Por Karina Custódio Sousa, para Jornalistas Livres
Poesia, a noite começou com poesia, vozes lisas, flexíveis e fortes, cabelos encaracolados e crespos, violão, flauta metálica em uma grande boca vermelha, batuque, flores, fotos, zines e livros, uma conjunção de detalhes significativos, era noite de Preta Poeta um coletivo de mulheres negras que produz e declama poesias sobre suas trajetórias.
Júlia Elisa a idealizadora do projeto nos conta um pouco de sua história “O Preta Poeta começou em 2017, pensado a partir de um edital da PRAE (Pró Reitoria de Assuntos Estudantis) da UFMG, que visava apoiar projetos de alunos de graduação. Pensando a escrita como mecanismo de resistência e liberdade, sem critério estético ou literário, a escrita e a declamação das participantes é instigada, assim como uma escuta sensível e atenta, além de difundir a escrita feminina negra.” Desde 2017 o Preta Poeta só cresceu, passando por ele diversas mulheres negras, entre elas Magna Cristina comunicóloga de 56 que teve no Preta Poeta uma oportunidade para “se integrar com uma geração valente, generosa, inteligente, amiga.”
Da esquerda para a direita: (sentadas) Alinne Damasceno, Lara Passos, Juliana Cristina, Raísa Muniz e Alice Teles. (em pé) Adriana de Deus, Dilu Freitas, Juliana Tolentino, Franciele Marinho, Lorrany Mota, Leila, Maria, Magna Cristina, Tamires Nunes e Júlia Elisa. Foto de Sara Fonseca
O final do segundo ciclo do coletivo foi marcado para quarta feira (31) as 19:00h na biblioteca estadual de Minas Gerais, foi o lançamento de seu segundo fanzine e trazia dezenas de histórias, Alice, Julia, Magna, Francieli, Lara e outras, todas se intercalaram para contar suas vivências e declamar suas poesias. Teve pés descalços, olhos atentos, mãos tremulas e lagrimas de emoção no palco e na plateia. As bocas, os gestos e as poesias falavam de dor, falavam de preconceito, de uma dívida histórica com as mulheres negras que se arrasta por anos e que está em tudo e em quase todos.
Foto de Sara Fonseca
Mas mais do que isso, falavam de amor, de poesia, de autodescoberta e esperança, mais potentes que qualquer tratado ou lei as palavras performance nos indicavam um mundo melhor em que mulheres pretas sabem que são capazes de tudo. Franciele Miranda estudante de Ciências sociais demonstra como o coletivo foi importante na sua vida acadêmica “O Preta Poeta foi um dos responsáveis pela minha permanência na universidade, o projeto me deu forças para perceber que eu posso me fazer presente em todos os lugares, e que por mais que seja difícil, é possível a minha voz ser ouvida.”
O encontro do dia 31 marca o final do segundo ciclo, segundo Júlia Elisa a ideia agora é “passar por reformulações, em tempos de radicalização de discursos e práticas de ódio, violência e discriminação, é um ato político e uma materialidade histórica investir na potência dos nossos corpos, das nossas escritas e das nossas vozes, permeando a política de afetos”. A política de afetos indicada por Júlia foi visível durante as apresentações, lá a palavra era passada com um abraço, as emoções não eram contidas e o decoro era inexistente, tudo isso nos mostra que não importa o quanto a realidade seja dura e cheia de intolerância. Há lugar para o afeto, há lugar para gritar a dor e comemorar o amor, e principalmente há lugar para poesia, e esse lugar não é um território delimitado, ele reside e habita na mulher negra.
Foto de Sara Fonseca
Quer saber mais sobre Preta Poeta? Acesse o facebook, instagram ou entre em contato pelo e-mail: pretaepoeta@gmail.com
E eis, que, de repente, as alunas do Colégio Tiradentes, mantido pela Polícia Militar no bairro Santa Tereza, em Belo Horizonte, estão sendo impedidas de usar tranças tipo ‘box braid’, atingindo de cheio as mulheres negras, que reclamam de racismo. Diante disso, nessa quarta-feira as estudantes realizaram um ato de protesto para denunciar o problema (Confira o vídeo abaixo). Curiosamente, o jornal “O Tempo”, um dos maiores de Minas, e um dos raros veículos a noticiar o fato, omitiu na longa reportagem que o colégio pertence à PM.
