Jornalistas Livres

Categoria: Entrevista

  • O aposentado Geraldo Magela da Tridade tem motivos de sobra para estar nas ruas:

    O aposentado Geraldo Magela da Tridade tem motivos de sobra para estar nas ruas:

    Vítima do golpe militar de 1964, ele sabe muito bem o que a sociedade brasileira aguarda se a aventura golpista se concretizar. O militante do Núcleo em Defesa da Democracia – coletivo de assessores parlamentares formado e atuante no Congresso Nacional – Geraldo está assustado com o germe do fascismo que teima em brotar no Brasil. “Depredação de sindicatos, hostilização de quem usa vermelho, médicos que não prestam atendimento por divergências ideológicas, isso tudo significa o início do fascismo, que vem a ser a intolerância ao diferente”, explica.

    Entretanto, diante de tanto ódio, Geraldo também enxerga a esperança. Para ele, o Acampamento pela Democracia, levantado ao lado do Ginásio Nilson em Brasília, é a mais pura expressão da solidariedade que marca a esquerda. “Aquilo ali é uma cidade”, espanta-se, “e a divisão de tarefas entre os acampados mostra a unidade na luta que construímos”. O aposentado está animado com o clima político e acredita que o processo de impeachment não vai vingar. “Imagina o quanto estão assustados com toda essa mobilização”, diverte-se, para então finalizar: “jamais imaginei passar por outro golpe novamente, mas já que tentam um agora, é obrigação estar nas ruas fortalecendo os movimentos sociais”.

  • Dona Matilde – Sertão da Bahia

    Dona Matilde – Sertão da Bahia

    Dona Matilde, Moradora do Sítio Feliciano em Uauá, região de Canudos no Sertão da Bahia, relembra com os olhos marejados dos tempos difíceis que passou. Antes de programas sociais como o Bolsa Família, ali morria-se de fome.

    Essa e outras conquistas estão em jogo com a ameaça de tomada de poder por Michel Temer e o PMDB.

  • Frei Betto: “O impeachment a Dilma é um golpe branco, à semelhança dos que ocorreram recentemente em Honduras e no Paraguai.”

    Frei Betto: “O impeachment a Dilma é um golpe branco, à semelhança dos que ocorreram recentemente em Honduras e no Paraguai.”

    Debate sobre redemocratização, em 1986. Compõem a mesa, entre outros, o sociólogo Florestan Fernandes e o professor Octavio Ianni. Frei Betto é o terceiro da direita para a esquerda. Foto: Helio Carlos Mello
    Debate sobre redemocratização, em 1986. Compõem a mesa, entre outros, o sociólogo Florestan Fernandes e o professor Octavio Ianni. Frei Betto é o terceiro da direita para a esquerda. Foto: Helio Carlos Mello

    Carlos Alberto Libânio Christo, o teólogo Frei Betto, 72, tem uma longa trajetória de luta pela democracia. Atuou em movimentos estudantis, pastorais e sociais. Foi preso político por duas vezes durante a ditadura militar: em 1964, por 15 dias, e entre 1969 e 1973. Do cárcere nasceram os livros “Cartas da Prisão” (Agir), “Diário de Fernando – nos cárceres da ditadura militar brasileira” (Rocco) e “Batismo de Sangue” (Rocco), pelo qual recebeu o Prêmio Jabuti.

    Foi torturado. Testemunhou as inúmeras torturas sofridas por Frei Tito ao nunca revelar aos militares o que sabia.

    Esteve ao lado de Carlos Marighella na guerrilha armada. Enfrentou os carrascos do regime militar e ajudou centenas de brasileiros a fugirem da morte anunciada. Estudou jornalismo, filosofia, antropologia e teologia.

    É ferrenho defensor dos direitos sociais e humanos e por esses trabalhos recebeu inúmeros prêmios.

    Diz que o contrário do medo é a fé, e não a coragem. E assim resistiu à repressão.

    Foi coordenador da ANAMPOS (Articulação Nacional de Movimentos Populares e Sindicais), participou da fundação da CUT (Central Única dos Trabalhadores) e da CMP (Central de Movimentos Populares).

    Conheceu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 1977, na greve dos operários no ABC paulista, quando Lula era líder sindical.

    Em 2003 e 2004 atuou como assessor especial do presidente Lula e como coordenador de Mobilização Social do Programa Fome Zero.

    Autor de 60 livros, Frei Betto sabe exatamente o que é um golpe.

    frei-2Leia, a seguir, a entrevista:

    Jornalistas Livres – O senhor criticou a opção dos governos de Lula e de Dilma em “assegurar a governabilidade pelo mercado e pelo Congresso”. A crise que o governo está vivendo hoje nasce dessa mudança de posicionamento a partir de 2002?

    Frei Betto – Não só, mas também, pois o governo do PT não se empenhou em criar bases de sustentabilidade do projeto de desenvolvimento do Brasil. Adotou-se uma política econômica artificial, ancorada no consumo e na especulação, e não da produção e na valorização do mercado interno. Agora chegou a fatura…

    JL – O PT está pagando o preço por ter se distanciado dos movimento sociais? De que maneira isso se reflete no atual momento?

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    FB – O PT preferiu ficar de braços dados com o empresariado e não com os movimentos sociais, que sequer conseguiram suportar a participação no Conselhão. E em 13 anos de governo nenhuma reforma de estrutura, nem a política, nem a agrária, nem a tributária, para citar as mais urgentes. Hoje, os movimentos sociais já não têm suficiente capacidade de mobilização para, nas ruas, superar a da direita que se manifesta pelo impeachment. E a esquerda não aprende: insiste em convocar manifestações em dia de semana, enquanto a direita, mais hábil, o faz no domingo.

    JL – No final do ano passado o senhor previu que a pressão pelo impeachment iria paralisar o país, opor as pessoas e comprometer a economia. Estamos vivendo exatamente esse ciclo. Na sua opinião, há uma ameaça real à democracia?

    FB – Evidente. O impeachment a Dilma é um golpe branco, à semelhança dos que ocorreram recentemente em Honduras e no Paraguai. As instituições brasileiras parecem entrar em colapso. A Câmara e o Senado presididos por dois acusados de corrupção, o Judiciário dependurado em um juiz de 1a. instância (Sérgio Moro), a Polícia Federal reclamando porque o ministro da Justiça ameaça puni-la caso prossigam os vazamentos seletivos.

    JL – Por que o impeachment seria um golpe?

