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Categoria: Justica

  • Brasileiros contra o Golpe, POVOS INDÍGENAS QUEREM TERRA E VIDA

    Brasileiros contra o Golpe, POVOS INDÍGENAS QUEREM TERRA E VIDA

    ACAMPAMENTO TERRA LIVRE 2016 EM BRASILIA

    POVOS INDÍGENAS QUEREM TERRA E VIDA

    O Acampamento Terra Livre 2016, que reúne em Brasília mais de mil indígenas dos povos de todo o país instalou-se ontem (terça, 10) e começou hoje cedo. Haverá uma série de ações e protestos contra a falta de demarcação das terras dos povos originários e contra a repressão que tem se agravado enormemente nos últimos meses. Organizada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e apoiada por entidades da sociedade civil, a mobilização vai até esta sexta.

    Ontem, lideranças da Aty Guasu, grande assembleia dos povos Guarani e Kaiowá do Mato Grosso do Sul, ocuparam a sede da Fundação Nacional do Índio (Funai), em Brasília. Entre as reivindicações, está a publicação do relatório de identificação e delimitação da Terra Indígena (TI) Dourados-Amambaí Peguá I, na região do município de Caarapó, no sul do estado. “Esse papel que tá aqui pra ser assinado não tem vida, mas por causa dele nosso povo tá morrendo lá”, afirmou Elson Guarani e Kaiowá.

    TENTATIVA DE CRIMINALIZAR O CONSELHO INDIGENISTA MISSIONÁRIO (CIMI)

    Deputados que representam os fazendeiros matadores de indigenas no Mato Grosso do Sul fizeram uma CPI para criminalizar o Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Numa ação combinada de deputados estaduais do PR e do PSDB (sempre o PSDB), o relatório da CPI forjada na Assembleia Legislatica do MS foi aprovado numa sessão que durou exatos 5 minutos e 48 segundos! A manobra foi provocada porque a CPI teve por base uma pretensa investigaaçao da Polícia Federal que foi arquivada, por absurda. Em nota sobre o relatório preliminar do deputado Paulo Correa, o CIMI já havia denunciado:
    “Repleto de acusações e difamações requentadas e totalmente desprovidas de provas, eivado de opiniões pessoais e de classe, feito aos moldes dos interesses ruralistas, o relatório assemelha-se a um discurso político feito por candidato aos seus pares em período de campanha eleitoral.
    Consideramos que o conteúdo do relatório preliminar mostra-se inteiramente fantasioso na identificação dos reais motivos e da origem dos conflitos fundiários envolvendo os povos indígenas e latifundiários do estado do Mato Grosso do Sul e completamente ineficaz no que tange à proposição de soluções efetivas para tema.
    Lamentamos o tom desrespeitoso e grosseiro usado no relatório relativamente aos povos indígenas, à Igreja Católica, aos missionários que atuam junto aos povos no Mato Grosso do Sul e ao CIMI.”

    Veja mais no site do CIMI

     

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    As imagens são da manha de hoje, fotos de Christian Braga

  • Dilma entre irmãs: Contra os podres poderes!

    Dilma entre irmãs: Contra os podres poderes!

    A presidente Dilma Rousseff, eleita por 54 milhões de brasileiros, será afastada hoje do cargo por um Senado venal, mergulhado no caldo grosso e repulsivo da corrupção.

    Será afastada pelo machismo, pela burguesia, pelo fundamentalismo religioso, pela mídia mentirosa e hipócrita.

    Será afastada pelo que há de pior neste país, que é a sua elite e os aparelhos ideológicos que sempre justificaram a escravidão e a submissão de um povo lindo e generoso demais.

    E foi nos braços da parcela mais oprimida dentre todas, a das mulheres pobres, negras, periféricas, quilombolas, indígenas, nordestinas, de todo o país, que a presidente Dilma Rousseff resolveu viver a véspera da consumação do golpe.

    Enxugando a todo momento as mãos –este o único sinal de ansiedade que aparecia, humana demais—Dilma tinha a História nas mãos.

    Em seu discurso, diante das representantes da luta feminista do país todo, reunidas na 4ª Conferência Nacional de Políticas Para as Mulheres, no ginásio Ulysses Guimarães, em Brasília, a mulher (que todos os podres poderes querem derrubar) abraçou as suas irmãs de luta. Que enfrentam a dura e tantas vezes inglória batalha da sobrevivência e do cuidar de si e dos filhos.

    Dilma era a mãe que apanha do machismo –todas entenderam logo.

    A plateia que escutou a fala firme de Dilma (não, ela não gaguejou nenhuma vez, viu, imprensa escrota!) era composta por irmãs que conseguiram se transformar em sujeitos de suas vidas apenas nos últimos anos, graças a políticas públicas distributivistas, que privilegiaram as mulheres pobres.

