Jornalistas Livres

Categoria: Intervenção Militar

  • Editorial – O “adulto na sala” ou ensaio para uma nova ditadura?

    Editorial – O “adulto na sala” ou ensaio para uma nova ditadura?

    O vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, publicou na edição de ontem do jornal O Estado de S. Paulo um artigo de opinião intitulado Limites e Responsabilidades. No texto, o vice-presidente, que diversos setores da sociedade tentam vender como o “adulto na sala” e a opção “moderada” contra o governo de destruição nacional de Jair Bolsonaro, demonstra claramente não entender NADA sobre limites e responsabilidades. Ele ultrapassa todos os limites do cargo ao ameaçar, novamente, a imprensa, o Supremo Tribunal Federal, o Congresso Nacional, os governadores dos estados que não estão alinhados incondicionalmente ao genocida que ocupa a presidência e até mesmo o direito de expressão individual de ex-presidentes da República. Portanto, Mourão não atenta à responsabilidade do cargo que possui atualmente e mata qualquer esperança de que numa eventual presidência pós-impeachment assumirá qualquer responsabilidade sobre os atos de Bolsonaro, a quem ajudou a eleger, sobre o apoio que segue dando ao genocida, ou mesmo sobre o papel fundamental de um governante que é unir a nação para resolver os problemas do povo.

    Ele ataca, mais uma vez, o jornalismo de modo geral ao dizer que “A imprensa, a grande instituição da opinião, precisa rever seus procedimentos nesta calamidade que vivemos. Opiniões distintas, contrárias e favoráveis ao governo, tanto sobre o isolamento como a retomada da economia, enfim, sobre o enfrentamento da crise, devem ter o mesmo espaço nos principais veículos de comunicação. Sem isso teremos descrédito e reação, deteriorando-se o ambiente de convivência e tolerância que deve vigorar numa democracia.” 

    Não, general, opiniões distintas NÃO devem ter o mesmo espaço quando se lida com vidas. Os jornalistas temos a responsabilidade de separar o que é fato, o que é opinião baseada em fatos e na ciência e o que é “achismo” ou declarações oportunistas de canalhas que querem se beneficiar do caos institucional sem se preocupar com as montanhas de cidadãos mortos. Se há intolerância na sociedade hoje, mais do que da imprensa a responsabilidade é de quem diz que os esquerdistas devem ser fuzilados e que torturadores assassinos são heróis, como fez o seu chefe e o senhor.

    As únicas frases corretas do texto estão no primeiro parágrafo: “Nenhum país do mundo vem causando tanto mal a si mesmo como o Brasil. Um estrago institucional, que agora atingiu as raias da insensatez, está levando o País ao caos”. No entanto, Mourão exclui do rol de limites e responsabilidades TODAS as ações do governo federal e joga sobre outros ombros a culpa pelo caos que vivemos, com perto de mil mortes diárias pela Covid-19 em números oficiais. Aliás, assim como seu ainda chefe, o general não fez qualquer referência no artigo ao sofrimento de milhares de famílias que perderam seus entes queridos, no dia em que o país somou oficialmente mais de 14 mil mortes. O tópico não faz parte dos quatro elencados por Mourão, mas e daí, né? Contudo, também a exemplo do chefe, o militar aproveitou o cargo no governo para dar o filé mignon ao filho, que foi promovido duas vezes no Banco do Brasil para ganhar mais de 36 mil reais.

    O estrago institucional em que estamos é consequência direta do golpe parlamentar/judiciário/midiático que tirou ilegalmente a presidenta Dilma Roussef do cargo. Quando um juiz de primeira instância grava e divulga ilegalmente uma conversa da presidenta e não é exonerado, há um enorme estrago institucional. Quando um ministro do STF impede que a presidenta escolha livremente um ministro da Casa Civil para se articular politicamente e impedir o impeachment, o golpe na institucionalidade é ainda maior. Quando um deputado federal vota pelo impeachment homenageando no Congresso um assassino e torturador e não sai de lá preso, a institucionalidade está ferida de morte. Quando um ex-presidente é condenado sem provas por “atos indeterminados” impedindo sua candidatura, rasgando até decisões em contrário da ONU e o ex-juiz responsável por isso vira ministro da justiça do candidato que beneficiou ilegalmente, é o fim da institucionalidade. Tudo o que temos hoje é fachada, é verniz, é disputa do butim. E os Jornalistas Livres avisaram disso em 2016.

    Mas, como disse o vice escolhido por ter feito em 2017 defesa enfática da ditadura de 1964 a 1985 e de uma intervenção militar, ainda “Há tempo para reverter o desastre. Basta que se respeitem os limites e as responsabilidades das autoridades constituídas” . Neste momento é passada a hora das autoridades constituídas assumirem suas responsabilidades dentro de seus limites. O Tribunal Superior Eleitoral, por exemplo, deve julgar urgentemente as eleições de 2018 e cassar a chapa eleita (Bolsonaro E Mourão) por caixa-dois e uso massivo de fake news como fartamente provado pela imprensa. O Supremo Tribunal Federal deve urgentemente votar a suspeição de Sergio Moro como juiz nos casos envolvendo Lula e anular a condenação do ex-presidente, como é consenso no mundo jurídico sério. O presidente do Congresso, Rodrigo Maia, deve escolher o quanto antes um dos mais de 30 pedidos de impeachment contra Bolsonaro e colocar em votação, já que não faltam crimes de responsabilidade provados. E mais, votar também a proposta de lei que exige novas eleições em 90 dias no caso de impeachment. Afinal, o país só poderá retornar à normalidade democrática quando de fato houver eleições limpas, com debates sobre projetos de governo e a presença de todos os principais candidatos dos partidos.