    FB – Primeiro, porque a direita não dorme. E não se conforma de não estar comodamente instalada no Palácio do Planalto. Segundo, porque o PT não cuidou de politizar a nação em 13 anos de governo. Daí o debate político ter decaído do racional para o emocional. Haja ódio…

    JL – Como o senhor vê a abordagem da Justiça ao ex-presidente Lula no âmbito da Lava Jato?

    “Ninguém está acima da lei, mas um homem que presidiu o Brasil por dois mandatos, tirou 45 milhões de pessoas da miséria e saiu do governo com mais de 80% de aprovação merecia mais respeito. A medida coercitiva que o prendeu em casa e o levou ao aeroporto de Congonhas (onde havia um jatinho da FAB pronto para transportá-lo a Curitiba…) foi típica da ditadura. Lula não era um foragido da Justiça.” Frei Betto

    JL – O que o senhor pensa sobre Lula ser ministro?

    FB – Acho um equívoco. Não é Lula ou qualquer pessoa que salvará o governo, é o próprio governo que enfia o pescoço na corda ao promover esse ajuste fiscal que penaliza sobretudo os mais pobres, não fazer a auditoria da dívida pública nem realizar reformas estruturais. Lula é uma “reserva” eleitoral do PT para 2018. Agora, se Dilma afundar ele afunda junto… E nada indica que ela esteja disposta a dar um cavalo de pau na economia.

    JL – O senhor conhece o Lula há muitos anos. O que o senhor acha da conduta ética e moral do ex-presidente?

    FB – Lula é uma pessoa íntegra.

    JL – Que parcela da população brasileira mais perde com o processo de impeachment e de criminalização do presidente Lula?

    FB – Os mais pobres, pois apesar das contradições e dos equívocos, nenhum governo de nossa história republicana investiu tanto no social como os de Lula.

    JL – Como o senhor vê a atuação da mídia tradicional no momento atual?

    FB – Ela está onde sempre esteve: confirmando o que disse o velho Marx no século XIX, de que o modo de pensar de uma sociedade é o modo de pensar da classe que domina essa sociedade. Não há imprensa neutra, há imprensa que se julga neutra, imparcial, livre. Mas como também disse Marx, ninguém é juiz de si mesmo.

  • Mais de 200 entidades pedem indulto às mulheres encarceradas

    Mais de 200 entidades pedem indulto às mulheres encarceradas

    Você sabia que?

    • Nos últimos 15 anos cresceu em 570% o número de mulheres encarceradas, chegando hoje a 38 mil.
    • Quase 80% das mulheres presas são mães e a maioria absoluta delas são o sustento e centro de suas famílias.
    • Duas em cada três presas são negras.
    • Mais de 1/3 das mulheres encarceradas não têm condenação.
    • 63% das mulheres encarceradas estão nesta condição por venda de quantidades ínfimas de drogas, para seu sustento pessoal e o de suas famílias; a proporção é três vezes maior que a de homens aprisionados pelo mesmo delito.
    • É praticamente inexistente a figura de mulheres presas por tráfico que exerciam papéis de liderança na atividade, sendo a elas relegada a venda miúda para sua subsistência e das famílias.
    • Menos de 15% das mulheres encarceradas recebem visitas.
    • Às mulheres encarceradas é praticamente vetado o direito a uma vida afetiva; o direito à visita íntima, já consagrada nos presídios masculinos, é quase inexistente para as mulheres; e apesar de proibida legalmente é usual nos presídios a repressão às relações afetivas entre as presas.
    • Apenas 1/3 dos presídios femininos têm berçário; e no caso das mulheres aprisionadas em unidades mistas, apenas 3% delas dispõe deste equipamento.
    • As mães aprisionadas são brutalmente separadas de seus bebês poucos meses depois do nascimento; os bebês de mulheres encarceradas são encaminhados para instituições quando as famílias das presas não têm condições de acolhê-los.
    • Há penitenciárias nas quais o gasto com materiais mínimos de subsistência (papel higiênico, absorvente íntimo, sabonete e outro) oscila entre R$ 2 e R$ 12 por ano.
    • A maioria das mulheres está encarcerada em presídios mistos, originalmente masculinos.
    • Barack Obama iniciou em 2015 antecipou a soltura de milhares de presos em 2015, iniciando uma mudança radical na política de encarceramento massivo por tráfico de drogas.

     

    A realidade dramática das mulheres encarceradas é objeto de uma campanha promovida pelo Grupo de Estudos e Trabalho “Mulheres Encarceradas” e mais de 200 entidades, que em dezembro de 2015 enviaram um documento à presidenta Dilma solicitando a concessão neste Dia Internacional da Mulher de um indulto massivo a mulheres com penas de até 5 anos de reclusão –a imensa maioria delas por tráfico de quantidade ínfima de drogas.

    Uma das líderes históricas do movimento em defesa das mulheres encarceradas, a desembargadora paulista Kenarik Boujikian disse aos Jornalistas Livres que a não concessão do indulto em 8 de março irá fazer com que a luta continue, com possibilidades de ele ser concedido mais tarde. “Estamos otimistas com a possibilidade de um indulto nos próximos meses”, disse ela, relatando um complexo processo de negociação em andamento.

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    A campanha cresceu nos últimos meses de maneira imprevista e ganhou enorme impulso depois do parecer favorável do renomado jurista Alberto Silva Franco, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo e atual vice – presidente do IBCCRIM-Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (veja aqui o parecer de Franco).

    O aprisionamento feminino massivo é de uma crueldade sem medida. Segundo Michael Mary Nolan, presidenta do Instituto Terra, Trabalho e Cidadania e outra líder histórica do movimento, “quando se prende uma mulher, se prende toda a sua família. Muitas pessoas, tanto o senso comum quanto tomadores de decisões, que se posicionam contra o indulto pregam o valor que a família tem, mas não prestam atenção em como se está destruindo famílias sem razão.”

    Quantas mulheres poderiam ser beneficiadas pelo indulto? Difícil saber. Os dados do sistema prisional são muito precários, segundo Luciana Zaffalon, supervisora de Atuação Política do IBCCRIM e outra integrante do GET – Mulheres Encarceradas. Uma estimativa grosseira, segundo ela, dá conta de que metade da população carcerária feminina poderia ser beneficiada pela medida.

    O indulto às mulheres encarceradas no Brasil não acontecerá neste Dia Internacional  da Mulher. Mas poderá ser uma das melhores notícias do país para o mundo – mesmo que atrasada – se assinado daqui a alguns meses.

