hoje quanto foi nos anos de chumbo. Fui ficando animado e lutando novamente.
Nesse ano difícil, os Jornalistas Livres e a mídia independente cumpriram um papel essencial em defesa da nossa democracia.
Foto: Ana Carolina Barros
Por Ana Carolina Barros
No começo de 2015 fui para Angola pela segunda vez. Convivi muito proximamente com as comunidades periféricas, pessoas que lutam diariamente para sobreviver aos extremos da pobreza e da opressão. Décadas de guerra pela independência seguida pelas guerras civis foram fatais para o povo angolano: devastação e sofrimento por todos os cantos do país. Mesmo assim, tive a oportunidade de conhecer pessoas que encontraram formas de transmitir esperança, de acreditar que uma transformação é possível e de lutar por um futuro menos desigual, mais democrático e livre. Esses olhos cheios de luz e determinação me marcaram profundamente.
Retornei ao Brasil convicta de que minha militância política precisava ser ainda mais incidente, que embora em fase turbulenta da minha vida acadêmica, eu gozava de uma situação privilegiada e que podia, desde esta posição, fazer alguma diferença. Aos poucos fui percebendo que a distância entre Angola e Brasil é grande apenas no mapa. Me envolvi, por ter aprendido com os angolanos a utopia, de uma forma irreversível nos movimentos populares (Levante Popular da Juventude e Marcha Mundial das Mulheres).
Sendo psicóloga (psicanalista, comunista e feminista) meu consultório também se transformou em símbolo de militância e resistência, assim como o trabalho com crianças em clínica institucional e o tema do doutorado (dificuldades no processo de alfabetização de crianças angolanas) se tornaram causas a serem defendidas. Me encontrei com os Jornalistas Livres neste processo, durante a IV Ação Internacional da Marcha Mundial das Mulheres, no Rio de Janeiro.
Fui convidada a escrever e não parei mais. Me tornei Jornalista Livre em 2015 porque acredito na relevância de defender a democracia e os direitos humanos. Porque acredito na transformação social e na revolução que pode acontecer dentro de cada ser humano. E porque tudo isso nunca foi e nem nunca será transmitido pela grande mídia no Brasil, enquanto vivermos sob um sistema onde o capital vale mais do que a liberdade.
Foto: Sato do Brasil
Por Sato do Brasil
Cena 1. O suor estava molhando meus olhos. Mas sabia que em um click, a porra toda ia cair. Não dava tempo pra enxugar, passar o braço, tirar o óculos. Não deu outra. O portão se abriu. A linha de frente cumpriu. Sem titubear, peguei a Tati, gritei pro Pedro e pro William e entramos.
Cena 2. Abrimos o tecido. Qual a frase? Decidido. A redução é roubada. Branco sobre retalhos. Tudo seco. Levantamos, subimos a escada, paramos no meio do viaduto. Cada um em um ponto, preparamos. Sinal dado, uma bandeira tremulando sobre o vale.
Cena 3. Levaram ela. Segui os caras, me juntei a uns 5, 6 fotógrafos. Viatura parada, porta aberta. Espaço pequeno. Dei a volta. Tava sozinho. Grudei na janela. Ela foi jogada pra dentro, olhou pra fora. Pedi um sinal. Ela abriu o peito. Luta.
A nossa vida é cheia de sonho e fúria. Nada menos que tudo. O copo sempre cheio. Oxigênio. Transborda.
Populações atingidas pela lama da Samarco, e que vivem ao longo do rio Doce. pedem socorro e água. Foto: Eviton Araújo
Por Egle Bartoli
Quando recebi o convite para participar da reunião dos Jornalistas Livresconfesso que não fiquei muito empolgada, afinal de contas, após anos trabalhando na mídia tradicional, conservadora e hierarquizada, não acreditava mais que fosse possível fazer um jornalismo de qualidade e comprometido com a realidade deste país. Mas como a curiosidade faz parte da minha natureza lá fui eu e para minha surpresa encontrei pessoas, das áreas mais diversas, empunhando a bandeira dos Direitos Humanos, dando voz aos movimentos sociais, condenado toda forma de preconceito e racismo, valores que defendo.