     

    Foto: www.mediaquatro.com
  • João Torrecillas Sartori: O modelo de propaganda de Bolsonaro entre Freud e Adorno

    João Torrecillas Sartori: O modelo de propaganda de Bolsonaro entre Freud e Adorno

    Por João Torrecillas Sartori, médico no SUS, psicanalista e doutorando em Ciência Política

     

     

    Muitos conceberam o pronunciamento oficial de Bolsonaro na noite de 31 de março como o mais moderado daqueles últimos dias. Alguns concluíram, atribuindo expressiva importância ao então recente isolamento político do Presidente, que este estaria recuando e se sentindo compelido a certa cooperação. Ainda mais ousadamente, em redes sociais, outros chegaram a afirmar a iminência de um impeachment. Factualmente, Bolsonaro se isolara politicamente: até mesmo alguns de seus ministros mais alinhados – como Mandetta, da Saúde – contrariaram abertamente suas declarações absurdas sobre a Pandemia da COVID-19. A contrariedade dos seus ministros certamente indicaria a instabilidade de seu governo. Naquele momento, acuado, solicitando de modo insatisfatório apoio do setor militar, Bolsonaro talvez tenha sentido a necessidade de uma revisão em seu discurso oficial.

    Contudo, embora Bolsonaro se encontrasse mesmo em isolamento político, o aparente recuo do dia 31 se inclui mais amplamente em um movimento cíclico, característico da sua estratégia de propaganda. Esta estratégia se alterna entre recuos e o uso de certo modelo de propaganda. Qual seria este modelo, no entanto? Recorrendo à obra de Adorno – referenciada na obra de Freud, criador da psicanálise –, o modelo de propaganda mais utilizado pelo presidente seria consistentemente considerado como mais um dentre muitos outros exemplos do denominado modelo de propaganda fascista.

    Em 1951, em sua obra intitulada Teoria freudiana e Modelo fascista de propaganda, Adorno utilizou a expressão agitadores fascistas na designação de líderes de massas os quais discursam de um mesmo modo, utilizando-se de um “complexo de medidas” rigidamente estabelecido. Para o autor, os variados agitadores, desde os menos valorizados socialmente, até os mais importantes, se comportam e se expressam semelhantemente em certos aspectos; monotonamente, embora de modo enérgico e extremamente ruidoso em muitas situações. Adorno escreveu que “a reiteração constante  e a escassez de ideias seriam elementos necessários ao método”. O material da propaganda fascista constituiria uma unidade estrutural, de modo que cada enunciado do agitador se determinaria por esta unidade.

    Dentro do marco estabelecido pela obra de Freud intitulada Psicologia das massas e Análise do Eu (1921), Adorno considerou que o agitador seria, ele mesmo, em alguma medida, convicto das ideias externalizadas às massas. Analisando o discurso de Bolsonaro nas últimas três décadas, é consistente a suposição de que as estruturas narrativas paranoicas externalizadas por ele aos bolsonaristas norteariam também as suas próprias ideias e atitudes.

    De outro lado, Adorno escreveu que a agitação fascista veio a ser um “meio de subsistência”, os agitadores aprimorando suas técnicas “empiricamente”, ao longo dos anos. O aprimoramento resultaria em certa padronização das técnicas, as quais, por sua vez, estão compatibilizadas com o modo de pensamento estereotipado dos indivíduos mais suscetíveis à propaganda fascista. Os agitadores menos eficientes não obteriam maiores êxitos e deixariam de ser considerados. De algum modo, mesmo que auxiliado por uma indústria de Fake News, Bolsonaro convenceu sua massa, obtendo o carisma medíocre de um agitador. Mas quais seriam as técnicas usadas pelos agitadores, entre os quais o Presidente?

    Para Adorno, entre os elementos constitutivos do método dos agitadores, estão as enunciações motivadas ao “apontamento do inimigo”, descrito na obra freudiana como um dos mecanismos de coesão das massas.  Neste contexto, Adorno estabeleceu que os agitadores se utilizam da denominada “técnica da unidade”. Discursam de modo a aumentar as diferenças concebidas entre os membros da massa e os não-membros da massa e, de modo a minorar as diferenças internas, entre os membros daquela, somente mantendo ressaltadas as diferenças hierárquicas. Justamente neste sentido, Adorno escreveu que os agitadores comumente atacam os intelectuais, os esnobes e os hedonistas, os quais, subversivos, contrariam a “técnica da unidade”. Estes três, mesmo não conscientemente, ameaçam o narcisismo do líder e, consequentemente, o de cada um dos membros da massa, evidenciando a inconsistência de suas crenças norteadoras.

    Adorno asseverou que, embora em alguns casos os agitadores tenham recomendado medidas concretas contra seus opositores – tais como a expatriação de sionistas e a realocação de estrangeiros aos campos de concentração – comumente o seu discurso se restringe, sobretudo, a argumentos ad hominem, por meio dos quais os opositores mencionados são sistematicamente atacados, sua imagem sendo convertida na de “inimigos da nação”, não se enunciando, entretanto, as citadas medidas concretas. Bolsonaro, mais comumente, não centrou o seu discurso em medidas concretas direcionadas ao combate aos seus repudiados opositores – chamados genericamente no bolsonarismo de comunistas, petistas ou esquerdistas –; mas, sim, na veiculação do ódio a estes últimos e na sua caracterização como “inimigos” do povo brasileiro – povo implicitamente concebido em seu discurso como não-comunista, não-petista e não-esquerdista.