    Leia a seguir o documento encaminhado em dezembro de 2015 à presidenta Dilma Roussef e ao presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, Alamiro Velludo Salvador Netto. Na ocasião, 80 entidades assinaram o pedido; em 4 de fevereiro ele foi reenviado, já com a adesão de 214 organizações.

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    EXMA. PRESIDENTA DA REPÚBLICA, SRA. DILMA ROUSSEFF

    EXMO. SR. MINISTRO DA JUSTIÇA, DR. JOSÉ EDUARDO CARDOZO.

    ILMO SR. PRESIDENTE DO CNPCP – CONSELHO NACIONAL DE POLITICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA, DR. ALAMIRO VELLUDO SALVADOR NETTO.

     

    INDULTO DIA DA MULHER

    O Grupo de Estudos e Trabalho “Mulheres Encarceradas” e as entidades que esta subscrevem vem à presença de Vossas Excias para requerer que seja expedido decreto de concessão de indulto e comutação de penas, em comemoração ao DIA DA MULHER.

    O GET “Mulheres Encarceradas”, que atua desde 2001, é uma rede que tem como objetivo primordial discutir a realidade da mulher presa, suas condições de encarceramento, seu acentuado perfil de exclusão social, a emergência de atendimento a seus direitos, a violência de gênero sofrida e apresentar propostas para que esta situação seja alterada.

    A exclusão e discriminação das mulheres encarceradas, iniciadas no seio da sociedade, nos dão a certeza que há um longo caminho a trilhar. Há necessidade de políticas efetivas e, com este propósito, indicamos a urgência para que o indulto, instrumento histórico de política criminal, de previsão constitucional, seja aplicado de modo eficaz, para que de fato atinja as mulheres.

    Documentos internacionais e regionais recomendam que se preste maior atenção às questões das mulheres que se encontram na prisão, inclusive no tocante aos seus filhos. Neste sentido, dentre outros, a Convenção Sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher; o Conjunto de Princípios para a proteção de todas as pessoas submetidas a detenção ou prisão – adotada pela Assembleia Geral da ONU de 1988; a Recomendação da Assembleia Geral da ONU, Resolução 58/183, que determinou que se prestasse maior atenção às questões de mulheres que se encontram em prisão, inclusive no tocante aos filhos; as Regras de Bangkok- normativa mais recente, da ONU, especialmente direcionada para o tratamento das mulheres presas.

    Documentos nacionais também indicam a necessidade de que se estabeleçam políticas públicas diferenciadas para as mulheres encarceradas, que constituem um percentual pequeno da população carcerária (cerca de 8%); com alta porcentagem de mães presas (cerca de 70/80%); que se encarregam de cuidar dos filhos.

    Os dados apontam para um aumento do aprisionamento feminino, sendo que na última década e meia, este aumento é da ordem de 570%, que não se circunscreve a delitos violentos. De cerca de 610 mil presos, 38 mil são mulheres. A maioria está detida por delito que envolve pouca quantidade de droga. O último relatório do Infopen, publicado pelo Ministério da Justiça, estima que 63% das mulheres estão presas por delitos relativos às drogas, o que representa, proporcionalmente, um número três vezes maior que o de homens detidos pelo mesmo delito (Infopen- Mulheres, do Ministério da Justiça).

    Raça é elemento primordial na identificação do perfil da mulher encarcerada, já que o número de mulheres negras que estão presas é proporcionalmente maior do que a população de mulheres negras. Duas em cada três mulheres presas são negras, desta forma, representam 67% da população carcerária feminina, enquanto na população em geral a proporção é de 51%, segundo dados do IBGE.

    O aumento do encarceramento das mulheres produz consequências de diversas ordens, mas necessário destacar a perda ou fragilização das relações familiares, pois grande parte das mulheres são simplesmente abandonadas. Outrossim, facilmente constatável o esgarçamento no universo filhos e mãe presas, em que pese um expressivo percentual de filhos de presas estar sob a tutela de seus familiares. Todas as crianças padecem com o rompimento, mas em número maior as crianças negras, diante do encarceramento desproporcional de mulheres negras.

    Note-se que os dados provam que a política criminal referente ao indulto, estabelecida até hoje, não contempla, em termos concretos, as mulheres presas, como se vê pelos números de mulheres indultadas nos Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Vejamos:

    A Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo informou os seguintes números de indultos concedidos:

    Secretaria de Estado de Defesa Social – SEDS, de Minas Gerais informou os seguintes números de indultos concedidos:

    A S– USEP – do Estado do Rio Grande do Sul, por sua vez, informou os seguintes números de indultados e comutados:

    São números pífios, que retratam a ineficácia do indulto concedido até então, já que os três estados da federação que prestaram a informação diretamente à Associação Juízes para a Democracia são os que concentram significativamente a população encarcerada do Brasil.

    O indulto é importante instrumento de política criminal, mas não é aplicado com critérios eficazes, de modo a atingir um número minimamente significativo de mulheres encarceradas. A restrição de concessão de indulto para as mulheres condenadas nos termos do artigo 33 da Lei n. 11343/2006, redunda na ineficácia do indulto para as mulheres.

    É importante que novas alternativas em políticas criminais comecem a ser realizadas. Este foi o caminho em vários países.

    O Presidente Barack Obama iniciou em 2015 uma nova página no encarceramento massivo relacionado a drogas, antecipando a soltura de milhares de presos. Os EUA se deram conta que uma nova abordagem é necessária; que os custos do sistema prisional são altíssimos, que o aprisionamento em massa não levou à superação ou diminuição do tráfico de drogas, que grande maioria da população atingida é de negros e hispânicos, que foi produzida uma superpopulação carcerária.

    Outros países, como o Costa Rica e Equador, também têm utilizado mecanismos alternativos para lidar com as mulheres envolvidas no tráfico de drogas. O Equador adotou em 2008 indulto que incluía pessoas presas pela primeira vez por transporte de drogas, com até 2kg de substância e que já tivessem cumprido pelo menos 10% de sua sentença. Mil e quinhentas pessoas foram contempladas. A Costa Rica incluiu o critério de gênero para análise de proporcionalidade das penas e de atenuantes causados por vulnerabilidade das mulheres em lei de 2013, passando a aplicar redutores de penas em função da extrema pobreza, chefia de lar, responsabilidade sobre crianças e adolescentes, idosos ou pessoas com deficiência – uma iniciativa reconhecida pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) como boa prática a ser implementada por outros países.

