Jornalistas Livres

Categoria: Assistência Social

  • Seminário aprova carta de reivindicações em defesa da política de assistência social

    Seminário aprova carta de reivindicações em defesa da política de assistência social

    Trabalhadores, usuários e gestores do Sistema Único de Assistência Social aprovaram uma Carta Aberta repudiando o completo desmonte que vem sofrendo a Política Nacional de Assistência Social. Além de se posicionar contrário a reforma da previdência, defende a valorização dos trabalhadores e trabalhadoras, o documento reivindica a ampliação de recursos em detrimento do desfinanciamento que vem sendo implementado pelo governo federal e que reflete diretamente nos recursos destinados à pasta em cada um dos municípios sergipanos.

    A aprovação da carta se deu durante “II Seminário: O SUAS em tempos de agenda ultraliberal”, realizado na última sexta-feira, 15, em Aracaju, pela Frente Nacional em Defesa do SUAS e da Seguridade Social (FNSUAS). O evento reuniu gestores, usuários e profissionais de mais de 20 municípios sergipanos, que foram debater os impactos do desmonte do SUAS para os trabalhadores e trabalhadoras e para a população usuária.

    Para provocar o debate, a atividade contou com a palestra da assistente social e ex-ministra de do Desenvolvimento Social e Combate à Fome do Governo Lula, Márcia Lopes, que resgatou a trajetória de implantação e fortalecimento do SUAS ocorrida no período que antecedeu o atual cenário de desmonte, destacando aspectos como a destinação de recursos, a articulação de políticas, estruturação dos equipamentos sociais com CRAS E CREAS e o controle social.

    Para a ex-ministra, a reação da sociedade civil, de forma organizada e com agenda, é imprescindível para enfrentar o cenário de desmonte do SUAS. O diálogo com os gestores municipais, articulação com parlamentares e a criação de espaços permanentes de debate e intervenção política por todo o Estado foram algumas das estratégias destacados por Lopes para fortalecer a articulação da sociedade.

    Neste sentido, ela apontou o processo de Conferências de Assistência Social como sendo importante instrumento de controle social. “Conferência de assistência social é compromisso. A conferência nacional vai acontecer o governo querendo ou não. Em outros momentos, a sociedade civil convocou a conferência que o governo não convocou”, motivou a ex-ministra arrancando palmas dos presentes.

    Itanamara Gudes, membro da Frente Estadual em Defesa do SUAS representando a FETAM, garante que os trabalhadores e trabalhadoras de Sergipe já estão definindo estratégias para cobrar ações locais que ajudem a enfrentar este difícil cenário. “Já como parte da agenda destacada por Márcia em sua palestra, a carta aprovada hoje por nós, trabalhadores do SUAS, será entregue ao governador do Estado Belivaldo Chagas, a prefeitos de municípios sergipanos e a parlamentares para que estes se comprometam com as reivindicações da nossa categoria”, explicou.

    “Esperamos contar com o diálogo fraterno dos gestores públicos, pois, além de prejudicar diretamente a parcela da população mais vulnerável e que necessita de atenção especializada, o desmonte do SUAS afeta até mesmo a economia dos municípios sergipanos, sobretudo os de pequeno porte, em que parcela significativa da população depende dos benefícios sociais”, apontou André, acrescentando que o evento contou com a presença de gestores de assistência social.

    Já Lenice Rosa, assistente social que atua na política de assistência do município de Canhoba, chama a atenção de seus pares para a centralidade da organização da classe trabalhadora para enfrentar o momento de agenda ultraliberal. “Sou filiada e atuante no meu sindicato. É fundamental que nos organizemos nos nossos sindicatos de servidores públicos municipais, reconhecer como espaço legítimo de luta da categoria, pois a política de assistência social é majoritariamente executada na esfera municipal”, estimulou a assistente social.

    Na edição do seminário O SUAS: em tempos de agenda ultraliberal, realizado pela FNSUAS, no dia 14, em Nossa Senhora da Glória, reuniu trabalhadores, gestores e usuários do Sertão, que, também, aprovaram uma carta em defesa da Política de Assistência Social.

    Plenária dos trabalhadores/as

    O evento foi encerrado com a II Plenária dos Trabalhadores do SUAS. Durante a plenária, coordenada pelo coordenador do Sindasse, Ygor Machado e pela presidenta da FETAM, Itanamara Guedes, os trabalhadores e trabalhadoras de mais de 20 municípios aprovaram o estatuto e a coordenação ampliada do Fórum Estadual dos Trabalhadores do SUAS de Sergipe (FETSUAS).