Tudo começou quando, na terça-feira, as alunas foram chamadas para ter uma conversa sobre a padronização de penteados, quando foram orientadas a não usarem as tranças ‘box braids’ usadas por várias delas. A proibição fez com que uma delas desabafasse: “Agora me perguntam o motivo das fotos chorando, meu amigos, foram ANOS de aceitação, ANOS que demorei para aceitar minha cor, meu cabelo, minha ancestralidade”, escreveu na postagem que viralizou. “Dói em mim, em pleno 2018, época em que todo dia vejo histórias de preconceito, um lugar onde deveria propagar o respeito às diferenças entre raças me manda ocultar quem sou de verdade”, acrescentou a aluna nas redes sociais. “Querem obrigar as meninas a tirar suas tranças, qual o problema ter tranças? Pode parecer besteira, asneira, mas não é. Algumas pessoas não sabem o que isso significa pra nós, meninas negras” desabafou a garota no Facebook.
Outra aluna contou que estava na aula quando foi chamada por um assistente de turno, junto com uma colega de turma que também usa tranças, para ir ao auditório. Quando chegaram lá, um grupo de meninas com penteados semelhantes estava no local aguardando para conversar com uma major, identificada como Lylian, e com a vice-diretora, Cláudia Boldoni. “A major e a vice-diretora estavam conversando com as meninas falando que o nosso cabelo não está no padrão da escola. Comecei a chorar, já tinha medo de isso acontecer há um tempo. Depois que falaram isso, algumas alunas foram liberadas e outras ficaram”, contou ao portal BHZ.
“A major, o tempo todo, falou que fazer trança estraga o cabelo, não sei de onde ela tirou isso. Disse que as tranças estragam a raiz do cabelo e eu expliquei que era até por uma questão de autoestima. Aí ela perguntou se eu já tinha alisado o cabelo. Uma outra menina respondeu por mim ‘é o cabelo dela, não vai alisar’ e a major disse que estava conversando comigo e não com ela”, contou a estudante. Voltei para a sala e comecei a chorar”, acrescentou.
Punição
Caso não cumpram a determinação de mudar o modelo das tranças até o próximo dia 22, quando termina o recesso escolar, as alunas poderão ser penalizadas com um Formulário de Registro Disciplinar (FRD). O acúmulo de FRD’s pode gerar suspensões e até mesmo a expulsão do colégio.
“Eu uso trança desde abril do ano passado e nunca reclamaram assim. Já falaram para prender o cabelo e reclamaram do tamanho. Eu uso porque melhora minha autoestima, não me sinto bem sem as tranças e não quero voltar a alisar o cabelo”, disse uma adolescente. “Eu estava pensando em falar com a vice-diretoria para que a nova regra fosse colocada para o ano que vem, por exemplo. Tem uma menina que colocou no fim de semana, custa no mínimo R$ 180, e, do nada, falam para tirar? Penso até em sair do colégio. As tranças fazem bem para a autoestima”, ressaltou a estudante, que tem o apoio da família para manter o penteado. “O cabelo é a autoestima dela, ela sempre sofreu bullying e, quando encontramos algo que a faça feliz, vem isso. Tem que olhar se a nota é boa, se é bem educada. Minha filha está arrasada, com o olho inchado”, disse a mãe da jovem.
O pior é que após a reunião, as meninas passaram a ser alvo de racistas. Em um áudio enviado pelo WhatsApp, um garoto se refere a elas como “macacas”. “Sai fora, suas macacas. Vocês não querem aceitar as regras, sai fora do colégio”, disse. No status do WhatsApp, outra manifestação discriminatória: “A interpretação das negrinha: ‘Colégio Machista opressor! #mimimi”, escreveu um estudante em tom pejorativo.
Regulamento
A direção do Colégio Tiradentes alega que não apenas as alunas que usam tranças foram chamadas, mas estudantes com cabelos tonalizados, topetes e outros fora do padrão imposto pelo regimento. “Diversos alunos foram chamados para falar sobre a adequação dos penteados, não só as meninas que usam tranças. Existe um regulamento que deve ser seguido. Então, se o cabelo está fora do padrão, que tem a ver com os valores da instituição, a mudança é necessária”, explicou a tenente-coronel Lívia Azevedo ao BHZ, sem explicar por que só agora o colégio está se preocupando com o penteado das alunas.
Quanto às manifestações racistas, a tenente-coronel disse que já tem uma equipe responsável pela identificação dos autores. “Ao serem Identificados, os alunos serão punidos conforme o código de ética do colégio. Trata-se de uma questão disciplinar”, afirmou.
Na manhã de terça-feira, estudantes de diferentes turmas se reuniram em um ato de apoio às colegas que usam trança, quando foram para a quadra, durante o intervalo, e deram as mãos. Após uma contagem regressiva, gritaram: “Uma por todas e todas por uma”, “Somos todas tranças!”. Em seguida, deram as costas e revelaram estar todas de trança, um modelo de penteado bastante usado por elas.