    A urgência da medida no Brasil se impõe, para que se encontre um mínimo de equilíbrio na questão prisional das mulheres, em cotejo com as consequências no âmbito social e familiar e o alto custo do seu encarceramento.

    Diante do quadro acima, requeremos seja decretado indulto/comutação comemorativo ao DIA DA MULHER, contemplando-se nas suas hipóteses de concessão as mulheres condenadas nos termos do artigo 33, da Lei 11343/06, com pena de até cinco anos de reclusão.

    Colocamo-nos à disposição de Vossas Excelências na esperança que o ano de 2016 seja um marco efetivo de política criminal para as mulheres encarceradas e desde já registramos que pequeno material sobre o tema pode ser encontrado através deste link

     

    Atenciosamente,

    São Paulo, 04 de fevereiro de 2016.

    1. Grupo de Estudos e Trabalho Mulheres Encarceradas
    2. AJD – Associação Juízes para a Democracia
    3. CNBB – Pastoral Carcerária Nacional
    4. KOINONIA- Presença Ecumênica e Serviço
    5. ITTC – Instituto Terra Trabalho e Cidadania
    6. IBCCRIM – Instituto Brasileiro de Ciências Criminais
    7. ASBRAD – Associação Brasileira de Defesa da Mulher da Infância e da Juventude-
    8. Conectas Direitos Humanos
    9. ARP – Associação pela Reforma Prisional
    10. IAB – Instituto dos Advogados Brasileiros
    11. ANADEF – Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais.
    12. Associação dos Defensores Públicos do Estado do Maranhão
    13. Conselho Penitenciário do Estado de São Paulo
    14. Conselho Estadual de Política Criminal e Penitenciária do Pará – CEPCP/PA
    15. CRESS -Conselho Regional de Serviço Social 9ª Região/SP
    16. Conselho Regional de Psicologia de São Paulo – CRP-06
    17. FENAJ – Federação Nacional de Jornalistas
    18. Rede de Justiça Criminal
    19. Plataforma Brasileira de Política de Drogas
    20. UNEAFRO Brasil
    21. Grupo Candango de Criminologia, da Universidade de Brasília
    22. Grupo de Pesquisas em Política de Drogas e Direitos Humanos da UFRJ
    23. União de Mulheres do Município de São Paulo
    24. THEMIS – Gênero, Justiça e Direitos Humanos
    25. Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro – Nacional
    26. Fórum Cearense de Mulheres
    27. OAB – Seção do Espírito Santo
    28. Justiça Global
    29. Instituto de Defensores de Direitos Humanos – DDH
    30. APROPUC – Associação dos Professores da PUCSP
    31. CSDDH – Centro Santo Dias de Diretos Humanos da Arquidiocese de SP
    32. CADHU – Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos
    33. CDHEP – Centro de Direitos Humanos e Educação Popular
    34. Centro de Assessoria Popular Mariana Criola
    35. ABESUP – Associação Brasileira de Estudos Sociais do Uso de Psicoativos
    36. Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos
    37. ABORDA – Associação Brasileira de Redução de Danos
    38. Grupo Asa Branca de Criminologia – PE
    39. INEGRA – Instituto Negra do Ceará
    40. Associação Missionários Leigos de Maryknoll
    41. Centro de Direitos Humanos de Sapopemba
    42. Centro de Referência sobre Drogas e Vulnerabilidades Associadas da UnB-Ceilândia
    43. Coletivo BIL – Coletivo de Mulheres Bissexuais e Lésbicas do Vale do Aço/MG
    44. Coletivo Juntas na Luta
    45. Coletivo Peso – Periferia Soberana MG
    46. Associação de Voluntários Integrados no Brasil
    47. Observatório da Mulher
    48. Laboratório de Direitos Humanos da UFRJ
    49. CEDECA – Sapopemba “Mônica Paião Trevisan”
    50. Fraternidade Cristã de Pessoas com Deficiência
    51. GAPD – Grupo de Ação Pastoral da Diversidade/SP
    52. GEPÊPRIVAÇÃO – Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação em Regimes de Privação da Liberdade
    53. GIESP – Grupo Interdisciplinar de Estudos sobre Psicoativos
    54. GT -Identidade de Gênero e Cidadania LGBTI da Defensoria Pública da União