    Muito comumente, os agitadores fascistas obtêm uma satisfação indireta de seus impulsos agressivos. Os seus liderados intuem de seu discurso estes impulsos e concluem sobre o modo como devem vir a agir: concretizando, eles mesmos, os impulsos agressivos de seu líder. As medidas do líder, sobretudo discursivas e não concretas, autorizam simbolicamente – isto é, validam socialmente – estes atos violentos. Já em meio às campanhas presidenciais, em 2018, se constataram mais comumente, em indivíduos e em movimentos de massa, certos comportamentos autoritários, agressivos e discriminatórios, a sua maioria, mantendo como alvos, indivíduos contrários à candidatura de Bolsonaro ou, aqueles identificados em “minorias identitárias” – étnico-raciais, sexuais, de gênero, entre outras. A maioria destes comportamentos teria sido constatada em apoiadores de Bolsonaro. O discurso de ódio deste último autorizou simbolicamente, e ainda autoriza, variadas modalidades de violência contra aqueles; e, inclusive, as modalidades físicas.[1]

    Por outro lado, Adorno sustentou que cada uma das variadas medidas constituintes do método dos agitadores se relaciona – mesmo que inconscientemente – com o estabelecimento ou com a manutenção de um certo vínculo afetivo, característico da massa. Este vínculo, denominado idealização, foi considerado, décadas antes na teoria de Freud (1921), como de natureza libidinal, uma modalidade de “enamoramento”, na qual certa disposição crítica individual desapareceria. Adorno evidenciou que mesmo Hitler mostrou saber da natureza libidinal da constituição das massas.

    Entretanto, Freud concluiu que o vínculo constitutivo da massa, correspondente a uma idealização de um indivíduo – isto é, à sua consideração como líder –, não consiste em um investimento libidinal direto. As suas metas sexuais são inibidas. Os integrantes da massa são muito excitáveis e sugestionáveis pelo seu líder, mas não estão conscientemente intencionando a atividade sexual explícita com este último. Freud entendeu que a “sugestionabilidade” dos integrantes da massa pelo seu líder, isto é, sua receptividade à sugestão deste último, se ocasiona pela sua relação de idealização.

    O Líder como encarnação do Eu Ideal

    Em 1921, Freud concluiu que em muitos casos o narcisismo estabelecido no indivíduo o condiciona à seleção, como seu líder, de um objeto semelhante a si mesmo, mas “caricaturado e demaculado” – isto é, contendo de modo exagerado os seus aspectos idealizados e contendo minorados os seus aspectos não aceitos. O líder seria aproximado imaginariamente do seu Ideal. Precisamente, seria a idealização de si mesmo pelos outros, aquilo que o líder intencionaria, inconsciente ou conscientemente, suscitar ou reiterar em seus seguidores.

    Adorno concebeu a propaganda fascista como relacionada com a “técnica da personalização”; e, assim, como motivada a ocasionar nos indivíduos a idealização – ou, mesmo, a mitificação –, de certo agitador. Não envolve, deste modo, a discussão objetiva de questões sociais e econômicas. Os membros da massa “se renderiam” a esta imagem idealizada. A sua rendição, assim como sua sugestionabilidade e a sua irracionalidade, são intencionalmente ocasionadas pelos expedientes mencionados. Freud, mesmo, considerou a escolha do líder como evento inconscientemente condicionado e, em seus termos, como “resultante não do raciocínio, mas, da vida erótica”. Isto é, considerou-a como resultante da ressonância individual de certos circuitos afetivos.

    Para Adorno, cada uma das medidas constituintes do método dos agitadores fascistas se motiva, mais restritamente, (1) à execução da “técnica da personalização”, antes evidenciada, ou (2) à concretização da ideia do “pequeno grande homem”. Esta ideia, por sua vez, consiste na crença de que o líder, ao mesmo tempo superior e vigoroso, seria um indivíduo comum, apresentando certos traços também apresentados pelos membros de sua massa. Para os bolsonaristas, o seu líder “botaria ordem na casa” tendo sido “capacitado por Deus”; mas, simultaneamente, seria em muitos aspectos exatamente como eles mesmos. Aparentemente, mesclaria entre si o extraordinário e o comum.

    Mesmo não sendo exaustiva, esta análise contribui a uma aproximação entre o modelo de propaganda comumente utilizado pelo Presidente e o modelo fascista de propaganda descrito por Adorno. Embora Bolsonaro tenha recuado ante as ameaças resultantes de seu isolamento político, e tenha revisado momentaneamente o seu discurso, não seria inconsistente a suposição de que, em seguida, retomaria o seu modelo de propaganda mais utilizado, caracterizado anteriormente. Foi o que ocorreu. A “estratégia” de comunicação do Presidente inclui, periodicamente, recuos e recrudescências, em uma espécie de movimento cíclico. A novidade deste recuo, ocorrido na noite de 31 de março, estaria mais em sua intensidade e no seu contexto que na sua ocorrência em si.

    [1] Ribeiro, Alexsandro; Zanatta, Carolina; Ferrari, Caroline; Roza, Gabriele; Lázaro Jr., José; Simões, Mariana; Lavor, Thays. Violência eleitoral recrudesceu no segundo turno. Agência Pública, São Paulo, 18 nov. 2018. Disponível em: https://apublica.org/2018/11/violencia-eleitoral-recrudesceu-no-segundo-turno/

     

    Leia mais artigos de João Torrecillas Sartori:

     

    João Torrecillas Sartori: Bolsonaro, o inconsciente e o negacionismo da pandemia

    João Torrecillas Sartori: O líder e o bolsonarismo em meio à pandemia

     

  • Jornalistas Livres exibem Intervenção – Amor Não Quer Dizer Grande Coisa

    Jornalistas Livres exibem Intervenção – Amor Não Quer Dizer Grande Coisa

    “O estado de exceção e a inimizade se converteram na base normativa do direito de matar. Nessas situações, o poder (que não é necessariamente um poder estatal) faz referência contínua e invoca a exceção, a urgência e uma versão ficcionalizada do inimigo”. (Achille Mbembe)
    A extrema-direita fala…

    A epígrafe é utilizada como sinopse do filme, um documentário-colagem com discursos de extrema-direita colhidos na internet durante 2015 e 2016, e que segundo os diretores, serviram de motor/animador ideológico no processo que culminou no impeachment da Presidente Dilma Rousseff e levou ao poder o líder fascista Jair Bolsonaro.