Em meio a todos os resultados das eleições onde temos o Coiso vencendo em 17 estados no 1o turno, Alexandre Frota, Major Olímpio, Janaína Paschoal, Kim Kataguiri, Eduardo Bolsonaro e tantos outros personagens da extrema direita conservadora eleitos, um acalento, uma felicidade gigantesca também está presente nos resultados das apurações das urnas, Marielle realmente virou semente: teremos diversas candidaturas negras, que eleitas com suas existências e resistências ocuparão os espaços de parlamentos pelo país.
Vai ter sim! Talíria Petrone (PSOL-RJ), vereadora de Niterói professora, militante LGBTI, nona deputada federal mais votada no RJ.
Vai ter sim, Erica Malunguinho (PSOL-SP), negra, trans, do quilombo Aparelha Luzia, como deputada estadual.
Vai ter sim,Erika Hilton, gerontóloga pela UFSCAR (Universidade Federal de São Carlos), foi eleita como membra da bancada ativista do PSOL em São Paulo. Ao lado de nove pessoas, pretende fomentar o debate do preconceito de gênero.
Vai ter sim! Áurea Carolina (PSOL-MG), deputada federal, socióloga a mais votada em MG.
Vai ter sim! a Andreia de Jesus (PSOL-MG), como deputada estadual.
E não acabou.
As experientes Leci Brandão (PCdoB – SP), deputada estadual e Benedita da Silva (PT-RJ), deputada federal foram reeleitas. Elas são as comandantes das lutas em defesa do povo de Candomblé, no caso de Leci, e Benê que fala todo dia de representatividade da mulher negra na Câmara Federal.
E Marielle Vive!
Vive e revive com todas as eleitas. Mônica Francisco e Renata Souza e Dani Monteiro, mulheres negras que trabalhavam com Marielle e que em 2019, ocuparão a ALERJ, como deputadas estaduais.
E verdade seja dita, o racismo nosso de cada dia, doa a quem doer, fez com que até os próprios partidos desacreditassem das corajosas candidaturas. Tem gente espantada com os resultados nesses partidos, mas essas pessoas sempre estiveram aqui, entre a gente, precisou que uma candidatura caótica fosse instalada com Bolsonaro para que as coisas começassem a mudar. É início, mas é vitória, e é uma vitória para o país debater a história de 354 anos de escravidão, e outros 20 de Ditadura.
Fundo partidário perto de zero e estrutura pífia, foi o que mais se viu nessa curta campanha, mas para os negros, isso foi elevado à terceira potência, segundo o desabafo de muitos deles, que encontramos nas ruas fazendo campanha com a ajuda de amigos, família e colocando à mostra toda a capacidade do povo negro de fazer um diálogo sobre a realidade da vida com o povo que sofre, que trabalha e que não vive sob a tutela de privilégios.
Uma leitura é necessária: quando os partidos ignoraram essa oportunidade, mantendo seu velho e cansado jeito de fazer política, perderam a chance de reaprender na raça, como fazer a reaproximação com suas bases, com movimentos sociais e populares. E não adianta agora, depois de passado o perrengue de fazer campanha a trancos e barrancos, mas com muita criatividade, amor e organicidade, dirigentes partidários tentarem se aproximar dessas pessoas negras eleitas.
Isso seria, no mínimo, hipócrita. Aquele partido, ou o outro deveria se curvar a essas pessoas e absorver humildade, além de se esforçar para de uma vez por todas, entender que a construção de uma eficaz frente que explique os efeitos drásticos que o Coiso poderá causar na vida das pessoas, fato que só é possível de ser feito com a maioria da população, ou seja, no Brasil, com negros, indígenas.
Ainda assim, há tempo.
Só que não dá mais para aguardar a hora de parar de teorizar Democracia e Fascismo. Está na hora de agir, de estabelecer ações concretas que mostrem o que Bolsonaro, de fato, trará (se eleito) para a vida dos negros pobres.
Não se pode cometer o erro de ficar até os 45 minutos do segundo tempo, como foi no período passado, permanecer se afogando, morrendo e gritando: NÃO VAI TER GOLPE e depois, FORA TEMER. Essas manifestações podem ter sido aprendizados interessantes para uma parcela da população, uma maioria composta de pessoas privilegiadas, que, de dentro de suas bolhas confortáveis dos bairros de classe média, se declaram como “de esquerda” e defensoras de Direitos Humanos.