Jornalistas, fotógrafos, palhaços, atores e outros tantos profissionais que fazem jornalismo de rua, apuram os fatos, denunciam, que levantam bandeiras, sim levantam bandeiras porque a imparcialidade é para os falsos. Este grupo renovou em mim a esperança de que é possível fazer um jornalismo sincero, transformador e de qualidade. Hoje sou Jornalista Livrede carterinha e coração porque acredito que um mundo melhor é possível e os JL lutam neste sentido, em busca de transformações. Também sou porque, afinal de contas, caminhar junto é sempre melhor que caminhar sozinha.
Manifestantes exigem a punição dos culpados pela chacina de Osasco, que ocorreu em agosto de 2015. Foto: Adolfo Garroux.
Por Adolfo Garroux
Estava indo para a Paulista filmar mais uma manifestação daqueles que usam o brasão da CBF no peito e gritam contra a corrupção, daqueles que cantam o hino nacional e pedem a volta da ditadura militar quando trombei com um amigo de longa data, Alex Veja, que me convidou ali, no meio da Brigadeiro Luis Antônio para somar na cobertura através de um coletivo,Jornalistas Livres.
Topei sem saber do que se tratava, mas confiando no meu parceiro. Ao final da cobertura fomos para a base descarregar e entregar para edição o material da filmagem. Lá encontrei um grupo de cerca de 30 pessoas, entre jornalistas, artistas, fotógrafos, cineastas, ativistas. Sem saber estava entrando numa das experiências de comunicação mais interessantes e inovadoras de 2015.
Não sabia naquele momento quem eram os Jornalistas Livres, fui descobrir aos poucos, depois, participando das reuniões, mas o que soube desde o primeiro momento era de qual lado estavam. Do lado dos sem voz, da juventude negra, pobre e periférica, do lado dos que lutam por moradia digna, do lado dos que lutam contra a exploração sexual, o machismo e a homofobia, do lado dos que lutam por um Brasil mais justo e democrático.
Ser Jornalista Livre é lutar por tudo isso. 2015 foi um ano de luta contra o retrocesso na política e Jornalistas Livres tiveram um papel importante nessa batalha — sinto muito orgulho de ter participado disso.
E que venha 2016, a luta continua!
Foto: Hélio Carlos Mello
Por Hélio Carlos Mello
Era 2014 e o ano acabava, bem como água também anunciava seu fim. Sentíamos que nosso copo estaria vazio em 2015 e a sede ameaçava a todos. Alguns amigos me convidaram para conversarmos sobre a crise da água que se anunciava para 2015 e entendermos essa conta, a conta d’água. Fora do eixo tudo parecia ser mentira na grande imprensa, era necessário falar o que acontecia na Cantareira e em nossos mananciais. De repente o jornalismo independente aflorou, como chuva boa e pura, e muitos e muitos estavam indo para a rua, e a grande mídia não tornaria a verdade pública.
Estávamos consternados com o que víamos publicado na mídia e o que sabíamos que eram os fatos, e em grande número nos reunimos certa noite na rua Conselheiro Ramalho e deu-se o Jornalistas Livres contra o susto e a vergonha que se mostrava na rua, no levante da direita.
Ser livre. Ser cidadão. Ser jornalista. Fotógrafo, artista, ativista era necessário. Nossa preocupação, que era a água em pauta, agora inundava a avenida, a terra, os edifícios, os índios, os negros, os transexuais e tudo o mais. Tudo seria nossa pauta a partir de março, e o pequeno grupo agora se fazia uma grande família espalhada por todas as regiões, Jornalistas Livres, nosso manifesto, nossa atitude com a verdade e a democracia.
2015 foi um parto. O que era olho d’água, mina fresca, hoje é mar, oceanos. Não passarão navios negreiros ou lama vermelha em metais pesados em nossa dignidade de manancial. Sou Jornalista Livre porque sou brasileiro, e isso me basta. Avante.
Foto: Bruna Duarte
Por Bruna Duarte
Todos sabem que 2015 foi um ano meio maluco. Ainda assim, foi um ano em que muitas coisas incríveis aconteceram justamente pelas surpresas e situações inesperadas que ele trouxe, e entrar nos Jornalistas Livres para mim se encaixa no rol dessas surpresas agradáveis.
No decorrer do ano vinha acompanhando as diversas coberturas que traziam um ar diferente da grande mídia, um ar muito necessário e quando começou o movimento dos estudantes secundaristas em São Paulo comecei a acompanhar as ocupações e os atos ajudando como podia.