    São agricultoras que puderam sair de casamentos e relacionamentos abusivos e violentos graças ao Bolsa Família, ao programa Minha Casa, Minha Vida. Que puderam ir para a faculdade graças ao ProUni e ao Fies. Que ganharam qualificação profissional por conta do Pronatec. Que puderam sair pela primeira vez de situações de semi-escravidão, graças ao Estatuto das Domésticas. Que, ganhando salário mínimo, viram esse piso ser valorizado além da inflação –pela primeira vez depois de anos de políticas de fome neoliberais.

    Dilma concluiu seu discurso para a História, abraçando suas irmãs de sofrimento. Havia lágrimas nos rostos.

    Mas não foi uma despedida. Dilma prometeu seguir na luta, com todas. Nas ruas, nas casas. Saiu abraçada e feliz. Com o reconhecimento apaixonado das mulheres que ela representa.

    Na caminhada de volta para casa, para os hotéis e para o acampamento pela Democracia, junto ao Ginásio Nilson Nelson, viam-se lutadoras exaustas, embandeiradas, com o corpo marcado por vários adesivos colados. Sinais da luta pelo Direito ao Aborto, Contra a Discriminação às Lésbicas, Contra a Violência Doméstica, da CUT, do PT, Fica Dilma!, pela Reforma Agrária, pela Demarcação das Terras Indígenas, da UNE, da Juventude Revolução etc.

    Esses adesivos são as insígnias desse Exército que, de golpes, entende muito. Porque este não é o primeiro e nem o último que sofre. Vida que segue! Luta que segue!

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  • EDITORIAL: TemerCunha, um só coração

    EDITORIAL: TemerCunha, um só coração

    Pouco tempo antes da votação da admissibilidade do pedido de impeachment pela Câmara dos Deputados, cresce na sociedade a percepção negativa de que Temer e Cunha cheguem a ser os responsáveis pela gestão pública e pelos rumos do país no próximo período. Apesar da propalada discrição do Vice-Presidente e aspirante a presidente, Michel Temer, não é difícil confirmar que ele e Cunha são parceiros de longa data, nunca tiveram conflitos e, muito pelo contrário, em muitas situações se apoiaram mutuamente em busca de seus objetivos.

    Quando confrontado sobre o polêmico aliado, Temer relativizou as críticas e declarou à “Revista Piauí” (edição 45, junho de 2010): “O Eduardo Cunha tem lá o jeito dele (…) Mas ele é competente, trabalhador, dedicado e tem uma inteligência privilegiada. Só recentemente descobri que ele não é advogado, e conhece o direito tanto quanto eu. Toda medida provisória, todo projeto importante o Eduardo Cunha conhece em detalhes”.

    O que deixa claro que além da parceria política e as alianças por resultados, a admiração entre eles vem mesmo de longa data. Cunha foi um dos principais artífices da eleição de Temer a Presidente da Câmara. No ano seguinte, quando Temer foi indicado para ser candidato a Vice-Presidente, a proximidade com o faminto-por-cargos-Cunha foi tema de resistências por parte do governo. Aliás, um dos motivos conhecidos do ódio de Eduardo Cunha pela Presidenta foi o desmonte de um esquema que ele mantinha em Furnas, órgão que esperava ter o controle por indicação de seu padrinho, Michel Temer.

    A chamada “chapa” Cunha-Temer ganhou corpo e materialidade com a proximidade da votação do dia 17 e com o anúncio recorrente pela mídia tradicional de que Temer já começa a discutir seu “futuro governo”. A pressa para anunciar a vitória dos favoráveis ao impeachment e o papel central de Cunha em cada passo do processo foi, portanto, catalisadora da reação negativa que a dupla enfrenta nesse momento. Diversos conteúdos na imprensa e nas redes sociais colaboraram para ressaltar isso.

    A matéria do “New York Times”, intensamente repercutida e replicada em redes sociais, que inclui a ambos numa lista de políticos corruptos que querem cassar uma Presidenta que não é acusada de corrupção foi talvez o principal deles, assim como um vídeo do ator Gregório Duvivier em que lança luz sobre a figura de Temer e diversos outros memes e textos na rede.

    A rejeição a Cunha, aliás, é um fato a parte nesse enredo. Ninguém no Brasil é tão rejeitado como ele, sua figura causa repulsa em grandes camadas da sociedade e poucos políticos hoje gostariam de associar sua imagem a dele. Temer precisa dele para ser presidente e por mais que tente “voar pra longe” está obrigado a tabelas com o parceiro. Os efeitos disso parecem ser inevitáveis: muitas pesquisas, públicas e feitas por parlamentares, apontam para a impopularidade cada vez mais alta de Michel Temer – e a soma das duas rejeições foi a força motriz que balançou o tabuleiro do jogo de xadrez da votação do impeachment.

    Ora, muitos deputados estão votando neste processo movidos pela pressão e pelo medo de serem identificados como apoiadores de um governo que é hoje muito impopular, mas se há poucas horas da votação eles percebem que o governo que pode assumir no lugar pode ser tão impopular ou mais e que tem muita gente nas ruas do país todo prometendo resistir ao golpe, a promessa do voto pelo “sim” começa a trazer menos bônus do que eles foram levados a acreditar.