Tomara que essa massa tenha percebido, que desde os tempos dessas palavras de ordem, a grande massa negra, pobre e periférica pouca unidade fez. E não fez, pois não se sentiu identificada com os privilegiados, que na volta para casa, saindo das manifestações, não são abordados de maneira vexatória pela polícia. Já os negros, agora sim, poderão ter sua representatividade na prática, nos parlamentos, como nunca se viu na história do Brasil. É um começo, mas é uma guinada negra muito linda e revolucionária para o país.
Preta-Rara (arquivo pessoal)
Nas redes sociais, vimos algumas manifestações emocionadas sobre o resultado das eleições, uma delas é a da rapper e MC, Preta-Rara que caminhou ao lado de diversas candidaturas negras nesse tempo curto de campanha. Sobre Erica Malunguinho, Preta escreve:
“O povo preto elegeu minha amiga, Erica Malunguinho que o próprio partido dela, o PSOL desacreditou que seria possível.
Para candidata branca a verba foi megainvestimento pra fazer campanha.
Pra nóix foi uma mixaria, pq aqui no Brasil sempre escutei que se ganha política c o megainvestimento na campanha.
Sendo assim, chupa PSOL e não retiro a minha palavra de falar que a esquerda também é Racista.
Mais o nosso modo de organização é milenar, a sagacidade é ancestral e a vontade de vencer é inenarrável.
Agora vcs entendem a nossa força, querida esquerda?
A semente de Marielle germinou e cresceu fruta preta da existência à resistência.
Agora o que sobra pra vcs e sair da porta, pq nosso bonde vai passar, ficar e permanecer até que as reparações históricas sejam de fato reparadas.
Pq a coisa ainda ficará preta de ponta a ponta, pq nosso levante bem de peso e cada dia mais, estamos mais preparados pra ocupar nosso espaço de fato. E fica a lição aí pra esquerda brasileira que adora usar corpos pretos de chaveirinho pro seu discurso falido sem prática e nem vivência.
Lidem e melhorem pois o quilombo está em festa e não tem hora pra acabar ✊🏿✊🏿
Preta-Rara”
Marcelo Rocha (arquivo pessoal)
Para Marcelo Rocha (PSOL-SP) que foi pré-candidato a deputado estadual em São Paulo, as candidaturas negras eleitas já trazem uma surpresa partidária importante para os parlamentos:
“É uma surpresa para as estruturas partidárias que já causa uma espécie de embate inicial: esse novo cenário de negros na política já inicia o fim da lógica da maioria de homens brancos de universidades públicas nos parlamentos. Isso dá o poder para o cara que é líder popular ser mais que um puxador de votos, ser um legislador e, com isso, estamos vendo o desejo das pessoas, de termos candidaturas negras. Assim, a partir do momento que os partidos reconhecerem isso, os negros passarão a ser os mais votados.
Outra mudança que acontece em 2019, é a do confronto estético, que mostrará aos parlamentos a verdadeira representatividade do povo brasileiro. Essa circulação de negros nos parlamentos, por si só, já transformará a política que até agora está abastada de discursos racistas e homofóbicos, que no próximo ano, se continuarem a existir, não passarão impunes. O tão verbalizado “decoro parlamentar” terá de ser aplicado e todos esses anos de dominação branca e machista nos parlamentos serão cobrados, é a dívida.
Marcelo Rocha”
Nesse ano, temos que aplicar um olhar especial para o índice de abstenções: 20,33%. É necessário pensar sobre o problema da falta de representatividade que poderia ter diminuição drástica, com mais candidaturas negras valorizadas pelos partidos.
Uma coisa é fato: nenhum parlamento será como antes. Os que ainda não passarão em 2019, por esses “confrontos estéticos” citados por Marcelo Rocha, não escaparão da mudança em 2020.
Por isso, conclamamos Baobá, por uma história de resistência preta e assim, queremos deixar uma mensagem para as corajosas candidaturas negras e para o povo brasileiro que elegeu essas pessoas.
Até o cair da última folha e enquanto a raiz resistir com seus frutos mesmo que secos, a árvore existirá e transbordará vida e vamos tentar entender o porquê continuar a lutar e resistir nesse Brasil que pode caminhar para o fascismo. Falar de resistência é lembrar do velho Baobá.
Uma árvore que veio da África e que já na primeira vista, encanta pela grandiosidade, que vai para além de sua copa, tem cheiro de ancestralidade.
As lendas em torno do Baobá trazem a força da resistência, a história de uma comunidade originária do orgulho de quem sempre lutou pela sobrevivência em terra de Brasil às vezes com “Z”.
A raiz desta lendária e forte árvore tinha aos seus pés (raiz) Grios que sabidamente sentavam ao chão com olhos de esperança e força nas palavras, para assim transmitirem o que Xangô, ensinava com sua força e sabedoria.
