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  • EXCLUSIVO: Prisão de lideranças do movimento de moradia é conluio entre promotores e policiais

    EXCLUSIVO: Prisão de lideranças do movimento de moradia é conluio entre promotores e policiais

    Jornalistas Livres obtiveram de fonte sigilosa peças fundamentais do inquérito policial que correu em segredo de Justiça e que levou à prisão temporária, no dia 24 de junho, de quatro lideranças de movimentos de moradia de São Paulo: Ednalva Silva Franco Pereira e Angélica dos Santos Lima (do Movimento de Moradia para Todos), e Sidney Ferreira Silva e Janice Ferreira Silva (a Preta Ferreira), do Movimento dos Sem Teto do Centro (MSTC).

    As prisões de outras cinco pessoas, entre elas Carmen Silva Ferreira, a protagonista do filme “Era o Hotel Cambridge” (2016), também foram pedidas e concedidas pelo juiz Marco Antonio Martin Vargas, que autorizou ainda buscas e apreensões em endereços de 17 dirigentes de movimentos. Todos os alvos dos mandados de prisão e de busca e apreensão, segundo a polícia, são suspeitos de associação criminosa e extorsão, por cobrarem “aluguéis” entre R$ 200 e R$ 400 nas ocupações que coordenam.

    A investigação que levou às prisões foi uma resposta à tragédia ocorrida no dia 1º de maio de 2018, quando o edifício Wilton Paes de Almeida, ocupado por pobres sem teto, acabou consumido por um incêndio e desabou, deixando nove mortos. Ananias Pereira dos Santos, alvo de mandado de prisão ainda não cumprido, era coordenador do MLSM (Movimento de Luta Social por Moradia), que comandava a ocupação no Wilton Paes.

    Prisão de lideranças pretas e pobres, baseada em acusações sem provas, sabe-se, é parte da herança escravocrata do Brasil e de um sistema de Justiça que nasceu para naturalizar a obscena exploração de negros e índios escravizados. Mas, neste caso, a perseguição não se deu ao trabalho nem ao menos de honrar os frufrus do discurso jurídico, que sempre ocultam natureza racista dos operadores do Direito neste país.

    Carmen da Silva Ferreira, durante a luta por moradia (Foto: Christian Braga / Jornalistas Livres)

    O pedido de prisão assinado pelo delegado André Vinicius Alves Figueiredo, da Divisão de Investigações Gerais do Deic (Departamento Estadual de Investigações Criminais), é uma vergonha. Repleto de erros de português, peca por tentar juntar movimentos de moradia muito diferentes entre si em uma só narrativa criminal.

    Enquanto o MSTC de Carmen Silva Ferreira e de Preta Ferreira, por exemplo, organiza ocupações exemplares, com elevados padrões de higiene e segurança, extintores e brigada de incêndio a cargo dos próprios moradores, portaria, atendimento em saúde básica e mental e cursos profissionalizantes funcionando nos prédios, entre outras benfeitorias, o sinistrado edifício Wilton Paes de Almeida era um depósito indigente de pessoas pobres –sem higiene, sem organização, sem privadas, sem água. As pessoas que viviam nos andares superiores eram obrigadas a fazer suas necessidades em baldes. E isso é apenas um detalhe.

    Eliane Caffé, Carmen Ferreira Silva, Daniela Thomas e Preta Ferreira
    Eliane Caffé, Carmen Ferreira Silva, Daniela Thomas e Preta Ferreira

    Mas não é apenas o erro de juntar movimentos tão diferentes entre si que transforma as prisões temporárias recém-decretadas em um escândalo. O delegado tenta criminalizar meras discussões entre vizinhos; extrai conversas de contexto, é pródigo em juízos de valor para atacar as direções das ocupações –para isso, baseia-se apenas em desabafos e bate-bocas sem consequências.

    Seria ridículo se não fosse trágico, porque implicou prender pessoas pobres, jogá-las no fundo de celas, privá-las sem justa razão do principal bem do ser humano, depois da vida: a Liberdade.

    Está lá, à página 7 da representação: “… ficou acertado que [o novo morador] deveria pagar a quantia de R$ 695,00 de calção”. Entendeu, não é? A Polícia Civil de São Paulo, por intermédio de sua divisão especializada no combate ao crime organizado, o DEIC, não se deu nem ao trabalho de revisar o texto. O delegado confundiu “caução”, que significa “garantia”, com “calção” (aquilo de ir à praia). Mas tudo bem, são só uns pobres sendo acusados, terá pensado a autoridade policial.

    Foi apenas dois dias depois de consumadas as prisões que os advogados dos acusados conseguiram acesso ao processo e, portanto, às acusações imputadas aos seus representados. Os quatro detidos, ressalte-se, são pessoas de bons antecedentes criminais, que sempre compareceram diante da autoridade policial quando solicitados, que vivem em endereços conhecidos, que possuem famílias e laços profissionais igualmente bem identificados.

    Mas o próprio delegado admitiu que a pressão da mídia “exigiu” que ele tomasse a providência de pedir a prisão temporária. E que pressão foi essa?

    No dia 5 de maio de 2019, há quase dois meses, o programa “Fantástico”, da TV Globo, publicou extensa “reportagem” baseada no mesmo inquérito que acabou levando às prisões temporárias realizadas nesta semana. Ao fim de 6 minutos de 41 segundos, uma eternidade, em se tratando de matéria televisiva, o “Fantástico” avisava: “A polícia deve pedir a prisão de 15 suspeitos”, por “participação em organização criminosa, extorsão e agressões”.

    “Tivemos de dar uma satisfação à sociedade”, disse o delegado André Vinicius Alves Figueiredo, depois de efetuadas as prisões. Ou seja: à Rede Globo, sempre ela –a mesma que exigiu e obteve a condenação e prisão de Lula, ancoradas, ambas, em um Judiciário e uma polícia antipovo.