    O que parecia delírio, paranoia e alucinação de ex-militares reformados, jovens e velhos ideólogos de extrema-direita, sugerindo, em 2015, manifestações na porta de quartéis pedindo a volta de um regime autoritário, ganhou corpo, forma e vida no atual governo, como demonstra a bizarra participação do Presidente da República no ato que pedia o fechamento do Congresso e do STF em frente ao Quartel General, em Brasília, no último dia 19.

    Por mais que o presidente venha minimizar o peso simbólico dos seus atos e palavras, é dever do jornalismo levar ao público conteúdos que ajudem a sociedade a se entender e pensar seus destinos. Nesse sentido, Intervenção – Amor Não Quer Dizer Grande Coisa tem o mérito de nos colocar em contato com um Brasil que ninguém quer ver, mas que ganha cada vez mais participação na vida pública.

    Inédito na internet, o filme foi exibido pela primeira vez em 2017 no 50º Festival de Brasília, na Mostra Terra em Transe. Na época, segundo um dos diretores, Rubens Rewald, “a sensação do público ao ver o filme era de profundo mal estar por parte de alguns, por travarem conhecimento com esse “novo” mundo desconhecido e assustador para eles, e de distanciamento por parte de outros, que consideraram o filme um mero catálogo de bizarrices. Quase três anos depois, nada mudou, ou melhor, as coisas pioraram, e muito, e aquilo que era considerado bizarro, hoje é normal, e cada vez faz mais parte do nosso dia a dia”.

    Para Tales Ab’Sáber “o que em um passado recente mal disfarçava o ódio e o desejo corpóreo de violência sobre alguém no ato limite de calar e atordoar o inimigo batendo panelas, hoje ultrapassou esta barreira, e prossegue, como compulsão à repetição indomável, tentando cada vez mais, cada dia mais, alcançar o corpo de direitos e o corpo real dos inimigos maléficos, sempre inventados, para animar esse sistema psíco-político. Do comunista imaginado de 2014/2015 chegamos aos artistas pedófilos, e às filósofas críticas bruxas do presente, sonhados para serem queimados”.

    Gustavo Aranda acredita que “a esquerda ainda não entendeu o processo revolucionário proposto pela extrema-direita. Ela apenas reage, se apegando às estruturas políticas que sempre foi crítica. Está abdicando de disputar a revolução em nome de uma ‘democracia’ que nunca fez parte da realidade da maioria da população brasileira”.

    Jornalistas Livres exibem Intervenção – Amor Não Quer Dizer Grande Coisa dia 21 de abril, terça-feira, às 21H30 pelo seu canal no Youtube.

     

    assista ao trailler

     

    Assista ao filme à partir das 21:30

     

    Sobre os diretores:

    Rubens Rewald e Tales Ab’Sáber (Rewald & Ab’Sáber)
    São formados em cinema, professores na USP e na UNIFESP em São Paulo e realizaram o documentário Esperando Telê em 2010. Rewald dirigiu também os filmes Corpo, Super Nada e Segundo Tempo. Ab’Saber é psicanalista e ensaísta. Juntos pesquisam um cinema de ensaio de baixíssimo orçamento.
    Gustavo Aranda é Jornalista Livre, documentarista e montador.

    Ficha Técnica:

    direção e montagem: Rubens Rewald, Tales Ab’Sáber (Rewald & Ab’Sáber) e Gustavo Aranda
    argumento: Tales Ab’Sáber
    edição de som: João Godoy
    musica: Romulo Fróes
    produtor executivo: Rubens Rewald
    produtora: Confeitaria de Cinema / Cérebro Eletrônico
    documentário de longa metragem: 76 minutos

  • “Jornalismo será peça-chave para a construção de um novo momento na democracia”

    “Jornalismo será peça-chave para a construção de um novo momento na democracia”

    Por: Safira Campos para o PNBonline

    Professor e pesquisador da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Bruno Araújo é jornalista pela Universidade de Coimbra, onde também cursou Mestrado em Comunicação e é doutor pela Universidade de Brasília (UnB). Atualmente é coordenador do Programa de Pós-graduação em Comunicação, o primeiro programa da área em todo Mato Grosso. É também um dos organizadores do livro ‘(Des)construindo uma queda: a mídia e o impeachment de Dilma Rousseff’, em que discute a atuação e influência da imprensa no impedimento da presidente petista em 2016. 

    Com estudos voltados à crítica da mídia, o professor tem desenvolvido pesquisas sobre comunicação e política por meio da análise de coberturas de escândalos políticos, eleições, casos de corrupção e construção de personagens políticas. Na entrevista especial deste domingo (19), o PNBonline conversa com Bruno Araújo sobre o papel do Jornalismo na sociedade, como a profissão pode contribuir para o combate à cultura do ódio e sobre perspectivas da mídia para o futuro diante do cenário de ataque no presente. 

    PNBonline – Como o Jornalismo pode contribuir com a sociedade em um cenário de dicotomia entre o seu papel social de informar e a notícia como mercadoria?