    Também foi aprovada uma agenda de ações de luta, a exemplo de encontros regionais para discutir o desmonte do SUAS por região, nos moldes do seminário realizado em Nossa Senhora da Glória, entregar a carta aos representantes dos Poderes Executivo e Legislativo. Outra importante ação deliberada foi a realização da Conferência Popular da Assistencia Social.

    Frente Sergipana

    Fazem parte da Frente Sergipana em Defesa do SUAS e da Seguridade Social o Conselho Regional de Serviço Social (CRESS), Conselho Regional de Psicologia (CRP), Sindicato dos Psicólogos do estado de Sergipe (SINPSI), Sindicato dos Assistentes Sociais de Sergipe (SINDASSE), Sindicato dos trabalhadores de socioeducação do estado de Sergipe (SINTS), Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Federação dos Trabalhadores do Serviço Público Municipal do Estado de Sergipe (FETAM) e o Conselho Estadual da Assistência Social, mandato do deputado estadual Iran Barbosa, militantes e pesquisadores do SUAS.

    por: Itanamara Guedes – Frente Estadual em Defesa do SUAS de Sergipe

  • Córrego do Feijão vive caos após rompimento da barragem

    Córrego do Feijão vive caos após rompimento da barragem

    Por Juliana Silveira, para o Jornalistas Livres

     

    O cenário é surreal. As lembranças do mar de lama, que invadiu impiedosamente o Córrego do Feijão no dia 25 de janeiro, são palpáveis. O rompimento da barragem rompeu também com a rotina pacata do vilarejo. Se antes os moradores compartilhavam “causos”, hoje dividem a dor da perda. A agitação e o barulho constante contrastam com a inércia do comércio local, que caminha para a falência.

    O bairro que nomeia a mina de exploração da Vale S.A, empresa que cometeu o crime, foi o primeiro a ser atingido pelo mar de rejeitos. Cerca de 500 pessoas moravam no local. Ainda não se sabe ao certo quantas vidas se perderam na lama, e os sobreviventes ainda não sabem como recomeçar. O cotidiano é marcado por desalento e preocupação. Há quem diga que as coisas nunca mais voltarão a ser como antes. E realmente não irão.

    “Perdi meu pai, um primo, o direito de ir e vir, a dignidade, a paz”. O relato de Adilson Lopes Silva, 35, é cercado pela incerteza do futuro. O almoxarife integra a Comissão de Atingidos do Córrego do Feijão e acompanha de perto o andamento das negociações, que a seu ver não caminham como deveriam. “Espero que aconteça um milagre, já que da Vale não posso esperar nada”, desabafa.

    Foto: Isis Medeiros

    Em meio ao desespero, muitas mãos se estendem para ajudar. Entretanto, a grande quantidade de pessoas que circula pela comunidade preocupa os moradores. Adilson tem dois filhos pequenos e uma enteada adolescente, e teme pelas motivações que podem ter levado algumas pessoas ao local. “É preciso barrar a grande quantidade de curiosos. Podem ser pedófilos ou aproveitadores. As pessoas que moram no bairro são simples e se não houver orientação podem cair em golpes”, alerta.

    Ilhada em toda essa confusão, a população segue do jeito que pode. Os rejeitos que atingiram o riacho de águas cristalinas, que era rodeado por vegetação da mata atlântica, atingiram também o emocional dos moradores. O lamaçal, com até 30 metros de profundidade, borrou de marrom, para sempre, a história de cada um.

     

    Foto: Isis Medeiros

    Com mais da metade do vilarejo sob o barro, a grande movimentação de pessoas no local e o fluxo intenso de helicópteros dificultam conversas, negociações, atrapalha o sono e destelha casas. As principais demandas, no momento, são de transporte, aluguel e apoio psicossocial.

    Até a última quarta-feira, 13 de fevereiro, 166 mortes foram confirmadas em Brumadinho. Mais de 300 pessoas trabalham nas buscas, entre militares do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais e de outros estados, da Força Nacional e voluntários civis. Eles atuam com o apoio de 43 máquinas pesadas, nove aeronaves e 12 cães. Ainda há 155 desaparecidos.