    55.Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos

    1. Instituto EcoVida – ONG
    2. IPJ – Instituto Paulista de Juventude
    3. Mulheres do Movimento sem Terra de Ermelino Matarazzo
    4. Núcleo de Educação em Diretos Humanos – NEDH UFRJ
    5. Núcleo de Defesa da Diversidade Sexual e Direitos Homoafetivos da Defensoria Pública do Estado do RJ
    6. Núcleo de Execução Penal da Defensoria Pública de Santa Catarina
    7. Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo
    8. Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Diretos da Mulher da Defensoria Pública de São Paulo
    9. Núcleo Interdisciplinar de Ações para a Cidadania – NIAC UFRJ
    10. Núcleos Contra a Desigualdade Racial – RJ
    11. FASE – Federação de Órgão para Assistência Social e Educacional
    12. Fórum21
    13. Comitê Pró-Haiti – Brasil
    14. Organização Indígena Revolucionária
    15. Rede Nacional de Coletivos e Ativistas Antiproibicionistas – RENCA
    16. Sociedade Amigos Vila Mara Jardim Maia e Vilas Adjacentes
    17. Tribunal Popular
    18. Associação Franciscana de Defesa de Direitos e Formação Popular
    19. SEJUS – Secretaria de Estado de Justiça de Rondônia
    20. Secretaria de Estado do Segurança Pública e Administração Penitenciária do Estado do Paraná – SESP
    21. Departamento de Execução Penal do Estado do Paraná – DEPEN,
    22. Cento de Regime Semiaberto Feminino de Curitiba – CRAF.
    23. Centro de Prevenção às Dependências
    24. Rede Social de Justiça e Direitos Humanos
    25. PACS – Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul
    26. Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Candido Mendes
    27. Católicas pelo Direito de Decidir
    28. APADEP – Associação Paulista de Defensores Públicos do Estado de São Paulo
    29. CAEMI – Centro de Acolhida Especial para Mulheres Imigrantes
    30. Associação Palotina – Casa de Acolhida das Irmãs Palotinas
    31. Coletivo Blogueiras Negras.
    32. Instituto Patrícia Galvão
    33. Fórum de Mulheres do Mercosul/Brasil
    34. Secretariado Nacional de Pastoral da Mulher Marginalizada
    35. Conselho Penitenciário do Estado do Pará.
    36. MAMA
    37. MMT Movimento de Mulheres do Tapanã
    38. Grupo Dignidade
    39. Instituto das Irmãs de Santa Cruz
    40. Conselho da Comunidade da Comarca de São Paulo
    41. CEPIA – Cidadania Estudo Pesquisa Informação
    42. Coletivo de Feministas Lésbicas-CFL – São Paulo
    43. Coletivos Minas de Cor – São Paulo
    44. Núcleo do Sistema Penitenciário da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro
    45. NaMargem – Núcleo de Pesquisas Urbanas da UFSCar
    46. Observatório de Violação dos Direitos Humanos contra a população em situação de rua (NEPP-DH/UFRJ)
    47. Tecle Mulher – Assessoria e Pesquisa no Âmbito das Mulheres
    48. Viva Rio
    49. Instituto Igarapé
    50. REDUC – Rede Brasileira de Redução de Danos e Direitos Humanos
    51. Conselho de Leigos da Arquidiocese de São Paulo – CLASP
    52. Coletivo Feminista Dandara
    53. Instituto Luiz Gama
    54. LEIPSI – Laboratório de Estudos Interdisciplinares sobre Drogas da UNICAMP.
    55. Associação de Amigos e Familiares de Presos/as AMPARAR
    56. Serviço Franciscano de Solidariedade –SEFRAS
    57. Grupo de Estudos e Pesquisa Direito Penal e Democracia (UFPA)
    58. Instituto Paraense de Direito de Defesa
    59. Centro de Defesa da Criança e do Adolescente Maria dos Anjos (CDCA/RO)
    60. Centro de Estudos em Desigualdades e Discriminação CEDD – UNB
    61. Instituto Augusto Boal
    62. Redes de Desenvolvimento da Maré
    63. Observatório das Favelas
    64. Grupo de Pesquisa e Extensão Loucura e Cidadania, da Universidade Federal da Paraíba
    65. Núcleo de Criminologia e Política Criminal da Pós-graduação em Direito da UFPR
    66. Grupo de Estudos de Criminologia Crítica da UFPR
    67. IPDD – Instituto Paraense de Direito de Defesa
    68. CONFAQ Confederação Nacional das Associações Quilombolas
    69. Grupo de Pesquisa Hermenêutica e Ciências Criminais – FURG/CNPq.
    70. RENILA- Rede Nacional Internúcleos de Luta Antimanicomial
    71. Sociedade Maranhense de Direitos Humanos
    72. IBADPP- Instituto Baiano de Direito Processual Penal

    129. PROAD

    1. Coletivo em Silêncio
    2. Família d’ Matthah
    3. Família Stronger
    4. Núcleo de Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro – NUDEM RJ
    5. Núcleo de Estudos Interdisciplinares da Violência na Amazônia – NEIVA/UFPA
    6. Irmãs Missionárias de Cristo
    7. Fórum Social de Manguinhos
    8. GEPEX.dh – Grupo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Sociedade Punitiva, Justiça Criminal e Direitos Humanos da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP
    9. Associação de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania -ADDHC – JF-MG-Brasil
    10. Grupo de Pesquisa Trabalho e Capital – GPTC, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP),
    11. Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais
    12. ABRAMD Associação Brasileira Multidisciplinar de Estudos sobre Drogas
    13. Raízes em Movimento – RJ
    14. Voz da Comunidade – RJ
    15. Mídia Periférica – RJ
    16. NEVIS/CEAM- Núcleo de Estudos Sobre Violência e Segurança- UNB
    17. Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Glória de Ivone/ Palmas -Tocantins
    18. Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos

    148.MNDH – Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH

    1. Fórum Brasileiro de Segurança Pública
    2. Instituto Sou da Paz
    3. Coletivo Papo Reto – Rio de Janeiro
    4. Projeto Saúde e Alegria- Pará
    5. Voz da Baixada – Rio de Janeiro
    6. Coletivo Em Silêncio
    7. PAL – Presença na América Latina
    8. IADA África – mulheres imigrantes e refugiadas.
    9. Diadorim Centro de Estudos sobre Gênero, Raça, Etnia e Sexualidade da Universidade do Estado da Bahia – UNEB
    10. Educap- RJ
    11. Grupo de Pesquisa Direito e Saúde da FIOCRUZ
    12. Elas Por Elas Vozes E Ações Das Mulheres
    13. MCTP – Movimento Contra o Tráfico de Pessoas
    14. Congregação das Missionárias da N.Senhora do Santo Rosário
    15. CFEMEA Centro Feminista de Estudos e Assessoria
    16. Clínica de Direitos Humanos da PUC SP
    17. Centro de Referência em Direitos Humanos do Cerrado / CRDH – Cerrado
    18. Coletivo de Direitos Humanos do Cerrado
    19. Brigadas Populares
    20. Centro Brasileiro de Estudos de Saúde- CEBES
    21. SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia
    22. CLADEM
    23. Fábrica Ocupada Flasko
    24. CEMOP -Centro de Memória Operária e Popular
    25. Cajueiro – Centro de Formação, Assessoria e Pesquisa em Juventude
    26. Presença da América
    27. Fórum Brasileiro de Segurança Pública
    28. Associação de Advogadas pela Igualdade de Gênero
    29. Comissão de Direitos Humanos da OAB RJ
    30. Diretório Central de Estudantes da PUCRS – DCE PUCRS
    31. Comitê Estadual de Controle da Tuberculose da São Paulo CECSTB SP
    32. NUG – Núcleo de Estudo de Gênero da Faculdade de Direito da USP
    33. Clínica de Direitos Humanos da UFMG
    34. Quilombo Xis-Ação Cultural Comunitária – Bahia/Brasil
    35. Conselho Federal de Psicologia
    36. Instituo Carioca de Criminologia
    37. Coletivo de Advogados do Rio de Janeiro
    38. Movimento Espiritismo e Direitos Humanos
    39. NACCRIM – Núcleo de Aperfeiçoamento e Crítica à Ciências Criminais-Faculdade e Direito de Franca

    188.Coletivo Agadá

    1. Fórum Ecumênico ACT Brsil
    2. Comissão de Promoção da Igualdade Racil da Assembléia Legislativa da Bahia
    3. Juventude da Coordenação Nacional de Entidades Negras
    4. Coordenadoria Ecumênica de Serviço – CeSe
    5. Ouvidoria Geral da Defensoria Pública da Bahia
    6. Coletivo de Entidades Negras – CEN
    7. Iniciativa Negra Por Uma Nova Política sobre Drogas – INNPD
    8. Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais – ABGLT
    9. Rede Ecumênica da Juventude (REJU)
    10. KIU! Coletivo Universitário pela Diversidade Sexual
    11. Coletivo de Juventude Ousar ser diferente
    12. Coletivo Quilombo