    Bruno Araújo – Esta é uma questão bastante complexa. A notícia é encarada em muitos estudos da Comunicação em pelo menos duas perspectivas. Em primeiro lugar, a notícia como um produto social que visa esclarecer a opinião pública sobre temas que interessam a vida da sociedade. De outro lado, você tem estudos e análises que vão olhar a notícia dentro de algumas limitações em relação à essa primeira perspectiva. A notícia então é vista como um produto de uma empresa que, embora tenha um compromisso social – sendo este um dos valores do chamado Jornalismo liberal que se identifica como uma espécie de quarto poder – visa a obtenção de lucros.

    “Estamos falando da lógica capitalista que invade, como negócios que são, as empresas de comunicação”

    Essa dicotomia precisa ser levada em consideração até para nos alertar que o Jornalismo, apesar de prestar um papel relevantíssimo à sociedade, também é afetado por lógicas que estão muito para além da noção de interesse público. Estamos falando da lógica capitalista que invade, como negócios que são, as empresas de comunicação. Isso dá à notícia uma complexidade muito grande, que faz dela algo que esclarece a opinião pública, mas que também pode entrar em processos de manipulação.

    Essa dicotomia não nasceu hoje e existe desde sempre. O que é preciso considerar, é que independentemente de ser uma mercadoria ou não, a notícia e o Jornalismo como um todo são instâncias que estão sujeitas ao escrutínio, ou seja, à análise da sociedade. Esta é uma porta de oportunidade que não dá ao jornalista uma carta branca para fazer o que quiser. É por isso também que na academia, nós fazemos crítica de mídia e pesquisas das mais diversificadas para analisar o trabalho jornalístico. Nós temos que fazer com que o Jornalismo aperfeiçoe a sua prática para que ele possa ser cada vez mais um serviço público e que tenha uma função de esclarecimento das pessoas.

    PNBonline – Então como preparar estudantes de Jornalismo para um mercado de trabalho em que objetivos econômicos podem ultrapassar o interesse social?

    Bruno Araújo – Na universidade, nós temos um papel muito importante, que é dizer ao estudante que ele trabalhará em empresas de comunicação que são privadas, que têm sua linha editorial, valores e interesses, mas que eles não são obrigados a contar inverdades, a mentir. Ou seja, há certos valores éticos, e por isso fazemos uma discussão sobre ética jornalística, que são inalienáveis. Dizemos a eles que podem perfeitamente trabalhar em uma empresa jornalística, que têm objetivos de obtenção de lucro, e fazer um trabalho que vise o esclarecimento das pessoas, que traga outra múltiplas vozes para participar do debate público. Que a imprensa é uma instância de mediação imprescindível para a sociedade e que não pode ser secundarizada.

    A formação em Jornalismo é a ainda hoje cada vez mais importante, porque é fundamental que nós formemos estudantes que tenham a noção de que nós não somos inocentes na crise democrática que nós vivemos hoje, mas que o Jornalismo também será peça-chave para a construção de um novo momento na democracia.

    PNBonline – Enquanto é atacado, como o Jornalismo brasileiro pode combater a cultura do ódio tão presente atualmente e que tanto trabalha com a desinformação?

    Bruno Araújo – Esse afeto que destila contra o outro as piores energias que estão em nós, que visa não apenas confrontar esse outro, mas destruí-lo como sujeito e ser social, sempre existiu. A diferença agora, e que por isso se fala em uma cultura do ódio, é a força que esse tipo de sentimento tem no espaço público. Muitas vezes você vê o ódio como um afeto que pertence principalmente ao espaço privado, mas agora esse sentimento ganha o espaço público de uma maneira generalizada e exponenciada pela força das redes sociais.

    “O jornalismo não pode naturalizar discursos de ódio e ser um medidor silencioso, sem oferecer um contraponto necessário”

    O Jornalismo tem um papel fundamental mais uma vez. É claro que pedir ao Jornalismo para resolver a cultura do ódio é uma missão mais que impossível, no entanto, o Jornalismo pode sim atuar criando possibilidades de enfrentamento à essa cultura do ódio. Como por exemplo, quando ele produz reportagens que dão conta de crimes que são motivados pelo ódio como as narrativas sobre feminicídio. Elas devem ser feitas de uma maneira muito responsável, mostrando as razões estruturais que estão por trás dos crimes cometidos contra as mulheres por questões machistas. O mesmo para o racismo, que se pulveriza nas nossas relações sociais e não está apenas naquele demonstração mais evidente, mas pode estar escondido em certas expressões, tratamento dado a certos grupos, etc.

    É preciso que as coberturas vão além das estatísticas, humanizando esses números. Dar a oportunidade para que as vítimas possam expressar sua voz no espaço midiático. O Jornalismo não pode abrir mão de ser o lugar da denúncia. Não é possível que se entreviste um candidato que vincula fake news, como o atual presidente na bancada do Jornal Nacional durante as eleições de 2018, sem que os jornalistas sejam capazes de denunciar as mentiras que estavam sendo ditas e que incentivam posições de ódio contra homossexuais, grupos progressistas ou outros candidatos. O Jornalismo não pode naturalizar discursos de ódio e ser um medidor silencioso, sem oferecer o contraponto necessário.

    “Não há nenhum tipo de linguagem desprovido de ideologia (…) O Jornalismo é uma atividade que comporta uma carga ideológica”

    PNBonline – Por que a imprensa brasileira insiste no mito da imparcialidade? 

    Bruno Araújo – No Brasil, nós somos muito influenciados pelo Jornalismo dos Estados Unidos. Essa influência trouxe uma noção chamada em literaturas liberais de ‘Jornalismo cão-de-guarda’. Evidente que em algumas situações isso é verdade, mas no Brasil nós temos uma situação híbrida. Em algumas situações nós temos uma imprensa que agiu como contra-poder, mas em geral a tendência brasileira é outra, em uma perspectiva de cobertura adversária. Nós temos como exemplo, toda a cobertura do impeachment da presidente Dilma Rousseff que não contemplou uma discussão sobre se houve mesmo crime de responsabilidade ou não. Quando houve essa crítica a colegas jornalistas, você ouvia “somos imparciais e objetivos, damos voz aos dois lados”.

