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Tag: Ilan Goldfajn

  • A suavidade retórica do Banco Central

    A suavidade retórica do Banco Central

     

    “Não há mal que sempre dure, nem bem que nunca se acabe.” A economia brasileira haverá de crescer um dia, independentemente dos erros de Levi e Meirelles. Teremos de ouvir, então, que voltamos ao caminho certo como resultado da austeridade, das reformas, do fim da “farra” com o dinheiro público.

    A verdade, no entanto, é que a crise política, que vinha se formando desde a eleição de Lula em 2002, passando pelo ilegítimo “domínio do fato”, pela campanha midiática transformada em manifestações de rua de 2013, culminando com a rejeição do resultado das eleições de 2015, cobrou alto preço econômico dos brasileiros, especialmente daqueles em maior vulnerabilidade.

    Verdade, também, é que as políticas econômicas, desde o início de 2015, só fizeram aprofundar a recessão e o desemprego, seu efeito mais perverso. Seguimos pelo caminho mais penoso. Mesmo tendo como contraexemplo mais recente as políticas adotadas pelos Estados Unidos, na crise financeira iniciada em 2008.

    Os EUA verteram tanto dinheiro na economia quanto julgavam necessário para escapar da pior, e potencialmente mais danosa, crise econômica desde 1929. Sofreram, derraparam, mas escaparam. O desemprego estado-unidense bateu 10 % em um único mês, outubro de 2009, enquanto o nosso, que bateu 13,7% no primeiro trimestre desse ano, está acima de 10% desde o início de 2016.

    É nesse quadro desalentador que o Banco Central reduz a taxa básica de juros da economia brasileira para 7,5% e vem nos informar, na ata de seu Comitê de Política Monetária (Copom) de outubro, que “o conjunto dos indicadores de atividade econômica divulgados desde a última reunião do Copom mostra sinais compatíveis com a recuperação gradual da economia brasileira”.

    Há uma oposição importante entre as duas afirmações. Ou bem a economia está se recuperando e não precisamos de cortes alucinados de juros para tentar animá-la, ou estamos derrapando sem sair do lugar há quase três anos e precisamos, desesperadamente, empurrar potenciais investidores para que saiam da sombra e água fresca dos juros e invistam na economia real.

    O Banco Central iniciou o mês de outubro do ano passado com uma taxa Selic em 14,25% ao ano. A taxa é hoje quase a metade da taxa de um ano atrás. Isso indica que “recuperação gradual” não é a denominação correta do paradeiro que estamos vivenciado. Se estivéssemos nos recuperando de modo satisfatório os cortes nos juros não seriam nem tão fortes e nem tão frequentes.

    Se bem procurarmos, encontraremos que “o Copom entende que a conjuntura econômica prescreve política monetária estimulativa, ou seja, com taxas de juros abaixo da taxa estrutural”. Mas o que isso quer dizer? Bem, significa que a conjuntura econômica está dizendo, com todas as letras, que a economia brasileira está mal das pernas, que precisa de estímulo e que o único recurso que o governo quer usar é baixar os juros.

    A ata afirma, ainda, que nas últimas reuniões do Copom, “debateram-se os dados mais suaves de atividade referentes ao mês de agosto, mas também a possibilidade de uma retomada mais forte à frente’. “Dados mais suaves” deve ser, possivelmente, o modo elegante de afirmar que nossa economia está patinando. O dicionário Houaiss ensina que suavidade é “efeito doce e muito agradável ou aprazível aos sentidos; doçura, maciez, delicadeza”.

    Gostaria de ver os integrantes do Copom dizerem aos 13 milhões de desempregados brasileiros que os dados da atividade econômica de agosto foram “mais suaves”, mas que estamos no caminho certo.

     

  • A inflação de janeiro foi baixa. Vamos comemorar?

    A inflação de janeiro foi baixa. Vamos comemorar?

    Há um mês “celebramos” a queda da taxa de juros. A chamada taxa Selic caiu de 13,75% ao ano para 13%. Um corte ousadíssimo, dado o conservadorismo dessa diretoria do Banco Central. Naquele momento, dissemos que o corte não era um bom sinal, mas mostra de uma economia em forte desaquecimento.

    Agora, somos informados, pelo IBGE, que a inflação de janeiro, medida pelo IPCA, ficou em 0,38%. Muito abaixo do que esperavam os sábios do mercado financeiro. O gráfico mostra a queda da inflação calculada em períodos de 12 meses. Devemos comemorar?