    Visivelmente chateado e constrangido, o delegado não escondia a decepção por não ter conseguido mostrar, depois de cumpridos os mandados de busca e apreensão, nenhuma arma, nenhum grama de droga, nenhuma balança de precisão, daquelas que servem para pesar a cocaína –NADA–, aos jornalistas que o entrevistaram.

    “No [cine] Marrocos foi diferente”, disse ele, que participou, em 2016, da operação do Departamento Estadual de Repressão ao Narcotráfico (Denarc), que encontrou fuzis, carabinas e drogas escondidos num poço de elevador do antigo Cine Marrocos, ocupado por um movimento de moradia manipulado pelo PCC.

    Se tivesse lido com atenção os testemunhos prestados à polícia pelos moradores das ocupações dirigidas pelas lideranças agora presas, o delegado não teria passado pelo vexame que passou. Em 392 páginas de depoimentos, transcrições de escutas telefônicas e cópias de documentos, tudo o que se encontra são moradores dos prédios ocupados comentando se a taxa condominial está sendo bem aplicada ou não; reclamando que as lideranças pegam “pesado” com os inadimplentes (expondo-os, por exemplo, à execração dos “bons pagadores”), descrições de casos de desinteligências entre vizinhos; estratégias para fazer os inadimplentes honrarem os compromissos com a manutenção dos prédios etc. etc. Sobre a presença de drogas e armas –e apesar da insistência dos policiais nesse quesito—todos os moradores entrevistados negaram ter visto coisas desse tipo nas ocupações visadas. Um exemplo dessas negativas está nesse depoimento, constante à página 50 do caderno das “Peças”.

    Na falta de armas e drogas, a polícia investiu na maledicência (ação ou hábito de dizer mal dos outros; difamação, maldizer), como se isso fosse investigação. Para demonstrar uma suposta relação do Movimento Moradia Para Todos (MMPT) com o PCC, por exemplo, os arapongas da polícia citaram uma situação ocorrida no dia 23 de outubro de 2013, quando interceptaram uma conversa telefônica entre uma mulher e Ednalva Franco, uma das presas. No grampo, a mulher pergunta a Ednalva se uma família, que estava na calçada defronte a uma ocupação, poderia entrar para “tomar um banho”. As duas mulheres hesitam em autorizar, porque conhecem a família e sabem que um de seus membros poderia pertencer a uma facção criminosa. No final, Ednalva acaba autorizando o ingresso da família.

    Isso seria prova de algum ilícito? 

    Em outro grampo, Ednalva conversa com uma mulher sobre “um caso de uma criança que não estava conseguindo fazer xixi porque um cara lá da Mooca mexeu com ela”. Duas horas depois, o grampo registra outra conversa, em que outra mulher informa que “são três crianças…”: 

    “O cara se chama Henrique e trabalha aqui no estacionamento… eu quero que você chega logo, pra nós irmos lá que eu vou falar logo pros irmãos”. 

    É o suficiente para a polícia cravar, em seu relatório (sempre em mau português, ressalte-se): “Segundo os áudios captados a líder do movimento Ednalva em envolvimento com o crime organizado, que auxiliam no trabalho da manutenção da ordem nos imóveis ocupados e ratificação do poder de comando de Ednalva”.

    Como se a palavra “irmãos” fosse privativa do PCC. Como se os adeptos do Evangelho de Jesus, os evangélicos, por exemplo, não pudessem usar essa expressão. Diga-se, aliás, que uma das ocupações dirigidas por Ednalva tinha duas igrejas evangélicas instaladas no andar térreo. 

    No intuito de satanizar a liderança sem teto, a polícia fez questão de registrar outra conversa, em que Ednalva, a propósito de uma desavença a respeito do preço cobrado por um pedreiro que reformou os banheiros de uma ocupação, diz: “Antes, quando eu via uma pessoa morta, eu falava assim: oh! Meu Deus! Hoje eu falo: Vai pro inferno Satanás! Porque mexer com o ser humano… o ser humano é lixo… A gente tem de cortar o pescoço dessa raça mesmo.”

    Vergonha de investigação! Citar um desabafo numa conversa telefônica como se fosse a consumação de um ato violento! Cadê a agressão? Cadê a vítima? Cadê o B.O.? Cadê o exame de corpo de delito? Cadê uma mísera comprovação de que as mulheres foram às vias de fato? Quem nunca se exasperou e falou o que não devia diante de situação que julgou injusta? Onde está escrito no Código Penal que a pena para quem fala uma besteira é a prisão?

    Mas a palhaçada fica pior:

    Veja o texto policial:

    Na data de 16 de Agosto transato, às 18h43m41s, a investigada Ednalva Silva Franco liga para a investigada EPC e já no inicio do diálogo ela indaga: “Oi linda !” Deixa eu perguntar uma coisa: qual do foi o prazo que você deu pra o senhor Gilmar ? E assim EPC prontamente respondeu: “Um mês”. Na sequência Ednalva comenta que o indivíduo “… já deu mais problema ontem..” o problema em questão é que o Gilmar teria se utilizado de palavras de baixo calão e desferido impropérios contra uma outra moradora da ocupação, uma senhora de idade de prenome Fátima. Nessa conversa evidenciou-se que existe um regime ditatorial, onde os “governantes”, no caso as investigadas Ednalva e EPC decidem as regras e quem pode residir no local.

    Ou seja, segundo a polícia, a coordenação do movimento deveria deixar o senhor Gilmar xingar à vontade a senhora de idade de prenome Fátima!

    O ridículo não tem fim e o relatório da polícia prossegue:

    No dia 17 de Agosto transato, às 22h38m47s, Elizete liga para Ednalva e fala: “…então, estou com dois problemas… estou batendo de porta em porta e o povo não esta descendo…” Nesse ponto Ednalva diz: “Oh! Elizete. Então …você não tá sabendo coordenar, me desculpa minha amiga…você vai na porta da pessoa , já vai dizendo…É pra descer agora…É mandar não é pedir… Não sei qual a parte que você não está entendendo…..”, essa conversa se desenvolveu devido a uma reforma que houve no prédio e foi contratado uma caçamba para a retirada dos entulhos, sendo que os moradores não estavam atendendo a convocação para auxiliar na retirada do material a ser descartado.