    Em semiótica, nós estudamos o papel ideológico da linguagem. Não há nenhum tipo de linguagem desprovido de ideologia, pois como afirmam Bakhtin e Volochinov, toda palavra é ideológica. O Jornalismo é uma atividade que comporta uma carga ideológica. O que temos estudado há muito tempo é que os veículos estão muitas vezes  a cargo de certas faixas políticas, de certos grupos de pressão e não exatamente com o esclarecimento público. Portanto, o Jornalismo é parcial e tem lado, mas precisamos refletir que lado é esse.

    Nos Estados Unidos há também o hábito dos jornais assumirem durante as eleições, que candidatos apoiam. Mas isso não quer dizer que eles farão uma cobertura enviesada. Aqui no Brasil, os veículos têm seus próprios candidatos e vários estudos refletem sobre isso, mas não é algo assumido. Atualmente, um dos poucos veículos que dizem o candidato apoiado, é a Carta Capital.

    PNBonline – Como o Jornalismo enfrentará as constantes crises de credibilidade e os ataques à profissão?

    Bruno Araújo – Nós estamos vivendo hoje uma situação de grande crise nas mais diversas instâncias da sociedade e o Jornalismo não passa ao largo disso. A credibilidade jornalística é algo que vem sendo bastante contestada, sobretudo e cada vez mais por líderes políticos dos polos extremos, especialmente a extrema-direita que tem feito uma investida muito grande neste sentido. É importante perceber que a contestação do trabalho da imprensa não é feita apenas por forças políticas, mas também por camadas da sociedade.

    Este momento, que para alguns significaria o fim da imprensa ou a perda total de sua relevância, é um momento de extrema oportunidade para que a imprensa retome o seu papel de mediadora das questões sociais e de esclarecedora do debate público. Neste momento, ao mesmo tempo em que as pessoas criticam o trabalho da imprensa, uma camada importante da sociedade está atordoada sem saber muito bem em que narrativas ela deve confiar para entender o que está acontecendo. É reafirmando sua natureza que o Jornalismo enfrentará este momento.

    PNBonline – Como o Jornalismo local pode se fortalecer e se aproximar do seu público sem se prender a fatores econômicos e políticos?

    Bruno Araújo – Quanto mais regionalizado é o Jornalismo mais dependente ele pode ser de fatores econômicos e políticos. Não há uma resposta pronta para os caminhos a serem traçados para que o Jornalismo local se torne mais independente. Mas certamente ele passaria pelo fortalecimento dos laços com os leitores. É preciso que as pessoas entendam que elas são fundamentais também no financiamento do Jornalismo profissional. Hoje na internet nos parece que tudo é de graça e livre, mas o trabalho empenhado demanda recursos. Em uma perspectiva otimista, quanto mais o público estiver envolvido no financiamento da informação, mais ele tirará o peso desses fatores políticos e de grandes grupos econômicos.

    PNBonline – O professor e pesquisador João Carlos Correia (UBI) diz que o jornalismo precisa contribuir para formar leitores qualificados. Uma falsa democratização do acesso à informação só aumentaria o elitismo. O senhor concorda com esse pensamento?

    Bruno Araújo – Sim. Acho que de fato o Jornalismo tem uma função pedagógica para cumprir na sociedade. É uma função que passa pelo esclarecimento das questões, pela visibilidade de grupos sociais que são historicamente marginalizados e que têm coisas a dizer. No Jornalismo profissional, muitas vezes por conta das próprias rotinas de produção que valorizam as fontes oficiais e instituições consolidadas não damos espaço de voz para esses grupos, que produzem reflexões altamente sofisticadas e são os verdadeiros representantes da sociedade brasileira.

    Quando damos essa visibilidade disminuímos o déficit democrático que temos. Isso contribui para a formação de leitores mais críticos, com uma perspectiva mais aberta, mais aprofundado de temas sociais. Apesar de sermos um país plural, muitas vezes essa pluralidade não reflete no trabalho da imprensa. É preciso, portanto, que nós demos espaço a essa pluralidade para que tenhamos leitores mais críticos e qualificados.

    PNBonline – Quais as expectativas em relação ao Programa de Pós-graduação em Comunicação da UFMT?

    Bruno Araújo – A aprovação do programa foi para nós um grande presente para nós da UFMT e para todo o estado de Mato Grosso, já que nós éramos o único estado da região Centro-Oeste sem uma pós-graduação stricto sensu em Comunicação. Será uma oportunidade de qualificação dos quadros que nós temos agora no mercado de trabalho e de todas as pessoas que se sentem motivadas a investigar na pesquisa e na carreira acadêmica. Teremos a oportunidade de produzir uma massa crítica sobre os fenômenos da Comunicação, principalmente contemplando os temas que são caros no âmbito regional. Com a pandemia, o processo seletivo que esteja em andamento para o mestrado foi interrompido, mas logo que as atividades forem retomadas pela UFMT, retomaremos o processo para dar início às aulas.

    Veja matéria original em: https://www.pnbonline.com.br/geral/a-jornalismo-sera-pea-a-chave-para-a-construa-a-o-de-um-novo-momento-na-democraciaa/65300

  • Viva a morte! Fascistas fazem ato pró-golpe militar e pelo fim da quarentena

    Viva a morte! Fascistas fazem ato pró-golpe militar e pelo fim da quarentena

    O ato ocorreu neste domingo (19/4) em frente ao Comando Militar do Sudeste (II Exército), localizado no bairro do Ibirapuera, região nobre da cidade e reuniu, em sua maioria, pessoas brancas de classe média, dentro de carrões. Os manifestantes, muitos dos quais com roupas de camuflagem, como as usadas por militares, são fissurados por tudo envolva a caserna, como o próprio presidente sociopata, Jair Bolsonaro, que eles idolatram.