    Perdão, sem querer ser um estraga prazeres, pediria que olhássemos o quadro completo: Como anda o desemprego? Como andam as vendas no varejo e o setor de serviços? Como andam os indicadores de pobreza?

    Temos 12 milhões e 300 mil desempregados no país, é o que nos informou o IBGE. No gráfico abaixo é possível notar a aceleração do desemprego após 2014. Durante o ano passado 3,3 milhões de pessoas passaram a fazer parte desse enorme grupo de desempregados. Essas pessoas, certamente, não vão comemorar a inflação baixa de janeiro. Elas devem, sim, estar se perguntando se a inflação caiu por conta do emprego que elas perderam. Elas tem razão de questionar, uma vez que, de fato, as políticas que pretendem baixar a inflação atingem em cheio o emprego. Ou você acha que juros altos e cortes de investimentos e gastos do governo beneficiam o emprego?

    Será que encontraremos boas novas no comércio ou no setor de serviços? A pesquisa do IBGE nos mostra que as vendas do Comércio Varejista Ampliado caíram 8,7% em 2016. As vendas de veículos caíram 14% e as de material de construção caíram 10,7%. As vendas do comércio sem veículos e material de construção caiu 6,2% em 2016, Como mostra o gráfico abaixo.

    O setor de serviços engloba transportes, comunicação, alojamento e turismo, entre outros. A queda nesse setor foi de 5% em 2016. O destaque de queda (10,4 %) foi no transporte terrestre. Aqui, é importante ressaltar, está o transporte de cargas, como matérias-primas e produtos acabados para a indústria. Menos transporte para a indústria implica menor produção industrial. As dificuldades da indústria também se refletem nos preços: não dá para aumentar preços, se nem vender direito a indústria está conseguindo. Comemorar inflação baixa, às custas de queda na produção industrial, é absolutamente descabido.

    Aqui é fácil perceber que aqueles que continuam empregados estão receosos de trocar de carro ou construir/reformar suas casas. Um governo que, no meio de uma brutal recessão, só fala em cortes de investimentos e gastos consegue dar confiança para que os trabalhadores consumam, especialmente, bens duráveis como automóveis?

    E a questão da pobreza? Bem, nessa semana fomos surpreendidos por um estudo do Banco Mundial que afirma que, somente nesse ano de 2017, a recessão deve derrubar 3,6 milhões de brasileiros para baixo da linha da pobreza. Cerca de 1 milhão desses “novos pobres” passarão a depender do benefício do Bolsa Família, que já ajuda 14 milhões de pessoas, sublinha o estudo. O pior é que, quando imaginamos que esse quadro é passageiro, nos lembramos que o orçamento do governo está “encarcerado” até 2036.

    Mal comparando, podemos imaginar nosso carro num atoleiro, com lama por todos os lados. De repente, o alegre motorista exclama: “Senhores, nosso limpador de para-brisas está funcionando perfeitamente. Estamos no caminho certo. Isso não é maravilhoso?”

    Comemorar a inflação baixa de janeiro é a mesma coisa. A economia brasileira está num atoleiro. Há dois anos que afundamos na lama. As políticas econômicas adotadas ajudam a afundar mais e mais. O desemprego, a queda de um enorme contingente de pessoas abaixo da linha da pobreza, a queda das vendas no varejo, a queda nos serviços e a enorme queda no PIB devem ser esquecidos. Celebremos a “vitória” diante do monstro inflacionário e bom Carnaval para todos nós!

    Notas

    1 Para ver o relatório do IBGE sobre o desemprego: http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3367&busca=1&t=pnad-continua-taxa-desocupacao-foi-12-0-quarto-trimestre-2016-media-ano

    2 Para ver o relatório do IBGE sobre a queda das vendas no varejo:

    http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3375&busca=1&t=dezembro-2016-vendas-varejo-recuam-2-1-fecham-ano-6

    3 Para ver o relatório do IBGE sobre a queda nas atividades do setor de serviço:

    http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3376&busca=1&t=dezembro-setor-servicos-cresce-0-6-fecha-ano-5

    4 Para ver a matéria sobre o estudo do Banco Mundial:

    http://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2017-02/banco-mundial-crise-pode-levar-36-milhoes-de-brasileiros-de-volta-pobreza

    Para ver o relatório sobre a inflação de janeiro de 2017:

    http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3372&busca=1&t=ipca-fica-0-38-janeiro

  • Deu ruim: queda brusca na taxa de juros não é bom sinal!

    Deu ruim: queda brusca na taxa de juros não é bom sinal!