O individualismo é algo inventado pela branquitude, já na África se aprende a lutar coletivamente.
Por isso, nesse segundo turno, não podemos votar apenas por ideologias, e sim por nossas ancestralidades e comunhão com a raiz de um povo que nasce da benção, da reza, da cura, do canto, do tambor e da vida.
A nossa luta passa por Xangô e seu Oxé que juntamente com sua companheira Iansã, a primeira a surgir nas cerimônias, lutam juntos, por justiça.
Nada pode tocar quem tem o corpo fechado pela fé e a raiz de uma história preta de vivência secular. Esse é o povo brasileiro.
O que mais me preocupa nessas eleições é o domínio da irracionalidade diante de uma escolha tão importante. E para que essa irracionalidade se concretizasse, o ódio foi vendido em massa na cara da população, que consome todos os dias um excesso de espelho do modelo americano imperialista, que há muito nos subjuga.
Vivemos no país da melhor música do mundo, onde se ouve de norte a sul música americana em todas as lojas. Nas boates, nas salas de espera, nas festas. Uma chatice. Uma espécie de estrangeirisse em todos os lugares. É a trilha oficial da academia, quem aguenta? E junto com isso vem o lixo dos games de guerra, a indução à violência em todos os canais abertos a toda pobre inocente criancinha brasileira.
A educação pela superação para vencer o outro, ser melhor do que o outro, ser o único, avança a cada dia. “Colégio São Sicrano, seu filho em primeiro lugar no vestibular!” Acontece que esse vencedor terá 799 inimigos ali, porque são 800 alunos. O que é isso, o tempo inteiro melhor do que o outro? A cultura da vantagem: pessoas compram o que não querem por causa da vantagem e começam a consumir o que escolheram só por causa da vantagem. “Comprei cinco latas de salsicha, estava na promoção”. Mas você gosta? “Agora eu gosto, né? Saio ganhando”. É tudo meio torto.
O desprezo por si, pelo que se come, o desprezo pelo outro que é potencialmente aquele que eu vou vencer, e por isso é que se vende nos EUA armamento a todo momento e o povo dispõe de balas, de armas de fogo expostas e vendidas ao lado das balas de chupar no cinema. Socorro! Não se pode vender arma sem vender o ódio. Estamos experimentando uma civilidade que não quer pensar além da capa, e tudo que lhe é contrário não existe, é mentira, é fake news. Um mundo irreal, onde é preciso criar uma paranoia para justificá-lo.
Estamos experimentando o resultado de uma negligência e uma irresponsabilidade que o nosso jornalismo sofreu nos últimos tempos. Em especial na história mais recente do país, onde há omissão dos muitos dos que narram a informação e deixaram-se contaminar pela teoria e prática da polarização política do país, pela uniformidade da informação, e de nos deixar ausentes de uma avaliação crítica do nosso tempo com mais independência.
Parece que a população está com raiva, parece que fomos mordidos por uns cachorros bravos. Peraí, mas ao mesmo tempo, as mulheres se reuniram em 37 cidades brasileiras e não se registrou nenhuma briga. Não estou puxando sardinha para o nosso lado não, meninas. Mas pode fazer sentido: à mulher foi dada uma educação onde a sensibilidade, o gosto pelas coisas pequenas e delicadas e, principalmente, pelas tarefas de doação, como amamentar, carregar criança dentro da barriga, cozinhar com ela no colo, cuidar do outro, coisa que toda mulher aprende e o homem não. Talvez culturalmente tenhamos mesmo a boa possibilidade de produzir a paz.
Por isso também agora pulsa em mim uma certeza de que, ainda que a critiquemos, a democracia ainda é o melhor sistema político encontrado para respeitar a diversidade dos seres e a liberdade do pensamento. É ela que quero garantir nesse primeiro turno. É ela que está ameaçada. O projeto de país que me atrai não pode ser mais excludente do que esse já é, nem mais homicida e violento. A cidadania avançou, nós caminhamos para respeitar o jeito de ser de cada um, sem racismo, sem homofobia, sem tudo o que não presta, tudo que vem pela via da intolerância.
No país que eu quero o Estado não é grande nem pequeno. É do tamanho do seu povo. Estado mínimo para mim é povo mínimo. Eu pago meus impostos e quero receber por ele: saúde, segurança, educação e cultura. Simples assim. E mais, no meu sonho, os bens de um tempo devem pertencer a todos daquela comunidade, no caso a grande comunidade brasileira. Não quero mais do só olhar para o MEU próprio umbigo, a segurança do MEU condomínio, do colégio do MEU filho, o seguro do MEU carro. Esse negócio de pouca gente ter tudo e muita gente ter pouco ou nada não parece que nos levará a alguma espécie de paz.