    Os presentes na manifestação serão responsáveis, também, pelo aumento da disseminação do COVID-19 na cidade de SP, pois deveriam estar em suas casas (muitos estão fazendo home office), mas reclamam que não podem passear com seu cachorrinho, que suas empregadas devem voltar ao trabalho, que Doria é “comunista” (ô criatividade!). Ouve-se o hino ufanista do governo do general Emílio Garrastazu Médici, tocado a milhão pelos auto-falantes instalados na caçamba de uma caminhonete 4X4 tinindo de nova: “Eu te amo, meu Brasil, eu te amo / Meu coração é verde, amarelo, branco, azul-anil / Eu te amo, meu Brasil, eu te amo / Ninguém segura a juventude do Brasil”. O hino, da dupla Dom e Ravel, embala os discursos malucos, segundo os quais a pandemia “não é tão letal” assim. É um contra-senso seguido de outro.

    A PM nem deu as caras na manifestação, que deveria ser dispersada, já que atenta contra a ordem do governador João Doria, de isolamento em casa em prol da saúde pública. Agora imagine se fossem professores manifestando-se ali, no mesmo local. Seria pau na certa (como é sempre, aliás). É inaceitável que defender a Democracia seja proibido e defender a morte seja legal.

    Captando as imagens dessa manifestação, em meio às tantas insanidades que vimos e ouvimos, proferidas por esse gado perdido nas ruas do entorno do Ibiraquera, foi-nos perguntado se éramos jornalistas do bem ou do mal. Respondemos: Do bem, é claro. Também nos perguntaram se éramos de direita ou de esquerda. De direita, é claro (dizer outra coisa seria arriscado demais, pensamos). Aproveitamos para orientar um senhor que, como Bolsonaro, não sabia usar a máscara corretamente. Ele estava com o nariz para fora da proteção contra o COVID-19.

    Saímos do meio dessa aglomeração o mais rápido que pudemos, pois ao contrário deles, acreditamos em Coronavírus e estamos fazendo toda a produção de conteúdos dos Jornalistas Livres, de dentro de nossas casas, com exceção dessa. Seguimos todos os protocolos de proteção durante a manifestação, porque somos responsáveis e não queremos levar coronavírus de fascistas para outras pessoas. Ao chegar em casa, um banho imediato —para combater algum vírus mais saliente e para limpar a onda ruim dessa gente que odeia a Democracia. Fique em casa e assista!

     

  • Apoio do governo ao Golpe de 64 revolta a sociedade

    Apoio do governo ao Golpe de 64 revolta a sociedade

    O que aconteceu em 1º de abril (e não em 31 de março) de 1964 foi um golpe de estado levado à frente por setores militares, com apoio do grande empresariado, da mídia hegemônica e suporte explícito (que poderia ser inclusive bélico, se fosse o caso) do governo dos Estados Unidos. Há uma abundância de provas documentais e testemunhais que impede qualquer historiador sério de negar esse fato. Análises e documentos históricos provam, ainda, que nunca houve uma “ameaça comunista”, nem uma “república sindicalista” e que a corrupção que havia no governo não era significativamente maior do que em qualquer outro período.
    Os legados da Ditadura são igualmente incontestáveis. A extrema militarização das polícias estaduais e seu uso na tortura de dissidentes políticos moldou a atual atuação das PMs, que são as forças de segurança que mais matam em todo o mundo. A explosão da dívida pública e a hiperinflação (que chegou a 3% ao DIA) são resultado direto do “Milagre Econômico” de Delfim Netto nos anos 1970. O imenso poder das grandes empreiteiras para corromper o executivo surgiu nos esquemas milionários de superfaturamento em obras como a Ponte Rio Niterói. E os oligopólios midiáticos que temos até hoje foram construídos a partir da concessão de TV à Globo em 1964, suas afiliadas pertencentes a políticos em todo o Brasil (Família Sarney no Maranhão, Collor em Alagoas, Antonio Carlos Magalhães na Bahia…).
    Se não bastasse tudo isso, ainda tivemos perseguições políticas, fechamento do Congresso, exílios, torturas, assassinatos, desaparecimentos forçados e todo pacote de autoritarismo e violação de diretos políticos e humanos que compõem uma ditadura clássica.
    Essa página, contudo, jamais foi virada na história. Agora que temos o maior desafio de saúde pública mundial em 102 anos, unificar e coordenar os esforços nacionais era fundamental. Mas falta um/a homem/mulher no posto chave da presidência. O que temos prefere vender ilusões em pronunciamento de TV e comemorar um passado mentiroso de glórias ao dizer que “Oh… Hoje é o dia da liberdade”, referindo-se ao Golpe de 64. E não está sozinho! O sujeito que ocupa a vice-presidência publicou em uma rede social que “com a eleição do General Castello Branco, iniciaram-se as reformas que desenvolveram o Brasil”. Ontem, o Ministério da Defesa divulgou ordem do dia dizendo que o Golpe, que eles chamam de “movimento militar”, é um “marco para a democracia”.
    Certamente esse apoio explícito a uma ditadura sangrenta como símbolo de ordem em meio às incertezas do futuro foi seguido em muitos lugares do Brasil. No Mato Grosso, por exemplo, o deputado estadual pelo PSL Sílvio Fávero, que teve uma postagem apagada pelo Instagram, denunciada por apologia a crime.
    Essas manifestações levaram a notas de repúdio de diversos setores da sociedade. Um deles foi o Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso, que se pode ler abaixo:

    VIVA A DEMOCRACIA!
    HERZOG VIVE!
    DITADURA NUNCA MAIS!