Nesse envolvimento conheci alguns Jornalistas Livres que, como dizem, “me sequestraram do ato pra reunião”. Decidi me tornar uma Jornalista Livre por enxergar esse trabalho como algo que possui uma importância fundamental em dar voz às pessoas e causas que geralmente não tem voz, e em dar uma outra perspectiva mais humana e realista às narrativas.
Obrigada pelo sequestro e obrigada por me permitir ajudar a cobrir esse movimento que provavelmente mudará os rumos de muita coisa.
Festa do Dia das Crianças no Edifício Cambridge, ocupação vitoriosa feita pelo MSTC (Movimento Sem Teto do Centro). Foto: Lina Marinelli
Por Lina Marinelli
Por que me tornei — e serei pra sempre — Jornalista Livre
Porque, no Brasil, quem ainda decide o que as pessoas vão ou não saber são os ricos. Porque quem ouve rádio, assiste TV, lê jornal, e sabe um pouco das coisas, vê que não está tudo ali e que o que interessa aos ricos é contado de forma alterada e mentirosa. Porque, na grande imprensa, os Movimentos Sociais são criminalizados e a propriedade privada é mais importante do que o ser humano. Porque a grande imprensa não respeita a Democracia. Porque, em 15 de Março, a TV Globo suspendeu toda a programação de um domingo para “mostrar a manifestação do povo indignado ”, e a gente viu que o representante do povo indignado que estava nas ruas era branco, e rico, e agressivo com os pobres, e ainda havia defensores da ditadura.
Porque não foi a Globo quem mostrou isso, foram os poucos jornalistas honestos de alguns veículos que estavam lá, foram alguns blogueiros, e foram os Jornalistas Livres — trabalhamos sem parar, sem hora para comer, sem hora para ir embora, até de madrugada, com a única missão de desmascarar a narrativa da Globo e do resto da imprensa de que ali estaria o “pacífico povo brasileiro”.
A grande imprensa continua sua narrativa mentirosa, continua atacando a Democracia. Nós seguimos trabalhando duro, ainda sem hora para comer, sem hora para dormir, lutando muito para chegar o mais perto possível da verdade. Sou Jornalista Livre por que é um dever.
Foto: Hélio Beltrânio
Por Kátia Passos
Um Jornalista Livre não se cria, não se forma. Já nasci Jornalista Livre.
Todos os dias acordo (quando durmo, rs), pensando na primeira pauta, no primeiro furo e como a narrativa vai entrar e transformar a vida das pessoas.
Ser dos JL’s não é tarefa fácil, é como se um sangue mais pulsante que o comum corresse em nossas veias. É a busca pelo justo, pela informação legítima, pelo desejo de ser real, democrático e sobretudo, de assumir o verdadeiro papel que todos os jornalistas deveriam ter.
Ser dos JL’s não é tarefa fácil, mas é sem dúvida, uma condição da qual muito me orgulho e que fará parte da minha vida para sempre.
Especialmente, neste ano, fiz muitas outras descobertas no Jornalismo. Destaco a cobertura das Escolas em Luta, em SP, pois foi quando, realmente eu tive que me dividir no papel importante de jornalista e mãe, tudo ao mesmo tempo, no mesmo local.
Não foi fácil presenciar a repressão da polícia militar contra os alunos na Ocupação da EE Maria José, onde minha filha estuda. Mas ali, realmente fui testada na racionalidade e na emoção.
Amanhecer na Escola João Kopke, ocupada pelo movimento contra a “reorganização” escolar. Foto: Henrique Cartaxo
Por Henrique Cartaxo
Percebia já há um tempo que a mídia é um dos terrenos fundamentais na luta pela nossa democracia. Quando os Jornalistas Livres começaram, fiquei admirando de longe: um megafone, um farol. Chegou em Outubro a oportunidade de ir a uma das reuniões abertas. Me apresentei como editor de vídeos e no outro dia já publiquei meu primeiro. Na semana seguinte mais um, na terceira foram dois, e aí começou a a luta das escolas públicas de São Paulo. Atos, passeatas, ocupações. Fiquei amigo de um monte de adolescentes que eu jamais conheceria na vida, virei videorrepórter, passei noite na ocupação, virei noite em casa editando vídeo… Já tinha militado como universitário e sempre achei importantes as lutas da educação, da moradia, da terra, mas acho que nunca na vida tinha me dedicado tanto a algo de uma realidade tão distante da minha própria.