     

    Impactos emocionais

     

    Um dos problemas mais graves de saúde que podem se desenvolver por causa do rompimento da barragem é o trauma psíquico, já que muitas pessoas tiveram suas vidas completamente transtornadas pelo crime. Em abril de 2018, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) divulgou o estudo “Pesquisa sobre a Saúde Mental das Famílias Atingidas pelo Rompimento da Barragem do Fundão em Mariana”.

     

    Foto: Isis Medeiros

    O levantamento avaliou 271 pessoas, das quais quase um terço foi diagnosticado com depressão. A pesquisa mostrou também que 12% dos participantes têm traços do quadro de transtornos de estresse pós-traumático, uma patologia mental ainda mais grave. A taxa é próxima à encontrada imediatamente após o acidente nuclear de Fukushima, no Japão, em 2011.

    Impactos ambientais

    Os três milhões de metros cúbicos de rejeitos que se espalharam por Brumadinho colocam o rompimento entre os 10 maiores do mundo nos últimos 30 anos. A lama é formada pelos restos deixados pela atividade de extração e beneficiamento do minério de ferro, principal metal explorado na mina Córrego do Feijão.

    Economicamente, a parte importante é a hematita, mas para chegar até ela é preciso separar os minerais de menor valor. Para fazer essa seleção o minério é moído, por isso os resíduos são formados de partículas finas. É esse material, em contato com a água, que forma a lama.

    Foto: Otávio Martins

    A barragem que rompeu tinha 86 metros de altura. Os rejeitos atingiram o Rio Paraopeba e descem acompanhando o leito. Não há como precisar até aonde pode chegar. Análises preliminares da água encontraram concentração de metais pesados, como chumbo e mercúrio, 21 vezes acima do normal.

    A subsistência de comunidades que vivem à margem do Paraopeba já foi afetada. O acúmulo de grandes massas altera o curso do rio e mata as espécies que nele habitam. A água também fica mais turva por ter 800 substâncias dissolvidas a mais do que o normal. Quando se chega nesse nível não é possível tratar a água, que se torna imprópria para consumo. A partir daí, o rio morre.

    Tentativas frustradas de negociação

    Foto: Isis Medeiros

    Nesta quinta-feira, 14 de fevereiro, em audiência para definir medidas emergenciais a serem tomas, a Vale S.A pediu mais uma vez o adiamento da decisão. A segunda sessão para discutir o Termo de Ajuste Preliminar (TAP), proposto pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual, Defensorias Públicas da União e Estadual, e Advocacias-Gerais da União e do Estado, terminou sem acordo.

    Uma nova tentativa de negociação será feita no dia 20 de fevereiro. O documento propõe medidas que interrompam os danos socioeconômicos e socioambientais decorrentes do rompimento da barragem.

    O encontro aconteceu em uma sala pequena da 6ª Vara da Fazenda Pública Estadual e Autarquias, no Fórum de Belo Horizonte, não comportando, portanto, todas as pessoas que queriam participar da negociação. Com a recusa de mudar a reunião para um lugar maior, representantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), da ONG Abrace a Serra da Moeda, atingidos de Brumadinho e Imprensa tiveram que esperar pelo resultado desanimador do lado de fora.

     

    Foto: Maxwell Vilela

    Guilherme Carvalho, procurador da ONG Abrace a Serra da Moeda, reclama que “o Tribunal de Justiça devia ter disponibilizado um espaço maior, pois um processo que é público devia comportar todo mundo”. O advogado que atua na defesa do meio ambiente não discorda do TAP, mas propõe ajustes e questiona a participação dos atingidos, do município de Brumadinho e dos comitês. Já Thiago Alves, integrante da coordenação nacional do MAB e atuante na Bacia do Rio Doce, lamenta que “no processo de Brumadinho há repetições ruins do que aconteceu em Mariana”.

    De acordo com a defensora pública de Minas Gerais Carolina Morishita, na audiência “nada foi concretizado e criou-se um cronograma de negociação”. Ela disse que houve um avanço nas negociações em relação ao pagamento mensal às famílias e à constituição da assessoria técnica.

    A atingida Renata Rodrigues Barbosa, 27, uma das poucas que conseguiu entrar na audiência, reclama que “os atingidos não tiveram o poder da palavra”. Ela acredita que o avanço obtido não é suficiente, já que vive “à base da incerteza, sem saber o que comer amanhã”. A agricultora teve sua fonte de renda afogada pela lama e declara que “esse processo é um novo pesadelo”. Exausta das idas e vindas até a capital para acompanhar os trâmites legais, desabafa: “da Vale eu só quero a minha vida de volta”.