    Sim, leitor, você entendeu bem: a polícia de São Paulo prendeu uma liderança do movimento de moradia porque exigiu que os moradores da ocupação ajudassem a retirar o entulho decorrente de uma reforma realizada no prédio.

     

    O vexame policial e do juiz que autorizou o assédio moral contra as lideranças acusadas e presas fica evidente quando se sabe que a Ocupação Nove de Julho, coordenada por Carmen Silva Ferreira e Preta Ferreira, cobra R$ 220 por mês dos moradores, dando-lhes em troca condições de vida, cidadania e de segurança que nem o Estado e nem a Prefeitura proveem. Para que se tenha uma idéia, na favela do Moinho, encrustada na região central da cidade de São Paulo, R$ 400 é quanto se cobra de aluguel de uma família, para que more em um barraco de 12 metros quadrados (3X4 metros, feito de madeira e lona). Sem direito a NADA!

    Artistas como Maria Gadu, Maria Casadevall, Chico César, Ana Cañas, Criolo, Eliane Caffé, Daniela Thomas, entre outras centenas, são entusiastas do trabalho de inclusão e cidadania realizado por nas ocupações do MSTC por Carmen e Preta Ferreira (que também é apresentadora do programa Lula Livre, produzido pelo comitê de apoio ao ex-presidente).

    Mas, como inexiste limite para o ridículo, o juiz plantonista Marco Antonio Martin Vargas, que apreciou o pedido de prisão temporária feito pelo delegado e concedeu nos casos mencionados, assim justifica sua decisão:

    “De fato, de acordo com a documentação existente nos autos de inquérito policial e o relato da D. Autoridade Policial, os crimes sob investigação são gravíssimos, gerando intranquilidade social que pode ser evidenciada pelo intenso temor de retaliação revelado pelas testemunhas protegidas que contribuíram para o desenvolvimento das investigações.”

    Intranquilidade, doutor juiz, é a cidade de São Paulo ter pelo menos 105,3 mil pessoas vivendo em situação de rua, conforme censo de 2018 feito pela própria prefeitura.

    Intranquilidade, doutor juiz, é esse número ser 66% maior do que a quantidade de pessoas abordadas na mesma situação em 2016, quando foram contabilizados 63,2 mil indivíduos, e 88% acima da de 2015.

    Intranquilidade, doutor juiz, é a taxa de desemprego na cidade de São Paulo: é de 15,4%.

    Intranquilidade, doutor juiz, é o Brasil ter 6,9 milhões de famílias sem casa e 6 milhões de imóveis vazios, e a Justiça fingir que não vê isso.

    Intranquilidade, doutor juiz, é a injustiça que a gente vê por aqui!

    #Liberdade para os nossos presos políticos!

    #Liberdade para Preta Ferreira!

    #Viva a Luta pela Moradia!

    #Viva a Luta por Direitos!

    LEIA AGORA OS DEPOIMENTOS DOS MORADORES DA OCUPAÇÃO NOVE DE JULHO, DIRIGIDA POR CARMEN E PRETA FERREIRA, DO MSTC :

    DEPOIMENTO ALEX FABIANO LEITE DOS SANTOS – VENDEDOR AUTONOMO, TRABALHA COM EVENTOS

    Quando eu cheguei pra morar numa ocupação foi logo no começo do Cambridge. A gente ocupou o Cambridge lá e antes disso eu morava numa situação bem-crítica porque eu morava num quartinho do fundo de uma sapataria. Quando eu fiquei sabendo dessa ocupação eu fui morar lá. Quando a gente chegou tinha um monte de entulho, o prédio tava bem-detonado mesmo. A gente conseguiu arrumar o prédio, deixou ele bem-bonitinho. Esse pessoal que acolheu a gente é um pessoal muito responsável, muito bom, que me tirou do fundo do poço e hoje em dia eu agradeço muito por estar aqui nessa ocupação.

    Eu nunca conseguiria pagar um aluguel fora daqui. Aluguel é muito caro, né, e nessa época que eu morava no fundo da sapataria eu ainda pagava uma taxa pro rapaz lá pra ajudar nos custos. Eu pagava em torno de R$ 250, R$ 280, aqui eu pago uma taxa pequenininha e graças a Deus eu moro bem.

    Essa taxa é pra investir em melhorias pro próprio prédio. Fizemos rede de esgoto que não tinha, eletricidade que não tinha, um monte de coisa. Pras crianças tem aula de inglês, aula de português, tem a biblioteca que eles estudam.

    Morar aqui mudou a minha vida totalmente. 

    Essas prisões são injustas, o pessoal está tentando reprimir uma coisa que é pro bem-estar da população. Eu nunca vi nada do que eles acusam acontecer aqui. Aqui é o oposto. A taxa que é cobrada aqui é igual qualquer condomínio, né. Você mora num condomínio você tem que pagar o custo que você mora, né. E aqui tem coisa pra ajudar a gente também. Quando tem os eventos aqui é uma coisa que me beneficia. Eu agradeço muito por isso porque posso vender minhas coisinhas aqui e conseguir uma renda.