A idéia de liberdade combina bem com o que temos feito e pra mim vai muito além da liberdade editorial. Combina com uma definição de Tarkovski, meu cineasta favorito, que eu sempre releio de vez em quando: “… liberdade significa aprender a exigir apenas de si mesmo, não da vida ou dos outros, e saber como doar: significa sacrifício em nome do amor.”
Pois pra mim, me tornar um Jornalista Livre foi o aprendizado de uma nova forma de amar.
E para 2016 estamos aqui, de coração.
Foto: Sato do Brasil
Por Jeniffer Mendonça
Dizem que o segundo ano de faculdade é decisivo para x estudante de Jornalismo: ou elx permanece no curso ou o abandona por não ter se identificado, de fato, com a escolha. Conheci os Jornalistas Livres em meio a essa crise interna, de universitária, e externa quanto ao mundo cujo levante conservador se tornava mais visível. Desde a primeira reunião, no dia 31 de julho, passei, aos poucos, a me identificar com o coletivo, sem saber ao certo o que me movia. Essa identificação se intensificou com o movimento dos secundaristas contra a “reorganização” do ensino, imposta pelo Governo Estadual paulista.
A primeira cobertura que fiz, me autodenominando Jornalista Livre, foi em outubro, período em que os atos das escolas começavam a ascender. De lá para cá, a relação com as pautas em prol da democracia e dos direitos humanos se tornou não apenas uma bandeira que passei a levantar, mas um sentido que pulsava, que transbordava. Foi nesse pouco (e difícil) tempo que descobri a responsabilidade social e a importância que a profissão e o coletivo carregam. Ser Jornalista Livre foi e está sendo um aprendizado infinito e agradeço eternamente a cada pessoa que contribuiu e contribui para o que sou e o que somos hoje — e seremos em 2016.
Ato da primavera das mulheres em São Paulo. Foto: Giovanna Consentini
Por Giovanna Consentini
15 de março de 2015, acordei sozinha em casa com o hino nacional tocando a cada cinco minutos. A Globo já tinha tornado a Av. Paulista “o grande palco da democracia” e a vizinhança toda compareceu. Tudo mais parecia uma bad trip de 2013 que bateu atrasada. O mundo lá fora simplesmente não fazia sentido.
Mas, como dizia Chico, amanhã há de ser outro dia, e foi. Nas primeiras
horas do dia minha timeline já havia sido invadida pelos compartilhamentos
de uma página, os Jornalistas Livres. Dentro do mar de dúvidas que vivi
desde que me formei de jornalismo, tive uma certeza: eu preciso conhecer
esse pessoal. Da primeira reunião de pauta até hoje, o ritmo acompanhou a
loucura de 2015.
Não foi nada fácil. Entre outras mil coisas, ocupamos com os movimentos de moradia, vimos a juventude barrar a redução da maioridade penal, defendemos a democracia acima de tudo, lutamos pela vida das mulheres, marchamos juntos das mulheres negras, choramos com a dor de Mariana, revelamos a guerra do Alckmin contra os estudantes, respiramos muito gás lacrimogêneo usado contra quem exigia seus direitos, ouvimos pedidos de volta ditadura em pleno aniversário do AI-5, até fomos presos por exercer nossa profissão, mas continuamos: Jornalistas Livres.
Na capital paranaense, a PM de Beto Richa (PSDB) massacra professores em luta no dia 29 de abril. Foto: Leandro Taques
Por Eduardo Nascimento
Me tornei Jornalista Livre porque depois de 6 anos na graduação na USP eu não tinha a menor vontade de exercer a profissão, pelo menos não nos lugares que via como possíveis. Nos JLs, desde a primeira reunião de pauta, senti que o grupo buscava o mesmo que eu queria no jornalismo: contar as histórias que não estão sendo ouvidas.
Não acredito em imparcialidade em nenhuma produção humana, seja artística, jornalística etc. A parcialidade do jornalismo mainstream é defender um projeto de sociedade elitista e antidemocrático; com o JL eu sei que minha parcialidade é dar voz aos grupos oprimidos, e a democracia só acontece de fato se todos tiverem voz.
Foto: Allan Ferreira
Por Allan Ferreira
Após alguns anos trabalhando como consultor e professor na área de inteligência de negócios, constatei que o discurso do meio corporativo, de modo geral, não corresponde às suas práticas. Cursar Ciências Sociais da Universidade de São Paulo era uma vontade antiga e só foi possível depois de deixar de lado o trabalho de consultor. Nas duas situações há o trato com dados, proposições, informações que serão utilizadas em algum grau em processos de tomada de decisão. Bem, e o que isso tem a ver com jornalismo?