  • OS TRAPALHÕES VIOLENTOS DA GCM E O SANTO GUERREIRO DESARMADO

    OS TRAPALHÕES VIOLENTOS DA GCM E O SANTO GUERREIRO DESARMADO

     

    A incrível história de uma arma calibre 38 deixada/esquecida por um

    Guarda Civil Metropolitano em um carro; a pancadaria dos guardas em cima

    dos moradores de rua para reaver o revólver; e como o padre Júlio Lancellotti

    ajudou a recuperar a arma que, se caísse em mãos criminosas,

    poderia ser usada para matar inocentes

    Guarda Civil Metropolitano esqueceu ou deixou jogada, na tarde de sábado (26), uma pochete com arma, munição, distintivo e seus documentos em uma viatura descaracterizada. O veículo estava estacionado na rua Jaibarás, altura do número 260, na zona leste de São Paulo. Trata-se de uma área com alta densidade de moradores de rua.

    Os moradores de rua afirmam que o policial esqueceu a pochete em cima do capô do veículo. O guarda civil metropolitano disse que a pochete estava dentro do porta-malas do carro. Afirmou que se passaram apenas seis minutos quando, ao retirar o veículo de onde o havia estacionado, percebeu que o porta-malas estava aberto e dele havia sido retirada a pochete.

    O fato é que um dos moradores de rua pegou a bolsinha e levou-a, sem saber que o carro era de um policial. Ao abrir, a surpresa: surgiu um vistoso revólver da marca Taurus, calibre 38, arma de propriedade da Prefeitura de São Paulo, acompanhada de 6 cartuchos íntegros, munição codificada da GCM de São Paulo.

    Trata-se de uma máquina mortífera que, no mercado legal de armas, é vendida por mais de R$ 3 mil. E essa máquina mortífera pode virar um tesouro para um morador de rua, se for vendida no mercado informal (lembre-se que se trata de pessoa sem roupa, sem cama, sem casa, sem comida, sem nada).

    No próprio sábado, iniciou-se uma verdadeira caçada ao revólver sumido. No boletim de ocorrência lavrado sobre o desaparecimento da arma, consta a versão do guarda civil metropolitano. Segundo ela, o furto teria ocorrido às 15h21. Mas a comunicação do fato (o registro do B.O.) deu-se apenas 3,5 horas depois, mesmo estando a delegacia a apenas 2 minutos de carro do local dos fatos.

    Dezenas de moradores de rua nas imediações do Parque da Moóca relataram aos Jornalistas Livres que foram espancados, ameaçados, enfiados em viaturas e coagidos a contar o que sabiam (e o que não sabiam) sobre a arma desaparecida.

    “Os guardas queriam informações para chegar aonde estava a arma. Diziam que viriam nos matar e que matariam o padre Julio Lancelotti, se o revólver não aparecesse imediatamente”, afirmou à reportagem um jovem, dependente de álcool e drogas, morador de rua há cinco anos e que não será identificado por razões de segurança.

    Na madrugada desta terça-feira (29), as ameaças tornaram-se mais severas e os espancamentos também. Apavorado, um morador de rua procurou o padre Júlio Lancellotti, famoso defensor do povo pobre e oprimido, para lhe dizer que havia encontrado e levado a pochete, mas que entrou em pânico ao saber que ela pertencia à GCM, tropa com uma larga ficha de abusos e violência contra a população sem teto.

    O homem resolveu devolver a arma à guarda, e pediu ao padre que avisasse ao comando que havia arremessado a pochete em um terreno pertencente à Eletropaulo, em que funciona a Estação Transformadora de Distribuição do Hipódromo, na mesma rua Jaibarás.

    Eram 13h46 da terça (29) quando dois agentes altamente qualificados da GCM (trabalham diretamente com o Comandante Geral – Inspetor Superintendente Carlos Alexandre Braga) chegaram à modesta Paróquia São Miguel Arcanjo, cujo pároco é o padre Júlio Lancellotti. Ele os levou até a estação da Eletropaulo.