Fui criada na ditadura, a infância passei sob ela. E não era bonito ser criança e ver a tensão dos pais com seus filhos estudantes adolescentes em perigo, cantores sendo presos, intelectuais silenciados. A impressão que se tinha, mais tarde confirmei, era de que os presos eram inocentes. Muita gente morreu, muita gente foi torturada. E o Brasil paga até hoje um custo alto por esta interrupção muito violenta num país de Darcy Ribeiro e Paulo Freire, para citar dois. A ditadura não foi uma revolução, nem um movimento. A ditadura foi, sobretudo, um misto de ignorância e covardia. Foi sério. As cabeças cortadas, os exílios que foram impostos a inteligentes brasileiros, tudo isso faz falta no país que hoje somos.
Ando todo tempo pelo Brasil, e em São Paulo um taxista me disse: “Comprei essa autonomia e minha casa no governo Lula e o Haddad que era nosso ministro da Educação, bicho inteligente, mandou construir entre três cidades lá do Ceará, com distância de 11 km uma da outra, uma universidade e uma escola politécnica. Hoje meus sobrinhos não precisam sair do Nordeste para ser taxista aqui em São Paulo; são professores, estão na universidade”. Então, meus amores, este é o Brasil que eu quero. Um país de todos. E confio nele, pois tem uma juventude negra, aliás, uma juventude excluída que entrou nas universidades e vai votar certamente por uma educação para todos. Não vou esperar o segundo turno para ter certeza da minha vontade. Fico com o povo. Voto com o povo. Sou povo. Domingo já vou de Haddad!
Artigo de Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História na Universidade Federal da Bahia, com charge de Paulo Batista
Conforme vamos nos aproximando do dia 7 de outubro, fica cada vez mais óbvio que estamos diante de uma forte polarização. Que polarização é essa? É esta a pergunta que tento responder neste ensaio.
Começo com uma afirmação forte, contundente: Bolsonaro é o candidato dos ricos e Haddad é o candidato dos pobres!
Essa frase, assim, solta no ar, vira alvo fácil de desmentidos. Certamente, o leitor e a leitora estão pensando: “Conheço um monte de gente pobre que vota em Bolsonaro”. Daqui, eu replico: conheço um monte de gente rica que vota no Haddad.
Segundo o TSE, existem hoje no Brasil 140,3 milhões de eleitores aptos a votar. Será mesmo que a minha percepção pessoal, que construo a partir daquilo que ouço da boca do meu vizinho, do meu primo, é o bastante para ter a visão do conjunto do eleitorado brasileiro?
Não, não é!
A análise não pode ficar restrita ao que vemos com nossos próprios olhos e ouvimos com nossos próprios ouvidos. Por isso, os dados estatísticos são tão importantes. São eles que nos permitem ter noção do que está acontecendo para além do horizonte, onde os olhos não alcançam, onde os ouvidos não escutam.
Parto sempre do princípio de que os institutos de pesquisa sérios e confiáveis são o Ibope e o Datafolha, pois na série histórica mais acertaram do que erraram. O Vox Populi também poderia entrar nessa lista, mas, como ele costuma ser próximo de movimentos sociais ligados ao PT, fiquemos apenas com o Ibope a o Datafolha.
Qualquer analista minimamente sério não briga com os dados do Datafolha e do Ibope. Isso é comportamento de eleitor/torcedor. O Ibope apresentou nessa semana dados qualitativos que ajudam a responder às perguntas que me parecem ser as mais importantes de serem feitas no atual momento da corrida eleitoral: quem é o eleitor de Jair Bolsonaro? Quem é o eleitor de Fernando Haddad?
Dos dois lados da fronteira ideológica saltam respostas caricatas que pouco ajudam na compreensão da realidade. À esquerda, fala-se muito em um “fascismo” que teria se espalhado pela sociedade brasileira. À direita dizem que os eleitores do PT são o resultado de uma revolução cultural que o partido vem silenciosamente fazendo no Brasil, especialmente a partir das universidades, onde atuam os “professores doutrinadores de esquerda”.
Para contraditar as caricaturas, aciono os dados divulgados pela pesquisa do Ibope publicada em 24 de setembro de 2018. Os números são cristalinos:
Haddad lidera com 30% das intenções de voto entre os eleitores que vivem com menos de 1 salário mínimo por mês. Bolsonaro tem 16%. Se o corte for o da escolaridade formal, o cenário é bem parecido: entre os eleitores que estudaram até a 4° série do ensino fundamental, Haddad lidera com 28%. Bolsonaro tem 19%.