O jornalismo é das faces ao mesmo tempo mais evidentes e mais naturalizadas do trato com a informação. Do mesmo modo que um dirigente pode tomar decisões catastróficas quando se baseia em informações distorcidas, um cientista pode também colocar a perder anos de trabalho quando se baseia em premissas erradas. O que ocorre quando boa parte da sociedade toma suas decisões diárias com base em jornalismo tendencioso que não hesita em distorcer fatos em favor de interesses inconfessáveis?
Os Jornalistas Livres representam uma renovação de forças que tem ajudado a apontar alguns dos principais problemas do jornalismo tradicional, que omite e distorce. Sou Jornalista Livre, pois acredito que é possível transformar a sociedade ao levar para as pessoas informações mais precisas e relevantes.
Grupo de artistas que integram os Jornalistas Livres presenteia o pessoal de direita, vestido de verde e amarelo, com corações vermelhos e prova que esta é a cor da emoção. Foto: Márcia Zoet
Por Maira Natassia
Num mundo onde me sentia sozinha, dentro de uma sociedade que me reprimia por eu não aceitar as suas próprias ações repressoras, eu encontrei a esperança. Num gesto de entregar um coração, forma de expor a face ridícula dos atos fascistas, ou por poder compartilhar a vontade de mostrar a verdade do que realmente acontece no Brasil. O aprendizado é todo dia, a luta é constante e não pode parar. Por aqueles que são esquecidos, pela verdade que não é mostrada, pela consciência de classes que cada vez deve ser mais presente. Hoje eu sou completa, sei que não estou sozinha e sei o quanto juntos podemos mudar. Por isso, para sempre, sou Jornalista Livre.
Foto: Bruno Miranda
Por Bruno Miranda
Pela necessidade de construir uma contra narrativa ao que vejo estampado nos meios de comunicação tradicional.
Por acreditar que qualquer um com um celular e uma motivação honesta pode ser mais jornalista (porque descreve a verdade) do que qualquer medalhão global.
Por acreditar que a única forma de mudança real vem com a participação popular, e a internet é o único canal para a democratização dos meios de comunicação, uma vez que mesmo com um governo dito de esquerda não conseguimos uma revisão da nossa lei de meios.
Depois deste ano de experiência em mídia colaborativa adquiri a certeza que a mudança não vai vir de fora para dentro, como eu antes acreditava. Os estudantes provaram isso.
Foto: Ana Trevisan
Por Ana Trevisan
Meu primeiro contato com os Jornalistas Livres foi durante a cobertura das ocupações das escolas pelos estudantes secundaristas — assunto de extrema importância para a sociedade e para os próprios jovens e pais, bombardeados por informações distorcidas e pela degradação da imagem dos colegas que corajosamente defendiam os seus direitos.
Há muito cansada de apenas me indignar com a grande mídia, sinto que é urgente e essencial colaborar com pessoas engajadas em informar a sociedade sobre a realidade dos fatos, agindo com total independência do sórdido financiamento privado. Cuidar para que cada texto seja bem revisado e resulte em matéria clara, inteligível e agradável para o leitor é uma grande satisfação! Estar no meio dos fatos, estar do lado de dentro dos acontecimentos e sentir a confiança das pessoas pelo trabalho dessa rede, sem dúvida, nos enche de esperança na força de uma nova mídia, com o real propósito de informar, educar e libertar quem antes não tinha acesso à verdade.
Sou Jornalista Livre porque quero que todos sejam livres para estar do lado da verdade.
Ocupação do MTST em Mauá, na Grande São Paulo; o terreno, no Jardim Oratório, tinha 300 mil metros quadrados de área improdutiva. Foto: Sato do Brasil
Por Oscar Neto
Eu nunca fui militante, nunca fui ativista, nunca estive literalmente nos braços do povo. Minha admiração pelos movimentos e reivindicações populares sempre foi pela internet, pelos livros e artigos. Por qualquer motivo, não frequentava o C.A. da faculdade de jornalismo, não participava das manifestações de rua, não colava tanto com a galera que curtia discutir política e questões sociais a fundo. Mas tudo isso sempre esteve dentro de mim e, de repente — graças as redes sociais -, recebi um comunicado de uns tais Jornalistas Livres que iam cobrir no dia seguinte uma manifestação pró-impeachment da presidente Dilma com uma linha editorial diferente do que costumamos ver pela grande imprensa. Ali, finalmente, eu entrava para o mundo do jornalismo real, na rua, e ancorado nas premissas da democracia, dos direitos humanos e dos movimentos sociais. Basicamente tudo o que eu esperava poder fazer com o poder da voz que têm os comunicadores.