    (Os parágrafos em itálico e negrito são do comunicado do Banco Central)

    Há muito tempo, o Banco Central (BC) não corta 0,75% em uma só reunião. E hoje cortou a taxa básica da economia brasileira, a Selic, de 13,75% para 13% ao ano. Para os neoliberais, hoje na direção do BC, ser conservador é manter a taxa muito alta. Desse modo, decidir por esse corte, indo contra seu habitual “conservadorismo”, tem somente uma interpretação: Deu ruim! Os sinais da economia brasileira são horrorosos!

    A atualização do cenário básico do Copom pode ser descrita com as seguintes observações:

    O conjunto dos indicadores sugere atividade econômica aquém do esperado. A evidência disponível sinaliza que a retomada da atividade econômica deve ser ainda mais demorada e gradual que a antecipada previamente;

    Atividade aquém do esperado quer dizer continuamos em recessão brava com queda na produção e no emprego. A volta ao crescimento e melhora no emprego não estão no horizonte.

    No âmbito externo, o cenário ainda é bastante incerto. Entretanto, até o momento, os efeitos do fim do interregno benigno têm sido limitados;

    Afirmar que o cenário externo é incerto é procurar transferir parte da culpa para a economia mundial. Os opositores de Dilma, agora no poder, adotam a explicação da influência externa que negaram existir ao longo de 2015. O desmonte em curso da nossa economia, entretanto, tem muito, muito mais relação com o sitiamento do governo Dilma, a crise política gerada pelo golpe e o garrote imposto pelas políticas econômica e monetária de Temer, Meirelles e Goldfajn.

    A inflação recente continuou mais favorável que o esperado. Há evidências de que o processo de desinflação mais difundida tenha atingido também componentes mais sensíveis à política monetária e ao ciclo econômico;

    Carregamos demais na dose é o significado da afirmação que a desinflação está mais difundida. Em português claro, o que os membros do Comitê de Política Monetária do BC estão dizendo é: estávamos, e ainda estamos, em uma enorme recessão e mantivemos a taxa de juros mais alta, muito mais alta, do que devíamos por mais tempo, muito mais tempo, do que devíamos. Assim a inflação está perdendo força mais rapidamente do que eles esperavam.

    A inflação acumulada no ano passado alcançou 6,3%, bem abaixo do esperado há poucos meses e dentro do intervalo de tolerância da meta para a inflação estabelecido para 2016;

    As expectativas de inflação apuradas pela pesquisa Focus recuaram para em torno de 4,8% para 2017, e mantiveram-se ancoradas ao redor de 4,5% para 2018 e horizontes mais distantes;

    Como subir preços quando o quadro recessivo e o desemprego só se agravam? É óbvio que a inflação ia cair, ainda mais com cortes de investimentos públicos e com as altíssimas taxas de juros mantidas pelo Banco Central. Só o Governo e o Copom estão surpresos.

    As projeções condicionais do Copom também recuaram em relação às divulgadas no Relatório de Inflação passado, que foram baseadas no conjunto de informações disponíveis até 9 de dezembro de 2016. Dentre outros fatores, os recuos nas projeções foram influenciados por dados de inflação e atividade econômica divulgados desde então. As projeções no cenário de referência encontram-se em torno de 4,0% e 3,4% para 2017 e 2018, respectivamente. Já no cenário de mercado, situam-se em torno de 4,4% e 4,5% para 2017 e 2018, respectivamente; e

    Em outras palavras, a inflação e o crescimento previstos estão muito mais baixos do que eles esperavam anteriormente.

    Os passos no processo de encaminhamento e aprovação das reformas fiscais têm sido positivos até o momento.

    Os passos nas reformas fiscais têm sido “positivos” para quem imagina que o melhor par o Brasil é a devastação. Cortes de gastos sociais, cortes de direitos, inflação em queda com brusca desaceleração da economia só faz feliz uma classe social: a dos endinheirados.

    O Comitê ressalta os seguintes riscos para o cenário básico para a inflação:

    Por um lado, (i) o alto grau de incerteza no cenário externo pode dificultar o processo de desinflação; (ii) o processo de desinflação de alguns componentes do IPCA mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária requer atenção contínua; (iii) o processo de aprovação e implementação das reformas e ajustes necessários na economia é longo e envolve incertezas;

    O que querem dizer é que: a vaca foi pro brejo, mas, mesmo assim, estaremos vigilantes para ter certeza de que ela não se desvie do brejo. Esse é o resumo desse parágrafo do Copom.