    ADRIANA MENEZES – ARTESÃ

    Adriana MSTC

    Eu cheguei aqui junto com a minha tia porque a gente não estava conseguindo pagar aluguel e uma moça indicou esse lugar pra gente. Eu sou cadeirante e quando eu cheguei a ocupação não era nem um pouco acessível, eu vim aqui perguntar se tinha espaço e pediram pra eu voltar no dia seguinte. Quando eu voltei já tinha aquela rampinha ali de acesso pra eu entrar, antes mesmo de eu morar aqui. Com o valor da taxa aprovada em assembleia foi adaptado o banheiro para que eu pudesse entrar com a cadeira de rodas e fiquei num espaço maior pra poder me locomover melhor com a cadeira. Todo o espaço aqui foi adaptado para que eu possa ir e vir tranquilamente. Eu acho muito justa essa contribuição porque não tem como a gente ocupar um espaço que estava degradado e continuar morando do jeito que tava. A gente tem que mudar ele. Foi mudada a elétrica, a hidráulica e todo o resto. Está bem diferente de quando eu entrei aqui. Todas as decisões são feitas em assembleias. Os valores que a gente vai ter que gastar tem que ser aprovado e aí é tudo dividido com o todo mundo pra todo mundo saber detalhes de como vai ser gasto. A gente consegue ver as mudanças dia a dia.

    SHEILA SILVA SANTOS – DONA DE CASA E BOLEIRA

    Eu vim de uma cidade chamada Barreirinhas que fica a três horas de São Luiz, no Maranhão, e quando eu cheguei aqui em São Paulo eu vim pra morar com a minha prima. Pra morar e trabalhar com ela. Eu vim com meu marido e ele estava sem emprego. Ela falou que ia me pagar R$ 800 por mês, mas eu morei com ela três meses e esses R$ 800 ficou pela moradia e contas –ela nunca chegou a me pagar. Aí, depois, meu marido arrumou um emprego e a gente alugou um quarto aqui na Luiz Barreto, na Bela Vista, a gente pagava R$ 850 de aluguel e meu marido ganhava R$ 940 de salário. A gente sobrevivia com o vale alimentação dele que era de R$ 240. Depois eu mudei pra Zona Leste, na Penha, eu fui morar numa casa que também era R$ 800 de aluguel então não mudou muita coisa. Era bem difícil –a gente passava aperto mesmo, nunca chegamos a passar fome porque Deus é maravilhoso, mas a gente passava aperto. Depois que nosso filho nasceu ficou mais difícil ainda, tinha dia que eu não tinha dinheiro pra comprar fralda porque eu tinha que pagar o aluguel, senão o dono da casa pedia pra gente se retirar.

    A ocupação só me deu oportunidade, seja de me mostrar como boleira, pra mostrar o que eu aprendi a fazer na vida e conseguir oportunidades com isso. Os eventos que tem aqui dentro são uma oportunidade pra eu ganhar uma renda pra me ajudar no sustento da minha família. Hoje moro eu, meu marido e meus dois filhos.

    Teve uma época, logo que eu e meu marido chegamos na ocupação que nós dois estávamos desempregados e a gente ficou sem pagar por alguns meses e nunca ninguém da administração chegou a me ligar ou pedir pra eu me retirar.

    Aqui é tudo decidido por assembleia, qualquer coisa é colocada em votação. A taxa de contribuição que a gente paga é pras melhorias no prédio porque nós não recebemos ajuda de nenhum órgão, a gente que tem que se manter. Se a gente quer melhoria, se a gente quer viver num lugar melhor a gente que tem que fazer a reforma. Porque, de onde que a gente vai tirar dinheiro pra arrumar o prédio se a gente não tem ajuda? A gente, trabalhador de menor renda, tem de tirar do nosso salário que é bem pouco pra, em coletivo, melhorar o lugar que a gente mora.

    Eu nunca me senti extorquida. Ocupação pra mim é oportunidade. A gente não está aqui lutando só por moradia, a gente luta por saúde, educação e, lógico, por moradia. Aqui dentro eu nunca me senti enganada. Extorquida eu era quando eu pagava um aluguel de R$ 850 e não sobrava dinheiro pra comer, pra eu dar uma alimentação, uma fruta pro meu filho. Se eu não tivesse o dinheiro do aluguel o dono da casa ia lá, batia na porta, falava que se eu não pagasse no dia ele ia colocar minhas coisas na rua e que a gente tinha que sair no mesmo dia.

    Se eu não estivesse nessa ocupação talvez eu já tivesse voltado pro Nordeste porque eu não ia ter condição de pagar um aluguel e dar alimentação pra duas crianças. Aqui em São Paulo eu sou sozinha, eu e meu marido, não tenho mais parentes então a gente que tem que correr com tudo, é nós e nós mesmo. Quem acolhe a gente aqui é a ocupação.

    MARIA DAS NEVES – COSTUREIRA

    Eu cheguei na ocupação de uma forma milagrosa, porque eu tava andando pelo centro e vi na ocupação da José Bonifácio e tinha uma placa dizendo a quem estivesse sem moradia: “Junte-se a nós”. Aí eu entrei pra ver como era e a porteira me deu todas as orientações, falou do grupo de base. Eu não dei muita conversa, mas pagar aluguel ficou muito difícil. Aí fiquei sabendo que ia ter a ocupação, mas eu não queria ir porque eu achava que em ocupação só tinha gente louca. Eu não tinha nenhum conhecimento e quem não tem conhecimento fala essas coisas, né. Mas, como as coisas estavam muito complicadas por causa do preço alto do aluguel, eu tentei, né. Foi a época que ocupou o Cambridge, aí eu entrei e fiquei até hoje.

    Antes eu morava na Zona Sul, era uma casa não muito grande e eu pagava R$ 700 mais água e luz. Com o tempo foi aumentando o valor do aluguel e a família era grande, só eu trabalhava. Foi complicando, né, tive que começar a dar prioridade ao aluguel pra não ir pra rua e diminuí as outras coisas. Até a alimentação você vai racionando cada vez mais pra não ter que morar na rua. Lá morava eu e mais quatro netos e só eu provia tudo, né. Hoje mora aqui na ocupação eu, um neto e uma bisneta. Os outros já estão com as mães morando aqui na ocupação também.

    Morar numa ocupação fez muita diferença na minha vida, uma das mudanças foi a situação financeira porque a gente se endivida muito quando paga aluguel porque fora ele ainda tem outras contas que a gente tem que pagar e eu não tenho uma renda fixa. Vindo pra cá, diminuiu esse valor que eu gastava com moradia que chegava a quase mil reais, então melhorou bastante.