A situação é oposta quando mudamos o filtro dos dados qualitativos:
Entre eleitores com renda mensal superior a cinco salários mínimos, Bolsonaro lidera com impressionantes 42% dos votos. Haddad tem 15%. Entre eleitores com ensino superior completo, Bolsonaro lidera com 33%. Haddad tem 16%.
As caricaturas de esquerda e de direita não sobrevivem aos dados: o tal “fascismo” não é um projeto da “sociedade brasileira”, mas, sim, dos mais ricos. As universidades não fazem “doutrinação ideológica de esquerda”, pois a parcela mais escolarizada da população (que tende a ser a também a mais rica) prefere Bolsonaro.
É claro que existem as exceções!
16% de pobres votam em Bolsonaro. É muita gente. Alguns deles salpicam aqui e ali nas nossas relações pessoais, o que pode nos levar a um erro de percepção. Nunca é demais lembrar o óbvio: se 16% dos mais pobres votam em Bolsonaro, 84% não votam. 84 é mais que 16, bem mais.
O que os dados qualitativos mostram é que o eleitor típico de Bolsonaro é homem com diploma universitário, branco, proprietário, com renda mensal superior a cinco salários mínimos e com idade situada entre 25 e 40 anos. Podemos chamar esse tipo ideal de eleitor de “Maicon”.
Já o eleitor típico de Haddad é eleitora. É mulher, é preta, com ensino fundamental incompleto e com renda mensal inferior a um salário mínimo. Vamos chamar esse tipo ideal de “Dona Nísia”.
Maicon vota em Bolsonaro e Dona Nísia vota em Haddad.
Agora, podemos avançar na discussão e apresentar outras perguntas: por que Maicon vota em Bolsonaro? Por que Dona Nísia vota em Haddad?
Maicon vota em Bolsonaro, principalmente, porque é proprietário e está assustado com a violência urbana, que nas pesquisas de opinião é apresentada como o segundo maior problema do Brasil, perdendo apenas para a saúde.
Alguns companheiros e companheiras se limitam a colar o rótulo de “fascista” em Maicon. Não me contento com atalhos argumentativos.
A percepção da insegurança é especialmente forte junto aos proprietários, e por um motivo bem óbvio: quem tem propriedade tem mais a perder com a violência urbana.
É claro que há outros elementos que formam a decisão eleitoral de Maicon: moralismo comportamental, machismo, homofobia. Mas o fundamental mesmo é o poder de sedução da utopia autoritária representada por Jair Bolsonaro, que se manifesta na tópica “bandido bom é bandido morto”.
Para Maicon, a imagem do bandido é personificada no homem preto e jovem que lhe assaltou na semana passada. Maicon está convencido de que se Bolsonaro for eleito esse tipo social será exterminado e, com isso, sua propriedade estará protegida.
Já Dona Nísia lembra com clareza o que aconteceu no governo Lula.
Segundo as Nações Unidas, as mulheres chefiam 92% das famílias assistidas pelo Bolsa Família. Entendem, leitor e leitora? 92%! O Bolsa Família significa o empoderamento da mulher pobre. A Dona Nísia sabe disso, e sabe muito bem.
Segundo dados do governo federal, as mulheres são proprietárias de 89% das unidades habitacionais financiadas pelo programa Minha Casa Minha Vida. Aquela mulher pobre, vítima de violência doméstica, que era obrigada a morar com o agressor porque não tinha para onde ir, foi empoderada pelo Minha Casa Minha Vida.
O que podemos tirar disso tudo?
Maicon vota em Bolsonaro movido pela expectativa de que o problema da violência urbana será resolvido por um governo autoritário e violento. Dona Nísia vota em Haddad porque já viveu a experiência do empoderamento, proporcionada pelas políticas públicas desenvolvidas e intensificadas pelos governos petistas. Os dois estão convictos dos seus votos. Não mudarão, não importa o que aconteça.
Sim, leitor e leitora. Sem dúvida, vivemos um ambiente de polarização. Lulismo X Bolsonarismo; Petismo X Antipetismo.
Mas a verdadeira polarização se dá mesmo entre Maicon e Dona Nísia. É conflito racial, é disputa entre gêneros. É, antes de qualquer coisa, luta de classes, a velha luta de classes. Desde sempre, a história humana é a história da luta de classes.