     

     

    No caminho, o padre Júlio Lancellotti foi a todo momento abordado por moradores de rua. Um lhe pediu ajuda para tirar os documentos; outro queria apenas um aperto de mão. O padre chama cada um pelo nome, sorri, conversa. Ele é o protetor daqueles seres totalmente desvalidos.

     

    Perigo de Morte na Estação Transformadora da Eletropaulo

    A estação da Eletropaulo estava fechada. Ameaçadora, uma placa advertia: “Perigo de morte. Não ultrapasse”. O jeito era esperar. Por uma portinhola aberta no imenso portão de ferro, viam-se condensadores gigantescos, capazes de criar campos magnéticos poderosos. Havia perigo mesmo.

    Logo apareceu o inspetor Hernane Pereira Meleti, homem de pouca conversa, bigodes fartos, uniformizado com o fardamento azul típico da guarda, pistola Glock no coldre, cercado por três motociclistas da GCM, um dos quais, franzino, logo começou a praguejar contra “esses esquerdistas protetores de bandidos”.

    As horas passavam e nada de aparecer um funcionário da Eletropaulo para abrir o portão de ferro e garantir o acesso seguro ao interior do terreno. Por volta das 17h, chegou um outro veículo da GM/Classic Life, branco, viatura descaracterizada da GCM, pilotada por agente à paisana, que se apresentou como membro da “Inteligência” da GCM. Junto vieram mais quatro agentes sem fardamento, que o policial da “Inteligência” explicou serem P-2, agentes secretos, segundo a gíria policial:

    “Eles estavam infiltrados nas manifestações da avenida Paulista [contra o aumento das tarifas e por moradia, que ocorreram nesta terça] e foram trazidos para cá, para acompanhar esta ocorrência”, disse, como se nada fosse.

     

    Interessante notar que, para o setor de inteligência da GCM, um sujeito, para ser “esquerdista”, tem de andar de bermudas, camisetas, tênis e boné.

    Confraternização geral entre os GCMs fardados e os vestidos com bermudas. Eram amigos.

    Logo, os policiais se puseram a defender a tese de que não havia nada demais em um agente armado esquecer/deixar sua arma em cima do capô ou dentro de um carro estacionado na rua.

    “Você nunca esqueceu o seu celular no carro?”, perguntou um deles, barbado, o mais nervoso do grupo, como se o potencial letal de um celular pudesse ser comparado ao de um revólver. Ao perceber que estava sendo gravado pelos Jornalistas Livres, o agente à paisana resolveu afastar a reportagem da porta da Estação Transformadora, alegando a criação de uma “área restrita” imaginária, que ia até uma árvore na calçada. Para imprimir autoridade, já que era difícil levar a sério imposição emanada de uma pessoa que parecia um hippie no túnel do tempo, ele mostrou o distintivo: tratava-se de um sub-inspetor da GCM.

    Por volta das 18h30 havia nada menos do que 11 agentes da GCM defronte à Estação Transformadora –quase uma manifestação. Os quatro P-2, assim identificados pelo seu superior hierárquico, atravessaram a rua e foram esperar do lado de lá pela abertura do terreno. Impacientes, telefonavam toda hora para o homem “da Inteligência”, que atendia o celular, dizendo ser um chamado “do Comandante”…

    O disfarce era pífio.

    Um dos agentes disse que, caso a arma fosse encontrada, o padre Júlio Lancellotti teria de “entregar” quem lhe dera a informação. Padre Júlio, paciente como é, ensinou que a informação lhe fora confiada “em confissão”, sacramento secreto fundamental para o perdão divino, cuja violação é passível de excomunhão.

    Passava das 20h quando, enfim, a Estação Transformadora foi aberta. A arma estava lá, conforme a informação passada ao padre Júlio Lancellotti. Ainda estava dentro da pochete, com a munição e o documento do guarda.

    O revólver não foi parar nas mãos de assassinos perigosos, mas poderia ter ido.

    Poderia ser usado para resolver uma briga de bar, uma crise de ciúmes, para roubar, para sequestrar. Para matar, que é para isso que uma arma de fogo serve.

    A prefeitura de São Paulo provê cursos de capacitação periódicos, para que os guardas aprendam como lidar com suas armas. O objetivo é prevenir, entre outras coisas, que as armas acabem nas mãos de bandidos. Faltou dizer que não pode deixar uma delas sobre o capô ou sozinha dentro do carro.