    Neste 31 de março de 2020, completamos 56 anos do Golpe militar que resultou em 21 anos de ditadura no Brasil, 20 mil pessoas torturadas e mais de 400 mortos ou desaparecidos, conforme Comissão Nacional da Verdade.

    A redemocratização ocorreu em 1985 após muita organização popular em defesa da Anistia, da Emenda pelas Diretas Já e na denúncia das torturas, perseguições e mortes a defensoras e defensores da democracia.

    Se hoje temos eleições diretas para cargos públicos e a autonomia dos três poderes, ainda que com suas inúmeras fragilidades, foi porque lutamos e derrotamos a ditadura militar.

    Nesta luta, centenas perderam a vida nos porões da tortura, como o jornalista Vladmir Herzog, que permanece vivo em nossa memória.

    Por isso repudiamos com veemência a postura do deputado estadual pelo PSL de MT, Silvio Fávero, por manifestar seu apoio ao regime de ódio e tortura expresso pelo Golpe de 64.

    Para que germes da ditadura não prosperem, dizemos em alto e bom som: ditadura nunca mais!

    Viva a Democracia!
    Herzog vive!

    Sindicato d@s Jornalistas de Mato Grosso (Sindjor-MT)
    (Gestão 2019-2020) Em defesa d@ jornalista

    Outra importante instituição a protestar contra a exaltação mentirosa da Ditadura foi o Instituto Vladimir Herzog, como se vê abaixo:

    O Instituto Vladimir Herzog vem a público repudiar de forma veemente a posição de membros do atual governo em relação ao golpe militar de 1964, que hoje completa 56 anos.

    Em ordem do dia publicada neste 31 de março de 2020, o ministro da Defesa do Governo Federal, general do Exército Fernando Azevedo e Silva, classificou o golpe como um “marco para a democracia”. Mais tarde, o vice-presidente da República, o general de reserva do Exército Hamilton Mourão, se expressou em uma rede social dizendo que a ditadura militar promoveu “reformas que desenvolveram o Brasil”.

    O atual governo, mais uma vez, manifesta uma posição absolutamente incompatível com o Estado Democrático de Direito, falseia a história e avilta o direito à memória e à verdade, previsto na Constituição.

    Tal conduta não pode passar desapercebida e, por isso, nos somaremos a outras entidades para denunciar mais esta afronta à democracia a instâncias nacionais e internacionais, na expectativa de que medidas cabíveis sejam tomadas.

    Definir o golpe de Estado e os 21 anos da ditadura militar como um “marco para a democracia” ou dizer que foram promovidas “reformas que desenvolveram o Brasil” é negar a gravidade dos atos cometidos durante esse período sombrio, marcado por violência, tortura, autoritarismo, corrupção, censura e gravíssimas violações de direitos humanos perpetradas contra cidadãos em todo o país.

    Ao promoverem esse revisionismo histórico grosseiro e valorizarem o que aconteceu a partir de 1964, o ministro da Defesa e o vice-presidente evidenciam uma total dificuldade de compreender o esforço civilizatório e a escolha da humanidade por um futuro que conjugue liberdade, justiça, respeito e promoção dos direitos humanos, e se pavimente nos verdadeiros ideais democráticos.

    Há mais de uma década, nós do Instituto Vladimir Herzog – entidade que leva o nome de um jornalista brutalmente torturado e assassinado pelas forças de repressão que sustentavam a ditadura militar – exercemos a missão de fazer com que a sociedade conheça o passado para entender o presente e construir o futuro.

    Ainda hoje, no entanto, convivemos com o legado autoritário dos anos de chumbo, visível, por exemplo, na ausência de punição aos agentes públicos que perseguiram, torturaram, assassinaram e ocultaram cadáveres durante os 21 anos em que generais, passando-se por presidentes, governaram o país.

    Esse legado de impunidade e autoritarismo é o que permite que agentes do Estado sigam matando, torturando e desaparecendo com corpos de cidadãos brasileiros, em sua grande maioria de pessoas pobres, pretas e periféricas.

    Isso evidencia, de forma preocupante, que a tarefa de consolidar a democracia no Brasil ainda está incompleta e é indissociável da necessidade de se garantir o direito à justiça, à memória e à verdade a todos que sofreram – e ainda sofrem – com as gravíssimas violações de direitos humanos cometidas no passado e no presente.

    Marco para a democracia e desenvolvimento para o Brasil será o dia em que militares – e todos aqueles que sustentaram a ditadura por longos 21 anos – reconhecerem os crimes cometidos por integrantes das Forças Armadas entre 1964 e 1985 e pedirem perdão às vítimas, seus familiares e à toda sociedade.

    Marco para a democracia e desenvolvimento para o Brasil será o dia em que o Poder Judiciário – atento ao fato de que a República Federativa do Brasil se constitui em um Estado Democrático de Direito e tem como fundamento a dignidade da pessoa humana – processar e, se demonstrada a responsabilidade, punir os muitos torturadores já identificados do período.

    Por tudo isso, encaramos o dia 31 de março como uma oportunidade para homenagear as crianças que foram covardemente sequestradas, as mulheres que tiveram seus familiares assassinados e desaparecidos, os pais que viram seus filhos serem torturados, indígenas, camponeses, trabalhadores e todos aqueles que foram submetidos a tanta desigualdade e precarização da vida, especialmente nas periferias e nas favelas, mas lutaram bravamente – muitas vezes sacrificando a própria vida – contra a ditadura, em defesa da democracia e de uma sociedade mais justa e igualitária.