    A gente dá uma contribuição de R$ 220 e esse dinheiro é revertido pra melhoria do prédio. Esse dinheiro é colocado na administração. Esse dinheiro é pra água, luz e reforma do prédio. Tem uma administração que cuida desse valor pra gente e quando precisa a gente se reúne. Agora mesmo, a gente teve que fazer várias reformas nesse prédio, de elétrica, de água, de varias coisas.

    Quando a gente chega num prédio desses ele tá bem-destruído e agora a gente vê que ele tá bem melhor. Nosso espaço que nós vamos morar, dentro da nossa casa, é arrumado por nós porque nada mais justo que a gente fazer do nosso jeito pessoal, mas o coletivo, como a luz, a água, o melhoramento das escadas, a iluminação do prédio, essas coisas tudo que é necessário pro prédio é decidido em coletivo. Toda vez que tem que comprar material ou alguma coisa a gente se reúne e decide.

    As crianças aqui tem muita coisa pra fazer, eu não sei nem se em um prédio de condomínio aí as crianças tem tanta coisa pra fazer. Aqui as crianças tem reforço escolar, tem brinquedoteca, tem gente que vem de fora pra ajudar as crianças a desenhar. Se você subir um pouco você vai ver vários quadros feitos pelas crianças. As crianças tem bastante diversão. Já tivemos capoeira, vários esportes, tem quadra pra brincar. Tem as festinhas do Dia das Crianças e do Natal, tem muita coisa pra se divertir.

    As pessoas me perguntam como faz quando alguém não consegue pagar, quando tá desempregado. Ninguém vai ficar desempregado a vida toda, né?! O difícil é você se trancar e ninguém saber que você tá nessa situação. Como eu, os outros moradores ou a administração vamos saber que você tá precisando de alguma coisa. Aqui nós vivemos em coletivo, a gente precisa conversar. Se você tá desempregada, isso acontece com todo mundo, mas aí você tem que chegar lá na administração e falar que não tá podendo contribuir. Quando você fala que não tá podendo contribuir você já comunicou, aí todo mundo já sabe da situação e vamos aguardar você conseguir um emprego pra poder contribuir.

    A gente tem que contribuir porque como que a gente vai morar num lugar melhor se ninguém ajudar? A gente não tem ajuda de nenhum órgão público. Então, é mantido pelos moradores. Os moradores que mantém. Porque, quando a gente ocupa um prédio, a gente já vem sabendo que ele tá sujo, que ele tá deteriorado, que ele tá precisando pelo menos de limpeza pra que você habite. Até a limpeza a gente precisa de um dinheirinho. Como que a gente vai comprar material de limpeza, vai comprar vassoura…

    São essas coisas que a gente precisa se juntar e construir juntos. Eu tô dando um exemplo mais simples, imagine chegar e comprar lâmpadas, comprar tinta, comprar canos… Todos esse material é caro e é por isso que damos essa contribuição. E é tudo combinado em assembleia. No caso das luzes, antes que se coloquem luzes no prédio, é feita uma assembleia geral pra explicar como é que vai conseguir melhorar o prédio. Tem material que é bem maior, que é caro, tipo material elétrico: o preço é bem elevado. A mão de obra é das pessoas que moram.

    Aqui tem eletricista, tem encanador, tem as mulheres que pintam as paredes, que cuidam da limpeza. Todo mundo se junta e é com esse dinheiro da contribuição que a gente faz a melhoria do lugar que a gente mora.

    Eu nunca presenciei cobrança com violência, nem ameaça de nada. Mas tem gente que vai embora pra não pagar, mas não é que sejam expulsos, é que eles não querem, falam que não vão contribuir porque é ocupação e aí os próprios moradores não aceitam. Eu mesma não aceito, não que eu vá brigar pra ele ir embora, mas eu digo assim, nós estamos num coletivo, nós viemos de um grupo de base orientado que quando a gente chega aqui nós que vamos reformar o nosso espaço, nós que vamos contribuir pra isso.

    Eu trabalho, eu usufruo de tudo, eu moro, eu tomo banho, eu uso a energia, eu uso água, como que eu não quero contribuir????

  • Presa por defender o direito à moradia

    Presa por defender o direito à moradia

    A cantora, atriz, e liderança do MSTC (Movimento Sem Teto do Centro), coordenadora da ocupação 9 de julho, uma das mais charmosas e culturalmente ativas do centro paulistano, está detida no Deic desde a manhã desta segunda-feira, dia 24 de junho.

    A polícia civil investiga supostos casos de extorsão que seriam promovidos por lideranças de alguns edifícios ocupados no centro – eles cobrariam aluguéis em nome de benfeitorias e manutenção dos edifícios. O Wilson Paes, prédio que desabou em maio do ano passado no Largo do Paissandu, é uma das ocupações investigadas.

    Ocorre que o processo traz como principal suspeito o nome de Ananias “e outros”, sem especificar quais seriam esses outros suspeitos e nem de qual movimento eles fariam parte. As prisões, portanto, estão sendo feitas de maneira aleatória e arbitrária. Movimentos históricos de moradia estão sendo tratados como organizações criminosas.

    O movimento do qual Preta faz parte, o MSTC, é liderando por sua mãe, Carmen Silva, e suas ocupações são reconhecidas internacionalmente, participando, inclusive, das bienais de arquitetura de Chicago, Nova Iorque e Veneza.

    A ocupação do Hotel Cambridge foi palco do filme “Era o Hotel Cambridge” da cineasta Eliane Café, premiado em vários festivais, entre eles os de San Sebastian, na Espanha, e Crèteil, na França.

    No ano passado, Carmen foi inocentada justamente da mesma acusação, a de cobrar aluguéis indevidos.

  • Parabéns às autoridades: o homem morreu queimado porque era pobre!