De lá pra cá, já virei a noite em ocupações de terrenos abandonados, conheci por dentro a realidade dos refugiados que vivem nos movimentos de moradia de São Paulo, subi o morro pra ver como a galera da periferia via a questão da redução da maioridade penal, e até encenei ter tomado um tiro durante um grande ato de rua, em referência à grande chacina ocorrida dias antes em Osasco que matou injustificadamente dezenas de pobres — e até hoje permanece à sombra de um esclarecimento.
Isso pra mim foi o máximo que já vivi como jornalista e a prova de que o trabalho dos Jornalistas Livres é uma ruptura na forma de retratar e participar do dia a dia do povo brasileiro. Nada do que você já viu na TV se compara a essa experiência e nenhuma leitura feita pela mídia tradicional te trará elementos tão reais e humanos dos acontecimentos do mundo.
Jornalistas Livres é a forma mais autêntica de mostrar a realidade como ela é, sem vícios. Nosso único interesse é contextualizar os fatos com a dura realidade das pessoas que têm seus direitos básicos sequestrados todos os dias. E essa leitura só pode ser feita de dentro para fora. Jornalistas Livresfaz e fará parte da minha vida para sempre.
Foto: Ennio Brauns
Por Ennio Brauns
Ser jornalista é mesmo uma função fundamental quando se pensa que o mundo precisa saber, cada vez mais, de suas potencialidade para melhorar o conhecimento e o bem estar.
Aos vinte anos entrei numa Escola Superior de Teatro, no Rio de Janeiro, achando que estava entrando numa Escola de Artes. Passei lá dentro quatro anos tentando entender como a “direção teatral” cabia na minha vida. Virei fotógrafo logo nos primeiros anos. Fotografava as peças e exercícios que fizemos lá dentro. Acho que isso foi o mais importante que aprendi ali. Fotografar a cena teatral é quase como documentar o sentimento de quem exerce a vida na plenitude do outro.
Em 1977 saí de lá e, apesar de já fotografar, fui escrever no 2º Caderno de “O Globo”. Poucos meses depois começava em São Paulo o jornal “Em Tempo”. Foi aí que o Marcelo Beraba, que era editor do 2º Caderno, me perguntou se eu gostaria de colaborar com o Jornal. Eu vim.
Mas o que essa história tem a ver com o Jornalistas Livres?
Por incrível que pareça tem sim. O “Em Tempo” era, em 1978, mais ou menos (bem mais do que menos) uma experiência muito parecida com osJLs de 2015.
A intransigente luta contra o arbítrio, a defesa exigente dos direitos humanos, a indeclinável certeza de que precisamos dar voz aos excluídos pelo sistema. Ditatorial, como na época, ou em fase de consolidação democrática, como agora.
Ao longo dos últimos quase 20 anos tomei consciência do crescimento e da importância que o assunto GÊNERO tem numa sociedade que acredito ser a mais justa, e também, a mais necessária.
Essa foi a pedra de toque que me fez aceitar imediatamente a sugestão da Marlene para ser parceiro do Leo Moreira Sá nas coberturas sobre os movimentos de emancipação e por direitos das comunidades LGBT.
Foi a certeza de que poderia estar dentro de uma luta em que, na verdade, sempre estive.
Por isso, a LUTA CONTINUA e nos Jornalistas Livres também.
Cada vez mais, ao longo desse infindável 2015, (vai acabar daqui a pouco, mas tá renitente), o JORNALISMO se mostrou fundamental e a LIBERDADE, ah!, essa sempre foi.
Evoé, essa mistura de gerações fundamental ao avanço dos direitos e da democracia!
Por Wagner de Alcântara Aragão, do Macuco Bloge fotos de Laiza Marinho, para os Jornalistas Livres
Há incontáveis semanas que o sol e céu azul não davam as caras em Curitiba. Pois se fizeram presentes neste domingo, 13 de dezembro. O cenário para que uma multidão fosse às ruas e aderissem ao movimento pró-impeachment da presidenta Dilma Rousseff se desenhava, para a oposição de direita, como ideal.