    Agora, se isso aconteceu com um GCM, imagine o que poderá ocorrer com as armas que estarão com pessoas comuns, depois que Jair Bolsonaro flexibilizou a posse de armas de fogo!!

    Não é sempre que surge um padre Júlio Lancellotti para resolver as confusões em que se mete uma tropa tão trapalhona quanto violenta, como é a GCM. Que pelo menos nesta noite cesse a violência contra os moradores de rua da Moóca.


     

    OUTRO LADO:

    Jornalistas Livres encaminharam perguntas à Assessoria de Imprensa e Comunicação da Secretaria Municipal de Segurança Urbana, à qual está subordinada a Guarda Civil Metropolitana de São Paulo. Aqui as respostas obtidas:

    Jornalistas Livres: Qual o procedimento padrão de um GCM para manter sua arma protegida? Quais as punições que podem ser aplicadas ao policial que deixou sua arma desacompanhada, no bairro da Moóca?

    Resposta: O comando da GCM informa que foi aberta apuração para investigar a conduta administrativa do agente, em virtude do furto de sua arma. As punições podem ser desde advertência até eventual demissão.

    Jornalistas Livres: O comando da Guarda pretende abrir uma investigação sobre as violências praticadas pelos GCMs contra a população de rua, incluindo ameaças ao padre Júlio Lancellotti, para obtenção de informações sobre a arma perdida/furtada?

    Resposta: Em relação aos questionamentos de violências praticadas por guardas da corporação à população de rua ou ao padre Júlio Lancellotti, o comando da GCM informa que não recebeu nenhuma denúncia ou reclamação, sendo que adotará as medidas de apuração se receber a notificação do fato por alguma testemunha.

    Jornalistas Livres: A GCM trabalha com infiltração em manifestações? Desde quando? Qual é o dispositivo legal que permite esse tipo de atuação por parte da GCM?

    Resposta: A GCM não atua com guardas infiltrados em manifestações, nem possui em seus quadros agentes P-2.

  • NOTAS SOBRE A PROTEÇÃO INTEGRAL, DIVERSIDADE E ENFRENTAMENTO DAS VIOLÊNCIAS

    NOTAS SOBRE A PROTEÇÃO INTEGRAL, DIVERSIDADE E ENFRENTAMENTO DAS VIOLÊNCIAS

    Foto: Leonardo Koury / 2014* Curumim Gávea

     

    Leonardo Koury Martins[1]

    A tentativa de construir um texto curto, de fácil linguagem e entendimento é o que norteará o breve diálogo sobre os termos e conceitos que falam dos desafios postos para a 11ª Conferência Nacional dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes. Portanto a perspectiva é que possamos iniciar uma localização do porquê sobre a proteção integral, diversidade e violências (no aspecto dos enfrentamentos) estão colocados neste conjunto.

    De início, falar sobre a proteção integral, em especial para esta parcela da população, não se pode descasar com as condições em que a maioria população brasileira na atualidade está disposta. Baixos salários, desemprego, precariedade no acesso das políticas públicas entre outros flagelos. Entender que é neste contexto a difícil tarefa em garantir uma noção de que proteger deve estar concatenada com a Seguridade Social e as políticas sociais.

    No que trata de crianças e adolescentes, sujeitos de direitos, viventes numa sociedade adultocêntrica (que não reconhece as diversas formas de representação política deste segmento) e por outro lado o constante desafio de estar com suas vidas garantidas meio à precariedade posta no parágrafo acima que retrata a conjuntura atual.

    Não é por acaso que o artigo 227 da constituição federal se inicia com a palavra é “dever” e não é direito. Pois às crianças e adolescentes, para ter os seus direitos resguardados, de forma primária precisam que (no aspecto do dever) a Família, a Sociedade e o Estado garantam o compromisso com a proteção integral que vai de questões relatas na materialidade pública até as políticas sociais, acesso ao mundo do trabalho protegido e resguardá-las de toda e qualquer violência.

    É necessário também fazer um recorte que as famílias são um pequeno núcleo da coletividade e quando a entendemos paralelas a sociedade e ao Estado não quer dizer que ela tenha as mesmas condições de garantir a proteção integral. Se é dever da família e da sociedade o cuidado (por exemplo) ele se materializa nas condições em que o Estado construa através de orçamento e políticas públicas o que se expressa no artigo no âmbito da materialização da saúde, educação, assistência social, esporte entre outras.