    Por outro lado, (iv) a atividade econômica mais fraca e o elevado nível de ociosidade na economia podem produzir desinflação mais rápida que a refletida nas projeções do Copom; (v) a inflação tem se mostrado mais favorável, o que pode sinalizar menor persistência no processo inflacionário; e (vi) o processo de aprovação e implementação das reformas e ajustes necessários na economia pode ocorrer de forma mais célere que o antecipado.

    Existe o risco da inflação cair mais do que estamos esperando hoje. A razão é a elevada ociosidade na economia, ou seja, há muitas máquinas e recursos produtivos parados e desemprego. Em outras palavras, sangramos o paciente até ele quase desfalecer, por isso a inflação pode ser menor do que estávamos mirando.

    Considerando o cenário básico, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, pela redução da taxa básica de juros para 13,00% a.a., sem viés. O Comitê entende que a convergência da inflação para a meta de 4,5% no horizonte relevante para a condução da política monetária, que inclui os anos-calendário de 2017 e, com peso gradualmente crescente, de 2018, é compatível com intensificação da flexibilização monetária em curso.

    Todos os membros do Comitê votaram pela queda da taxa de 13,72 para 13%. Isso significa menos o mais monetaristas perceberam que o aperto passou muito dos limites.

    O Copom avaliou a alternativa de reduzir a taxa básica de juros para 13,25% e sinalizar uma intensidade maior de queda para a próxima reunião. Entretanto, diante do ambiente com expectativas de inflação ancoradas, o Comitê entende que o atual cenário, com um processo de desinflação mais disseminado e atividade econômica aquém do esperado, já torna apropriada a antecipação do ciclo de distensão da política monetária, permitindo o estabelecimento do novo ritmo de flexibilização. A extensão do ciclo e possíveis revisões no ritmo de flexibilização continuarão dependendo das projeções e expectativas de inflação e da evolução dos fatores de risco mencionados acima.

    Esse penúltimo parágrafo afirma que eles estarão de olho: se a economia cismar de cresce eles voltam com as pauladas.

    Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Ilan Goldfajn (Presidente), Anthero de Moraes Meirelles, Carlos Viana de Carvalho, Isaac Sidney Menezes Ferreira, Luiz Edson Feltrim, Otávio Ribeiro Damaso, Reinaldo Le Grazie, Sidnei Corrêa Marques e Tiago Couto Berriel.

    Eis os nomes daqueles que, junto com Henrique Meirelles e Temer, estão tornando mais distantes o emprego e crescimento econômico

    Brasília, 11 de janeiro de 2017.

    Banco Central do Brasil

  • O sonho da retomada da confiança na economia

    O sonho da retomada da confiança na economia

    Essa frase é do presidente do Banco Central, 12/08/2016, Ilan Goldfajn. Ele e a equipe de Meirelles, contudo, que acenam com “ajustes” nas contas do governo, cortes de gastos e investimentos, associados a juros muito altos.

    Eles, Ilan e a equipe econômica do governo interino, julgam que o caminho para voltarmos a crescer é recuperarmos a confiança e que isso se faz com juros altos e com corte de gastos e baixo investimento do governo. Você acha que faz sentido tentar recuperar a confiança colocando os juros na Lua e cortando investimentos na hora que o país enfrenta grave recessão?

    Imagine que você é trabalhador e que precisa decidir se vai trocar de carro. Você ouve o discurso de que o governo precisa se “ajustar” e cortar gastos e investimentos, que é preciso cortar direitos dos trabalhadores, que é preciso “ajustar” a previdência e assim por diante. Você imagina que teremos, nos próximos tempos, mais ou menos desemprego? Daí você olha para a taxa de juros e, concretamente, desiste da troca de carro, não é? E desiste da compra de qualquer bem durável, porque não sabe se estará empregado no futuro próximo.

    Quando você desiste da compra, a indústria não vende. O que faz a indústria?

    Imagine agora que você tem dinheiro para investir na construção de uma fábrica ou para abrir um negócio. Você olha para os juros de 14,25% e para uma inflação prevista de 5,42 % e se pergunta: por que vou investir se posso aplicar meus recursos a uma taxa de mais de 8% acima da inflação?

    Aí você olha para a previsão de que o PIB cairá 3,2% neste ano, segundo o Boletim Focus, divulgado pelo Banco Central do Brasil. O que você faz? Espera tempos melhores para investir, não é? E vai lucrando com os juros pagos pelo Banco Central que, aliás, aumentam rapidamente a dívida do governo. Recursos que, ao invés de irem para investimentos, vão para bolsos já endinheirados.

    Como é que a economia voltará a crescer se quem está no comando da economia continua com o pé firme no freio dos investimentos do governo, se os trabalhadores estão com medo do desemprego e se os empresários estão felizes aplicando seus recursos a uma taxa de juros superconfortável?