Não foi.
Embora a verborragia e o volume do carro de som continuassem elevados, e as palavras de ordem contra o PT, o comunismo e o bolivarianismo se repetissem à exaustão, o público presente e a duração do ato foram bem menores do que nas manifestações anteriores. Parece que os curitibanos não estão dispostos a respaldar um impeachment com aroma, cores e sabor de golpe.
Não que a insatisfação com o governo Dilma tenha diminuído. Mas nos atos anteriores — em março, abril e agosto — não havia um pedido de impeachment acatado, tramitando. Não era só o antipetismo o combustível das manifestações. Havia um descontentamento contra as medidas de arrocho tomadas pela equipe econômica de Dilma.
Com o impeachment posto à mesa, ir às ruas passou a significar não apenas ir para protestar “contra tudo o que está aí”. Vestir o verde-amarelo e cerrar fileiras com os organizadores desses movimentos antipetistas passou a ter outro significado: referendar um pedido de afastamento claramente sem base legal, capitaneado por um turma que não consegue ganhar eleição e viu no impedimento da presidenta uma chance de voltar ao poder, pelo tapetão.
A maioria da população, inclusive a maioria dos insatisfeitos com o atual governo, parece ter percebido isso.
Na capital paranaense, a concentração do ato começou por volta das 13 horas, na Praça Santos Andrade, no Centro. Depois, os manifestantes seguiram em caminhada até a Boca Maldita, tradicional ponto de atos políticos. Por volta das 15h30, a manifestação se dispersou.
O pato inflável gigante, símbolo escolhido pela Federação das Indústria de São Paulo em campanha contra a carga tributária, foi o que ainda restou por mais tempo na Boca Maldita.
Os organizadores falaram em 15 mil participantes. A Polícia Militar, em 10 mil. Difícil corroborar esses números.
Em razão das festas de final de ano, o comércio do Centro de Curitiba abre aos domingos. Neste, as lojas atraíram mais gente que a manifestação pró-impeachment. Os que não foram às compras no comércio de rua, lotaram os shoppings.
Já aqueles que preferiram deixar a gastança para depois, resolveram aproveitar o raro domingo de sol nas praças, parques e outros espaços públicos de lazer e cultura. O Museu Oscar Niemeyer e bosque dos arredores, por exemplo, estiveram lotados durante a tarde.
Por Rodrigo Vianna, do Blog Escrevinhador, para os Jornalistas Livres
O novo AI-5, puxado pelo PSDB e a turma de Eduardo Cunha, não deu certo. Se FHC queria multidões nas ruas pelo golpe, vai ter que mandar buscar na Ucrânia…
Mas as marchas dos gatos pingados geraram um festival de respostas bem-humoradas.
13 de dezembro de 2015 foi o dia em que o pato dos tucanos virou mico. O zoológico do golpe vai fechar por falta de povo.
Em São Paulo, um pato a favor do impeachment: coxinhas desmoralizam até o golpismo
A seguir, uma seleção do que rolou na rede, enquanto a turma apoiada pelo PSDB pedia “intervenção militar” e “morte aos petistas” na avenida Paulista…
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1) O segurança — constrangido
“O cidadão de bem não para o trânsito. O cidadão de bem protesta dentro do shopping” (por @malvados)
2) Reveillon do golpe
“O @MBLivre anunciou nova manifestação para o próximo dia 31 de dezembro às 23HS em Copacabana. Todos de branco pelo Impeachment” (por @egirao)
3) A mini-festação do PSDB
“@zehdeabreu inventaram o novo tipo de protesto: a mini-festação” (por @henriquesguida)
Em Brasília….
4) Globo desagrada até golpista
“Globo News interrompeu transmissão ao vivo com os manifestantes gritando — Ei, Globo, vai tomar no c…” (por @adrianosribeiro)
5) Suruba do golpe
“Bolsonaro, pato Inflável, Alexandre Frota: isso é ato político ou gravação de alguma pornochanchada” (por @analepse)
6) À sombra do AI-5
“No Rio, manifestantes que apoiam o impeachment tentam se esconder debaixo de árvore para não passarem vergonha” (por @dilmabr/Dilma Bolada)
7)BH abandona o golpe de Aécio
“Em BH, já são 350 gatos pingados. Se o impeachment fracassar, prometem se refugiar na base aérea de Cláudio” (por @rvianna)