    Vale ressaltar que nos últimos anos o Estado Brasileiro tem deixado de lado a ampliação de uma série de serviços públicos e a partir da aprovação da Emenda Constitucional 95, e será um grande desafio a proteção não apenas deste segmento, mas para toda a sociedade. Vejamos os números e questões colocadas:

    De acordo com Grazielle David, assessora do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), o orçamento do ano de 2017 para as políticas públicas marcou o pior investimento dos últimos 50 anos. União, estados e municípios ampliaram no valor de 2016 apenas 1,17% do PIB em todas as políticas públicas. Em contrapartida, as isenções tributárias e os juros da dívida pública chegam a somar 52,7% do Orçamento Público. O que isto quer dizer? Que até o ano de 2036, quando termina o prazo da emenda 95, os investimentos serão cada vez menores o que acarretará inclusive o fim do orçamento para algumas políticas como a de Assistência Social ou mesmo a terceirização de serviços públicos como Escolas, Unidades de Saúde e Hospitais. Como garantir a proteção integral neste cenário?

    Antes de falar da diversidade é necessário dialogar sobre as diversas violências sofridas cotidianamente por crianças e adolescentes no Brasil e no Mundo. As violações de direitos são um tema contínuo e deve ter a atenção deste conjunto de atores sociais (Família, Sociedade e Estado), as crianças e adolescentes estão em todo e qualquer dado estatístico como as mais vulneráveis à violência e exploração sexual, tortura ou mesmo propícias ao abandono. O olhar adultocêntrico deve ser quebrado em nossa sociedade.

    De acordo com a Organização das Nações Unidas, a cada 7 minutos morre uma criança ou adolescente no mundo.

    O cuidado passa ao compreendemos que crianças e adolescentes são sujeitos de direitos e suas formas de verbalização e política devem ser compreendidas na sua integralidade. Nos anos de 2016 e 2017 o número de violações no Brasil para este segmento aumentou em 56% no âmbito das denúncias feitas pelo Disque 100 de acordo com o Ministério dos Direitos Humanos.

    Criar políticas de enfrentamento às violências é preciso, mas os números que tratam das diversas violações só irão cair quando a qualidade de vida das crianças, adolescentes e suas famílias forem foco do investimento público. Não se pode investir mais no capital financeiro do que em políticas sociais (vide Emenda 95). Prevenir violências passa por garantir condições de acesso as políticas públicas e que este acesso seja pautado na qualidade da oferta e construída inclusive com a participação das crianças e adolescentes que tem toda a condição e legitimidade de dizer sobre o que demandam e o que esperam desta oferta.

    E por onde caminha neste conjunto de conceitos a Diversidade? É importante primeiramente construir a ideia de que diversidade é esta que estamos colocando como desafios para a garantida dos direitos da população entre zero até dezoito anos. O Brasil esconde por uma condição hipócrita de democratismo e passividade sob a realidade de que somos majoritariamente negras/os como exemplo concreto.

    Além disso, a condição não pode determinar quem somos, porém, a esperança é que nas crianças e adolescentes, em especial na primeira infância, que o compromisso de desconstruir o preconceito e valorizar nossos saberes, da sexualidade, histórias e cores de uma sociedade brasileira seja potencializada no dia a dia da Família, Sociedade e Estado.

    A infância e a juventude podem dar para o presente /futuro a convivência das nossas diferenças sem que se tornem desigualdades. Está presente também neste segmento pessoas com deficiência, mulheres, religiosidade e enquanto classe: a potencial luta por sobreviver ao preconceito construindo alternativas cotidianas de ter o sorriso e a esperança como a estratégia de afirmar nossas diferenças.

    O texto termina por aqui, o diálogo não; mas ao parafrasear Rosa Luxemburgo é necessário acreditar em uma sociedade em que crianças e adolescentes sejam farol de um mundo humanamente diferente, socialmente igual e claro, um dia, todas e todos totalmente livres.

    [1] Leonardo Koury Martins – Assistente Social (CRESS 15.472 6ª Região), Professor do Curso de Serviço Social do Centro Universitário Unihorizontes, servidor público em Ribeirão das Neves e conselheiro coordenador da Comissão de Direitos Humanos do CRESS-MG.

    REFERÊNCIAS:

    CONANDA, Documento Orientador da XI Conferência Nacional dos Direitos das Crianças e Adolescentes. Brasília, 2018.