    Parabéns às autoridades: o homem morreu queimado porque era pobre!

    ACABA DE MORRER O homem pobre, sem nome, sem casa, sem direitos, que vivia na Favela do Cimento, na Avenida Radial Leste, incendiada na tarde de sábado (23), quando agentes da GCM entraram na comunidade tocando o terror.

    A GCM apareceu antes do término do prazo dado pela juíza para a saída dos sem-teto, que expirava às 6h de hoje, domingo, gerando uma grande revolta entre os pobres.

    Um homem morreu. Como a Prefeitura não providenciou nem sequer ambulâncias para a reintegração, o homem foi andando, sua pele queimada pendurada como se o corpo fosse um varal de trapos. As solas dos pés dele, em carne viva, deixaram um rastro de sangue pela rua.

    O motorista da ambulância estacionada em frente ao hospital contou aos Jornalistas Livres que nunca viu cena igual. As pessoas na porta do hospital gritavam de horror ante a passagem do morto-vivo.

    Hoje o coração parou de bater.

    Vocês não fizeram nada para evitar a tragédia. Mas podem pelo menos tentar ajudar os demais moradores da favela, inclusive várias mulheres grávidas e crianças e bebês, que estão espalhados, assustados e sem assistência alguma andando pelas ruas da Mooca, na zona leste de São Paulo.

    A crise humanitária está aqui, bem ao lado de nós!

     

    Um homem pobre, miserável, morreu hoje à tarde, vítima de uma Justiça, de uma Prefeitura, de uma polícia, que não olha para a realidade triste dessas vítimas de um País sem Esperança!

    Nota oficial:
    O Hospital Salvalus informa que na noite deste sábado (23), às 20h31, registrou a entrada de um paciente sem qualquer identificação, vítima do incêndio que atingiu a favela no entorno do Viaduto Bresser. 
    O paciente com queimaduras foi prontamente assistido por nossas equipes e ficou internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) em estado grave. No início da tarde deste domingo a vítima não resistiu e faleceu em decorrência de complicações das queimaduras. O corpo foi encaminhado para o Instituto Médico Legal. 
    O Hospital Salvalus se solidariza e lamenta o ocorrido.

  • Dona Carmem, líder da luta por Moradia, é absolvida de acusação injusta e infamante

    Dona Carmem, líder da luta por Moradia, é absolvida de acusação injusta e infamante

    O juiz Marcos Vieira de Morais, da 26ª Vara Criminal de São Paulo, absolveu a dirigente do movimento de moradia Carmem da Silva Ferreira do crime de extorsão contra moradores da ocupação do Hotel Cambridge. Segundo o magistrado, as provas apresentadas, e que visavam a provar que Carmem ameaçava moradores para obter ilicitamente benefícios financeiros, não foram eficazes para gerar uma condenação.

    “Com efeito, o quadro probatório é conflitante e inconcludente, sendo insuficiente para comprovar que a acusada realmente exigiu, mediante violência ou grave ameaça, das vítimas protegidas Alfa e Beta os valores mencionadas na denúncia e seu aditamento, muito menos que obteve para si ou para outrem vantagens econômicas indevidas.”

    O juiz ensinou em sua sentença de 88 páginas:

    “É patente a impossibilidade de configurar a extorsão, neste caso, quando a [suposta] vítima não se comporta como se atemorizada estivesse, tampouco sofre as consequências que sustentou ser inexoráveis. Oras, não se tipifica a extorsão, se a vítima não ficou atemorizada.”

    Em outro ponto da sentença, o juiz apontou a falta de “credibilidade” na “prova da acusação”. Ele escreveu:

    “As contradições e divergências existentes na prova da acusação, desprestigiam a sua credibilidade, mormente se confrontadas com o valor probante advindo das oitivas das testemunhas de defesa inquiridas no contraditório judicial, assim como do convincente interrogatório da acusada.”

    “Se, para o recebimento da denúncia, exige-se apenas a narrativa geral da imaginada e suposta empreitada criminosa, no julgamento derradeiro deve revestir-se o decisum de fundada certeza, a partir dos elementos probatórios, de que a denunciada concorreu para a prática das infrações penais a ela imputada, e em qual medida se deu tal a sua participação.”

     

    O xeque-mate veio nesta frase, extraída da melhor jurisprudência:

    “A verossimilhança, por maior que seja, não é jamais a verdade ou a certeza, e somente esta autoriza uma sentença condenatória. Condenar um possível criminoso é condenar um possível inocente”.

    (Ainda bem que nem todos os juízes são seguidores da estapafúrdia tese Lava-jatista, segundo a qual convicções podem substituir provas…)

    A defesa de Carmem foi feita pelos advogados especialistas em Direitos Humanos e Movimentos Sociais, Ariel de Castro Alves e Francisco Lucio França. Para eles, o objetivo da promotoria, que apresentou a acusação, foi tão somente “criminalizar os movimentos de moradia”.

    “As contribuições dos moradores são de fato recolhidas na ocupação, mas nunca em benefício de Carmem ou de seus parentes, mas sim porque são essenciais nas ocupações para a manutenção dos locais ocupados, já que viabilizam reformas, limpezas, projetos habitacionais e segurança, inclusive para evitar tragédias como a que ocorreu no ano passado na ocupação do edifício Wilton Paes, no Largo do Paissandu. A absolvição de Carmem consiste em decisão importante e emblemática contra a criminalização dos movimentos sociais e de moradia!”, afirmou Castro Alves.

    Jornalistas Livres, que acompanham de perto a trajetória de Carmem da Silva Ferreira e da Frente de Luta por Moradia, desde 2015, jamais presenciaram qualquer atitude que desabonasse a grande dirigente. Parabenizamos, portanto, o movimento social por esta importante vitória na Justiça. Seguiremos juntos porque, como diz o lema sempre lembrado nas ocupações, “Quem Não Luta Tá Morto!”