    Isso abre espaço para dois caminhos: o mais simples, que é a negociação com o governo federal e com governadores de estados que não apoiam o golpe e, além disso, um movimento novo que foi relatado hoje na coluna de Monica Bergamo como “nem Dilma, nem Temer”, que levaria deputados de alguns partidos a se abster de votar.

    Portanto, a lembrança avassaladora de que Cunha e Temer podem estar prestes a assumir o país é uma “verdade inconveniente” para a maioria dos brasileiros. E a manutenção dos dois, aparecendo sempre juntos na narrativa dos que combatem o golpe, funciona como forte antídoto natural para o vírus do impeachment para uma parte mais sensível do parlamento.image

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    Texto: Fernando Stern

  • Carol não verá seu irmão nascer

    Carol não verá seu irmão nascer

    Por Roberto Corcioli, especial para Jornalistas Livresadolas_sato
    Foto: Fernando Sato/Jornalistas Livres

    Naquele abril de 2014, Carol (nome fictício, claro) foi abordada por guardas municipais. Estava com seu namorado, mais velho, e foram ambos levados à delegacia sob a acusação de que praticavam tráfico de drogas: portavam uma dúzia de porção disso, meia-dúzia de porção daquilo. Carol tinha 12 anos de idade.

    Carol ficou 45 dias internada na Fundação Casa, tendo atingido o prazo máximo de permanência enquanto se aguarda a sentença. Esta veio semanas depois, e concluiu que a conduta da adolescente tinha sido absolutamente hedionda. Por isso, sua internação seria imprescindível e por prazo indeterminado.

    O advogado nomeado para a defesa de Carol recorreu. Passei a atuar no juízo em que tramitou o processo e, então, recebi o recurso de Carol determinando que ela aguardasse em liberdade até que houvesse uma condenação definitiva.

    É o que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente. É o que está escrito na Constituição, que resguarda a presunção de inocência.

    Quem recorreu, dessa vez, foi o Ministério Público. E o tribunal deu razão. Carol deveria ser internada imediatamente.

    Recebi a ordem e determinei, então, seu cumprimento, anotando que Carol deveria ser trazida à minha presença assim que encontrada pela polícia – é o que manda o Pacto de São José da Costa Rica.

    Hoje trouxeram Carol ao fórum.

    Entrou na sala com ar despreocupado. Estava acompanhada de sua mãe – mulher já não muito jovem, rosto que não deixava dúvidas a respeito da vida sofrida que levava e barriga que evidenciava certamente mais de oito meses de gravidez.

    Vim a saber depois o motivo da tranquilidade de Carol ao vir ao meu encontro. O policial que a acompanhava não escondera suas impressões acumuladas (e hiperbolizadas) após estar presente em tantas audiências comigo: “fique sossegada, esse juiz solta todo mundo”.

    Audiência iniciada, expliquei para mãe e filha que ela fora procurada pela polícia porque havia uma determinação do tribunal para que Carol cumprisse imediatamente a condenação que sofrera há mais de ano, a respeito daqueles fatos ocorridos há dois.

    Naquele instante, a mãe de Carol já percebeu a gravidade da situação: “não acredito, doutor. Internada? Mas ela não fez mais nada! Eu tô grávida, doutor. Preciso da ajuda dela. Ela já ficou 45 dias na Fundação… Mais quanto tempo ela ficará lá?”

    “Não é possível saber, senhora, mas agora é para cumprir uma medida, e ela pode durar por volta de seis meses – algumas vezes menos, mas às vezes mais…”

    “Seis meses!”

    A mãe de Carol chorava copiosamente. E Carol? Ela, no alto de seus 14 anos, estava atônita.

    O desespero de ambas não parava de aumentar e eu, que costumo enfrenta situações como tais, em meu ofício, com aquela convicção firme de que o trabalho precisa ser feito, passei, neste caso, a não apenas temer que algo mais grave acontecesse com aquela mulher, grávida a ponto quase de ter seu bebê, mas também a sentir um nó na garganta.

    O que pude fazer foi explicar que passaríamos o endereço de onde mãe de Carol poderia obter o auxílio de um advogado custeado pelo Estado e que procuraria ajudar na situação.

    Foi então que ouvi uma última pergunta. Na verdade, quase que uma afirmação:

    “Mas, doutor, depende do senhor, não é?”

    A vontade que sentia era dizer o quanto considero estúpida e cruel a chamada guerra às drogas (que é guerra contra uma parcela bem específica da população, como se sabe), minha discordância com aquela condenação, com a ordem de cumprimento imediato da internação… Mas apenas expliquei que a ordem era do tribunal, e que, portanto, eu não poderia nada decidir a respeito.

    É provável que eu não tenha sido convincente – afinal, quem, diante de tal cena, teria a coragem de dizer, olhos nos olhos, que “sim, depende”?

    Carol, sentada, envolvia a barriga da mãe – que permanecia chorando em pé – num abraço desesperado. Era um abraço a três. Mas Carol não verá seu irmão nascer.

    Itapevi, 14 de abril de 2016.

    Roberto Luiz Corcioli Filho, juiz de direito.
    Para Alexandra Szafir.