    Desafios da Emenda Constitucional 95, portal Jornalggn: https://jornalggn.com.br/noticia/por-que-revogar-a-emenda-constitucional-95-por-grazielle-david0020 Acessado: 11/08/2018

    Violência sofrida por Crianças e Adolescentes, EBC: http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2017-11/unicef-violencia-mata-uma-crianca-um-adolescente-cada-7-minutos  Acessado: 11/08/2018

  • ID JOVEM: A quem interessa o direito da juventude?

    ID JOVEM: A quem interessa o direito da juventude?

    Revisão de Agatha S. Azevedo

    Criado em 2015, o ID JOVEM tinha a proposta de auxiliar jovens (de 15 a 29 anos) de baixa renda a conseguir viajar pelo país, frequentar ambientes sócio-culturais, como teatro e cinema. Criado no Governo Dilma, o projeto visava dar mais oportunidades aos estudantes porém, uma das medidas golpistas do Governo de Michel Temer foi suspender o projeto.

    Ao procurar os motivos da suspensão no site do projeto, encontramos várias dificuldade, por exemplo a URL da audiência pública é inacessível, ou seja: da erro ao tentar entrar no site. Essa é uma maneira de não explicar, plausivelmente, o motivo da suspensão da ID Jovem. Procuramos também nas redes sociais do Planalto e do Temer mas também não há explicação, além disso tentamos contato com o Whatsapp publicado pelo SNJuventude, porém até o momento não obtivemos resposta.

    Essa é, sem dúvidas, mais uma medida contra a educação dos jovens do país, após a PEC que congela os gastos da educação por 20 anos. O programa ajudava diretamente os jovens a acessar, muitas vezes, programas culturais que sem o mesmo, eles não frequentariam. Carlos Jáuregui, que é professor universitário, do Instituto de Comunicação e Artes (ICA) do Centro Universitário UNA, diz que “em termos de formação profissional, a gente tem que pensar muito bem quando deixamos de investir na juventude, pois estamos criando um problema e um atraso para o país na ordem de 20, 30 até 40 anos. O jovem que tem hoje cerca de 20 anos e não recebe o devido investimento em sua formação, está deixando de ser um cidadão produtivo, engajado e informado nas próximas decadas, que ficarão prejudicadas”.

    Até julho de 2017 havia cerca de 230.991 IDs emitidas no país, até quando que a educação desta, e das próximas, serão sucateadas pelo governo Temer?

  • GOVERNO TEMER TENTA MAIS UMA VEZ CONVENCER SOBRE O GOLPE NA PRIMEIRA INFÂNCIA E SUCATEIA A ASSISTÊNCIA SOCIAL

    GOVERNO TEMER TENTA MAIS UMA VEZ CONVENCER SOBRE O GOLPE NA PRIMEIRA INFÂNCIA E SUCATEIA A ASSISTÊNCIA SOCIAL

    De acordo o material apresentado pelos representantes do Ministério, a primeira infância faz do carinho e cuidado sendo que segundo “pesquisas” as crianças e mães pobres, assim como suas famílias podem estar sendo afetas no seu entendimento cognitivo e neurológico pela falta deste “carinho”. Neste sentido o Governo Federal reduziu o orçamento das políticas sociais e lançou da alternativa de criar novos programas como o Criança Feliz.

    Entre as falas se destacam: “Usuário se sente desrespeitado pelo esforço de ir na conferência e depois vem dizer que deliberação não vale nada” Isaac,” família pobre também sabe amar e cuidar de seus filhos e não precisa de uma pessoa de nível médio pra vir ensinar isto pra ela” D . Arlete conselheiros no CEAS-MG.

    Entre as falas os Conselhos de Psicologia, Serviço Social e mesmo o COGEMAS reiteram a posição de ser contrário a adesão ao programa. Desde a sua criação o que foi debatido em comum é a ausência de espaços de participação na elaboração de sua proposta e descumprimento das deliberações das conferências e espaços de pactuação.

    A falta de carinho e cuidado não são causadoras da pobreza e sim a desigualdade social, que pós 2016 se amplia, trazendo milhões de desempregadas/os, retração dos investimentos no Serviço Público e no contraponto aumento de isenções tributárias e fiscais às grandes empresas privadas no país.

    Promover a infância e a juventude é garantir mais direitos, que só se faz com justiça, democracia e igualdade em condições.