  • Ocupação 9 de Julho: o melhor lugar para assistir à eleição de Bolsonaro

    Ocupação 9 de Julho: o melhor lugar para assistir à eleição de Bolsonaro

    Nos últimos 20 dias os Jornalistas Livres montaram sua base no prédio do antigo INSS, região central de São Paulo, que foi tomado por 200 famílias. Na Ocupação 9 de Julho vivem há dois anos quase 450 mulheres, homens, crianças, velhos e adolescentes. São alegres, organizados e resilientes. Acolhidos por eles, trabalhamos em uma sala ampla que virou estúdio e redação. Durante 280 horas produzimos conteúdos sobre as eleições, pautando a cobertura da campanha de Fernando Haddad que a velha mídia e a mídia servil não enxergaram. Não havia lugar melhor para ouvir o nome do próximo presidente do Brasil, Jair Bolsonaro.

    Primeiro, as pessoas choraram diante de um telão onde acompanhavam a apuração. Não demorou para a decepção dar lugar ao consolo. E à resistência. Todos se juntaram no pátio, onde acontecia uma festa que comemorava o aniversário da ocupação e a democracia. “Dona Carmen vai falar, arrumem um lugar para ela subir”, diz um morador. Apareceu uma cadeira de plástico. Carmen da Silva Ferreira, 58 anos, oito filhos, é líder da comunidade ligada ao MSTC, e pode ser considerada o retrato da força bruta, terna e teimosa da mulher brasileira que nunca se deixa deter. Seu primeiro endereço na capital paulista foi a rua. Veio da Bahia, escapando da violência doméstica, e logo aprendeu a organizar as pessoas que sofrem como ela.

    Foi importante estar ali para receber o resultado das eleições. Fernando Haddad e Manuela terminaram vitoriosos pela campanha que fizeram, pelos 47.038.966 de votos que obtiveram. O fim não é hoje.

    Ouvir Carmen é restaurador: “Estamos vivendo o retrocesso no Brasil. Mas não vamos cair no retrocesso deles. Faremos nossa resistência, como sempre fizemos. Não é com arma, como o senhor Bolsonaro declarou. Vai ser com a voz, com o canto. Vai ser com amor, porque somos uma família. Aqui está a verdadeira família, a que ama independentemente de classe, de cor, de sexualidade. E vamos mostrar que ele vai ter que nos exterminar, porque a nação é feita de 80% de pessoas que trabalham duro, como nós. Tudo tem sido difícil, nada para nós veio de graça.”

    Carmen sentiu-se mal e desmaiou. Sua filha Preta Ferreira, 32 anos, tomou a palavra: “Nada mudou. Um vai cair, o outro se levanta. Mataram Marielle, o mestre Moa e nós estamos aqui”. A emoção tomou conta das pessoas, mas elas continuaram atentas. Preta afirmou: “Que sirva de lição. Quem não escutou: ‘Cuidado’, agora vai ouvir: ‘Coitado”. Ela sugeriu que ficassem unidos e que entendessem que a minoria, na verdade, é a maioria. “Ninguém vai anular nossa existência. A gente vai combater o mal com amor.” Palavras de ordem foram lembradas: “O povo unido jamais será vencido”, “Lula Livre”, “Aqui está o povo sem medo de lutar”, “Quem não luta tá morto”… Alguém gritou: “Nós seremos a maior oposição que o Brasil já viu”.

    Dona Carmen, recuperada do mal-estar, volta a discursar: “Eles estão achando que vamos sair por aí depredando. Temos sabedoria. Não vão tirar nossa inteligência. Vamos reformar os quilombos, andar de mãos dadas, mostrar que somos um povo legítimo.”

     

    Preta Ferreira ao centro. Foto Christian Braga Jornalistas Livres

    Foram de muito aprendizado os 20 dias que passamos na ocupação, comendo na cozinha onde Sheila, uma moradora, preparava arroz, feijão com louro e outras comidas de sabor inesquecível. Bolsonaro terá que ser o presidente de Sheila, Carmen, Preta, de um povo que não aceita mais o anonimato, a exclusão, que saiu do armário, que não se envergonha de ser negro, que chegou à universidade, aprendeu a lutar por moradia. Um povo que se levanta, como disse Preta, de qualquer adversidade, da derrota política.

    Os 20 dias de cobertura vão ficar na memória do público que carinhosamente nos acompanhou e acreditou na verdade das nossas publicações. Os Jornalistas Livres vão guardar para sempre a acolhida na Ocupação. E a história da comunicação no Brasil tem um novo capítulo sobre a guerrilha travada para furar bloqueios e registrar a mais difícil campanha da esquerda depois da redemocratização do país. Cada jornalista livre vai para a casa agradecendo o banho de cidadania e coragem que tomou aqui. Salve Dona Carmen, que deu o rumo para a resistência sábia que teremos de fazer. Sem afastar um milímetro da defesa das conquistas que tivemos até aqui. E, se prevalecer entre nós o espírito dos moradores da Ocupação 9 de Julho, vamos erguer a cabeça e encarar o que vem por aí.

    Assista o vídeo do depoimento de Carmen da Silva Ferreira.

    Patrícia Zaidan é autora do texto, que traduziu o sentimento de todos nós, Jornalistas Livres.

     

  • Festival O POVO PODE: não dá pra perder!

    Festival O POVO PODE: não dá pra perder!

     

    Por Santiago Gómez, especial para os Jornalistas Livres

     

    A Ocupação 9 de Julho, do Movimento Sem Teto do Centro (MSTC), organiza o Festival “O povo pode”, para debater a conjuntura atual do Brasil, desfrutando da comida elaborada pelxs moradorxs na Cozinha da ocupação. A programação será intensa durante os dias 29 e 30 de setembro, com rodas de conversas, das quais participarão Valeska Teixeira Martins, advogada do Lula; a jornalista Laura Capriglione, dos
    Jornalistas Livres, entre outros convidados. O festival terá intervenções artísticas, shows e atividades para crianças. E põe artista legal nisso! Ana Cañas, Maria Gadú, As Baianas e a Cozinha Mineira, entre outrxs.