    Juntemos esse desânimo da recessão com a instabilidade política. Você sabe quem estará na presidência da República em janeiro de 2017? Sabe quem estará solto e quem estará preso? Sabe se essa política econômica, que agrava a recessão, ficará por longo ou curto tempo? Dado que é impossível ter estabilidade econômica com instabilidade política, podemos concluir que o sonho de Ilan com a recuperação da confiança e retomada do crescimento não está no horizonte.

    Os economistas de cunho neoliberal e os meios de comunicação, que apoiam o golpe, vão continuar vendendo que agora a economia está no rumo saudável. Mais hora, menos hora, sairemos da recessão, porque assim é o funcionamento do modo de produção capitalista. Com custo altíssimo pelos juros e pelo desemprego. Um custo muito maior do que o necessário.

    Custo social maior, desemprego maior, aumento da dívida pública, aumento da desigualdade e acirramento das relações sociais e da violência: são resultados da política econômica do governo interino. Dizem buscar a confiança e provocam a desconfiança de quase todos.

    ilustração por Joana Brasileiro

  • Viva o jornalismo econômico!

    Viva o jornalismo econômico!

    Qual é o efeito da taxa de juros na atividade econômica e no emprego? Taxas mais altas prejudicam o crescimento e aumentam o desemprego. Procure em qualquer manual de economia e é isso que encontrará. Não é por outro motivo que, desde o início da crise de 2008, EUA e UE praticam taxas próximas de zero. Mas no Brasil…

    O presidente do Banco Central sinalizou ontem (28/06) que manterá a taxa de juros em 14,25% ao ano por período maior do que o esperado. O Jornal Valor Econômico, os, apressou-se em tranquilizar a nação e, em artigo de primeira página, Novo discurso do BC adia início da queda dos juros, afirmou que isso não afetará a retomada do crescimento.

    Quais são as previsões do próprio boletim Focus divulgado pelo BC? A inflação prevista para os próximos 12 meses é 6%. Se a taxa de juros básica é 14,25% ao ano, o ganho acima da inflação (ganho real) para quem aplica em títulos do governo indexados à taxa básica é 8% ao ano.

    O artigo do Valor admite que a taxa é absurdamente alta, e comete um errinho na conta: “O juro real (descontada a inflação) também deve se manter entre os mais altos do planeta, em 6% ao ano.”

    Imagine que você tem recursos para investir em um negócio. Você olha para a previsão de crescimento do país e descobre que os economistas acham que o PIB vai cair 3,4%. Daí, você olha para taxa de juros, percebe que pode ganhar 8% acima da inflação. Sem risco e com liquidez, pois pode vender os títulos a qualquer momento se mudar de ideia. O que você decide?

    meio

    Ilan Goldfajn, presidente do BC, diz que assim a inflação irá mais rapidamente para o centro da meta e com “menos custos”. Os economistas de bancos e administradoras de recursos vibram e dizem que ele está sendo cauteloso e conservador. E dane-se o emprego. O juro real nesse nível sacia plenamente a voracidade do mercado financeiro. Só o governo Federal paga ao redor de 600 bilhões de reais por ano de juros. É muita grana para a gente ainda ter que se preocupar com o emprego, não é?

    Todos os países desenvolvidos do mundo, na iminência de recessão, baixam os juros. No Brasil, a taxa é aumentada, mantida por longo tempo. O Valor até concorda que o mundo caminha no sentido contrário: “A tendência brasileira é contrária à do ambiente global.” Segue o artigo dizendo que a saída do Reino Unido da União Europeia deve provocar a queda de taxas de juros na Europa e que o Fed, banco central norte-americano, pode estancar seu movimento de alta de taxas.

    No entanto, não precisamos nos preocupar muito, pois: “A provável manutenção dos juros em 14,25% ao ano no Brasil pelo menos até outubro terá pequeno impacto sobre a atividade econômica, segundo analistas.” O Brasil manter a maior taxa de juros real do planeta não é um grande problema, não é mesmo?

    O incrível artigo é encerrado com a pérola: “O novo discurso do BC, portanto, não comprometeria a retomada da economia, que começa a aparecer nos indicadores de confiança, principalmente na indústria.”

    ilustrações Joana Brasileiro

    O jornal e os jornalistas contam com a vantagem de que, daqui a duas semanas, ninguém se lembrará do que foi dito. A certeza de que agora estamos em boas mãos, por outro lado, permanecerá por período um pouco maior. Torçamos para que a peripécia não tenha custado um mau jeito na coluna.