Agricultura quilombola desenvolvida na Casa de Cultura Fazenda Roseira que foi destruída pelo incêndio Foto: Fabiana Ribeiro
… “Mato seco pegou fogo
Mamoeiro ficou de pé, mamoeiro ficou de pé
Se é fogo morro acima
Ou tu fica ou dá no pé, se é mamoeiro fica em pé
Se é água morro abaixo
Ou tu fica ou dá no pé, se é mamoeiro fica em pé ”…
(Ponto de jongo da Comunidade Dito Ribeiro, Campinas)
Resistir, persistir, prosseguir e unir para que todos e todas façam aquilo que uma única pessoa não consegue fazer sozinha, assim é a Comunidade Jongo Dito Ribeiro, guardiões do legado do Jongo do Sudeste que é patrimônio imaterial da cidade de Campinas (SP).
A Comunidade Jongo Dito Ribeiro está fazendo uma campanha para a doação de mudas de diversas espécies, e promoverá nos dias 1 e 2 de setembro um mutirão para replantio nas áreas que foram destruídas pelo incêndio no mês de junho, no local ocupado pela Casa de Cultura Fazenda Roseira.
A Casa de Cultura Fazenda Roseira é gestada pela comunidade e abriga inúmeras ações culturais e educativas promovidas pela comunidade. As ações que tem como eixos a cultura, a história, a mitologia e o meio ambiente em uma perspectiva afro-brasileira, no local funciona também o Centro de Referência dos Jongueiros e Jongueiras do Sudeste.
Esse rico patrimônio foi ameaçado no final de junho (26) por um incêndio que consumiu parte da APP (Área de Preservação Permanente), quase toda da plantação da comunidade e por pouco não atingiu um dos casarões do complexo da Casa de Cultura Fazenda Roseira. A comunidade desenvolve a agricultura quilombola no local, que é uma prática baseada nos saberes e fazeres da cultura de matriz africana, respeitando o tempo de produção de cada cultivo, não se utiliza nenhum tipo de agrotóxico para controle da vegetação espontânea e nem para o controle de pragas.
O prejuízo causado pelo incêndio foi grande, a plantação de legumes, de feijão, a horta e as árvores frutíferas foram destruídas em quase sua totalidade, restando algumas bananeiras e um mamoeiro. Apesar de controlado, o incêndio iniciado no entorno da Casa de Cultura demonstrou a vulnerabilidade do local , segundo Bianca Lúcia Lopes, coordenadora geral da casa. “ Não temos cerca, não temos segurança . Se fosse durante a noite, o fogo teria atingido a casa” declarou. O alambrado que cercava a Casa de Cultura Fazenda Roseira foi roubado meses atrás.
Para a ação restauro do plantio, a Comunidade Jongo Dito Ribeiro precisa e conta com voluntários para a doação de mudas (preferencialmente) ou sementes de diversas espécies de hortaliças, ervas, legumes e frutas ( lista completa no final da matéria). A colaboração também pode ser realizada por meio da doação de mudas de primaveras que serão utilizadas para o cercamento da área pertencente a Casa de Cultura Fazenda Roseira. Os voluntários também poderão ajudar na atividade de plantio das áreas, ou com doação de gansos para servirem de alerta a invasores e auxiliarem na segurança do espaço ocupado pela casa de Cultura Roseira.
Os gansos são aves consideradas territorialistas, característica que faz com que o animal não responda com tanta facilidade a estímulos que podem torná-lo dócil. Dessa forma, são altamente utilizados para fazer a segurança de locais diversos.
O quê doar?
100 – Mudas de Primavera – Urgente/ para o cercamento
Mudas de Hortaliças – Replantio
100 – Alface
100 – Rúcula
100 – Chicória
100 – Couve
100 – Agrião
100 – Cebolinha
50 – Salsinha
50 – Salsão
50 – Coentro
50 – Mostarda
Ervas – Replantio
50 – Alecrim
50 – Orégano
50 – Arruda
50 – Manjerona
50 – Manjericão
50 – Alfazema
50 – Hortelã
50 – Colônia
50 – Poejo
50 – Cidreira
50 – Erva Doce
50 – Cana Do Brejo
50 – Quebra Pedra
Legumes e Frutas – Replantio
50 – Tomate
50 – Chuchu
100 – Bulbos Inhame
100 – Bulbos Cará
100 – Manivas de Mandioca
30 – Abacaxi
30- Limão
30 – Laranja
30 – Jabuticaba
100 – Mudas de Banana
30 – Acerola
10 – Gansos para Preservação da área
Como doar?
As doações poderão ser levadas diretamente na Casa de Cultura Fazenda Roseira ( Rua Domingos Haddad, s/nº – Residencial Parque da Fazenda – Campinas SP – de terça à sexta-feira das 10 às 17h ), mais informações e contato pelos telefones (19) Alessandra Ribeiro 19 99134 3922, Maira 19 99409 5247, ou ainda pelos e-mails : alejongo@gmail.com ou mai17.silva@gmail.com.