    O lugar mais lindo do mundo existe e fica em São Paulo – Foto de Marlene Bergamo

    O Festival é uma parceria entre a Ocupação 9 de Julho e agentes que compartilham a luta por causas sociais e democráticas, com o objetivo de criar um espaço de reflexão e troca de experiência sobre cultura, política e conjuntura atual; com atores que participam da luta dentro de movimentos sociais, coletivos artísticos, na disputa dentro do judiciário, a mídia, as universidades. O Festival também é uma oportunidade para divulgar a websérie e documentário de mesmo nome: O povo pode, de Max Alvim.

    Durante a tarde dos dois dias acontecerão mesas de debate, compostas por três convidados, que sempre serão mediadas por moradorxs da Ocupação. “Podemos como?” será a questão que vai perpassar todas as mesas, para poder ouvir histórias de experiências e não ficar só numa análise teórica ou intelectual sobre os problemas abordados. É por esse motivo que os convidados são pessoas envolvidas ativamente nos espaços nos quais agem.

     

    ANOTA O ENDEREÇO AÍ! Rua Álvaro  de Carvalho 427, Bela Vista. É só chegar!

     

    No sábado, serão as mesas: Resistência artística; Direito à Moradia; e Morar sem teto dentro e fora do movimento, na qual três mulheres da ocupação compartilharão a experiência de viver dentro de uma organização social, articulada sobre a solidariedade e a luta. Nos intervalos entre as mesas, se desenvolverão intervenções artísticas, com a participação de: Ilú Oba de Min, Ave Terrena, Mag Alegria, Renata Soares, Teatro O de Casa, Thaisa Barbosa, Anhaia x Prestes – Experimento Teatral”, Ava Terrena,  Flora Florentina, entre outrxs artistas. No domingo acontecerão as mesas: Mulheres peitando o golpe; Golpe sobre as minorias maiorias; e Democracia em risco.

     

    O Festival terá um espaço lúdico para crianças e adolescentes, que acontecerão na Brinquedoteca da ocupação. Rodrigo Bueno desenvolverá uma oficina para crianças. Mario Deganelli e Liz Mantovani apresentarão o Espetáculo de Contação de Histórias “Rosa e Tempo”. Haverá também uma roda de conversa sobre sexualidade e uma oficina sobre a Construção de Mapas Afetivos.

     

    Também contará com uma dinâmica de conversa aberta chamada Aquário, na qual serão debatidos “A comunicação como produção de um ‘comum’, no dia 29; e os “Desafios para a mídia: verdade ou mentira; compromisso ou isenção; como a política é indissociável da comunicação”, no dia domingo 30. No Aquário, as temáticas começarão ser discutidas pelxs convidadxs, mas com a possibilidade de interação direta do público, que pode tirar um dos participantes e ficar no seu lugar para dar continuidade ao debate. Entre os convidados estão: Kiko Nogueira, do Diário do Centro do Mundo; Luiz Augusto de Paula Souza (Tuto), prof. titular da FaCHS e assistente para assuntos de Comunicação da Reitoria da PUC-SP

     

    Alma de bronze

     

    Na Ocupação 9 de Julho está acontecendo a exposição “Alma de bronze”, da artista Virginia de Medeiros. Em uma série de fotografias e depoimentos em vídeo, a exposição estabelece um diálogo – artístico, mas também existencial – com as militantes do MSTC. As fotografias foram colocadas em cada andar da ocupação, até chegar ao 14º andar, onde será possível ouvir as histórias das militantes, como foi que perderam o teto ou que chegaram na ocupação, e todas as dificuldades que tiveram de atravessar.

     

    Programação

    Endereço: Rua Álvaro de Carvalho, 247, Bella Vista.

     

    MESAS E RODAS DE CONVERSA:

     

    Sábado 29 de setembro

     

    14hs: Resistência Artística.

    15:30h: Direito à Moradĩa.

    17hs: Morar sem teto dentro e fora do movimento.

     

    Domingo 30 de setembro

     

    14hs: Mulheres peitando o golpe

    15:30hs: Golpe sobre as minorias maiorias

    17hs: Democracia em risco

     

    Aquário

     

    O Festival contará com uma dinâmica de conversa aberta grupal chamada Aquário, na qual serão debatidos No Aquário, as temáticas começarão ser discutidas pelxs convidadxs, mas com a possibilidade de interação direta do público, que pode tirar um dos particpantes e ficar no seu lugar para dar continuidade ao debate.

     

    Sábado 29 de setembro

     

    15:30 hs: A comunicação como produção de um “comum”

     

    Ricardo Teixeira

    Rogério da Costa

    Fabi Borges

     

    Domingo 30 de setembro

     

    15:30hs: Desafios para a mídia: verdade ou mentira; compromisso ou isenção; como a política é indissociável da comunicação

     

     

    Kiko Nogueira (Diário do Centro do Mundo)

    Luiz Augusto de Paula Souza (Tuto), Professor da FaCHS e assistente para assuntos de Comunicação da Reitoria da PUC-SP

    Max Alvim, Diretor de Cinema

     

    Shows:

    Sabado 29 de setembro

     

    Yanamoano

    Arismar do Espírito Santo

    Aila

    Samba Alegria

    Tamoyos

    Zé Cafofinho

    Debora Critian

    Batuque Lara

    Dj Oriundo

     

    Domingo:

     

    Ana Cañas

    Fernanda Ayme

    Grupo Oh de Casa

    Igor Veloso

    Pitayas e Zé Pereira

    As Bahias e a Cozinha Mineira

    Marcelo Preto

    Maria Gadu

    Thaisa Barbosa (performance)

     

    ANOTA O ENDEREÇO AÍ! Rua Álvaro  de Carvalho 427, Bela Vista. É só chegar!