    201.Diretório Central dos Estudantes – UFBA

    1. Coletivo Lélia González
    2. Movimento Zoada
    3. Ala Feminista da Marcha da Maconha
    4. Coletivo Margarida Alves
    5. Marcha das Mulheres Negras
    6. Coletivo Feminismo Agora
    7. Fórum de Juventude Negra
    8. Coletivo Diadorim

    210 Departamento de Direitos Humanos e Saúde – DIHS/Fiocruz

    1. Colégio de Ouvidorias das Defensorias Públicas do Brasil
    2. Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – ABGLT
    3. RENADE – Rede Nacional de Defesa do Adolescente em Conflito com a Lei
    4. Associação dos Defensores de Tocantins
  • “É como se a cada dois dias derrubássemos um avião lotado de jovens”

    “É como se a cada dois dias derrubássemos um avião lotado de jovens”

    O artigo 5o da Constituição Brasileira garante a inviolabilidade do direito à vida. Mas as conclusões apresentadas pela Anistia Internacional no relatório “O Estado dos Direitos Humanos no Mundo”, que será lançado hoje, revela que estamos violando sistematicamente o direito à vida no Brasil. São cerca de 58 mil homicídios por ano no país. É uma letalidade altamente seletiva: 77% das vítimas são jovens negros, moradores da periferia. Como se essas vidas não tivessem valor algum para a nossa sociedade e para o Estado. Ao invés de o Brasil reagir com políticas públicas para enfrentar uma situação duas vezes superior à considerada epidêmica pela Organização Mundial de Saúde, o Congresso avança em pautas que tendem a dirimir direitos conquistados e a expor ainda mais essa população à violência, como a tentativa de reduzir a maioridade penal e a proposta de revogação do Estatuto do Desarmamento. “Há uma focalização dos homicídios e da penalização em um certo tipo de pessoa, de um determinado território”, explica Átila Roque, diretor-executivo da Anistia Internacional no Brasil. “São sujeitos considerados ‘matáveis’, quase descartáveis. É como se a cada dois dias derrubássemos um avião lotado de jovens – e isso não é notícia no jornal.”

    A boa notícia é que a sociedade brasileira, por meio dos movimentos sociais, está reagindo aos retrocessos e omissões. Leia, a seguir, a entrevista completa com Átila Roque.

    Por Maria Carolina Trevisan, especial para Jornalistas Livres

    Jornalistas Livres – O relatório apresentado pela Anistia Internacional este ano evidencia uma série de graves violações a direitos humanos e revela que o parlamento reforça medidas conservadores, na contramão do enfrentamento às violações. Há alguma surpresa, na sua opinião?

    Átila Roque – O que chamou a atenção da Anistia no caso do Brasil no ano passado, foi a agressividade da agenda conservadora no âmbito do Legislativo, que fez avançar a sua pauta. Terminamos o ano com muitos direitos importantes sob risco. São propostas que estão em tramitação ou já foram aprovadas na Câmara e aguardam confirmação do Senado. Percebemos que, diante de um certo vazio de lideranças no Congresso, acabou acontecendo a ascensão de uma liderança muito oportunista no sentido de engavetar uma série de propostas que significam um grave retrocesso em várias áreas importantes para a agenda de direitos humanos e que agora estão sujeitos a serem aprovados pelo Congresso.

    Jornalistas Livres – É possível destacar algum avanço na garantia de direitos humanos no país?
    Átila Roque – Um ponto positivo foi que houve uma mobilização importante da sociedade na defesa desses direitos, especialmente de parcelas bastante significativas da juventude, tanto no que diz respeito à tentativa de redução da maioridade penal, como no que se refere aos direitos das mulheres e, mais para o final do ano, a mobilização dos estudantes, com várias manifestações importantes. Isso mostra que apesar do enorme baixo astral da agenda legislativa e do enorme descrédito que as instituições e os partidos estão sofrendo devido à crise do próprio modelo político, existe ainda uma força de participação da sociedade muito disposta a não recuar nas conquistas da democracia.


    Jornalistas Livres – Diante desse cenário conservador atuante no Congresso, qual a importância das Comissões Parlamentares de Inquérito que se instauraram e se mantiveram ativas, como, por exemplo, a CPI contra o genocídio da juventude negra?  

    Átila Roque – Tivemos duas CPIs tratando especificamente do genocídio da juventude negra, uma na Câmara e outra no Senado. A Anistia vem tentando, há um ano e meio, mobilizar a sociedade e pautar, no marco da campanha Jovem Negro Vivo, a agenda do alto índice de homicídios no Brasil, o impacto que isso tem sobre a juventude brasileira e a juventude negra em particular. A gente vem demandando, por um lado, que a própria sociedade rompa essa cortina de silêncio e invisibilidade sobre essa agenda e por outro lado que o Estado coloque esse tema no marco de prioridades que a gente acha que ele deve ter. O fato de o Congresso ter respondido com as CPIs merece destaque. Foram momentos em que essa agenda entrou de maneira muito qualificada no debate parlamentar. Em geral, esse debate chega no parlamento por vias muito tortas e marcadas por estereótipos e preconceitos, com uma visão conservadora, como aconteceu no debate sobre a redução da maioridade penal. Foram momentos em que esse debate pode chegar à agenda do Legislativo de maneira muito mais qualificada.

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    Jornalistas Livres – Em relação aos índices de homicídio, quais as tendências observadas pela Anistia?

    Átila Roque – Os dados mais recentes mostram uma assustadora continuidade no crescimento desses índices. No último Mapa da Violência, a curva dos últimos 10 anos, referentes ao homicídio de jovens entre 15 e 29 anos, há uma situação bastante dramática. Quando você olha os jovens brancos, há um decréscimo da ordem de 33%. Quando você olha, nessa mesma faixa de idade, os jovens negros, há um crescimento de 33%. Ou seja é um espelho invertido, o que leva a gente a pensar que em grande medida, a taxa de homicídios de jovens negros é o que está sustentando a taxa de homicídios na faixa tão alta de 56 mil, ou 58 mil, segundo o Fórum de Segurança Pública Brasileiro.

    “São quase 60 mil mortos por homicídio. Embora tenha caído em grandes cidades como no Rio de Janeiro e em São Paulo e tenha se interiorizado, de certa maneira, você não vê uma redução significativa para o patamar de calamidade que nós vivemos.”

    O fato é que o Brasil vive uma situação que pode ser considerada de emergência, de epidemia de homicídio. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, uma taxa de homicídios por cem mil habitantes, acima de 10, já pode ser considerada epidêmica. O Brasil, em média, está em mais ou menos 25 homicídios por cem mil habitantes. Ou seja, nós estamos mais no patamar da calamidade, porque 60 mil mortos por homicídio no ano é muito acima de várias guerras.

    Jornalistas Livres – É uma taxa muito expressiva e que preocupa por sua seletividade racial e geracional.
    Átila Roque – A taxa absoluta de quase 60 mil homicídios por ano é muito alta sob qualquer aspecto. A taxa relativa, de 25 homicídios por 100 mil habitantes também é muito alta, porque está muito acima do patamar de epidemia. A taxa por idade e o registro por cor também são muitos elevados. Mais de 50% dessas mortes são de jovens. E entre os jovens, 77% são negros. Isso significa uma focalização da vitimização de jovens negros e pobres, da periferia. Mostra que há uma letalidade altamente seletiva.

    Jornalistas Livres – Como o Estado reage? Há um desenho de política pública para enfrentar essa situação?
    O Juventude Viva [programa federal com desdobramentos municipais, desenhado especialmente para enfrentar o homicídio de jovens negros] é uma gota no oceano. É um programa que, quando você olha o conceito, é um meritório. Agora, o alcance dele, diante da tragédia que estamos vivendo é absolutamente pífio, para não dizer quase ridículo, considerando o tamanho do problema que a gente enfrenta no Brasil. O Governo Federal, o ministro da Justiça, vem há anos prometendo e adiando a publicação de um Plano Nacional de Redução de Homicídios, que traria um conjunto de iniciativas integradas, que envolveria o Estado e a União, focados na redução de homicídios. Nós estamos esperando isso há oito anos. A última vez que o ministro Cardoso prometeu isso foi no ano passado, no encerramento do encontro anual do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, quando ele disse que o plano estaria pronto e seria apenas questão de fechar os detalhes, para lançar não um “plano” mas um “pacto”. Estamos até agora esperando esse pacto. Já passou um ano desse momento.

    Então, isso tudo sugere que estamos vivendo um impasse: o Estado brasileiro não está conseguindo focar e dar prioridade àquilo que é a maior emergência humanitária que o Brasil vive. É uma situação que, daqui a 10 anos, vai nos deixar na mesma ou pior. Porque se você não fizer alguma coisa, de forma organizada para reverter isso, isso não vai se reverter naturalmente. Pelo contrário. O que a gente deve assistir é o que estamos começando a ver nos dados: uma focalização cada vez maior dos homicídios, com a penalização cada vez maior de um certo tipo de pessoa, de um determinado território, que estão sendo considerados sujeitos ‘matáveis’, quase descartáveis, e a sociedade, o Estado consegue dormir todos os dias com essa tragédia. São 30 mil mortes de jovens por ano, é como se a cada dois dias você estivesse derrubando um avião lotado de jovens, 77% negros, e isso não é notícia no jornal.

    Jornalistas Livres – O relatório diz que um dos pontos importantes para combater essa violência é a transparência na área da segurança pública. Como o senhor vê o posicionamento do governador Geraldo Alckmin, que impôs sigilo de 50 anos aos registros dos Boletins de Ocorrência?

    Átila Roque – Essa medida do governador Alckmin é inacreditável. Vai na contramão do que pedem os especialistas e dessa reivindicação por maior transparência e por maior sistematização dos dados. São Paulo, que já foi um evento nessa área, está entre os estados que no passado deram exemplo, junto com o Rio de Janeiro. Hoje está caminhando a passos largos para um retrocesso gravíssimo. Se essa medida se confirmar, vai ser realmente assustador.

    O que temos hoje no Brasil é uma situação em que a participação da polícia nos índices de homicídios é muito alta, ainda que os dados sejam fragmentados. Mostram que a participação do Estado, através da polícia, nesse total de homicídios é altíssima. No caso do Rio de Janeiro, por exemplo, olhando apenas os “autos de resistências”, ou seja, não estamos falando de todas as mortes que envolvem policiais, mas se a gente olhar apenas a situação em que a própria polícia diz que matou em legítima defesa, nós tivemos uma média nos últimos quatro anos de 15%. Ou seja, cerca de 15% do total de homicídios ocorridos no Rio de Janeiro são de pessoas mortas pelas mãos da polícia, supostamente em ações de legítima defesa. Mas diversas pesquisas mostram que essas mortes tratam-se de execuções sumárias e não de resistência seguida de morte. O relatório “Você matou meu filho”, lançado pela Anistia no ano passado, faz uma análise dos autos de resistência ocorridos no Rio em 2014 e também uma análise histórica desde 2011: há fortes indícios que a maioria dos casos de auto de resistência se tratou, na verdade, de execuções.

    Foto: Marlene Bergamo
    Foto: Lina Marinelli

    Jornalistas Livres – Então é correto afirmar que uma parte importante dos homicídios no Brasil é causada pela polícia.
    Átila Roque – Temos uma situação em que a polícia é parte do problema. A gente tem dificuldade de falar do conjunto do Brasil porque não há transparência, coleta uniformizada por parte das instâncias do estado, que têm responsabilidade sobre o controle e o monitoramento das ações policiais, com medidas efetivas nesses casos. O Ministério Público se omite e não atua no marco da sua responsabilidade constitucional, afinal de contas cabe ao MP o controle externo da ação policial, que não está fazendo isso. A Justiça, por sua vez, atua de maneira lenta, quase parada. Então, o número de situações que chega a qualquer tipo de responsabilização é quase nulo e a Polícia Civil também não investiga esses episódios. É quase uma cadeia de cumplicidade. Embora seja uma palavra forte, é como se tivesse todo um sistema funcionando para manter e autorizar a má atuação da polícia, no sentido de que ela pode continuar exercendo um papel de executora de pessoas consideradas traficantes ou bandidos, ou que quer que seja.

    Jornalistas Livres – Como isso se reflete no sistema prisional?
    Átila Roque – O campo da Segurança Pública e da Justiça no Brasil, que em qualquer sociedade funciona como um termômetro, um importante patamar de cidadania, está se revelando num enorme déficit de Justiça, uma enorme violência. O que a gente vê é esse sistema funcionando para penalizar um certo tipo de pessoa, muito mais como um fator de repressão, controle e até eliminação de um certo perfil de cidadão do que uma instância recuperadora, garantidora de um patamar de civilidade e eventualmente de punição e responsabilização daquela pessoa que está em confronto com a lei.

    “É um país que está prendendo as pessoas erradas”

    É, na verdade, um instrumento de controle e supressão de direitos da própria vida de uma certa parte da população. Ao traçar um paralelo entre a taxa de homicídios (quase 60 mil por ano) e a taxa de resolução de homicídios (entre 5 e 8%), ou seja, menos de 8% obtém qualquer resultado da Justiça, encontra-se um número altíssimo de impunidade. Como pode um país em que o crime contra a vida é praticamente impune, ter, esse mesmo país, a quarta maior população prisional do mundo? É um país que está prendendo a pessoa errada! A maior parte dessas quase 600 mil pessoas que estão hoje nas prisões, nas piores condições possíveis, não cometeram crimes violentos, não cometeram crimes contra a vida. São pessoas que cometeram crimes contra o patrimônio ou o chamado “tráfico de drogas”, porque o usuário é enquadrado como traficante, e 40% dos presos estão em prisão provisória – passam mais tempo na prisão do que no final das contas é a pena.

    “Basicamente o sistema de Justiça ou prende ou mata o jovem negro pobre. E a população do território de favela. Essa é a situação. Quem está morrendo são eles e quem está sendo preso também são eles – e cada vez mais elas.”

    Jornalistas Livres – Sobre o posicionamento político do Brasil, o que significa o país não ter se candidatado ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, como chama a atenção o relatório?

    Átila Roque – Isso foi visto como uma surpresa negativa. Desde o início o Brasil tem participado e ocupado assento na Comissão de Direitos Humanos. Pela primeira vez, o Brasil declinou da participação. É muito surpreendente que um país como o nosso, que tem reivindicado uma posição de protagonismo internacional político e econômico, no momento em que tem a oportunidade de ocupar um lugar de importância como essa comissão, espaço em que os Estados membro das Nações Unidas exerce seu mandato fundamental de monitorar as condições de direitos humanos do mundo, se furte voluntariamente a ocupar esse lugar. O Brasil está quase dizendo para o mundo que ele é um ator secundário. Quase declarando e assinando com firma reconhecida que não tem competência para estar em um espaço global de defesa dos direitos humanos tão importante como a comissão.

    Jornalistas Livres – O Brasil também não ratificou o Tratado sobre Comércio de Armas.
    Átila Roque – Quando o tratado foi aprovado, o Brasil foi um dos primeiros países a assinar, aderiu imediatamente. Mas desde então, a ratificação ainda não foi feita. O que cria uma enorme frustração e uma reversão de expectativas. Havia uma expectativa de que o Brasil fosse um dos primeiros a ratificar, dada a importância desse tratado no mundo de hoje. É mais fácil exportar arma do que banana. Existe muito mais controle do comércio internacional sobre banana do que armas de porte médio e pequeno, as que mais matam. Hoje o Brasil está mandando uma sinalização muito negativa ao não priorizar, não pressionar o Congresso.

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    Foto: Bruno Miranda/Na Lata

    Jornalistas Livres – No conjunto dos países pesquisados pela Anistia, como vai o Brasil? Há algum motivo de orgulho?

    Átila Roque – A Anistia não faz ranking. Normalmente não traçamos esse paralelo porque a gente prefere não comparar países. Mas podemos dizer que nós estamos entre os países que mais mata no mundo. Provavelmente em termos absolutos corre o risco de ser o país que mais mata e está entre os mais desiguais e mais violentos, mantendo um nível muito alto de violência de defensores de direitos humanos.

    Se você olha o volume de pessoas mortas no campo ou lideranças indígenas camponesas que são assassinadas, o Brasil é dos países que mais mata no mundo. Então, se você traçar um paralelo, o cenário dos direitos humanos no Brasil não nos orgulha. Tem avanços pontuais, mas estamos vivendo um momento em que tem uma grave ameaça de retrocesso. Ainda não se configurou porque ainda não foram medidas aprovadas, foram parcialmente aprovadas.
    Espera-se que a reação da sociedade possa reverter a situação. Mas estamos falando de grandes riscos. A situação brasileira não corresponde aos avanços que nós logramos em outras esferas, como o protagonismo global, a luta contra a pobreza, o avanço da democracia. O Brasil obteve grandes avanços ao longo dos últimos 30 anos do ponto de vista da Constituição, mas mantém ainda um patamar alto de violação, devido à dificuldade de implementação desse marco legal avançado, que não corresponde ao que nós gostaríamos de ver.

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    Átila Roque, diretor-executivo da Anistia Internacional no Brasil

    Ilustrações por Joana Brasileiro

  • Entenda o plano do PSDB para a Educação (ou por que São Paulo, Paraná e Goiás têm escolas em luta)

    Entenda o plano do PSDB para a Educação (ou por que São Paulo, Paraná e Goiás têm escolas em luta)

    Em 2015, professores da rede pública de seis estados desafiaram os governos estaduais com uma greve que buscava não só melhores salários como também uma escola pública de qualidade. Em São Paulo, foram 92 dias. No Paraná, com 50 dias de greve, a violência policial contra os servidores públicos, manifestantes e jornalistas mostrou quem era a PM do governador Beto Richa (PSDB).
    Greve dos Professores_Paraná_2015Em São Paulo, a truculência da PM contra os estudantes não foi diferente com o projeto de “reorganização” das escolas. Após o levante dos secundaristas pelas ruas e pelas mais de 200 ocupações, Geraldo Alckmin (PSDB), que não recuou durante a greve, cedeu, temporariamente, às reivindicações e suspendeu a aplicação do plano para 2016.
    Em Goiás, desde dezembro, os estudantes seguem na luta contra a militarização do ensino e a imposição do governador Marconi Perillo (PSDB), em transferir a gestão das escolas públicas a organizações sociais. Até o momento, são 27 escolas ocupadas.

    O que há por trás dessas medidas? Neste primeiro vídeo de uma série de quatro blocos, o Diretor da Faculdade de Educação da UNICAMP, Luís Carlos de Freitas, explica aos Jornalistas Livres quais são os atalhos impostos pelos governadores contra a escola pública de qualidade.

    Reportagem: Laura Capriglione e Jeniffer Mendonça / Edição: Oscar Freitas Neto, especial para os Jornalistas Livres.